Acórdão nº 558/03-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2003

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução02 de Maio de 2003
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães A "A" (Universidade) intentou a presente acção declarativa com processo comum e forma ordinária contra "B" pedindo a condenação deste a entregar-lhe o bar da Escola "C" que lhe está concessionado desde 16 de Dezembro de 1993 e a ressarcir-lhe os danos para ela advenientes da sua actuação, a determinar em execução de sentença.

Alegou, para tanto e em síntese, que celebrou com o réu um protocolo de concessão de exploração do Bar da Escola "C", pelo período máximo de dois anos e enquanto fosse aluno da referida Universidade, mediante uma retribuição no montante de 135.000.000$00 mensais e que, não obstante, a 26 de Março de 2001, lhe ter sido enviado um ofício, notificando-o para proceder à desocupação do bar concessionado até ao dia 30 de Abril de 2001, o réu não o fez.

O Réu contestou, sustentando que o contrato celebrado entre ele e a A. traduz-se num contrato de arrendamento e que, caso tal contrato venha a ser declarado nulo por falta de forma – escritura pública -, então é de supor que se, à data da respectiva celebração, as partes tivessem conhecimento daquela invalidade teriam pretendido celebrar um contrato promessa bilateral de arrendamento para indústria.

Deduziu, ainda, reconvenção, pedindo seja a Autora condenada a: a) Reconhecer que celebrou com o Réu um contrato definitivo de arrendamento para indústria; b) Reconhecer que tal contrato é formalmente válido, eficaz e permanece em vigor; Ou caso assim se não venha a entender, a condenação, subsidiária da mesma a: c) Ver declarado nulo o articulado contrato definitivo de arrendamento para indústria; d) Ver declarado inteiramente válido, eficaz e em vigor o contrato promessa bilateral de arrendamento para indústria em que aquele se deve ter por convertido; Mas sempre, e em qualquer dos casos, a condenação da Autora a: e) Não perturbar, seja por que forma for, essa detenção exercida pelo Réu sobre aquele local.

Fundamentou as suas pretensões na interpretação, distinta da autora, que das declarações de vontade expressa pelas partes no protocolo celebrado que teve por objecto o bar em causa – e que serve de fundamento à acção - faz e no consequente enquadramento jurídico que para as mesmas propugna: o do contrato de arrendamento.

Mais defendeu que a ser declarado nulo, por falta forma – escritura pública -, então é de supor que se, à data da respectiva celebração, as partes tivessem conhecimento daquela invalidade teriam pretendido celebrar um contrato promessa bilateral de arrendamento para indústria.

Na réplica, a Autora sustentou que o contrato celebrado reveste a natureza de contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial e contestou o pedido reconvencional.

Na tréplica, o Réu pugnou pela improcedência da tese da Autora.

Foi proferido despacho, no qual se afirmou a validade e a regularidade da instância.

Foram elaborados os factos assentes e a instrutória, os quais não foram objecto de reclamação.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento com observância de todo o formalismo legal, decidindo-se a matéria de facto controvertida pela forma constante do despacho de fls.287 a 293.

A final foi proferida sentença que julgou a acção acção procedente e a reconvenção totalmente improcedente e, em consequência: a) condenou o Réu "B" a entregar à Autora "A" o bar da "C" da "A" em ..., entendido este como o espaço correspondente à zona de menor pé direito do hall central do edifício onde se encontra em funcionamento a dita "C", com o balcão, mesas e cadeiras ali instaladas pela "A"; b) condenou o Réu "B" a ressarcir a Autora pelo dano resultante da não utilização, pelo período de cerca de dois/três meses, dos equipamentos informáticos a serem colocados na zona do hall central da "C", em montante a determinar em execução de sentença, absolvendo-o do pedido de indemnização relativo à degradação e obsolescência dos equipamentos informáticos; c) absolveu a Reconvinda "A" da totalidade dos pedidos contra a mesma formulados pelo Reconvinte "B"; d) condenou a Autora e o Réu no pagamento das custas da acção, na proporção de 8/10 a cargo do Réu, 1/10 a cargo da Autora e 1/10, por ora, a cargo de Autora e Réu em partes iguais, relegando-se, quanto a este 1/10, o respectivo rateio para a sentença de liquidação; e) condenou o Reconvinte nas custas da Reconvenção.

Não se conformando com a decisão, dela, atempadamente apelou o réu, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: “1ª- No que concerne à interpretação das declarações negociais o Código Civil português consagra (artigos 236° e sgs.) uma doutrina objectivista, temperada por uma restrição de inspiração subjectivista (ver, neste sentido, Pires de Lima e Antunas Varela, in, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª edição, pág. 223).

  1. - Acrescenta, ainda, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26/02/1998 (in www.dgsi.pt/jstj.nsf /954...), que “na interpretação dos contratos (...) deve atender-se a todas as circunstâncias do caso concreto, não sendo em regra suficientes os termos do negócio ou o texto do respectivo documento”; 3º- O que distingue o contrato de arrendamento urbano para indústria do contrato de cessão de exploração de estabelecimento industrial é que enquanto naquele é o proprietário do prédio do prédio quem cede a outrem o gozo do imóvel, ou de parte dele, para exploração de um estabelecimento industrial, encontrando-se este nu, ou seja, desprovido de qualquer equipamento, ou ainda com algum desprezível equipamento, isto por um certo período de tempo e mediante retribuição, sendo o locatário quem coloca no local as respectivas mercadorias e equipamentos, escolhendo fornecedores e angariando clientes, implantando no mesmo local uma unidade económica complexa e caracterizada da universalidade designada juridicamente por estabelecimento industrial de que fica sendo titular.

    Neste último contrato é o proprietário de estabelecimento industrial, independentemente de ser ou não do prédio, quem cede a outrem o gozo temporário e mediante retribuição do mesmo estabelecimento, encontrando-se este totalmente instalado, ou seja, provido do equipamento necessário à respectiva exploração, dos fornecedores, das mercadorias, da clientela e do aviamento, constituindo, por isso, uma unidade económica complexa caracterizadora da universalidade designada juridicamente por estabelecimento industrial, de que o cedente é titular (ver, neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 26/04/1984, in B.M.J. nº 336, pg. 406 e de 27/01/1993, in www.dgsi.pt/jstj.nsf/954...).

  2. - Adiantando já a posição final adoptada, diremos que somos de opinião de que, face à factualidade provada acima descrita, entre a A. e o Réu foi celebrado um contrato de arrendamento urbano para indústria.

  3. - A nosso ver a vontade da A. deveria ter sido buscada, com maior propriedade, na acta da reunião da “Comissão de Avaliação de Propostas para a Exploração do Bar da "C" de ...” (documento nº 6 junto aos autos pela Autora com a réplica), uma vez que é este documento que traduz os motivos concretos com base nos quais a A. decidiu contratar com o Réu e não com qualquer dos restantes candidatos.

    Se analisarmos o teor daquele documento com maior atenção, verificarmos que, em concreto, o critério que permitiu a selecção do Réu como melhor candidato à exploração do bar em causa foi o número 7 que, muito embora apenas tivesse sido indicado no pedido de candidaturas como “outras contrapartidas”, foi considerado para efeitos de selecção dos candidatos.

    Na classificação final o Réu teve 91 pontos, contra os 86,25 pontos do quarto candidato, ou seja, o Réu teve mais 4,75 pontos que este candidato, pelo que só o primeiro lugar do Réu no 7º critério (compensação financeira) lhe permitiu a vitória no concurso em causa.

    Aliás, se repararmos, nos 4 critérios principais (1º a 4º) que a A. definiu, em abstracto, para seleccionar os candidatos, o Réu apenas ficou em primeiro lugar no 1º critério, sendo que, como se viu, não foi a vitória neste que lhe possibilitou a escolha pretendida.

    É, assim, de concluir que, em concreto, o que distinguiu o Réu sobretudo daquele quarto candidato, António ..., levando-o a ser seleccionado para a exploração em causa, não foram os primeiro a quarto critérios, pois quanto a esses o Réu, como se viu, não se destacou dos demais concorrentes, foi antes sim o sétimo critério, ou seja, a retribuição proposta que classificou o Réu no primeiro lugar.

  4. - Por isso, em conclusão, a A. concedeu ao Réu o gozo temporário (com a duração inicial de 2 anos) de parte de um prédio urbano (zona de menor pé direito do hall central), para exploração de um estabelecimento industrial (bar), mediante a retribuição de 135.000$00, pelo que estamos na presença de um contrato de arrendamento urbano para indústria.

    Estes sim são os elementos essenciais do negócio em causa, ou não será evidente que o que as partes pretendiam, fundamentalmente, era a instalação e posterior exploração de um bar no referido local, mediante uma contrapartida financeira? 7ª- Acontece que, o dito contrato de arrendamento urbano para exploração de um estabelecimento industrial foi celebrado entre a A. e a Ré em 06/12/1993, sendo que nesta data a lei (artigo 7º nº 2 alínea b) do RAU) dispunha que devem ser reduzidos a escritura publica os arrendamentos para indústria.

    Ora, o contrato em apreço apenas foi formalizado através de um documento particular assinado pela A. e pelo Réu, o que determina a respectiva nulidade por falta de forma (artigo 220º do Código Civil).

  5. - Porém, o presente contrato, como definitivo e “economicamente cumprido” que foi, já que reduzido a escrito, da autoria e assinado por ambos os outorgantes (requisito formal) e tendo as partes querido entregar e receber, na data da sua celebração e da forma descrita supra, o mencionado hall central para lá ser instalado e, posteriormente, explorado o referido Bar (requisito substancial), é...

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