Acórdão nº 35/09.8TTSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelJOÃO LUÍS NUNES
Data da Resolução24 de Maio de 2011
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório Em 12 de Janeiro de 2009, M… participou, ao Tribunal do Trabalho de Setúbal, um alegado acidente de trabalho de que diz ter sido vítima no dia 28 de Setembro de 2008, quando se encontrava ao serviço de S…, Lda., cuja responsabilidade emergente de acidentes de trabalho se encontrava transferida para a Companhia de Seguros…, S.A.

Os autos prosseguiram os seus termos, tendo-se procedido à tentativa de conciliação a que alude o artigo 108.º e segts. do Código de Processo do Trabalho (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro), não se tendo, porém, logrado obter o acordo dos intervenientes, desde logo porque quer a seguradora quer a empregadora não reconhecerem o acidente sofrido pelo Autor como de trabalho.

* Com o patrocínio do Ministério Público, o sinistrado intentou, então, a presente acção especial emergente de acidente de trabalho, contra: 1. Companhia de Seguros…, S.A.

, e 2. S…, Lda.

, pedindo a condenação destas, na proporção das respectivas responsabilidades, a pagar-lhe: (i) uma indemnização por incapacidade temporária absoluta (IPA) no valor de € 3.061,50; (ii) uma indemnização por incapacidade temporária parcial (ITP) de € 1.179,24; (iii) o capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de € 612,30; (iv) o montante de € 11,50 referente a despesas médicas; (v) o montante de € 136,40 referente a despesas com tratamentos de fisioterapia; (vi) o montante de € 120,07 referente a despesas de deslocação; (vii) juros de mora à taxa legal sobre as importâncias referidas desde o respectivo vencimento até integral pagamento.

Alegou para o efeito, e em síntese, que no dia 28-09-2008, pelas 16h15m, quando regressava do trabalho, a poucos metros da sua residência, no caminho utilizado diariamente de acesso à mesma, quando conduzia o veículo motorizado desequilibrou-se e caiu.

Embora o caminho onde ocorreu o acidente se localize em propriedade privada do Autor, é o caminho de acesso à residência, utilizado não só por ele como por todos aqueles que se desloquem à sua residência.

Em razão da queda, sofreu fractura luxação do tornozelo direito, o que lhe demandou incapacidade temporária absoluta, e posteriormente incapacidade permanente parcial de 6%, vindo a ter alta em 28-04-2009.

Teve também que suportar despesas diversas, que descreve, em razão do referido evento.

Entre as Rés vigorava um contrato de seguros de acidentes de trabalho, por força do qual a segunda Ré transferiu para a primeira a responsabilidade emergentes de acidentes de trabalho em relação ao sinistrado, pelo valor correspondente ao salário anual de € 9.702,00 (€ 693,00 x 14).

Todavia, o Autor auferia anualmente a remuneração de € 14.578,58, sendo que ambas as Rés se recusam a assumir a responsabilidade por não reconhecerem o acidente como de trabalho.

* Contestou a Ré seguradora, sustentando, muito em resumo, não aceitar a caracterização do acidente como de trabalho, assim como os períodos de ITA e a IPP que foram fixados ao Autor.

Além disso, afirma que para si apenas se encontrava transferida a responsabilidade por uma remuneração do Autor de € 9.702,00 e este, segundo alega, auferia anualmente € 14.578,58.

* Também a Ré S…, Lda., contestou a acção, afirmando, em suma, que o acidente sofrido pelo Autor não pode ser considerado como de trabalho, até porque ocorreu no interior da propriedade privada do mesmo.

Além disso, não concorda com o período de incapacidade temporária, assim como com o período de incapacidade permanente, sendo que transferiu para a primeira Ré a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho, não lhe cabendo, por isso, qualquer dever de indemnizar o Autor.

Finalmente, pede em reconvenção a condenação do Autor pelas despesas que teve que suportar na acção com a contratação de advogado, bem como a condenação do mesmo Autor como litigante de má fé.

* O referido pedido reconvencional não foi admitido, tendo sido proferido despacho saneador stricto sensu, fixada a matéria assente e elaborada base instrutória, que não foram objecto de reclamação.

* Em apenso para fixação da incapacidade, foi fixada ao sinistrado a incapacidade permanente parcial (IPP) de 0,06.

* Os autos prosseguiram os seus termos, tendo-se procedido à audiência de discussão e julgamento e, seguidamente, respondido à matéria de facto, que não foi objecto de reclamação.

Após, foi proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor: «Em face do acima exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente porque provada em parte e, em consequência, condeno as RR. Companhia de Seguros…, S.A., e S…o, Lda., a pagar ao A. M…, na proporção de 66,55% para a primeira e de 33,45% para a segunda, absolvendo-as do mais peticionado: a. A pensão anual de € 612,30, obrigatoriamente remível, com início reportado a 29 de Abril de 2009, por ser o dia imediato ao da alta, acrescido tal montante dos juros de mora vencidos e vincendos às respectivas taxas legais em cada momento em vigor para créditos civis sobre o capital de remição, desde a data da alta; b. A quantia de € 3.052,36 a título de indemnização por incapacidades temporárias, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, contados desde o fim da quinzena em que cada parcela deveria ter sido liquidada, e até integral pagamento; c. A quantia € 257,97 a título de despesas médicas, tratamentos de fisioterapia, e despesas de deslocação pagos pelo A., acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, contados desde a data da citação e até integral pagamento.».

* Inconformada com a decisão, a Companhia de Seguros…, S.A., dela interpôs o presente recurso, tendo nas alegações formulado as seguintes conclusões: «

  1. Resulta dos factos provados que o Recorrido, no dia do acidente, após ter saído das instalações para ir para casa parou para almoçar com o colega num restaurante sito em Grândola.

B) Tendo, ainda, após ter chegado ao seu destino, ficado à conversa com o colega durante algum tempo.

C) E, só decorrido "um tempo", o Recorrido pegou no seu motociclo e dirigiu-se para sua casa tendo caído já dentro da sua propriedade.

O) Ou seja, o trajecto utilizado pelo Recorrente não foi aquele que era normalmente utilizado, tendo o mesmo decidido almoçar com o colega num determinado restaurante, para o que fez, necessariamente o correspondente desvio - mesmo que seja só o sair da via pública e entrar no restaurante.

E) Por outro lado, com a paragem para o almoço o trajecto ficou, desde logo, logo interrompido.

F) Não se poderá considerar como uma necessidade atendível o parar para almoçar.

G) Igualmente há interrupção quando o Recorrido, assim que chegou ao local onde se encontrava o motociclo que o devia conduzir até casa, ficou à conversa com o seu colega durante algum tempo, situação que, indubitavelmente, também interrompe o período de tempo habitualmente gasto pelo Recorrido no regresso a sua casa.

H) Logo, o acidente em causa não correu no trajecto normalmente utilizado nem durante o período de tempo ininterrupto habitualmente gasto pelo trabalhador, não se tratando, por conseguinte, de um acidente de trabalho “in itinere”.

I) Por outro lado, como ficou provado, o acidente ocorreu no interior da propriedade do recorrido, já a alguns metros do portão de acesso para a via pública.

J) Logo, por força do citado preceito, não pode o acidente que o Recorrido sofreu ser considerado como de trabalho, pois sucede após a abertura do portão de acesso à via pública, já a alguns metros de distância daquele e no interior da sua propriedade.».

E a rematar as conclusões, pede que seja julgado procedente o recurso e, em consequência, revogada a decisão que condenou a recorrente no pagamento das pensões, indemnizações e despesas.

* O Autor/recorrido respondeu ao recurso, a pugnar pela respectiva improcedência.

* O recurso foi admitido na...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT