Acórdão nº 0316405 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Novembro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelÂNGELO MORAIS
Data da Resolução10 de Novembro de 2004
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: Nos autos de processo comum colectivo nº../.., que correm termos no -ºjuízo da comarca da....., foi proferida a seguinte decisão: "A) julgar improcedente e não provada a acusação relativamente ao arguido B..... e, por isso, absolvê-lo da prática do crime de incêndio e da contra-ordenação que lhe haviam sido imputados; B) julgar procedente e provada a acusação, na forma referida, e, consequentemente: - condenar o arguido C....., pela prática de um crime de incêndio negligente, p. e p. pelo artigo 272°, n° 1, alínea a) e n° 3 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão: - condenar o arguido D..... pela prática de um crime de incêndio negligente, p. e p. pelo artigo 272°, n° 1, alínea a) e n° 3 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão, e na coima de 1.000,00 €, pela prática da contra-ordenação p. e p. nos artigos 25° a 27° do Regulamento sobre Fiscalização dos Produtos Explosivos (aprovado pelo DL n° 376/84, de 30 de Novembro), com referência ao artº. 24°, n° 1 do mesmo Regulamento e ao artº. 38°, n° 1 do Regulamento sobre o Fabrico, Armazenagem, Comercialização e Emprego de Produtos Explosivos (aprovado pelo mesmo Decreto-Lei).

*Nos termos do disposto no artº. 50°, n°s 1, 4 e 5 do Código Penal, pelos fundamentos já acima expostos, suspende-se a execução das penas aplicadas aos arguidos C..... e D....., pelo período de 3 (três) anos".

*Inconformados com tal decisão, desta interpõem recurso para esta Relação os arguidos: I- D....., que remata a sua motivação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1- Não resulta provado que o aqui recorrente tenha violado qualquer norma sobre produtos explosivos e como tal não deve ser condenado por qualquer contra-ordenação.

2- A matéria dada como provada na alínea P) é contra a lei - viola no mínimo o artigo 38°, n.°2 do Regulamento sobre Fiscalização dos Produtos Explosivos e é contraditória com a matéria dada como provada na alínea C.

3- O Tribunal fez errada interpretação desta norma, que deve ser entendida no sentido de, obtido o parecer prévio e favorável dos Bombeiros, é a estes que cabe cuidar de tomar medidas para prevenir o incêndio.

4- O crime previsto no artigo 272° do C.P. é um crime de PERIGO CONCRETO e no caso em apreço nada permitia ou fazia prever que o incêndio pudesse ocorrer, tendo o Recorrente agido nos limites da normalidade e como tal não deve ser condenado.

5-A alínea E) da matéria dada como provada é contraditória com a matéria dada como provada nas alienas C) e S), contradição essa que torna nula essa matéria.

6- Atenta a prova supra reproduzida e a matéria dada como provada em J) deve ser alterada a alínea J) da MATERIA NÃO PROVADA, ficando dela a constar: Que o arguido lançou o fogo em local indicado pelo arguido C..... ou seja em local onde sempre o foi.

7- A matéria da alínea K) da matéria dada como não provada deve ser eliminada, por contrária à lei, em específico o artigo 38°, n.°2 do Regulamento supra citado.

8- Atenta os elementos de prova supra referidos, a matéria expressa na alínea L) da matéria dada como não provada, deve figurar como matéria provada.

9- Se o local de lançamento do fogo, é da responsabilidade do Juiz da Irmandade que o determina e foi quem obteve as licenças, bem como o parecer dos bombeiros e celebrou o contrato de seguro, foi ele quem ordenou o lançamento do fogo e que, interpelado, assumiu a responsabilidade de o fogo ser lançado ao limite de ter transmitido ao E..... que assumia toda a responsabilidade., se sempre o fogo nos últimos dez anos aí foi lançado, sendo exigência da lei que os Bombeiros teriam de estar presentes, ignorando o aqui recorrente o que continha a embarcação H....., não lhe seria exigido qualquer outro comportamento.

10- Nos termos do artigo 35° do C.P. verifica-se um clara causa de exclusão da ilicitude e da culpa.

11- O aqui recorrente apenas celebrou com a irmandade dois contratos: um de prestação de serviços (apenas estava obrigado a lançar o fogo com rigor técnico - o que fez) e um outro de compra e venda.

12- Se este homem tiver como certo que o local, as condições de segurança, a existência de contrato de seguro, a presença dos bombeiros, o ter o Juiz da Irmandade assumido a responsabilidade então não lhe podia era exigido outro comportamento.

13- Parece haver assim, em suma, contradição insanável na análise da prova, para além de que a matéria dada como provada não corresponde à prova produzida.

14- O Tribunal violou igualmente o artigo 272° do C.P. que deve ser interpretado no sentido de ser obrigatório analisar o caso em concreto, para cuidar de saber se O PERIGO CONCRETO EXISTIA».

II- C....., que remata a sua motivação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «A - IMPÕE-SE A MODIFICAÇÃO DA DECISÃO DO TRIBUNAL "A QUO" SOBRE MATÉRIA DE FACTO, A QUAL SE IMPUGNA: Pontos de facto que se consideram incorrectamente julgados (artigo 412º, n°3, alínea a) do CPP): os mencionados nas alíneas e), f), p) e r) da matéria de facto dada por provada no acórdão recorrido.

