Acórdão nº 0344755 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Novembro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | CONCEIÇÃO GOMES |
Data da Resolução | 03 de Novembro de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam em Audiência na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1.
RELATÓRIO 1.1. No Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia -1º Juízo Criminal - o Ministério Público requereu o julgamento em processo comum singular de B.........., devidamente identificado nos autos, imputando-lhe a prática de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo art. 291º, nº1, al. b) do CP, em concurso real com as infracções ao disposto nos art. 12º, nº 1, 20º nº1, 45º n.º 1, al. d) e c) e 90º, nº 1, al. d) do Código da Estrada com a redacção introduzida pelo D.L. nº 2/98 de 3 de Janeiro, conforme acusação de fls. 29/31.
1.2. Na decisão instrutória proferida na sequência da abertura de instrução requerida pelo arguido, foi declarado extinto o procedimento criminal movido contra o arguido por amnistia, quanto às contra-ordenações p. e p. pelos arts. 12º, nº1, 20º nº1, 45º, nº 1, al. d) e c) e 90º nº 1, al. d) do Código da Estrada com a redacção introduzida pelo D.L. 2/98 de 3 de Janeiro, e pronunciado o arguido, pela prática de um crime condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo art. 291º, nº 1, al. b) do CP, pelos factos descritos a fls. 109 a 111 1.3. Efectuado o julgamento foi o arguido B.........., condenado como autor material, de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo art. 291, n.º 1, al. b) do CP/95, na pena de 300 dias de multa à taxa diária de € 4, bem como na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, pelo período de 10 meses.
Foi declarado perdido a favor do estado o motociclo apreendido nestes autos.
1.4. Inconformado com a sentença dela interpôs recurso o arguido, que motivou, concluindo nos seguintes termos: 1. A matéria de facto provada, cabem apenas factos materiais simples, isto é, ocorrências concretas da vida real, estado qualidade ou situação de pessoas e de bens, o que, de todo, se não harmoniza com o ponto 7- da douta decisão sob crítica, matéria vaga e conclusiva a expurgar dos factos assentes.
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Também o que o Tribunal consignou sob 8 e 10 dos factos provados, consubstancia generalidade que, por absoluta falta de ligação às circunstâncias concretas previstas nas pertinentes regras de circulação rodoviária, designadamente as previstas nos arts. 12°, 13°, 14°, 20°, 29º e 45°, todos do Código da Estrada, configura matéria conclusiva e revel a qualquer premissa de suporte, a eliminar dos factos provados.
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Os depoimentos prestados em audiência de julgamento pelo arguido - cfr. cassete n.1, do n.° 00.00 do lado A até ao fim do lado A e pelas testemunhas C.......... - cfr. cassete n.° 1, lado B, do n.° 22.27 ao n.° 4.80 da cassete n.° 2, lado A - e D.......... - cfr. cassete n.° 2, lado A, do n.°' 4.80 ao 14.09, contrariam inequívoca e frontalmente a factualidade consignada como provada sob 5, 11 e 12.
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Na verdade, a escorreita ponderação e avaliação desses mesmos depoimentos, impunha firmar que, ao tempo dos factos: eram visíveis no local agentes da autoridade; as manobras efectuadas pelo arguido o foram em local afastado de pessoas e de veículos; e em momento de circulação alguma de veículos e de peões.
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Por isso, ao assentar ali em sentido diametralmente oposto ao que lhe era determinado pela prova a esse respeito produzida, o Tribunal incorreu em ostensivo erro de julgamento da matéria de facto.
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Por outro lado, também da correcta avaliação dos mesmos depoimentos do arguido e das testemunhas C.......... e D.........., constantes, respectivamente, das cassetes n.1 do n.° 00.00 do lado A até ao fim do lado A; n.° 1, lado B, do n.° 22.27 ao n.° 4.80 da cassete n.° 2, lado A; e n.° 2, lado A, do n.° 4.80 ao 14,09, se impunha ao Tribunal ter considerado como provada a factualidade incluída nos pontos c), d), e), g), i), j) elo dos "factos não provados".
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Com efeito, a análise criteriosa dos referidos depoimentos, impunha que se tivesse dado como provado que no momento referido em 3 dos factos provados e enquanto o arguido permaneceu no local, circulavam veículos da G.N.R. devidamente caracterizados; que o arguido se inteirou junto de, duas pessoas suas conhecidas sobre o que se estava a passar; que essas pessoas o tenham informado que se tratava de um festival de motociclos que tinha vindo anunciado no jornal de Notícias; que face às circunstâncias deparadas, designadamente a presença dos meios de comunicação social e da G.N.R., arguido se tenha convencido de que tudo se passava a coberto de autorização legal; que tenha sido com base nessa convicção que o arguido efectuou as duas manobras designadas por "cavalo"; que, não obstante, o fez em zona afastada do real polo de concentração de pessoas e veículos e em momento de nenhuma circulação; sem que daí tivesse advindo perigo algum a pessoas, veículos ou outros bens.
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Ao decidir-se, ainda aqui, em sentido contrário ao que lhe era ditado pela prova produzida em audiência de julgamento, que avaliou e sobrepesou deficientemente, pois, voltou o Tribunal a incorrer em manifesto erro de julgamento sobre a matéria de facto.
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Conquanto todas as provas apontavam, e apontam, inelutavelmente, no sentido da improcedência da: pronúncia e da absolvição do arguido.
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A decisão recorrida encontra-se viciada por um deficiente exame crítico das provas, desvalorizando todas as que se não compaginam com a tese da pronúncia e, concomitantemente, sobrevalorizando uma só, o depoimento- do soldado autuante, que àquela vem moldada.
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Tal posição, encontra-se, porém, apoiada não em qualquer circunstância capaz de justificar a maior ou menor razão de ciência das testemunhas, tampouco a fé que possam merecer ao Tribunal, antes nos próprios factos e provas, pelo que se lhe não pode reconhecer a virtualidade de garantir que a decisão se formou em moldes logicamente correctos.
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Ainda assim, razão alguma se antolha para que o Tribunal tivesse ultrapassado o estado de dúvida em que se deveria encontrar colocado desde o início do processo, tudo a conduzir à absolvição do arguido, atento o principio in dubio pro reo.
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A perda a favor do Estado dos objectos utilizados na prática de um determinado crime, não pode ser entendida como uma verdadeira reacção contra o crime, sendo, antes, uma medida preventiva que não dispensa um prognóstico quanto ao perigo de repetição de novos` factos ilícitos através do mesmo, instrumento 14. Ora, no caso em; apreço, em fundamentação da declaração de perda do motociclo do arguido a favor do Estado, o tribunal limitou-se a uma seca alusão ao art. 109.° do Cód. Penal, interpretando-o, designadamente o seu n.° 1, no sentido de uma aplicação automática, que o mesmo não permite.
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Na verdade, e conforme se colhe da letra do n.1 do citado normativo, a declaração de perda a favor do Estado só opera quando, para além da utilização do objecto na prática de um certo tipo legal de crime, seja de concluir, face à sua natureza, ou às circunstâncias do caso, que é posta em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, ou que exista sério risco de voltar a ser utilizado no cometimento de novos crimes.
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Ora, no caso dos autos, bastaria ao Tribunal ter atentado na factualidade que deu como provada sob 15, 16, 17, 20, 21 e 22 dos factos provados para concluir pela ocasionalidade da conduta imputada ao...
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