Acórdão nº 0335678 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Novembro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SALEIRO DE ABREU |
Data da Resolução | 27 de Novembro de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.
Em 9.6.1995, Florinda ............., solteira, residente em .........., ........., intentou a presente acção com processo sumário contra Manuel ............. e mulher Rosa ............., residentes na mesma freguesia, alegando, em síntese, que: - Por sentença de 3 de Junho de 1992, homologatória de partilha operada no inventário facultativo a que se procedeu por óbito de Carolina .......... e António ............, foram adjudicadas à A. e ao R., respectivamente, a parte rústica e a parte urbana do prédio misto composto de casa de habitação, sito no Lugar ........, freguesia de .........., concelho de ..........., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 24.799 a fls. 99 do Livro B-77, e inscrito nas respectivas matrizes sob os arts. 373 urbana e 1716 rústica; - Os RR. estão a ocupar parte da eira e da casa da eira ou beiral e uma porção de terreno situado a nascente da eira e beiral, que integram a parte rústica adjudicada à Autora; - Os RR. recusam-se a entregar à A. a parte por eles indevidamente ocupada.
Concluiu pedindo que se declare que é proprietária da parte rústica daquele prédio e que dela fazem parte a eira, beiral e terreno referidos, e que os RR. sejam condenados a entregar-lhe a parte da eira, beiral e terreno por eles ocupados.
Na sua contestação, os RR. invocaram as excepções de erro na forma de processo, do caso julgado e do abuso de direito, e alegaram que ocupam parte da eira, beiral e terreno em virtude de um acordo celebrado nesse sentido com a A. aquando das partilhas, previamente à adjudicação dos bens.
Em reconvenção, pediram que a A./Reconvinda seja condenada a ver declarado que a parte urbana que lhes foi adjudicada inclui o logradouro e parte da eira e do palheiro.
Na resposta, a A. arguiu a nulidade do acordo invocado pelos RR. e concluiu pela improcedência da reconvenção.
No despacho saneador, foram julgadas improcedentes as excepções do erro na forma do processo e do caso julgado e relegou-se para final o conhecimento do alegado abuso de direito.
Da parte desse despacho que "julgou improcedente a excepção de caso julgado" interpuseram os RR. recurso de agravo (fls. 164), admitido com subida diferida (fls. 166).
Elaborada a especificação e o questionário, o processo seguiu a sua normal tramitação, tendo, a final, após audiência de discussão e julgamento, sido proferida sentença a julgar improcedente a acção e procedente a reconvenção.
Inconformada, apelou a Autora, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. A Autora, com base na douta sentença de 3-6-92, homologatória de partilha operada em inventário facultativo que correu termos pela Comarca do .......... (com o n°. .../.., da .. Secção do .. Juízo Cível da Comarca do ........), que lhe adjudicou a totalidade do artigo 1716 da matriz rústica de .........., ........, pede, na presente acção, intentada em 9-5-95, a entrega de parte desse prédio que o Réu, anterior arrendatário desse e doutros prédios, deixou de lhe entregar.
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A, aliás douta sentença recorrida, na parte que interessa considerar, julgou improcedente a acção e procedente a reconvenção, atribuindo aos Réus o direito de propriedade à parte do terreno reivindicado, com o fundamento de que o acordo que teve lugar na conferência de interessados, que atribuiu à Autora a totalidade do dito prédio, foi acompanhado de um outro, segundo o qual desse prédio ficaria a pertencer ao Réu a parte que a Autora reivindica, e desde então Autora e Réu, nessa conformidade, têm fruído uma e outra parte do prédio, e feito em cada uma delas as obras convenientes.
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Porém, a douta sentença homologatória da partilha, que atribuiu à Autora a totalidade do prédio, não pode ser contrariada por outra posterior, com fundamento em factos já ocorridos (o acordo paralelo ao consignado na conferência de interessados à data da sua prolacção), porque a tanto se opõe o art°. 671º, n° 1, do C.P.C.
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Só depois de revogada essa sentença através de um recurso extraordinário de revisão, com fundamento da anulação desse acordo (al. d) do art°. 771º C.P.C.), é que seria possível obter nesta acção uma sentença em sentido diferente.
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E essa anulação seria possível com fundamento em simulação, nos termos do art°. 240º n°s 1 e 2 C.C., dado que houve, na conferência de interessados, por parte da Autora e Réu, uma divergência intencional entre a vontade real (adjudicação à Autora, apenas, de parte do prédio rústico descrito na matriz respectiva sob o artigo 1716, e adjudicação ao Réu da parte restante) e a declarada (adjudicação à Autora da totalidade desse prédio), com o propósito de enganar o próprio Juiz do processo, já que o referido prédio não estava, mediante o respectivo destaque, cindido em duas partes.
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Assim, a sentença recorrida violou o disposto no art°. 671º, nº 1 C.P.C., pelo que deve ser revogada, e mantida a douta sentença referida na conclusão 1ª, na sequência da qual não pode deixar de proceder o pedido de reivindicação formulado na presente acção e improceder a reconvenção.
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Por outro lado, a violação excessiva das normas de boa fé, a que alude o art°. 334º C.C., como fundamento da invocação do abuso de direito, em que se integram, v.g., numa escala decrescente, a incapacidade do outro contraente, a coacção, o dolo e o erro, dão origem a anulabilidades...
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