Acórdão nº 0344557 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Janeiro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO GOMES
Data da Resolução26 de Janeiro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam em Audiência na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1.

RELATÓRIO 1.1. No Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo do arguido B.........., filho de C.......... e de D.........., nascido a 24.02.68, em Luanda, Angola, com última residência conhecida na R. ....., nº. .., ..., Ermesinde, casado, vendedor, titular do B.I. n.º 000..., em 30.12.92, por Lisboa, com fundamento nos factos alegados na acusação (fls. 78 e ss.), que se dá por reproduzida, foi imputado ao arguido, em autoria material, um crime de BURLA QUALIFICADA, p. e p. pelos arts. 217º e 218º, nº 2, al. a), ambos do Código Penal.

1.2. E.........., com sede na Travessa ....., .., ....., ....., Valongo, veio deduzir pedido cível contra o arguido, pedindo a condenação deste a pagar-lhe, a título de indemnização por danos patrimoniais, a quantia de € 21.514,85 (Esc:4.313.340$00), acrescida de juros de mora, à taxa legal vencidos (€ 5.231,94) e vincendos, até efectivo e integral pagamento.

1.3. Efectuado o julgamento foi julgada a acusação procedente, por provada e, em consequência, foi o arguido B.......... condenado, pela prática de um crime de burla qualificada, p.p., pelos arts. 217º, nº1 e 218º, nº 2, al. a), do CP, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por um período de quatro anos, uma vez que, atendendo à personalidade do arguido, condições de sua vida, com três filhos menores para criar e conduta anterior ao facto (apesar de tudo, as condenações anteriores referem-se a factos praticados em 92 e 96), concluem que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (CP art. 50º), suspensão que, contudo, fica subordinada ao dever de pagar à demandante civil, no prazo de 18 meses, a indemnização que lhe for arbitrada nos presentes autos [CP art. 50 e 51º, nº l, al. a)], em caso de revogação desta suspensão, será aplicado o perdão da Lei nº 29/99, de 12/05 (seu artº. 1º, nº l).

Foi julgado o pedido de indemnização civil procedente, por provado e, em consequência, foi o demandado B.......... condenado a pagar à demandante E.........., a quantia de € 26.746,79 (capital e juros vencidos), acrescida de juros moratórios vincendos, sobre o capital, à taxa legal, até integral pagamento.

1.4. Inconformado com o acórdão dele interpôs recurso o arguido, que motivou, concluindo nos seguintes termos: "

  1. Ao dar como provado facto diverso daquele que foi objectivado em audiência de julgamento, o Tribunal violou o disposto no art. 410º, nº 2, al. c), do CPP.

  2. Efectivamente do que decorre em termos de prova e dos depoimentos gravados o arguido ora recorrente não agiu com intenção de obter para outrem, que nem sequer conhecia um enriquecimento ilegítimo.

  3. nem enganou a ofendida fazendo-a crer que a mercadoria se destinava à cliente mencionada na "venda a dinheiro" e que seria paga no acto da entrega, pois tais elementos e condições foram-lhe dados pela ofendida.

  4. Pois o presente é interposto do Acórdão proferido a fls., dos presentes autos no qual se condenou o recorrente pelo crime de burla qualificada p.p. pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nº 2, alínea a) do Código Penal na pena de três anos de prisão, declarando suspensa a execução da pena por um período de quatro anos, subordinada ao dever de pagar à demandante civil "E..........", no prazo de 18 meses, a indemnização que lhe foi arbitrada nos presentes autos, isto é, a quantia de Euro 21.514,85 acrescido dos juros de mora legais vencidos e vincendos até integral pagamento.

  5. Foram dados como provados os seguintes factos: que o arguido era vendedor da sociedade "E..........", com sede na Trav. ....., .., ....., Valongo e que 24 de Setembro de 1998 este terá pedido ao encarregado de armazém dessa sociedade, o carregamento de 380.520 m2 de soalho, no valor total de Esc. 4.313.340$00, para ser entregue nesse mesmo dia e que tal mercadoria se destinava à sociedade "F.........." a ser paga no acto da entrega. Tendo a mercadoria sido carregada e o motorista de ofendida dirigiu-se para um local do concelho de Santa Maria da Feira, onde o arguido se encontrava à espera, e indicou ao motorista que seguisse atrás de si, parando em diversas obras de construção civil, alegando estar à procura do comprador da mercadoria e que uma vez que não encontraram o empreiteiro, o arguido indicou como local de descarga uma garagem, sita na Rua ....., nº ..., Oliveira de Azeméis, tendo a mercadoria sido aí descarregada na presença do arguido e de um casal cuja identidade não foi possível apurar, e que como o empresário demorava os funcionários da ofendida e o arguido junto com o referido casal, ainda aguardaram mais um pouco junto ao local de descarga do material, quando o arguido os informou que iriam esperar pelo comprador num restaurante próximo daquele local, mas uma vez aí e o comprador continuava a não aparecer o arguido informou os funcionários da ofendida que se podiam retirar uma vez que ele ficaria até aquele chegar, tendo dado ao alegado genro do comprador a factura para que este a rubricasse, entregando depois uma cópia aos funcionários da ofendida, dizendo-lhes que dali não sairia sem o pagamento e que o arguido nunca mais contactou com qualquer funcionário da ofendida, tendo esta sofrido um prejuízo igual ao valor da mercadoria, sabendo pois que ao agir da forma descrita determinaria a ofendida a entregar, em prejuízo próprio e para enriquecimento doutrem cuja identidade não foi possível determinar, mercadoria no valor de Esc. 4.313.340$00.

