Acórdão nº 0342218 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Abril de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | TEIXEIRA PINTO |
Data da Resolução | 14 de Abril de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I- Os arguidos A.......... e B.........., identificados nos autos, foram julgados em processo comum e perante Tribunal Singular e a final foi proferida sentença que decidiu condenar cada um dos arguidos como co-autores materiais de um crime de exploração ilícita de jogo p.p. pelo artº 108°, n° 1, com referência aos artºs 1°,3° e 4° nº1 al. g) , do Dec.-Lei n° 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção do Dec.-Lei n° 10/95, de 19/01, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de prisão e 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 3 (três euros), substituindo-se a pena de prisão pelo número de dias de multa correspondente, aplicando-se, assim, aos arguidos a pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de € 3 (três euros), o que perfaz a multa de € 600 (seiscentos euros).
A mesma sentença decidiu ainda: Nos termos do artº 109°, n° 1 do C. Penal, declarar perdido a favor do Estado o material de jogo apreendido; Nos termos do disposto no artº 117°, do citado Dec.-Lei declarar perdida a favor do Fundo de Turismo a quantia em dinheiro apreendida nestes autos.
Nos termos do artº 116° do Dec.-Lei n° 422/89, de 2 de Dezembro na redacção dada pelo Dec.-Lei n° 10/95, 19/01 ordenar a oportuna destruição daquele material de jogo.
É desta sentença que os arguidos interpõem o presente recurso concluindo que: 1. A factualidade dada como provada nos autos não integra os elementos do crime de exploração ilícita de jogo pelo qual os recorrentes foram condenados.
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O Tribunal "a quo" deu como provados determinados factos, sem que tenha feito uma análise critica sobre os mesmos, e sem ter aferido de questões pertinentes que convergiam, de forma lógica e razoável, na veracidade dos depoimentos prestados pelos ora recorrentes.
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O Tribunal concluiu pela ocorrência da exploração de jogo ilícito, com base no pressuposto de que a percentagem de lucros obtida pelos recorrentes decorria do jogo de fortuna ou azar, esquecendo o facto de a máquina em causa ter também instalado um jogo de diversão "TETRIS", donde igualmente provinham os lucros obtidos pelos recorrentes.
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Ou seja, o facto de se ter constatado que a máquina continha jogo proibido, não quer obrigatoriamente dizer que todos os proveitos económicos resultantes da mesma derivassem do jogo proibido "P. BLOCK." uma vez que, logicamente, também era utilizado o jogo de diversão, quiçá, unicamente o jogo utilizado, donde os recorrentes apuravam a sua percentagem.
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De forma que, nunca poderia o tribunal "a quo" concluir que os recorrentes exploravam ilicitamente uma máquina só porque auferiam rendimentos com aquela.
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Mais que, os recorrentes afirmaram, de forma segura e peremptória, que não eram proprietários da máquina dos autos e que desconheciam que desenvolvesse jogo de fortuna ou azar, visto a mesma possuir registo e licença de exploração, o que lhes incutiu credibilidade quanto à legalidade da mesma.
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O Tribunal não valorou tais depoimentos, nem logrou apurar se de facto a máquina possuía ou não licença, para apreciar da veracidade de tais declarações.
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Não se compreende como pode o tribunal a quo considerar como isentos e seguros os depoimentos prestados pelas testemunhas ouvidas em audiência de julgamento, quando as mesmas não conseguiram precisar se a máquina em causa tinha, efectivamente, a respectiva licença.
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Não se mostra razoável acreditar que na acção de fiscalização levada a efeito os elementos da G.N.R. apenas se tenham preocupado em averiguar se a máquina desenvolvia ou não jogo ilícito, sem que se tenham certificado da existência de licença de exploração com o propósito de levantar o correspondente auto de contra-ordenação caso se mostrasse pertinente.
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Pelo que, salvo o devido respeito, contrariamente ao entendido, somos em crer que os depoimentos que fundamentaram a decisão, se revelaram pouco precisos, incoerentes e inseguros.
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As testemunhas, C.......... e D.......... foram peremptórios em afirmar que quando se dirigiram ao estabelecimento que é explorado pela aqui recorrente A.........., quem os atendeu foi o recorrente B.........., não estando nessa mesma altura no estabelecimento a A...........
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Sendo que, a fiscalização dos jogos da máquina foi levada a cabo pela terceira testemunha, E.........., que depois de falar com o recorrente B.......... se dirigiu para a máquina.
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Sucede que, inquirido o Sr. E.........., foi dito de forma contraditória relativamente ao afirmado pelas primeiras testemunhas que, quando entraram no estabelecimento quem se encontrava a atender era a A.......... e não o B.......... e que a mesma teria fornecido um código para aceder ao jogo de fortuna ou azar que entretanto teria sido desligado pela recorrente, em virtude da sua presença.
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Após ter sido confrontado com tal contradição admitiu que, eventualmente, a A.......... teria chegado posteriormente.
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Ora, tal facto, é revelador de incertezas, não se compreendendo como pode a recorrente ter desligado o jogo de fortuna ou azar e ter fornecido um código logo que entraram os elementos da G.N.R., quando, efectivamente, nem sequer se encontrava no estabelecimento, como afirmado por duas das testemunhas.
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E se de facto os recorrentes tivessem consciência de que a máquina continha jogo ilícito, que sentido faria terem o jogo de fortuna ou azar a descoberto no ecrã de forma a que qualquer pessoa pudesse verificar, sabendo que podiam ser inspeccionados, como aconteceu?! 17. Logicamente o jogo que devia aparecer no ecrã seria o de diversão e o jogo de fortuna ou azar apenas se verificaria quando accionado.
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Sucede que, não apurou o tribunal se no momento da fiscalização o referido jogo estava ou não a ser explorado, pois não faz sentido que a máquina não estando a ser utilizada estivesse visível o jogo proibido.
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Até porque, caso assim acontecesse estaria também implicada a pessoa que o estivesse a jogar, o que não se verificou.
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O que só demonstra que nunca poderia estar no ecrã o jogo de fortuna ou azar -mas sim o de diversão, motivo pelo qual se presume que o agente inspector pudesse estar a confundir a fiscalização efectuada com outra qualquer.
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Pelo que, não tendo o tribunal "a quo" providenciado pela procura das respostas que se afiguravam úteis, nunca poderia ter emitido um juízo seguro de condenação.
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O tribunal deveria ter ordenado a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa - artigo 340.º, n.º1, do C.P.P. - o que não aconteceu.
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Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável- artigo 17º, nº 1, do C.P..
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Relativamente ao recorrente B.........., não se pode concordar com uma decisão condenatória quando resultou provado nos autos que este apenas se encontrava no estabelecimento esporadicamente, que não é essa a sua profissão e que habitualmente é apenas a A.......... quem explora o estabelecimento e quem contacto com clientes e fornecedores.
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Revela-se incongruente condenar alguém que tem outro modo de vida e de profissão, que não explora nem o estabelecimento nem a máquina exposta no mesmo, aliás, que desconhece completamente o modo de funcionamento da mesma e o tipo de jogos que desenvolve.
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Quanto à A.......... não se mostra razoável condenar uma pessoa para quem, ingénua e confiantemente, a exploração de máquinas se prende somente com o facto de possuir registo e licença de exploração, 27. Ademais que, tal facto decorre da consciencialização que o proprietário da máquina lhe incutiu de que, dessa forma, estaria plena e descansadamente a explorar uma máquina de diversão legalmente.
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A conduta dos arguidos de forma alguma reflecte qualquer qualidade desvaliosa e juridicamente relevante da sua personalidade.
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Não é do conhecimento geral que a exploração dos jogos como os dos autos é proibida e punível.
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A finalidade da proibição de exploração de jogos de fortuna e azar fora dos locais legalmente autorizados mostra-se despida de conteúdo ético.
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Os arguidos mantiveram-se fieis a uma recta consciência ético-jurídica, o que afasta a sua culpa - artigo 17.º, n.º 1, do C.P..
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A máquina apreendida nos autos não serviu ou estava destinada a servir para a prática de qualquer facto ilícito típico.
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O legislador, ao criar a referida al. g) sabe perfeitamente que as máquinas aí previstas não são nem nunca serão utilizados ou utilizáveis em zonas de jogo legalmente autorizadas.
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O seu único objectivo é proibir que fora dessas zonas se utilizem essas máquinas, obviamente para apenas e tão só proteger os casinos da concorrência das mesmas.
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O propósito de protecção das concessionárias de zonas de jogo não é claramente a tutela de um princípio ético.
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Tal protecção não pode ser feita através de sanção penal, sob pena de se violar os princípios da "liberdade individual" e da "proporcionalidade" consagrados no artigo 18.º da Constituição.
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O artigo 108.º, n.º 1, do DL 422/89, conjugado com os artigos 3.º e 4.º, n.º 1, al. g) do mesmo diploma, violam os princípios da "liberdade individual" e da "proporcionalidade" das penas consagrados no artigo 18.º da Constituição, o que impõe que o Tribunal recuse, por inconstitucionalidade, a sua aplicação.
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A douta sentença sob recurso violou os artigos 1.º, 3.º, 4.º, n.º 1, al. g), e 108.º, n.º 1, do DL 422/89, de 2.12, o artigo 340.º, n.º 1, do C.P., o art.º 17 n° 1 do C.P. e o artigo 18.º da Constituição.
Terminam pedindo a absolvição dos arguidos, uma vez que os factos provados não se enquadram no crime de exploração ilícita de jogo ou, caso assim se não entender, que se recuse a aplicação do artº 108º nº1 do DL nº422/89 por...
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