Acórdão nº 0342397 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Outubro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | CONCEIÇÃO GOMES |
Data da Resolução | 15 de Outubro de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam em Conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1. RELATÓRIO.
1.1. No Tribunal Judicial da Comarca de Paços de Ferreira corre termos o processo comum singular nº ........... em que é denunciante o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e arguido "D............. & ...., Lda" e Outros, contra os quais, no âmbito do respectivo inquérito, foi deduzida acusação pública imputando-lhes a prática de catorze crimes de abuso de confiança à Segurança Social, treze dos quais p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 7º, nº1, 9º, nº2, 24º, nºs 1 e 2 e 27º-B e outro pelo art. 24º, nº1, do DL nº 20-A/90, de 15JAN.
1.2. O Instituto de Segurança social veio requerer a sua constituição como assistente, nos termos do art. 68º, nº1, do CPP.
1.3. Por despacho de 07FEV03, o Mmº Juiz "a quo", com o fundamento de que não gozando a administração fiscal ou da segurança social, concretamente o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, de legitimidade para se constitui como assistente, indeferiu o requerimento para o efeito apresentado.
1.4. Inconformado com este despacho, dele interpôs recurso o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, que motivou concluindo que o despacho recorrido deve ser substituído por outro que admita o IGFSS a constituir-se Assistente e intervir nos autos nessa qualidade.
1.5. No Tribunal recorrido respondeu o Mº Pº, pronunciando-se pela procedência do recurso, concluindo que: Nos presentes autos estão os arguidos acusados pela prática de crime de abuso de confiança à Segurança Social p. e p. pelos arts. 24º, nº1, e 4 e 27º-B do DL nº 20-A/90, de 15JAN.
É o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social o titular do interesse que a lei quis proteger com aquela incriminação.
De acordo com o disposto no art. 68º, nº1, tem pois, o recorrente legitimidade para se constituir assistente nos presentes autos.
Deve, pois, ser dado provimento ao recurso e o douto despacho recorrido ser substituído por outro que admita o recorrente a intervir nos presentes autos como assistente.
1.5. O Mmº Juiz "a quo" manteve a decisão recorrida.
1.6. O Exmº Procurador- Geral Adjunto nesta Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso merece provimento.
1.7. Foi cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do CPP.
1.8. Foram colhidos os vistos legais.
*** 2. FUNDAMENTAÇÃO.
2.1. Resultam dos autos as seguintes ocorrências processuais com relevância para a questão a decidir: 2.1.1. No Tribunal Judicial da Comarca de Paços de Ferreira corre termos o processo comum singular nº ................ em que é denunciante o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e arguidos "D....... & ...., Lda", Dia....... e L........, contra os quais, no âmbito e findo o respectivo inquérito, foi deduzida acusação pública imputando-lhes a prática de factos ocorridos no período compreendido entre MAI97 a SET97, SET99 a NOV99 e FEV00 a AGO00, integradores de catorze crimes de abuso de confiança à Segurança Social, treze dos quais p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 7º, nº1, 9º, nº2, 24º, nºs 1 e 2 e 27º-B e outro pelo art. 24º, nº1, do DL nº 20-A/90, de 15JAN, 2.1.2. O Instituto de Segurança Social veio requerer a sua constituição como assistente, nos termos do art. 68º, nº1, do CPP.
2.1.3. Por despacho de 07FEV03, o Mmº Juiz "quo", com o fundamento de que não gozando a administração fiscal ou da segurança social, concretamente o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, de legitimidade para se constitui como assistente, indeferiu o requerimento para o efeito apresentado.
*** 3. O DIREITO 3.1. O objecto que emerge no presente recurso cinge-se à seguinte questão: - se o recorrente tem ou não legitimidade para se constituir como assistente nos presentes autos.
Conforme resulta dos autos foi deduzida acusação pública imputando aos arguidos a prática de factos ocorridos no período compreendido entre MAI97 a SET97, SET99 a NOV99 e FEV00 a AGO00, integradores de catorze crimes de abuso de confiança à Segurança Social, treze dos quais p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 7º, nº1, 9º, nº2, 24º, nºs 1 e 2 e 27º-B e outro pelo art. 24º, nº1, do DL nº 20-A/90, de 15JAN.
3.1.1.O despacho recorrido fundamenta-se, em suma, no facto de «a actual Lei nº 15/2001, de 05JUN, que aprovou o novo Regime Geral para as Infracções Tributárias (RGTI) que revogou o RJIFNA, não prevê qualquer norma idêntica à do art. 46º, do RJIFNA, que atribuía à administração fiscal legitimidade para se constituir assistente em processos penais relativos a crimes fiscais.
Assim, inexistindo agora lei especial que confira tal faculdade (cfr. art. 68º, nº1, do CPP) a legitimidade para a administração fiscal se constituir assistente haverá que ser apreciada de acordo com os critérios gerais do art. 68º, do Cód. Proc. Penal».
Acrescenta-se no despacho recorrido que «Se com a incriminação da conduta tipificada no art. 24º do RJIFNA, se sanciona a violação dos deveres de colaboração com a administração fiscal e da relação de confiança estabelecida entre a administração fiscal e o agente (relação de confiança essa resultante da investidura do agente, em virtude do cumprimento de obrigações legais, na qualidade de depositários de determinados valores com vista à sua entrega ao Estado), não é no entanto apenas ou por si só essa relação de confiança que a incriminação do abuso de confiança fiscal ou em relação à segurança social visa proteger, mas antes objectivos mais vastos de repartição da riqueza e da justiça social (os objectivos do sistema fiscal: arts. 103º e 101º, da Constituição da República Portuguesa), de que tal relação de confiança é mero instrumento.
Está portanto em causa a tutela de interesse estadual, não podendo confundir-se Estado com órgãos da Administração Pública e, concretamente, com a administração fiscal ou Segurança Social (que não são titulares dos interesses do Estado, mas antes revela-se a redundância - administradores dos meios afectos à satisfação de tais interesses).
O interesse especialmente protegido com a incriminação do abuso de confiança fiscal ou contra a Segurança Social não é portanto titulado pela administração fiscal ou pela própria Segurança Social.
Talvez pela consideração desta ordem de razões, o legislador estabelecia expressamente no RJIFNA norma especial atribuindo legitimidade à administração fiscal para se constituir assistente (pois de acordo com o regime geral do Cód. Proc. Penal não gozava de legitimidade para o efeito)».
Argumenta-se ainda na decisão sob recurso que, «não prevê agora o RGIT norma análoga à do art. 64º do RJIFNA, antes atribuindo no art. 50º à administração tributária e à Segurança Social determinados deveres e faculdades (para além dos de investigação dos crimes fiscais: cfr. art. 40º, nº2) que, não se confundindo com os previstos no art. 69º, do CPP para os assistentes, apresentam, no entanto, aspectos de identidade que fazem com que se torne desnecessária e inútil a atribuição à administração fiscal ou à Segurança Social dos poderes e faculdades que cabem aos assistentes».
3.1.2. Vejamos, pois, se colhem os argumentos do despacho recorrido, posto em crise pelo recorrente.
Não há dúvida que no âmbito do DL nº 20-A/90 de 15JAN, que aprovou o regime jurídico das...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO