Acórdão nº 57/08.6TTBCL.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2011
Magistrado Responsável | MACHADO DA SILVA |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Reg. nº 1499.
Proc. nº 57/08.6TTBCL.
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: 1. B………., viúva, por si e em representação do seu filho C………., intentou a presente acção, com processo especial emergente de acidente de trabalho, contra a Companhia de Seguros D………., S.A., e E………., Lda., pedindo o pagamento pelas RR., na medida da responsabilidade de cada uma delas, das seguintes prestações: - à A. B………., os montantes de € 11.760, de pensão anual e vitalícia, actualizável, € 2.556, a título de subsídio por morte, € 3.408, de despesas de funeral, e € 10 de despesas de transporte; - ao beneficiário C………., os montantes de € 7.840, de pensão anual e temporária, actualizável e € 2.556, de subsídio por morte; - tudo, acrescidos dos legais juros de mora.
Para tanto, alegando, em síntese: i) em 12.01.2008, quando o cônjuge da A. e pai do menor acima identificado, se encontrava em Franca a trabalhar foi atingido no crâneo e tronco pelo taipal metálico de cofragem no qual trabalhava; ii) tal acidente foi causa directa e necessária de lesões, as quais foram directa e necessariamente causadores da sua morte, que ocorreu no dia 12.01.2008; iii) à data da sua morte, o cônjuge da A. exercia as funções de carpinteiro de cofragem de 1ª, sob as ordens, direcção e fiscalização da R. E………, Lda., auferindo uma remuneração mensal de € 2.800 x 14, sendo assim a sua retribuição anual ilíquida de € 39.200.
iv) o corpo do sinistrado foi transladado para Portugal e sepultado em Barcelos.
v) em Janeiro de 2008 encontrava-se em vigor o contrato de seguro celebrado entre a R. C………. e a R. companhia de seguros, pelo qual aquela havia transferido a sua responsabilidade infortunística laboral para esta.
+++Contestaram as RR., alegando, em síntese: - a R. entidade patronal: Impugnando o alegado pela viúva do sinistrado no que tange ao montante auferido por este a título de deslocação para o estrangeiro, mais invocando que à data do acidente tinha a responsabilidade transferida para a R. companhia de seguros por uma retribuição base de 518,50 €, tendo este auferido no mês de Janeiro de 2008 a retribuição total de 185,57 €, referente a retribuição base, subsídio de alimentação, subsídio de férias e de Natal, trabalho extraordinário e ajudas de custo, nada mais pagando ao sinistrado, nomeadamente o transporte, alojamento e alimentação em Franca.
- a R. Seguradora: Alegando que a sua responsabilidade no pagamento das pensões e demais quantias que venham a ser fixadas tem como limite uma remuneração anual de 7.259,00 (518,50 x 14) pois que é esta a retribuição declarada pela RR entidade patronal nas folhas de vencimento enviadas à RR contestante.
+++Foi proferido despacho saneador e seleccionada a matéria de facto assente e controvertida, sem reparos.
+++ Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, posteriormente, proferida sentença, nela se decidindo: 1. Absolver a RR "E………., Lda." dos pedidos contra si formulados.
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Condenar a R. "Companhia de Seguros D………., SA" a pagar: - à A. B………., viúva do sinistrado: - a quantia de 10.500,00 € de pensão anual e vitalícia, até à idade da reforma, actualizável, com inicio em 13 de Janeiro de 2008, actualizável a partir de 1.10.2010, a pagar nos moldes previstos no artigo 51° do citado RLAT.
- a quantia de 2.556,00 € de subsídio por morte.
- a quantia de 20,00 € de despesas com transportes.
- ao filho do sinistrado C……….: - a quantia de 7.000,00 € de pensão anual e temporária, actualizável com início em 13 de Janeiro de 2008, actualizável a partir de 1 de Janeiro de 2010, a pagar nos moldes previstos no artigo 51° do citado RLAT.
- a quantia de 2.556,00 € de subsídio por morte.
- juros de mora à taxa legal de 4%, vencidos desde 13.01.2008 (dia seguinte ao da verificação da morte do sinistrado) sobre as quantias acima discriminadas.
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Absolver a R. companhia de seguros do pagamento à A. e ao seu filho menor da quantia referente às despesas de funeral do sinistrado F………..
+++ Inconformada com esta decisão, dela recorreu a R. Seguradora, formulando as seguintes conclusões: a)- A discordância da recorrente assenta na transferência para a demandada seguradora da totalidade da responsabilidade pelo acidente dos autos.
b)- É consabido que um princípio norteador de todo o processo e o dever de cooperação para a descoberta da verdade (art. 519º CPC), cabendo ao julgador a livre apreciação das provas, decidindo segundo a sua "íntima convicção (...) gerada em face do material probatório trazido ao processo e de acordo com a sua experiência da vida e conhecimento dos homens" - cf. Domingues de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil - apreciação sobretudo admitida quanto à prova testemunhal e quanto à prova por arbitramento, podendo o juiz, em qualquer momento, e, em "homenagem ao princípio da verdade material, e em qualquer caso, determinar oficiosamente a produção de outras provas que considere indispensáveis à decisão" - cf. preâmbulo do CPT.
c)- Contudo, a livre apreciação deverá se subsumir nos termos do nº 2 do art. 655º do CPC: "Mas quando a lei exija, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial, não pode esta ser dispensada".
d)- In casu, foi celebrado um contrato de seguro na modalidade de prémio variável, que "cobre um número variável de pessoas seguras, com retribuições seguras também variáveis, sendo consideradas pela seguradora as pessoas e as retribuições identificadas nos folhas de vencimento que lhe são enviadas periodicamente pelo tomador de seguro" - cf. art. 4º, al. b) da apólice uniforme do seguro de acidentes de trabalho para trabalhadores por conta de outrem.
e)- Decorre dos deveres enquanto tomadora de seguro, que a entidade patronal estava obrigada a "enviar mensalmente a seguradora, quando se trate de seguro de prémio variável, e até ao dia 15 de cada mês, as folhas de retribuições pagas no mês anterior a todo o seu pessoal e que devem ser duplicados ou fotocópias das remetidas à Segurança Social, devendo ser mencionada a totalidade das remunerações previstas na lei, como parte integrante da retribuição para efeito de cálculo, na reparação por acidente de trabalho, devendo ainda ser indicados os praticantes, os aprendizes e os estagiários" - cf. art. 1º, al. c) da apólice uniforme do seguro de acidentes de trabalho para trabalhadores por conta de outrem.
f)- Com este envio, a recorrente, como seguradora, toma conhecimento do número variável de pessoas seguras bem como as retribuições seguras, o que implica, necessariamente, não só a identificação dos trabalhadores como a variação da massa salarial, repercutindo-se inevitavelmente no montante dos prémios a cobrar.
g)- Só com o envio da folha de retribuição, durante o mês de Fevereiro, é que a ora recorrente tomou conhecimento da existência do trabalhador F………. ao serviço da co-demandada.
h)- A variabilidade de pessoal, implicando necessariamente a variação da massa salarial, que repercutir-se-á inevitavelmente no montante do prémio a cobrar.
i)- In casu, face à existência de seguro na modalidade de prémio variável, compete à entidade patronal a indicação da remuneração correcta para efeitos infortunísticos, devendo para tal efectuar os cálculos que a lei e o contrato de seguro determinam, por imposição legal da apólice uniforme, em concordância com o princípio da transparência e da boa fé, sob pena o contrato de seguro ferir de nulidade.
j)- O incumprimento, por parte do tomador de seguro, da obrigação consubstanciada na inclusão do(s) trabalhador(es) ao seu serviço na folha de ferias a enviar à seguradora até ao dia 15 do mês seguinte ao do início das funções do(s) respectivo(s) trabalhador(es), determina, consequentemente, a não assunção de responsabilidade, por parte da seguradora, pelos danos sofridos pelo trabalhador omitido, pois verifica-se uma situação de não cobertura, decorrente do não preenchimento das condições necessárias estabelecidas pelas partes, para a assunção da responsabilidade, tendo a entidade patronal de suportar o pagamento do que for devido ao trabalhador.
I)- O risco é um elemento essencial do contrato. Segundo José Vasques, é pressuposto fundamental para existir contrato de seguro, que exista acordo entre as partes (seguradora e tomador) relativamente aos elementos mínimos e essenciais do contrato: o prémio, o risco e a prestação.
m)- Reflexo do dever de informação, prescreve o art. 91º do DL 72/2008 que "durante a vigência do contrato, o segurador e o tomador do seguro ou o segurado devem comunicar reciprocamente as alterações do risco respeitantes ao objecto das informações prestadas (...)".
n)- Prescreve o art. 44º, n.º 2 do DL 72/2008, de 16/04, na sua versão original: "o segurador não cobre sinistros anteriores à data da celebração do contrato quando o tomador do seguro ou o segurado deles tivesse conhecimento nessa data".
o)- Contudo, "a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstruir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo em conta a unidade do sistema jurídico (...)" - cf. art. 9º do CC.
p)- Por conseguinte, deverá admitir-se e ampliar - interpretação extensiva - aquele art. 44º, n.º 2, no seu conteúdo, com o que a seguradora não cobre sinistros anteriores à data de alteração da apólice quando o tomador do seguro dele tivesse conhecimento nessa data.
q)- Nos termos do n.º 1 do art. 9º das Condições Gerais de Apólice que o segurado ou tomador do seguro deve comunicar à seguradora as...
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