Acórdão nº 2757/05-2 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelALMEIDA SIMÕES
Data da Resolução11 de Janeiro de 2007
EmissorTribunal da Relação de Évora

* PROCESSO Nº 2757/05 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA *"A", engenheiro, demandou, no Tribunal de …, "B", advogado, e mulher "C", pedindo a declaração de nulidade, por simulação, nos termos do artigo 240° do Código Civil, do contrato de compra e venda outorgado por escritura pública celebrada no cartório notarial de …, em 26 de Novembro de 1999, relativo a um prédio misto sito em … e … ou …, freguesia de …, concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o nº 907, de …, bem como a condenação dos réus no pagamento dos respectivos registos e na quantia de 2.800.000$00, correspondente aos frutos já percebidos, acrescida de juros de mora desde a citação.

Alegou, no essencial, que o réu marido patrocinou "D", irmão do autor, no inventário aberto por morte dos pais de ambos, tendo licitado, em nome do seu constituinte, o prédio atrás referido, pelo valor de 3.500.000$00.

Tendo seu irmão falecido a 2 de Janeiro de 2000, o autor é agora seu único e universal herdeiro.

No entanto, o irmão do autor passou procuração, em 15 de Julho de 1999, ao réu marido, apesar de já se encontrar muito doente e debilitado, atribuindo-lhe poderes para alienar o prédio em causa, incluindo o de celebrar negócio consigo mesmo, o que permitiu ao mesmo réu adquiri-lo pelo preço declarado de 2.000.000$00, intervindo na escritura como comprador e na qualidade de representante do vendedor, sendo que a escritura teve lugar dois dias antes do internamento hospitalar do irmão do autor, que se encontrava em condições de grande degradação física e intelectual, mantendo-se no hospital até à sua morte.

Acresce que o seu irmão nunca recebeu qualquer importância pela venda, que o réu nunca apresentou nota de honorários e que o valor declarado na escritura. é muito inferior ao valor de mercado, uma vez que o imóvel vale entre 38.000.000$00 e 40.600.000$00, tendo o réu marido arrecadado 2.800.000$00, em Agosto de 2000, pela venda de 400 arrobas de cortiça.

Na contestação, os réus excepcionaram a legitimidade do autor para a acção e negaram a existência de acordo simulatório, referindo que o prédio valia cerca de 6.000.000$00, mas que o réu marido, que é advogado, era credor de honorários, pelo que o irmão do autor acordou receber apenas 2.000.000$00 pela venda do prédio, de modo a saldar a dívida, estando ele, na altura, na posse de todas as sua faculdades mentais. Impugnaram ainda o valor da venda da cortiça, estimando-a em cerca de 400.000$00.

Houve réplica e lavrou-se despacho saneador a julgar, para além do mais, improcedente a excepção de (i)legitimidade, tendo sido também descritos os factos assentes e organizada a base instrutória (Os réus agravaram da decisão que julgou o autor parte legítima, mas o recurso foi julgado deserto, por falta de alegações).

Posteriormente, foi admitido um articulado superveniente apresentado pelo autor e aditado um novo artigo à base instrutória, vindo, depois, no início da audiência de julgamento a proceder-se a alteração da lista dos factos assentes e da base instrutória (fls. 246 e 462).

Feito o julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, absolvendo-se os réus do pedido.

Inconformado, o autor apelou, tendo alegado e formulado as conclusões que se transcrevem:

  1. No tocante à matéria de facto: 1ª. O presente recurso é interposto da sentença de fls., que julgou improcedente a presente acção, por entender que a putativa compra e venda não se encontra ferida de nulidade por vício de simulação, nem anulável por abuso de representação, nem que a conduta dos réus tenha lesado patrimonialmente e de modo injustificado a família do autor, pelo que também não os condenou a custearem os emolumentos destinados a regularização registral, nem a restituírem ao autor o valor dos frutos percebidos desde a pretensa alienação do imóvel em questão até à data da sua efectiva restituição ao proprietário.

    2ª A factualidade dada como provada alicerçou-se, segundo o Tribunal, na análise crítica de toda a prova produzida.

    3ª. É, todavia, entendimento do recorrente que os referidos meios de prova encarados de per si e conjugados com as regras da experiência comum não permitiam ao Tribunal dar como provada a matéria constante dos quesitos 8°, 11°, 12°, 13°, 15°, 16°, 17° e 19°, responder como respondeu aos nºs. 1, 5, 10, 17 e 18 da base instrutória, bem como considerar não provados os factos vertidos nos quesitos 2°, 3°, 4° e 21°.

    4ª. Assim, foram incorrectamente julgados os factos constantes dos pontos acima referidos e, de uma forma geral, tudo o que ex-adverso ...

    5a. Quanto ao valor da extracção da cortiça dado como provado nas respostas aos quesitos 5° e 18°, o mesmo não corresponde à prova produzida, porquanto, por um lado, o relatório dos peritos (doc. de fls. 290 e segs., mais concretamente fls. 294, e ainda esclarecimentos dos peritos quanto à extracção de 1999, insertos a fls. 346, 4° parágrafo) determinou o número de arrobas extraídas entre 1999 e 2002, concretamente 1010 @, sendo 201 @ de desboia, o que corresponde a uma média anual aproximada de 246 @, por outro, a testemunha dos RR, …, afirmou que pagou essa cortiça a Esc. 4.500$00 a arroba (Cassete 4 - lado A / Falas: 03.008 - 03.180 com as seguintes rotações: 02.978; 02.979 e 02.983) e ainda porque essa mesma testemunha afirmou que no ano de 1999 não foi extraída cortiça da propriedade em questão (Cassete 4 - lado A , Falas: 03.008 - 03.180 de rotações 02.898 e 02.948); 6a. Aliás, o réu, antes de "corrigir o tiro", e ter dito que recebeu pela cortiça 1.200 contos no ano de 2000 e 600 contos no ano de 2002, "fugiu-lhe a boca para a verdade" e, a instâncias da Sra. Juíza, revelou números mais consentâneos com a realidade das arrobas efectivamente extraídas e do valor líquido da arroba indicado pelo autor, de Esc. 8.000$00, ao invés dos meros Esc. 4.500$00 referidos pela testemunha do réu (Cassete 1 -lado A / Falas:00.236 - 00.186 de rotações 00.066).

