Acórdão nº 423/07.4PWPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Abril de 2011
Magistrado Responsável | MARIA DO CARMO SILVA DIAS |
Data da Resolução | 13 de Abril de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
(proc. n º 423/07.4PWPRT.P1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO Nos autos de processo comum (Tribunal Singular) nº 423/07.4PWPRT, a correr termos no 3º Juízo Criminal do Porto, 3ª Secção, foi proferida sentença, em 31.5.2010 (fls. 209 a 226 do 1º volume), constando do dispositivo o seguinte: “Pelo exposto, julgo procedente e provada, a douta acusação pública e, consequentemente:
-
Condeno o arguido B…, como autor material de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art. art. 25°, al. a), do Dec.- Lei n° 15/93, de 22-1, com referência à tabela I-A, anexa ao mesmo diploma legal, e em consequência condeno-o na pena de 14 meses de prisão; b) Condeno o arguido B…, como autor material de um crime de crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º1, al. d), com referência ao art. 2.º, n.º 1, al. ar) e art. 3.º, n.º2, al. e), da lei 5/06, de 23/02, na pena de 3 meses de prisão; c) em cúmulo jurídico das penas referidas nos itens a) e b) -nos termos do art. 77.º, do Cód. Penal-, condeno o arguido, B…, na pena única 15 meses de prisão d) ao abrigo do disposto no art. 50.º, do Cód. Penal actualmente em vigor (na redacção da Lei 59/2007, de 04/09), suspendo a execução da pena única aplicada ao arguido por um período de 15 meses.
-
tendo em vista promover a reintegração do arguido na sociedade, nos termos dos arts. 52.º a 54.º, do Cód. Penal, sujeito a referida suspensão a regime de prova, de acordo com o plano de reinserção social a elaborar pela D.G.R.S. (ex IRS), impondo ainda, ao arguido, a seguinte regra de conduta: 1- colaborar com os técnicos da D.G.R.S. (ex IRS) e comparecer nos dias e horários determinados pelos mesmos.
***Nos termos do art. 109.º, n.º1, do Código Penal, declaro perdida a favor do Estado a droga apreendida nos autos, a qual será, após trânsito, oportunamente, incinerada (art.62º do DL. 15/93 de 22/01).
*Nos termos do art. 109.º, n.º1, do Código Penal, declaro também perdido a favor do Estado o dinheiro e a navalha apreendidos nos autos.
***Condeno o arguido nas custas do processo, com taxa de justiça que fixo em 2 UC’s, acrescidas do mínimo de procuradoria contada a favor dos S.S.M.J. e 1 % da taxa de justiça aplicada, nos termos do art. 13°, n° 3 do Dec.-Lei n° 423/91, de 30/10, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe venha a ser concedido.
***Após trânsito, comunique esta decisão ao Gabinete de Combate à Droga do Ministério da Justiça (art. 64. °, n.º 2 do Decreto Lei n.º 15/93, de 22.01, tendo-se em conta o art. 74. ° do mesmo diploma legal);**Envie boletim ao registo criminal, após trânsito.
Notifique e deposite (arts. 372º, nº 5 e 373º, nº 2 do C.P.P.).”*Não se conformando com essa sentença, o arguido B… interpôs recurso (fls. 229 a 238), formulando as seguintes conclusões: I- A douta decisão recorrida deve ser alterada pois houve um erro notório na apreciação da prova, nos termos do art. 410º, nº 2, alínea c), do Código de Processo Penal.
II- A punição do crime de detenção de arma proibida, previsto no art. 86º, nº 1, alínea d), da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, tem de ter em atenção a definição de “arma branca” estabelecida no art. 2º, nº 1, alínea l), da mesma lei.
III- Como também a definição de “faca de abertura automática ou faca de ponta e mola” terá que ter em consideração essa mesma definição de “arma branca”.
IV- Da definição de “arma branca” resulta que a lâmina do objecto portátil tem de ter o comprimento igual ou superior a 10 cm.
V- A navalha encontrada em casa do Recorrente tinha uma lâmina de apenas 9 cm de comprimento.
VI- Com este comprimento de lâmina, a navalha do Recorrente não poderá ser qualificada de “arma branca”.
VII- Não sendo qualificada como arma branca, não poderá ser qualificada como “faca de abertura automática ou faca de ponta e mola” para efeitos da aplicação da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro.
VIII- O tribunal a quo não teve em consideração a definição de “arma branca” estabelecida no art. 2º, nº 1, alínea l) da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, tendo, por isso, condenado o Recorrente no crime de detenção de arma proibida, prevista no art. 86º, nº 1, alínea e), com referência ao art. 2º, nº 1, alínea ar) e art. 3º, nº 2, alínea e) da já referida lei.
IX- Ao não ter atendido à definição de “arma branca”, o tribunal a quo cometeu um erro notório na apreciação da prova, nos termos do art. 410º, nº 2, alínea c), do Código de Processo Penal.
X- Por força desse erro notório na apreciação da prova, o tribunal a quo acabou por condenar, injustamente, o Recorrente no crime de detenção de arma proibida.
Termina pedindo o provimento do recurso, alterando-se a sentença impugnada com a sua consequente absolvição do crime de detenção de arma proibida.
*Respondeu o Ministério Público (fls. 244 a 255 do 1º volume), pugnando pelo não provimento do recurso.
*Nesta Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer (fls. 280 a 282 do 2º volume), concluindo pelo não provimento do recurso.
* Foi cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do CPP.
*O arguido respondeu ao parecer nos termos que constam de fls. 287 a 289, concluindo pelo provimento do recurso.
*Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
*Na sentença sob recurso foram considerados provados os seguintes factos: “1. Cerca das 11h45m do dia 4 de Setembro de 2007 e devidamente autorizados pelo arguido, os agentes da P.S.P. identificados a fls. 3, efectuaram uma diligência de busca ao quarto onde então o arguido habitava sito na Rua …, n.º .., .° dt., no Porto, ali tendo então apreendidas, 16 embalagens de plástico contendo um produto em pó que, submetido a exame laboratorial, revelou ser heroína, com o peso líquido global de 1,183 gramas.
-
Na mesma data e local, foram ainda apreendidos ao arguido, dois frascos contendo um líquido que, em sede de exame laboratorial, revelou ser metadona, com o volume de 8,00 ml.
-
Na mesma ocasião e lugar foi igualmente apreendida ao arguido a quantia de €38,00 (trinta e oito euros), proveniente de vendas de substâncias idênticas às que lhe foram apreendidas e descritas em 1), efectuadas pelo arguido anteriormente à realização da acção policial acima descrita.
-
Ainda na mesma ocasião e lugar, foi apreendida ao arguido a navalha examinada a fls. 98 (cfr. também fls. 11), a qual, tendo lâmina com 9 cm de comprimento, "possui um mecanismo para bloqueamento e desbloqueamento, com comando e patilha de segurança na ponta posterior do cabo, que, quando accionado, permite a abertura automática da lâmina".
-
O arguido conhecia a natureza e característica da heroína que lhe foi apreendida e que destinava a ser por ele vendida a qualquer consumidor de tais substâncias que o procurassem em busca da mesma, não obstante saber que a respectiva aquisição, detenção cedência e/ou venda lhe eram vedadas, sendo punidas por lei.
-
Tinha também o arguido perfeito conhecimento da natureza e características da navalha que lhe foi apreendida, bem sabendo que a mesma, desde que manuseada com mediana destreza e visando o corpo de alguém, era apta a colocar seriamente em perigo a saúde, integridade física ou mesmo saúde da pessoa que fosse assim visada, sabendo também o arguido que o mecanismo com que aquela navalha se encontrava dotada aumentava o efeito surpresa - e consequentemente também o respectivo perigo - do uso daquela navalha.
Mais se provou: 7. Na data dos factos a que se referem os autos, o arguido era consumidor de produtos estupefacientes (cocaína e heroína).
-
O arguido anda em tratamento de consumo de drogas, no CRI Porto Ocidental E.T. de Matosinhos, desde 29/03/01, integrando desde essa data programa de substituição pelo cloridato de metadona, cuja toma efectua diariamente; mantém ainda consultas de acompanhamento médico e socioterapeutico.
-
O arguido: a) é solteiro e vive sozinho em casa arrendada, pagando de renda €180,00 mensais; b) trabalhou na industria hoteleira, encontrando-se desempregado desde há cerca de um ano; recebe o rendimento de inserção social no valor de €187,00 mensais; c) tem apoio social para pagamento da renda; d) confessou quase integralmente os factos de que vinha acusado, com relevância para a descoberta dos mesmos; e) Não tem antecedentes criminais.
Quanto aos factos dados como não provados consignou-se o seguinte: Não se provou: a) que o arguido destinasse à venda a terceiros, a metadona que lhe foi apreendida; b) que o arguido apenas vendesse estupefacientes para obter droga para o seu consumo; c) que o arguido tivesse tirado a navalha que lhe foi apreendida, numa máquina de um café, após ter introduzida, qualquer quantia em dinheiro; d) não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos dados como provados, com interesse para a boa decisão da causa.
Da respectiva motivação da decisão proferida sobre a matéria de facto, fez-se constar o seguinte: A convicção do Tribunal fundou-se, quanto aos factos provados e não provados, no conjunto da prova produzida, mais concretamente: a) nas declarações do arguido, que confessou quase integralmente os factos de que vinha acusado e depôs de forma credível quanto à sua situação pessoal actual e na data dos factos a que se referem os autos.
Referiu ainda que na data dos factos era consumidor de cocaína e heroína e que tentava vender alguma, para o seu consumo (no entanto, não resultou credível que a droga que vendia fosse apenas para adquirir estupefaciente para o seu consumo).
Quanto à metadona, referiu que andava em tratamento no CAT e a mesma lhe foi aí receitada, facto que foi confirmado pela declaração de fls. 202.
Confirmou que o dinheiro apreendido era proveniente da venda de estupefacientes.
Confirmou ainda que a navalha que lhe foi apreendida lhe pertencia; no entanto, referiu de forma que não se afigurou minimamente credível - uma vez que se trata de uma navalha de ponta e mola e não de um brinquedo - que a tirou numa...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO