Acórdão nº 5670/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Janeiro de 2007
Magistrado Responsável | PIMENTEL MARCOS |
Data da Resolução | 16 de Janeiro de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.
M.[…] Lda.
, com sede […] em Lisboa, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Pedro B.[…] e Pedro A.[…], titular do estabelecimento que gira sob o nome C.[…] M.[…], alegando, em síntese que: - é dona e editora da revista Guia TV Cabo, registada no Instituto da Comunicação Social em seu nome desde 16 de Maio de 1995; - desde então, e até Junho de 2002, publicou a revista mensalmente; - era a única revista portuguesa dedicada em exclusivo à televisão por cabo; - a revista, seu formato, projecto gráfico e conteúdo editorial foram concebidos pela A.; - em Junho de 2002, a A. resolveu suspender a edição da revista; - em 28 de Junho de 2002 foi posta à venda uma revista com o título "Tele Cabo", com formato e conteúdos em tudo idênticos à revista da A., incluindo as mesmas rubricas, crónica e colunas com os mesmos títulos e feitas pelas mesmas pessoas que antes colaboravam com a A.; - esta revista "Tele Cabo" tem como proprietário e director o 1º R. e como editora a empresa do 2º R.; - para lançar a Tele Cabo, os RR. aproveitaram-se dos suportes informáticos da revista da A., sem autorização desta, poupando assim os RR. todos os custos de organização, elaboração, lançamento e publicitação de uma nova revista; - os RR. têm aproveitado a publicação da Tele Cabo para nela inserirem alusões depreciativas acerca da revista da A. e da própria A.; - os R.R. têm causado à A. prejuízos patrimoniais importantes, nomeadamente impossibilitando a retoma da Guia TV Cabo pela A., bem como danos na sua imagem e bom nome comercial.
E termina pedindo que a acção seja julgada procedente e, em consequência, os R.R. condenados a pagar-lhe: a) indemnização pelos danos patrimoniais sofridos e já contabilizados no valor de 390.000,00 €, bem como por aqueles que a A. venha a sofrer no futuro, estes a apurar em incidente de liquidação em execução de sentença; b) indemnização por danos patrimoniais e morais na sua imagem comercial e reputação, a apurar em execução de sentença; c) juros de mora sobre as quantias arbitradas, desde a citação e até integral pagamento.
Os RR foram devidamente citados e contestaram.
O R. Pedro B.[…] alega, resumidamente, que: - a revista Guia TV Cabo não era a única revista portuguesa dedicada em exclusivo à televisão por cabo; - no início de Junho de 2002 a A. resolveu acabar definitivamente com a publicação da revista Guia TV Cabo, o que foi comunicado a todos os trabalhadores e colaboradores, os quais foram dispensados pela A.; - é falso que o R. tenha copiado por alguma forma a revista da A.; - os artigos contido na revista do R. são da autoria dos seus colaboradores e não da A.; - não publicou quaisquer comentários que atingissem ou visassem atingir a reputação comercial da A.; E termina pedindo que a acção seja julgada improcedente, com a sua absolvição do pedido.
Em reconvenção pede que a A. seja condenada a pagar-lhe uma indemnização no valor de 1.664.800,00 €, acrescida de juros de mora desde a notificação e até integral pagamento.
O 2º R. alegou, em síntese, que: - nunca foi editor da revista Tele Cabo, tendo-se limitado a produzir em papel, sob a forma de pré-impressão e impressão os conteúdos dos nºs 1 e 2 da revista, os quais lhe foram entregues em suporte informático pelo 1º R.
- nada teve a ver com a decisão de criar a Tele Cabo ou com os seus conteúdos; E termina pedindo a sua absolvição da instância por ilegitimidade ou, caso assim se não entenda, que a acção seja julgada improcedente por não provada com a sua consequente absolvição do pedido.
No despacho saneador, o 2º R. foi julgado parte legítima.
Procedeu-se a julgamento.
Seguidamente foi proferida a competente sentença, tendo sido decidido: «Pelo exposto, julgo a acção parcialmente provada e procedente condenando o 1º R. a pagar à A. uma indemnização no valor de 125.000,00 € (cento e vinte cinco mil euros), acrescida de juros de mora às taxas legais entretanto em vigor ou outras que venham a vigorar, a contar da citação sobre 100.000,00 €, e desde a presente condenação sobre 25.000,00 €, até integral pagamento; mais condeno o 1º R. em multa de 50 UC e igual montante de indemnização à parte contrária, por litigância de má fé, absolvendo-o do demais pedido; absolvo o 2º R. e a A. reconvinda dos pedidos contra eles formulados».
Dela recorreu apenas o R Pedro Bordalo Pinheiro, formulando as seguintes conclusões: 1- As revistas "Guia TV Cabo", da apelada, e "Tele Cabo", do apelante, destinam-se ao mesmo público, a quem transmitem as mesmas informações sobre a mesma matéria (a programação televisiva).
2- Trata-se, pois, de obras de natureza funcional e prática, a que só se aplica a protecção do direito de autor quando, e se, "o seu carácter artístico prevalecer claramente sobre a destinação industrial".
