Acórdão nº 0446210 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Junho de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelJORGE JACOB
Data da Resolução07 de Junho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO: Nos autos de instrução nº …./02.0GBPRG, do …º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Peso da Régua, após debate instrutório foi o arguido e ora recorrente, B…….., pronunciado pela autoria material de dois crimes de abuso sexual de crianças p. p. pelo art. 172º, nº 3, al. b), do Código Penal na redacção introduzida pela Lei nº 99/01, de 25 de Agosto.

Inconformado, o arguido interpôs recurso retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1 - O arguido tem o direito de estar presente no debate instrutório; 2 - A lei impõe tal obrigatoriedade; 3 - Na data daquele comunicou o arguido ao Tribunal a sua incapacidade para comparecer por motivo de doença; 4 - O seu mandatário no seu livre arbítrio entendeu que aquele poderia ser feito sem a sua presença.

5 - Apesar de nunca o arguido lhe ter comunicado qualquer intenção de renunciar ao direito de presença.

6 - Sendo certo que o mandato com meros poderes gerais não habilitava o mandatário a renunciar em nome do arguido ao direito de presença.

7 - Deveria aquele ter sido adiado; 8 - Tendo o mesmo sido realizado o mesmo é nulo e nula é a decisão instrutória e respectiva pronúncia, por violação dos artigos 32º CRP, 410º, nº 3, 119º, alínea c) e 61, nº 1, a), b) e f) do C.P. P.; 9 - O crime de abuso sexual de crianças reveste natureza semi pública; 10 - Só em casos excepcionais pode o MP iniciar o impulso processual (artº 178º, nº 4 do CP); 11 - Sendo certo que as ofendidas não apresentaram queixa contra o arguido; 12 - Apesar da cláusula do artº 178º, nº 4, que não impõe a obrigatoriedade de intervenção do MP, deverá este quando se recorre daquele preceito fundamentar a sua decisão, habilitando o Tribunal das razões de facto e de direito que o levam a tomar a iniciativa, porquanto não raras vezes é nociva a intervenção do direito criminal.

13 - No caso concreto não fundamentou o MP o seu impulso processual, não tendo ponderado sobre as razões da sua intervenção, pelo que carecia de legitimidade para promover a acusação, devendo os autos serem por isso arquivados.

14 - A decisão instrutória é nula, porquanto não fundamentada (em violação do artº 97º, 283º CPP e 208º CRP.

15 - A leitura da decisão instrutória é nula, porquanto não foi comunicado ao arguido - cfr artº 119, d) e c), 61º, a), b) e f) do CPP; 16 - Sendo certo que o seu mandatário também não compareceu à mesma; 17 - O despacho de pronúncia não foi devidamente fundamentado em termos de facto e de direito, devendo pois, declara-se a respectiva nulidade, por violação do art. 97º, 283º, 308º, do C.P.P. e 208º da C.R.P.; 18 - O arguido não foi notificado da data em que seria lida a decisão instrutória, tratando-se de acto ferido de nulidade, por violação no disposto no art. 61º do C.P.P., nulidade que pode ser apreciada em sede de recurso.

Termos em que deve o presente recurso ser declarado provado e procedente, declarando-se a nulidade do debate instrutório e do subsequente despacho de pronúncia, pelos motivos infra invocados.

Na sua resposta, o Exmº Procurador-adjunto pugnou pela improcedência do recurso.

Nesta instância, o Exmº Procurador-geral Adjunto, secundando a posição assumida pelo M.P. na comarca, emitiu parecer no mesmo sentido.

Foram colhidos os vistos e realizou-se a conferência.

Segundo a jurisprudência corrente dos tribunais superiores, o âmbito do recurso afere-se e delimita-se pelas conclusões formuladas na respectiva motivação, sem prejuízo do que deva ser oficiosamente conhecido.

No caso vertente, as questões a decidir são as seguintes: - Falta de legitimidade do M.P. para o exercício da acção penal; - Realização do debate instrutório sem a presença do arguido; - Nulidade do despacho de pronúncia por falta de fundamentação; - Falta de notificação do arguido da leitura de decisão instrutória.

II - FUNDAMENTAÇÃO: Desde já se transcrevem os factos pelos quais o arguido foi pronunciado, dada a sua manifesta relevância para a apreciação do recurso, nos termos que adiante serão referidos: 1 - O arguido B…….., no ano lectivo de 2002/2003, desempenhou as funções de professor da disciplina de História na Escola EB 2/3 de ……, Peso da Régua.

2 - O arguido, praticamente desde o início do ano lectivo, dizia às menores suas alunas C……, nascida a .../…/1989, e D……., nascida a ../../1989 que haviam de ir visitar a sua casa.

3 - Em data não concretamente apurada, mas numa sexta-feira de Novembro de 2002, o arguido disse às menores, após uma aula de História, para irem a casa dele onde lhes forneceria o enunciado do próximo teste de História.

4 - Na segunda-feira seguinte, por volta das 14h00 o arguido reiterou o convite, pelo que as referidas menores acederam, acompanharam o arguido ao apartamento arrendado em que este vivia, sito no Edifício ….., ….º Esq., Rua ……, ….., Peso da Régua.

5 - No mesmo grupo iam também as menores E……., nascida em ../../88 e F……., nascida em ../../87.

6- Aí chegados o arguido sentou-se na sua cama, dizendo que era fofinha e afirmando na presença das menores que se imaginava a fazer sexo com a E…… ou com a F….. e perguntou a estas se queriam fingir ou praticar sexo com ele.

7 - Nessa sequência, o arguido questionou as menores se tinham namorados e se eram virgens, revelando que tinha uma namorada com a qual já havia praticado sexo.

8 - Quando a menor C….., acompanhada da E……, se deslocou à...

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