Acórdão nº 0545425 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelJOSÉ PIEDADE
Data da Resolução20 de Dezembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. Nº 5425/05-4 .º Juízo do TJ de Marco de Canaveses Proc. …/03.4 GAMSN Acordam, em Audiência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: No TJ de Marco de Canaveses, processo supra referenciado, foi julgado B………. tendo sido proferido Acórdão com o seguinte dispositivo: - Operando a legal convolação, julgar a acusação do Ministério Público procedente por provada e, em consequência como autor de um crime de abuso sexual p. e p. pelo artigo 172º, n.º 1 do Código Penal, condenar o arguido B………., na pena de trinta meses de prisão.

- Nos termos do disposto no artigo 50º do Código Penal, suspender a execução da pena agora aplicada ao arguido pelo período de três anos.

*Desse Acórdão recorreu o arguido, formulando as seguintes conclusões: 1. O arguido foi condenado pelo crime de abuso sexual, previsto e punido pelo art. 172º, nº 1 do CP.

  1. A acusação deduzida pelo MºPº, imputa ao arguido factos que consubstanciam um crime de abuso sexual na forma intentada, previsto e punido pelos arts. 171º, nº 1 e 22º do CP.

  2. O Tribunal recorrido decidiu pela alteração da qualificação jurídica dos factos, nos termos e para efeitos do disposto no art. 358º, nº 1 e 3 do CPP.

  3. Entende o arguido, salvo o devido respeito e melhor opinião, que e verifica erro notório na apreciação da prova a que alude o art. 410º, nº 2, al. c) do CPP.

  4. Desde logo cumpre expor porque todas as testemunhas o confirmaram, que o arguido juntamente com o irmão da ofendida, C………., foram ambos a casa da família de acolhimento buscar os irmãos (D………., E………. e F……….) para comemorar o aniversário daquele.

  5. Não resultou provado que a sugestão de ir buscar o bolo partiu de G……… pois também nesta matéria foram os depoimentos contraditórios entre si, ficando por apurar sobre quem deu a sugestão de ir comprar um bolo e sobre quem sugeriu que a D………. acompanhasse o arguido.

  6. Não se apurou em Audiência de Julgamento em que local foi comprado o bolo. Pelo que não pode ser dado como provado que o arguido parou o veículo entre ………. e ………., Marco de Canaveses.

  7. A ofendida refere que não sabe em que local foi comprar o bolo porque não conhece o local e, refere ainda que era de noite dizendo que eram 8 horas da noite. O seu depoimento é incoerente e inconsistente. Os factos ocorreram em Agosto e a ofendida refere que às 8 horas estava escuro.

  8. Quanto ao relatório médico-legal, do Gabinete Médico-Legal de Penafiel, junto aos autos fls. 88 e depoimento/esclarecimento do Sr. Perito Médico prestado em sede de Audiência de Julgamento, desde logo cumpre referir que o citado relatório médico-legal faz menção que a ofendida D………. não apresenta qualquer lesão corporal ao nível do exame geral.

  9. Independentemente das notórias contradições, não seria normal a ofendida apresentar alguma lesão uma vez que segundo o Douto Acórdão a mesma resistiu aos intentos do arguido? 11. O Tribunal recorrido deu como provado que o arguido ainda apontou o seu pénis erecto e, tentou introduzi-lo no ânus da menor contudo, o atrás citado relatório médico-legal, que a ofendida não apresenta lesões objectiváveis ao nível da região anal.

  10. Da análise dos depoimentos constata-se desde logo que, não só há contradição entre os mesmos e o referido relatório, bem como com os esclarecimentos do Sr. Perito. Isto porque, desde logo, no depoimento da irmã da ofendida, testemunha E………., esta apenas confirma que aquela lhe referiu que o arguido tentou por o pénis no ânus, local onde não haviam quaisquer lesões, como se refere no relatório em causa.

  11. Mas, mais grave ainda, é que esta não corroborou sequer com a versão dada ao Tribunal pela sua irmã D………., a ofendida, pois em momento algum do seu depoimento referiu que ela lhe contou ter o arguido também tentado introduzir o pénis na respectiva vagina, o que não conseguiu.

  12. No que diz respeito à congestão superficial generalizada com formação de rágada, com dois centímetros de comprimento na comissura posterior - união posterior dos grandes lábios que apresentava a D………., em consequência da actuação do arguido, facto que resultou provado, se atentarmos no relatório médico-legal de fls. 88 dos autos e nos esclarecimentos prestados pelo perito médico, Dr. H………., em sede de Audiência de Julgamento, verificamos que não deveria ter sido também este facto dado como provado.

  13. Refere o relatório médico-legal do Gabinete Médico-Legal de Penafiel, fls. 88 dos autos, in conclusões: "As lesões referidas a nível da região genital terão resultado de traumatismo de natureza contundente, cuja natureza é compatível com a informação, embora não sejam só por si patognomónicas de abuso ou acto sexual" "Tais lesões apresentam aspecto de terem sido produzidas num período inferior a 6 dias" 16. Conclusões que foram, em sede de Audiência de Julgamento, confirmadas pelo Sr. Perito Médico-Legal.

  14. Entende o aqui recorrente, que não ficou provado que a lesão traumática que apresentava a menor foi consequência da sua alegada actuação. Como podemos verificar os esclarecimentos do Sr. Perito vão no sentido de esclareceu que o traumatismo em causa não é especifico de abuso sexual, referindo mesmo que a lesão poderia ter sido causada por falta de higiene.

  15. Também não pode ser ignorado o facto de o citado traumatismo poder ter sido provocado até 6 dias antes à realização do exame, do que se conclui que já no dia 26 de Agosto, data em que alegadamente terão ocorrido os factos, a menos poderia já ter aquelas lesões.

  16. Pelo que, salvo o devido respeito e melhor opinião, constata-se um erro notório na apreciação da prova. Assim, no mínimo, em nome do princípio in dubio pro reo, deveria tal facto ter sido dado como não provado, uma vez que não ficou provado em sede de Audiência de Julgamento o nexo causal entre a lesão que a menor apresentava a nível dos órgãos genitais e a ocorrência de abuso ou acto sexual.

  17. Neste sentido vide Ac. do STJ de 15 de Abril de 1998, BMJ, 476, 82 - "Só existe erro notório na apreciação da prova quando o texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com regras da experiência comum, resulta com toda a evidência a conclusão contrária à que chegou o Tribunal. Nesta perspectiva, a violação do princípio in dubio pro reo pode e deve ser tratada como erro notório na apreciação da prova quando do texto da decisão recorrida se extrair, por forma mais do que óbvia, que o colectivo optou por decidir, na dúvida, contra o arguido." 21. Refira-se, ainda, que se constata uma notória contradição entre os factos referidos no ponto 9 e 13 do art. 3º: ora, se o Tribunal entendeu ter tido a menor compleição física para evitar a penetração por parte do arguido na vagina e no ânus da também teria para evitar que lhe tirasse a roupa. Aliás, recorrendo às regras da experiência comum mais fácil seria evitar pela referida compleição física da menos referida na Douta Sentença que o arguido lhe tirasse a roupa do que depois de tirada a roupa esta tivesse conseguido evitar a respectiva penetração anal e vaginal.

  18. De qualquer das formas, existe patente contradição entre os factos provados em nºs 9 e 13, pois das duas uma: ou a menor tinha à data compleição física bastante para qual conseguisse evitar os intentos do arguido entenda-se as penetrações atrás referidas ou, não tinha atenta a compleição física do arguido "sequer possibilidade de reacção de defesa por parte da ofendida".

  19. Ao abrigo do art. 370º, nº 1 al. b) e nº 2 do CPP, é nula a Sentença que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver fora dos casos nos arts. 358º e 359º do mesmo código.

  20. Ora, foi o arguido condenado pelo crime de abuso sexual, previsto e punido pelo art. 172º, nº 1 do CP.

  21. A acusação deduzida pelo MºPº, imputa ao arguido factos que consubstanciam um crime de abuso sexual na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 171º, nº 1 e 2 e 22º do CP.

  22. O Tribunal recorrido decidiu pela alteração não substancial dos factos, nos termos e para efeitos do disposto...

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