    7a. Assim, se tivermos em consideração os valores constantes do quadro inserto no relatório de peritagem (fls. 294) em apreço e tomando em conta a produção média indicada na sua última coluna (média de 246 @ / ano), obteremos os montantes que se indicam:

    1. Ano de 1999 a 2002 - 809 @ (920 @ - 201 @ de desboia) x 4.500 $/@ = Esc. 3.640.500$00 ou 18.158,74 euros; b) ou partindo da média: Ano de 1999 a 2002 - 246 @ / Ano = 4.280 contos ou 22.086,77 euros.

      8a. Mesmo dando de barato um dado totalmente irreal e absurdo constante do relatório dos peritos que é a atribuição da produção de 120 @ de cortiça de desboia (cortiça virgem), em 2002, em montado, atendendo às características do povoamento existente no prédio (árvores quase tosas velhas), quando foram intervencionadas nesse ano mais de 300 árvores, bem como aceitar-se o valor de 4.500$00 líquido atribuído à arroba de cortiça, quando esse valor se situava, pelo menos, nos 8.000$00 / 10.000$00, como era facto público e notório em inúmeras publicações (jornais, revistas, artigos de opinião, televisão) quando tratavam do valor da cortiça na Serra de Monchique (Veja-se a este propósito algumas das passagens do depoimento de … , Cassete 3 - lado A - Cassete 3 - lado B / Falas: 01.945 - 02.567 de rotações 02.047; 02.049; 02.052; 02.057; 02.063; 02.065; 02.067; 02.069; 02.076; 02.077 02.079; 02.084; 02.089; 02.093; 02.097; 02.099; 02.100; 02.115; 02.116; 02.117; 02.149; 02.150; 02.156; 02.158; 02.159; 02.160; 02.162; 02.167; 02.288; 02.292; 02.293; 02.294; 02.304; 02.306; 02.308; 9a. Daí que os quesitos 5 e 18 devem merecer uma das seguintes respostas:

    2. De 1999 a 2002 foram extraídas 1010 @ de cortiça, sendo 201 @ de desboia que, na aproveitável, foi vendida a pelo menos 4.500$00 a arroba; b) ou, com recurso à equidade, o Tribunal pode facilmente concluir que da extracção da cortiça resultou para os réus um apuro líquido superior a Esc. 3.640.500$00 ou 18.158,74 euros.

      10a. Também quanto à determinação do valor do prédio, o Tribunal errou, e bastava-lhe tão somente ter tomado atenção aos seguintes elementos:

    3. Portaria 980/95, de 22 de Março de 1996 aliada à Circular do I.F.A.D.A.P n°. 4/96, que entrou em vigor em 22MAR96; b) relatório do perito dos réus e do Tribunal de fls. 290 a 299; c) "esclarecimentos" destes peritos a fls. 345 a 347; d) relatório do perito do autor a fls. 312 a 323; e) documento de fls. 323; f) depoimento de … (Cassete 3 - lado A - Cassete 3 - lado B / Falas: 01.945 - 02.567) com as seguintes rotações: 01.976; 01.977; 01.979; 01.997; 01.998; 02.000; 02.004; 02.007; 02.008; 2.010; 02.012; 02.017; 02.020; 02.022; 02.122; 02.123; 02.125; 02.210; 02.211; 02.239; 02.242; 02.243; 02.244; 02.525; 02.531; 02.535; 02.553 e 02.555); g) e ainda o depoimento de … (Suporte(s): Cassete 1 - lado B - Cassete 2 - lado A / Falas: 00.789 - 01.208) de rotações 00.920; 00.923; 00.924; 00.926; 00.928; 00.929; 00.930; 00.932; 00.935; 00.936; 00.938; 00.986; 00.989; 01.030 e 01.038); 11ª. Face a todos estes elementos objectivos não se compreende nem se aceita porque é que o Tribunal a quo foi "levado" a considerar que o prédio sub judice valia apenas 89.654,00 euros, valor que essa Relação, naturalmente, nunca poderá aceitar, tanto mais que é fácil de vislumbrar no relatório assinado pelo perito dos réus e pelo perito do Tribunal, que estes dois senhores utilizaram uma taxa de cinco por cento para os casos que não têm rendimento, para os casos que têm rendimento utilizaram a taxa de sete por cento. Isto mereceu o natural comentário da testemunha … 02.012 "... não percebo!". E é mesmo para não perceber e, consequentemente, para não aceitar esta "engenharia financeira"; 12ª. Diversas Circulares do I.F.A.D.A.P, nomeadamente a nº. 4/96 que entrou em vigor em 22MAR96, impõem critérios de valorização de prédios rústicos para o Algarve, "terra nua", em concreto no concelho de Monchique, com uma variação de 2% a 5% e nunca de 7%, concluindo-se que o perito dos réus e do Tribunal assinaram um relatório contrário à própria lei e às...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT