Acórdão nº 0644669 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelANTÓNIO GAMA
Data da Resolução24 de Janeiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal Judicial da Comarca de Matosinhos foi decidido: I) Condenar a arguida B……………., pela prática, em co-autoria, de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 108.º, 1.º, 3.º e 4.º, nº1, al. g), do D.L. nº422/89, de 2.12 (na redacção dada pelo D.L. nº10/95, de 19.01), e dos artigos 14.º, nº1, e 26.º do CP: na pena de 10 meses de prisão, cuja execução foi suspensa, ao abrigo do disposto no artigo 50.º do Código Penal, pelo período de 1 ano e 5 meses; e b) na pena cumulativa de 80 dias de multa, à taxa diária de 3 €, no montante global de 240 €.

II) Condenar o arguido C………………., pela prática, em co-autoria, de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 108.º, 1.º, 3.º e 4.º, nº1, al. g), do D.L. nº422/89, de 2.12 (na redacção dada pelo D.L. nº10/95, de 19.01), e dos artigos 14.º, nº1, e 26.º do CP: na pena de 7 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 1 ano; e b) na pena cumulativa de 50 dias de multa, à taxa diária de 8 €, no montante global de 400 €.

III) absolver a arguida B………………. da instância, quanto à prática da contra-ordenação p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 28.º e 31.º do CIVA, com referência ao artigo 117.º do RGIT.

V) Ao abrigo do disposto no artigo 116.º do D.L. nº422/89, de 2.12 (na redacção dada pelo D.L. nº10/95, de 19.01), determinar a destruição da máquina apreendida à ordem dos autos, a efectuar, após trânsito em julgado, pela entidade apreensora.

VI) Ao abrigo do disposto no artigo 117.º do D.L. nº422/89, de 2.12 (na redacção dada pelo D.L. nº10/95, de 19.01), declarar o dinheiro apreendido à ordem dos autos perdido a favor do Fundo de Turismo.

Inconformado com a condenação o arguido C………………, interpôs o presente recurso rematando a pertinente motivação com as seguintes conclusões: Os factos dados como provados, salvo melhor opinião, foram incorrectamente julgados, porque decorreram de referências incertas e vagas, não sustentadas por qualquer exame pericial que, no caso concreto, era a prova rainha, por fundamental para a qualificação do ilícito em causa e para determinar o preenchimento do seu elemento objectivo, havendo insuficiência de prova capaz de fundamentar de modo inequívoco a existência de jogo de fortuna e azar na máquina apreendida nos autos, bem como escassez de elementos probatórios susceptíveis de determinarem com certeza a responsabilização penal do arguido.

A decisão do Tribunal "a quo" alicerçou-se única e exclusivamente no depoimento prestado pelo Agente da GNR D…………… para condenar o Recorrente, depoimento este que foi contrariado por duas outras testemunhas - E……….. e F………… -, não tendo o Tribunal diligenciado no sentido de efectivamente se aperceber de quais os jogos desenvolvidos por tal máquina, e se os mesmos poderiam ou não constituir um qualquer ilícito criminal, Apenas tendo sido feita referencia à existência de um tal jogo de "Póquer" por meio de um único depoimento, o qual não foi de modo algum corroborado por quem habilitado para o efeito, entenda-se um qualquer Perito da Inspecção Geral de Jogos, única entidade competente para classificar o tema de jogo.

Para além do que, se alicerçou o Tribunal "a quo" em meios de prova que não foram examinados em audiência, designadamente, prova documental, no sentido de responsabilizar o ora Recorrente por esse tal ilícito, sem que tivesse sido realizada qualquer outra diligência no sentido de apurar se teria sido o Recorrente a colocar aquela máquina no estabelecimento dos autos, e se a mesma seria por si explorada, pois que, várias hipóteses poderiam justificar a existência daquela máquina no estabelecimento sem ser esta pertença do ora Recorrente.

De modo que, não se pode ter por aceite esta condenação do recorrente C……………., já que, assenta numa prova indiscutivelmente insuficiente, o que por si só fundamenta o presente recurso, tal qual dispõe o art. 410.º, n.º 2, al. a) do C.P.Penal.

Assim, é evidente a escassez de elementos fácticos e probatórios que pudessem suportar com firmeza a existência de um qualquer ilícito criminal na exploração da máquina em causa, bem como, a alegada atribuição da responsabilidade por tal ilícito ao aqui Recorrente.

Nesta decorrência, foi colocada à margem pelo Digno Tribunal o princípio da presunção de inocência do aqui Recorrente, quando o decidiu condenar com base apenas num único testemunho, tendo-se por certo que tal depoimento foi valorado com manifesto erro de apreciação crítica e valorativa.

Se o Tribunal não podia, como não pode, retirar da prova realizada em audiência de julgamento uma convicção positiva acerca dos elementos constitutivos do tipo, deveria, sem mais, absolver o arguido do crime pelo qual vinha acusado.

Logo, incorrendo a douta sentença numa subversão do princípio "In Dúbio Pro Reo", também enferma de um erro notório na apreciação da prova, conforme o disposto no art. 410.º, n.º 2, al. c) do C.P.P., na medida em que, retira um facto dado como provado através de uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória ou notoriamente violadora das regras de experiência comum.

Com o devido e sempre merecido respeito, mal andou o Tribunal recorrido ao enquadrar os factos na qualificação jurídica de crime de exploração de jogo ilícito, uma vez que, não resulta da prova produzida em audiência de julgamento, de forma suficiente, segura e certa, o preenchimento dos elementos constitutivos do tipo de crime supradito. Conclusão inversa só por manifesto erro na apreciação da prova pode ser assacada.

A decisão ora recorrida enferma de erro na apreciação da prova, porque baseou a sua motivação apenas no depoimento do agente autuante, sendo certo que este não logrou esclarecer o Tribunal sobre determinados elementos fulcrais quanto à classificação do jogo desenvolvido pela máquina.

Na verdade, questionado sobre determinadas características relativamente ao desenvolvimento do jogo que teria visionado no écran, a testemunha não soube responder e não elucidou o Tribunal sobre as mesmas, mormente, não referiu ter visionado no écran da máquina apreendida qualquer referência ao tema de jogo denominado Póker e não referiu que tivesse visionado elementos essenciais, qualificativos e específicos do jogo de póker, tais como: se era possível creditar ou dobrar apostas ou se o jogo tinha algum plano de prémios no écran.

Acresce que, não se refere na douta sentença sob recurso qual o objectivo do jogo ou em que assenta o resultado esperado pelo jogador e, concretamente, quais as possíveis combinações premiadas que possibilitem a obtenção de créditos, factos imperiosos para a qualificação jurídica do jogo, de forma a poder proferir decisão segura quanto à existência ou não de um jogo de fortuna ou azar.

Por outro lado, e sem conceder de tudo quanto supra foi expendido, discorda ainda o Recorrente da medida concreta da pena que lhe foi aplicada.

É que, a exigência do respeito pela dignidade da pessoa do agente e os termos da referência à culpa, critério consagrado expressamente no n.º 2 do art.º 40.º do C. Penal, impõem que não haja pena sem culpa e a culpa decida da medida da pena.

Acontece que, se é certo que é muito difícil "medir" a culpa de quem pratica factos criminalmente puníveis, não o é menos que, para a determinação judicial da pena, a nossa lei penal oferece ao julgador um quadro ou moldura em cujos limites aquela deverá ser fixada e dentro dos quais o julgador deverá ter em consideração, em conjunto, as particularidades do crime e do seu autor, orientando-se por critérios valorativos objectivos.

De entre tais critérios ou regras temos, em primeiro lugar, o critério de culpa do agente, que desempenha uma função justificável e limitadora da pena, o mesmo é dizer, impõe uma retribuição justa - artigo 71.º, n.º 1 do Código Penal - ou seja, uma pena justa, adequada, proporcional e razoável.

Ora, radica neste ponto, da retribuição justa, a discordância do aqui Recorrente em relação à medida da pena fixada pelo Meritíssimo Tribunal "a quo".

E isto porque, o Tribunal "a quo" considerou como elementos agravantes relativamente ao ora Recorrente a mediana ilicitude do facto, a intensidade do dolo que o classificou como directo, tudo tendo em conta as exigências de prevenção geral e especial que se impunham considerar.

Assim sendo, conclui-se que, o Tribunal "a quo" envereda por um caminho que ultrapassa a medida da culpa "in casu", imputando um juízo de censura que não se atém à esfera da realidade que circunda o arguido, extravasando o sentido subjacente ao conceito de "prevenção geral" que, aliado à protecção de bens jurídicos, tem que ter sempre em conta a proporcionalidade entre a medida da pena e a gravidade do facto praticado.

Com efeito, não valorou convenientemente o Meritíssimo Juiz "a quo" todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do arguido, designadamente: o grau da ilicitude, o facto de não haver qualquer notícia posterior da prática, por parte do arguido, de qualquer outro crime e de o mesmo se encontrar social e familiarmente inserido.

Motivo pelo qual, as penas aplicadas ao arguido revelam-se extremamente exageradas e desproporcionadas às exigências de prevenção geral e especial aqui reclamadas.

De sorte que, em obediência aos imperativos consignados no n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal, o Meritíssimo Tribunal "a quo"...

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