Acórdão nº 472/04.4TAAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução25 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – RELATÓRIO 1.

No Processo Comum Singular n.º 472/04.4TAAGD, no Juízo de Instância Criminal de Águeda, na comarca do Baixo Vouga, por sentença datada de 9 de Novembro de 2010, foi condenado o arguido RM...

pela prática do crime de abuso de confiança fiscal contra a Segurança Social, na forma continuada, p. e p. pelos n.°s 1 e 2 do artigo 107º, conjugados com os n.ºs 1 e 4 do artigo 105º, todos do R.G.I.T., na pena de 90 dias de multa à taxa diária de EUR. 10,00, perfazendo o montante global de EUR. 2.900,00 (subsidiariamente, na pena de 193 dias de prisão), sendo a arguida X…, Ldª, responsável nos termos do artigo 7º/1 do RGIT, condenada na pena de 430 dias de multa à taxa diária de EUR. 16,00, tal perfazendo uma multa total de EUR. 6.880,00.

2.

O ARGUIDO RM... recorreu da sentença, assim concluindo o seu recurso (em transcrição): «- DA NULIDADE DA SENTENÇA POR VIOLAÇÃO DO ARTIGO 374°, N.° 2 DO CPP: FALTA DE EXAME CRÍTICO DA PROVA

  1. O Tribunal recorrido não cumpriu o disposto no n.° 2 do art. 374.° do CPP ao não realizar um exame crítico da prova produzida em Audiência de Discussão e Julgamento, sofrendo a sentença de que ora recorrida de falta de fundamentação e indo contra a prova produzida, pelo que o juiz condena com base em convicções.

    B) O Tribunal quo não faz um exame crítico na apreciação da participação do arguido na tomada de decisões, na medida em que fundamenta a sua decisão com base, em primeiro lugar nas declarações iniciais do arguido, quando este arguido sempre referiu nos seus depoimentos que a sua actuação era determinada pelas directrizes que lhe chegavam através de TR..., nomeadamente quando disse que: “A X...Lda sucedeu a uma outra fiação que existia em Águeda que era a Z..., e continuou a ser o antigo dono da Z...; que era o técnico fabril têxtil e o chefe da família (...) que mandava no negócio”, tendo ainda referido que: “Era o gerente cumprindo as ordens que me eram dadas superiormente por ele”.

    C) Apoia-se ainda nas declarações das testemunhas JP... e MR... quando estes nos seus depoimentos comprovaram repetidas vezes que, de facto, o arguido tinha que consultar o Engenheiro TR... e actuar de acordo com as indicações deste, como de resto estavam obrigadas elas próprias enquanto gerentes.

    D) Fundamenta ainda com base nas regras de experiência comum, quando estas opostamente ao raciocino preconizado pelo juiz a quo, vão no sentido de serem frequentes as situações em que, não obstante determinada pessoa ser gerente, essa atribuição formal não tem uma correspondência de facto, situações que se qualificam em termos jurídicos, que um gerente de direito é sempre um gerente de facto.

    E) Além de que, não explicou o Tribunal porque motivo não teve em conta as declarações do arguido, corroboradas pela testemunha MR..., no que respeita às garantias que lhe foram dadas pelo Engenheiro TR..., oralmente e por escrito, no sentido de que aquelas dívidas seriam regularizadas, sendo que o arguido sempre esteve convicto de que não estaria a incorrer na prática de um crime devido à esta promessa de regularização dos montantes.

    F) Também relativamente à prova dos valores em dívida e da sua entrega o Tribunal a quo deu como provados os meses de quotizações em falta e os seus respectivos valores atendendo aos depoimentos de BC..., SN... e TV..., dando-os como “patentemente merecedores de crédito e bastantes para esclarecer esta matéria”.

    G) Contudo, e não obstante tais testemunhas terem afirmado que foram enviadas declarações de remunerações para a Segurança Social e que na contabilidade da empresa arguida estavam lançados os pagamentos salariais efectuados aos trabalhadores, certo é que, nenhuma daquelas declarações prova, efectiva e indubitavelmente, que houve pagamento de salários nos períodos em que ficaram provados existir falta de entrega das quotizações, pelo que nunca o tribunal a quo poderia simplesmente ter dado como provado tal facto exclusivamente com base nesta prova.

    H)- Mas além disso, não poderia também ter ignorado o resto da prova que foi produzida neste âmbito e nomeadamente Relatório de Inspecção (fls. 36. a 38. do processo), elaborado pela testemunha BC..., e no qual esta atribui uma fraca credibilidade à empresa arguido, relatório esse simplesmente ignorado pelo Meritíssimo juiz, que não fundamentou o porquê da sua não valoração como prova.

    I)- Mas também foi ignorado pelo juiz a sentença de reclamação de créditos no Processo n.° 573/04.9TBAGD-A, que foi junta aos autos e da qual consta que foram pagos créditos laborais de 145 trabalhadores no valor de 1.542.399,62€ (um milhão, quinhentos e quarenta e dois mil, trezentos e noventa e nove euros e sessenta e dois cêntimos), bem como os créditos pagos no valor de 914.028,95€ (novecentos e catorze mil e vinte e oito euros e noventa e cinco cêntimos) pelo Fundo de Garantia Salarial, tudo durante o período que releva na acusação.

    J)- Ora, o facto de ter desconsiderado estes documentos e os valores que deles constam, é incompreensível, na medida em que tais documentos provam que os salários não foram pagos, daí a reclamação de créditos no processo de insolvência, ou foram pagos pelo Fundo de Garantia Salarial, e, nesse caso, não são devidas quotizações.

    K)- Relativamente à matéria dada como não provada, também o douto tribunal não fundamentou devidamente o que esteve na base a sua decisão em dar aqueles factos como não provados, não tendo, por isso, realizado um exame crítico da prova.

    L)- O tribunal entende que “não foi produzida prova bastante no sentido de o Presidente do Conselho de Administração da W... — SGPS, SA — na qual, à data dos factos, TR..., não tinha cargo -, tomar e/ou comunicar concretas decisões relativas à vida da arguida sociedade, ou o sequer modo como tais decisões fossem tomadas (por maioria ou com um voto preferencial, ficando o arguido vencido)”, sendo que, no entanto, a questão que se encontrava em discussão nos autos, e é a que consta da contestação era o facto de o Engenheiro TR... ser quem efectivamente mandava e dava as ordens, independentemente e não obstante não ser presidente ou ter qualquer cargo nas empresas W....

    M) Todavia, o juiz simplesmente esquece e passa por cima de toda a prova que foi produzida em julgamento e à qual já aludimos, nomeadamente aos testemunhos do próprio arguido, e das testemunhas DS..., FK..., MR... e JP....

    N)- O tribunal a quo não operou um exame crítico da prova uma vez que não fundamentou com exactidão e precisão a sua decisão, e isto seja porque vai contra a prova que foi apresentada em audiência, seja porque partiu de premissas em razão das regras de experiência incorrectas, ou seja porque não fundamentou a razão de não ter valorado, sem que o explicasse, alguma da prova que foi oferecida em sede de Audiência e Julgamento, pelo que a sentença deverá ser declarada nula.

    - DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO O)- Foram incorrectamente dados como provados os pontos 6...

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