  1. - O fogo de artifício dos autos foi lançado no local previamente licenciado pela P.S.P.; 2.° - Os arguidos, nomeadamente o ora recorrente, não alteraram esse local e, em consequência, essa não foi a causa do incêndio dos autos; Fica, assim, impugnada a matéria de facto respectiva da alínea e) dos factos provados constantes do acórdão recorrido e acima citada; porque a licença da P.S.P. de fls. 6 impõem decisão diversa.

  2. - Não pode dar-se como provado - como se fez na decisão em crise - que antes da conversa referida em g) dos factos provados (do acórdão recorrido), o ora recorrente tivesse tido conhecimento do concreto local em que o co-arguido D..... e seus empregados iriam instalar o equipamento de lançamento do fogo de artifício; 4.° - Ou seja, não foi por instruções do ora recorrente que o equipamento de lançamento do fogo de artifício dos autos foi colocado a curta distância do estaleiro "I....., Lda"; Fica, assim, impugnada a matéria de facto referida, da alínea f) dos factos provados constante do acórdão recorrido e acima citada; porque da prova produzida em audiência de julgamento nada permite concluir como concluiu o tribunal recorrido.

  3. - O arguido, ora recorrente, diligenciou pela presença dos bombeiros e da polícia marítima na área do lançamento do fogo de artifício.

    Em consequência, vai impugnada a matéria de facto contida em p) dos factos dados por provados no acórdão recorrido, já que os documentos de fls. 26 e de fls. 30 dos autos impõem decisão diversa.

  4. - O ora recorrente, porque o técnico competente - o co-arguido D..... - solucionou a questão recuando o fogo, não sabia que o lançamento do fogo de artifício, do local onde ocorreu, podia provocar incêndio nos barcos; por isso, foi legítima a ordem de lançamento.

    Em consequência, vai impugnada a matéria de facto da citada alínea r) no que respeita ao ora recorrente; porque impõem decisão diversa da recorrida (constante da alínea r) dos factos provados) o depoimento do co-arguido D..... constante do suporte técnico respectivo - K7 cassete n.° 2/ lado B, voltas 2500 a 4817, páginas 131 -, a matéria de facto dada por provada em h) do acórdão recorrido, a provada profissão do ora recorrente e a do co-arguido D....., a provada qualidade em que cada um destes ali se encontrava, e a contratação recorrente, ao longo dos anos, do co-arguido D..... para o lançamento do fogo naquelas festividades sem que tenha ocorrido qualquer acidente (alínea s) dos factos provados do acórdão recorrido).

  5. - De todo o supra exposto decorre, assim, que os pontos de facto atrás mencionados foram incorrectamente julgados. Consequentemente, o ora recorrente não praticou o crime por que foi condenado.

    Assim não se entendendo e, SUBSIDIARIAMENTE, B - OCORRE INSUFlClÊNClA PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA: 8.° - Nada se tendo provado quanto aos montantes ou valores dos bens patrimoniais alheios postos em perigo pelo incêndio dos autos, não pode afirmar-se que esse valor é elevado e, em consequência, não pode considerar-se preenchido o tipo objectivo de ilícito do artigo 272.°, n.° 1, alínea a) e n.° 3 do CP.

    9-° - Ao condenar o ora recorrente pela prática do crime previsto no inciso legal citado, o Tribunal "a quo" presumiu a verificação de um dos elementos integradores do tipo objectivo de ilícito em causa - o valor elevado - interpretando, assim, de forma inconstitucional esse mesmo normativo. Por isso, se argui expressamente essa inconstitucionalidade por violação do preceituado no artigo 32.°, n.° 1 da CRP.

    Sendo que o Tribunal "a quo" violou o preceituado no artigo 272.°, n.° 1, alínea a), e n.° 3, do CP, em virtude de ter presumido que o valor dos bens patrimoniais alheios, em perigo, era elevado. O normativo legal, pura e simplesmente, não foi preenchido.

    Assim não se entendendo e ainda SUBSIDIARIAMENTE, C - OCORRE IMPOSSIBILIDADE LEGAL DE IMPUTAÇÃO AO RECORRENTE DO CRIME POR QUE FOI CONDENADO: 10.° - Os Regulamentos aprovados pelo DL 376/84, de 30.11, não permitem responsabilizar criminalmente o ora recorrente pela ocorrência do sinistro dos autos, dada a presença no local de técnico devidamente habilitado, a quem pertencia, em exclusivo, a decisão última e definitiva de proceder ou não ao lançamento de fogo de artifício no local e nas circunstâncias em que o foi.

    Ao não entender deste modo e ao condenar também o ora recorrente, a decisão em crise violou os ditames dos artigos 3.°, 4.°, 5.°, 35.° e 38.° do Regulamento sobre o Fabrico, Armazenagem, Comércio e Emprego de Produtos Explosivos e do artigo 24.°, n.° 1, do Regulamento sobre a Fiscalização de Produtos Explosivos.

    Assim não se entendendo, e também SUBSIDIARIAMENTE, D - O ACÓRDÃO RECORRIDO ESTÁ FERIDO DE NULIDADE POR TER CONDENADO O RECORRENTE POR FACTOS DIVERSOS DOS DESCRITOS NA ACUSAÇÃO: 11.° - O acórdão recorrido não procedeu apenas à alteração da qualificação jurídica dos factos da acusação; para o...

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