  6. Como não provados apenas que o arguido enriqueceu, ao actuar da forma descrita.

  7. Das gravações efectuadas em audiência de julgamento nem sequer transparece que o arguido ora recorrente tivesse tido conhecimento ou agisse de forma a ter cometido o crime de que vinha e foi efectivamente acusado e dos depoimentos das testemunhas de acusação e de defesa não decorre qualquer indício da prática de algum crime pelo recorrente.

  8. Pelas declarações do demandante civil e das testemunhas de acusação apenas se poderá inferir que estes tendo tido conhecimento e tendo contactado a empresa que solicitou a aludida mercadoria bem como o "casal" que indicou o local de descarga da mesma, e nada tendo feito, nem sequer informado o Tribunais de tais circunstâncias, provavelmente entenderam que não teria valido a pena. O porquê de tal actuação só os mesmos poderão explicar, mas que aqui não se deixa de considerar e estranhar.

  9. Também é referido pela testemunha G.......... que nunca ficou convencido que a mercadoria fosse para o arguido aqui recorrente, sempre pensaram que a madeira era para o empreiteiro, ou seja nunca as testemunhas pensaram que o B.......... os tivesse a enganar, mas apenas a cumprir as suas funções.

  10. Do depoimento do arguido B.........., infere-se que o mesmo tinha total desconhecimento que o aludido casal, ou que a empresa que solicitou a entrega de tal material, tivessem, intenção de enganar a ofendida. Aliás foi à ofendida que a aludida sociedade compradora tinha fornecido os seus elementos, e assim parece ser pois foi esta quem forneceu ao Tribunal tais elementos.

  11. Pois foi apenas baseado na análise feita às declarações do demandante civil e dos depoimentos das testemunhas, que se baseou o douto Acórdão que condenou o arguido ora recorrente, pelo que assim, tal conclusão não poderá ser aceite. Não se poderá concluir que o arguido enganou a ofendida, mas sim que o arguido ora recorrente também foi enganado.

  12. Pelo que o erro notório na apreciação da prova foi determinante para que o Tribunal condenasse o recorrente, como o fez. Aliás o Tribunal ao dar por provado facto diverso subverteu em absoluto a prova da audiência de julgamento, o que implicaria nos termos do disposto no artigo 426º do Código de Processo Penal o reenvio do processo para novo julgamento, quando não for possível decidir da causa mas parece que este Tribunal dispõe de todos os elementos para decidir, isto é para absolver o recorrente.

  13. Verdade é que existiu erro na crítica dos factos provados, pois contra o que resulta dos elementos constantes dos autos, o Tribunal emitiu um juízo sobre a verificação da matéria de facto que o não poderia ter feito e que por isso se torna incontestável a existência de tal erro de julgamento sobre a prova produzida. O Tribunal retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, pois não há nenhuma prova conclusiva que tenha sido o arguido a praticar o crime de que foi acusado.

  14. E não se tendo provado a prática do crime de que vem o arguido acusado, terá forçosamente que improceder o pedido de indemnização civil formulado nos presentes autos».

Termina pelo provimento do recurso.

1.5. Na 1ª instância houve Resposta do Ministério Público o qual conclui que o recurso não merece provimento, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

1.6. O Exmº Procurador-Geral Adjunto nesta Relação emitiu Parecer, no sentido de que o recurso não merece provimento, concordando com a resposta à motivação apresentada pelo MºPº em 1ª Instância.

1.7. Foi cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do CPP.

1.8. Procedeu-se à documentação dos actos da audiência.

1.9. Foram colhidos os vistos legais.

1.10. Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo.

***2.

FUNDAMENTAÇÃO 2.1. No acórdão recorrido deram-se como provados os seguintes factos: 2.1.1. O arguido era vendedor da sociedade "E..........", com sede na Trav. ....., .., ....., Valongo.

2.1.2. A 24 de Setembro de 1998, o arguido pediu ao encarregado de armazém da referida sociedade, o H.........., o carregamento de 380.520 m2 de soalho, no valor total de Esc. 4.313.340$00, para ser entregue nesse mesmo dia.

2.1.3. O arguido informou que aquela mercadoria se destinava à sociedade "F.........." e seria paga no acto da entrega.

2.1.4. A mercadoria foi carregada e o motorista da ofendida...

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