Acórdão nº 836/2006-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Maio de 2006
Magistrado Responsável | MARGARIDA BLASCO |
Data da Resolução | 16 de Maio de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa I 1-M … , Maria M… e P…, foram admitidas a intervir nos autos como assistentes por despacho judicial de 15 de Abril de 2004. Em 16 de Novembro de 2004, vieram deduzir acusação contra o arguido Manuel …, imputando-lhe factos integradores da prática de três crimes de difamação, três crimes de injúrias e três crimes de publicidade e calúnia.
2-Esta acusação foi acompanhada, nos seus precisos termos, pelo Ministério Público (MP), em 23 de Março de 2005- cfr. fls. 208, tendo requerido que o julgamento fosse efectuado com a intervenção de tribunal singular.
3-Por despacho de 7 de Junho de 2005, o Sr. Juiz entendeu rejeitar a acusação deduzida pelas assistentes e acompanhada pelo MP, por entender que quanto ao crime do art. 184º do Código Penal (CP) dada a sua natureza semi-pública, não era possível que as assistentes deduzissem acusação, pelo que a mesma é legalmente inadmissível. Relativamente à acusação pelos crimes p. e p. pelos arts. 180º, 181º, 182º e 183º do CP, entendeu que a mesma é manifestamente infundada, por considerar que os factos narrados não integram os ilícitos imputados ao arguido.
4-As Assistentes vieram interpor recurso deste despacho por entenderem, em síntese, que, e transcreve-se: o despacho recorrido, ao não integrar a prática dos ilícitos, cometidos pelo arguido, narrados na peça acusatória e ao rejeitar a acusação particular deduzida pelas assistentes, e ou melhor, ao nem sequer ter apreciado os indícios recolhidos em sede de inquérito, relativamente a esses factos, invocando o disposto no artigo 285.º do Código de Processo Penal (CPP), sem sequer qualificar juridicamente o vício que o desrespeito por certos princípios acarreta para a acção penal decorrida, ao ter descaracterizado totalmente o despacho do Ministério Público, que acompanhou a acusação das assistentes/recorrentes, sem sequer lhe fazer referência, violou os princípios da economia processual, aproveitamento dos actos, direitos dos sujeitos processuais, e o disposto nos artigos 118.º a 123.º do C.P.P. Terminam pedindo que deve ser dado provimento ao presente recurso, ser revogado o despacho que rejeitou o recebimento da acusação das recorrentes/assistentes, integrando-se a prática dos ilícitos nela constante e consequentemente decretado o julgamento, com substituição do Meritíssimo Juiz de processo, face às convicções manifestadas, por outro, que promova despacho que clarifique a qualidade das assistentes, com a consequente renovação da acusação, ou à promoção do Ministério Público com o subsequente recebimento dos autos.
5-O recurso foi devidamente admitido e fixado o efeito legal.
6-Na sua resposta, o MP entendeu que existem factos que integram o cometimento pelo arguido de três crimes de difamação e injúria p. e p. pelos arts. 180º, 181º, 182º e 183º, nº1 al. a) do CP, pelo que o despacho impugnado deve ser revogado e substituído por outro que receba a acusação particular que foi acompanhada pelo MP.
7-Subiram os autos a este Tribunal, onde na vista a que se refere o art. 416º do CPP, a Exma. Procuradora - Geral Adjunta emitiu Parecer no sentido de acompanhar a bem elaborada resposta do MP, entendendo que por existirem indícios suficientes de o arguido ter cometido os crimes que as assistentes lhe imputam, deve ser concedido provimento ao recurso e determinar-se a substituição do despacho recorrido por outro que receba a acusação e designe dia para a realização da audiência de julgamento do arguido Manuel … .
8-Cumpriu-se o disposto no art. 417º do CPP, nada tendo sido dito.
9-Efectuou-se exame preliminar, tendo os autos sido remetidos para conferência.
10-Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
II 1-Recordemos o teor do despacho recorrido (transcrição): "Rejeita-se a acusação particular de fls. 200 a 205, deduzida por Maria …, Maria M… e P…, contra o arguido Manuel …, em que se imputa ao arguido a prática de: três crimes de difamação p. e p. pelos arts. 180º do Código Penal, três crimes de injúria p. e p. pelo 181º do Código Penal, ambos com a equiparação efectuada pelo artigo 182º do Código Penal e, três crimes de publicidade e calúnia, p. e p. pelo artigo 184º, também do Código Penal.
De facto, é nosso entendimento, assente no que deriva, desde logo, do teor da acusação particular, de que os autos não indiciam a prática pelo arguido dos crimes de que vem acusado.
Decorre claramente dos autos e da referida acusação, que os factos imputados ao arguido, se reconduzem integralmente a frases e expressões constantes do denominado Boletim "Trapalhadas", cujo conteúdo, reputam as assistentes como ofensivo e prejudicial da sua honra e consideração, preenchendo nesses mesmos termos, as previsões dos crimes de difamação e publicidade e calúnia.
Deste modo, os crimes imputados ao arguido, e reconduzem-se todos eles, à protecção da honra e consideração, bens jurídicos em relação aos quais o legislador numa constante e evolutiva linha de valoração, procurou, inequivocamente, reafirmar a sua dignidade penal, procurando protegê-los nas suas múltiplas refracções.
Neste sentido, considera-se honra como um bem jurídico pessoalíssimo e imaterial, enquadrável subjectivamente no juízo valorativo que cada pessoa faz de si mesma e objectivamente enquadrada na representação que os outros têm sobre o valor de uma pessoa, ou seja, na consideração, bom nome e reputação de que uma pessoa goza no correlativo contexto social envolvente.
No que respeita ao crime de difamação...
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