3- A existência de diversos elementos comuns, que dessa natureza necessariamente resulta, implica semelhanças entre ambas que, por respeitarem ao "modo de representação do mesmo objecto", não afectam a "individualidade própria" de qualquer delas (Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, artigo 116°, n.° 4).
4- É irrelevante a identidade ou a semelhança entre o projecto gráfico, o "lettering", o "lay-out" e o formato das revistas, pois, estas consistem em "processos, sistemas ou meios operacionais "excluídos da tutela do direito de autor" (citado Código, artigo 1°, n.° 2).
5- Também é irrelevante, para esse efeito, a igualdade ou similitude entre várias secções, como a grelha dos canais mais vistos, a programação, as fichas de assinaturas ou os temas de crónicas e rubricas, tanto mais que não se fez prova (nem foi sequer alegado) de serem idênticos os respectivos conteúdos - e só se fossem poderia falar-se em violação do direito de autor.
6- Aliás, e quanto a essas crónicas e rubricas e seus títulos, a titularidade do direito de autor pertence aos respectivos autores, de cujos serviços a apelada prescindiu quando suspendeu a publicação da sua revista, passando a prestá-los à revista do apelante (citado Código, artigos 19°, n.° 2, 173° e 174°).
7- Não pode existir concorrência entre duas revistas que não existem simultaneamente no mercado.
8- Ora, a revista do apelante só começou a publicar-se depois de a apelada haver suspendido a publicação da sua.
9- O decurso dos prazos estabelecidos nos artigos 5°, n.° 2 do citado Código e 21° a 23° do Decreto Regulamentar n.° 8/99, extinguiu o direito exclusivo da apelada ao título da sua revista "Guia TV Cabo" e à sua republicação.
10- Não houve violação, pelo apelante, das regras relativas ao direito de autor ou à concorrência desleal, ficando assim prejudicada a questão da violação do direito ao bom nome e reputação da apelada, que daqueles deriva; porém, a entender-se que esta é autónoma, a indemnização arbitrada deve reduzir-se ao valor que lhe foi atribuído (25.000 euros).
11- Não se justifica a condenação do apelante como litigante de má fé, devendo a sentença ser totalmente revogada.
Não foram feitas contra-alegações.
Pelo apelante foi junto um parecer do Dr. Luiz Francisco Rebelo antes de ser proferida a sentença recorrida.
** Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.
Em 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos (não impugnados neste recurso): 1. A Autora dedica-se à actividade editorial e jornalística, sendo proprietária de diversas publicações periódicas, contando no seu portfólio conhecidas publicações periódicas, nomeadamente as revistas Teleculinária e Guia TV CABO (A).
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A Autora é proprietária e editora da revista Guia TV CABO, registada no Instituto da Comunicação Social em seu nome desde 16 de Maio de 1995 (B).
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A revista Guia TV CABO é uma publicação mensal que contém informação sobre a programação dos diversos canais televisivos transmitidos por fibra óptica, em sinal aberto ou codificado (vulgo televisão por cabo), bem como notícias e entrevistas sobre o mundo do espectáculo (C).
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O projecto e o formato da revista Guia TV CABO foram concebidos, criados e executados em 1995 pela Autora , tendo constituído para tal um corpo editorial, de redacção e comercial para a produção regular e periódica da revista (1º).
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O projecto gráfico foi concebido pela A. e por empresa a quem ela o encomendou (2º).
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Ao longo de mais de sete anos, a revista Guia TV CABO tem vindo a ser concebida, editada, distribuída e vendida ao público de forma regular, contínua e com uma periodicidade mensal (3º).
-
A revista "Guia TV Cabo" era a única revista portuguesa da especialidade dedicada em exclusivo à televisão por cabo e vendida nas bancas ao público em geral (4º).
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O n.º 80, de Junho de 2002, tem o título, o formato e o conteúdo que consta do exemplar junto como documento 2 ao requerimento de providência cautelar (D).
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À data de Junho de 2002, era Director da Guia TV CABO o Sr. A.[…] (E).
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E eram redactores os senhores F.[…], N.[…], J.[…] e M.[…] (F).
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E eram colaboradores habituais, entre outros, os Senhores T.[…], Z.[…], S.[…], P.[…], B.[…], J.[…], G.[…], M.[…], O.[…] e D.[…] (G).
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Todas as pessoas acima mencionadas eram trabalhadores ou colaboradores regulares da Autora (H).
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Á data de Junho de 2002, o trabalho de impressão e pré-impressão da revista Guia TV CABO era executado pela empresa C.[…], propriedade do 2º Réu (I).
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Para tanto, a Autora entregava mensalmente à empresa do 2.º Réu um CD ROM contendo o lay out, os conteúdos e as fotografias do número da revista a imprimir (J).
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A qual procedia à pré-impressão com base no CD ROM entregue e posteriormente encarregava-se da impressão dos exemplares (K).
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Á data de Junho de 2002, a revista Guia TV CABO tinha uma tiragem de 60.000 exemplares (L).
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No início de Junho de 2002, a A. suspendeu a publicação da "Guia TV Cabo" (5º e 50º).
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Essa decisão foi tomada na sequência da denúncia pela "TV Cabo", em Outubro de 2001, de um contrato que a A. tinha com aquela empresa (6º e 51º).
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A denúncia do contrato que a TV...
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