Acórdão nº 263/06.8JFLSB.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelABRUNHOSA DE CARVALHO
Data da Resolução22 de Abril de 2010
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

TEXTO PARCIAL: Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: Na 1ª Vara Criminal de Lisboa, por acórdão de 23/02/2009, constante de fls. 2062 a 2119, foi o Arg.

[1] A…, com os restantes sinais dos autos (cf. fls. 1741) condenado nos seguintes termos: “VIII.

E assim, julgando parcialmente procedente a pronúncia, nos termos e com os fundamentos expostos, decide este Tribunal Colectivo, em: 1.

Condenar o arguido, A…, como autor de um crime de corrupção activa para acto lícito, previsto e punível nos termos do mencionado Art.º 18.º, n.º 2, da Lei 34/87 de 16/7, na pena de 25 (vinte e cinco) dias de multa, à razão diária de € 200 (duzentos euros), o que perfaz o montante global de € 5.000,00 (cinco mil euros); e 2.

condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 10 (dez) Ucs, e a procuradoria em ¼ - Artºs 513º do CPPenal e 85º nº 1 e 95 nº 1, estes do CCJudiciais – a que acresce 1% da taxa de justiça nos termos do Artº 13º, nº 3, do DL 423/91, de 30/10.

”.

* Inconformado, veio o Ex.m.º Magistrado do MP[2] interpor recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 2138 a 2161, com as seguintes conclusões: “

  1. Face à prova produzida em audiência de discussão e julgamento, a conduta do arguido integra a prática de um crime de corrupção activa para a prática de acto ilícito, previsto e punível noArt.18°, n.° 1, por referência aos Arts. 16°, n.° 1, e3°, n.°1, alínea i), da Lei n.° 34/87 de 16/07, na redacção da Lei n.° 108/2001 de 28/11—e não um crime de corrupção activa para a prática de acto licito, p. e p. pelo Art.18°n.° 2 da Lei n.°34/87,de 16/07, ilícito criminal pelo qual foi condenado.

    b) O tribunal "a quo" não extraiu, como podia e devia, das transcrições das gravações relativas aos encontros, entre a testemunha B... e o arguido, ocorrido sem 24/01/2006 e 27/01/2006 – constantes do Apenso E, nem das declarações prestadas pela referida testemunha, os factos relevantes à subsunção da conduta do arguido ao crime de corrupção activa para a prática de acto ilícito.

    c) A transcrição da gravação relativa ao encontro de 24/01/2006 - constante do Apenso E, é clara.

    d) Apesar da testemunha B… vincar ao arguido que o seu irmão não o quer prejudicar, o tribunal não valorou o distanciamento, intencional, que o arguido manifestou em relação ao assistente, quando refere "...eu não falo com o seu irmão, não posso." (sic) e) A ser consistente a ideia, espelhada na fundamentação do acórdão, que o arguido pretendia, tão só, que o Vereador assumisse, publicamente, a legalidade do negócio, justificando essa conclusão na consulta de documentação existente ao seu dispor no município ou na Câmara, não se compreende que o mesmo não tomasse a iniciativa activa, com a ajuda da testemunha B…, no sentido de transmitir/explicar, pessoalmente, ao assistente, a razão dos seus argumentos na base da estrita legalidade, caso, saliente-se, os mesmos tivessem a dignidade legal que o acórdão, de certo modo, parece conferir.

    f) Ora, o arguido assumiu posição contrária.

    g) Tal comportamento não corresponde ao que seria de esperar do homem médio numa posição de certeza e de convicção da legalidade dos seus argumentos.

    h) Não vinga o argumento, também, vertido na decisão impugnada, de que não está provado que os negócios levados a cabo pelas empresas representadas pelo arguido foram contrários à lei e lesivos dos interesses do Município por o litígio judicial, ainda, estar pendente em tribunal e que não está demonstrado que o arguido pretendia declarações do assistente que falseavam a verdade relativa a assuntos a que tinha acesso nessa sua qualidade de vereador.

    z) Se é verdade que o litígio judicial não teve, ainda, decisão final, não é menos que daí se possa concluir que os negócios levados a cabo pelas empresas representadas pelo arguido não foram contrários à lei e lesivos dos interesses do Município e sobre tal matéria é inequívoca, pública e conhecida a posição do assistente, que considera que foram lesivos.

    j) Sobre tal matéria a seu tempo o tribunal administrativo, porque o competente, decidirá, sendo prematuro/precipitado tirar quaisquer ilações sobre o desfecho da acção popular.

    k) A partir da transcrições da gravação do encontro de 24/01/2006 - constante do Apenso E, dúvidas não temos, que o arguido pretendeu manobrar o Vereador, assistente, fazer com que alterasse, as suas convicções legais, nas suas palavras"...demovê-lo…" das suas posições, a troco de uma compensação, de natureza pecuniária.

    l) Neste plano de demover o assistente das suas posições ganha particular relevo a compensação monetária a pagar ao mesmo, a troco da desistência da acção popular e de declaração pública sobre a legalidade da actuação das empresas representadas pelo arguido.

    m) Desta gravação do encontro resulta claro que o arguido pretendia, ao contrário da valoração feita pelo tribunal, que o assistente através da declaração pública manifestasse, precisamente, no palco da Câmara, posição favorável aos seus interesses, só assim se compreende que reportando-se à declaração pública concordou que a mesma fosse expressa numa reunião da Câmara ao referir "Perfeitamente.... numa reunião da Câmara e manda isso para tribunal, manda a desistência para tribunal..." (sic) n) Na transcrição da gravação relativa ao encontro de 27/01/2006 - constante do Apenso E, também, o tribunal não curou valorar a preferência do arguido da declaração a ser proferida na Assembleia Municipal, ao responder a pergunta feita pela testemunha B… se"...preferia uma declaração na Câmara ou na Assembleia?" respondeu "Na ahhhh', eu preferia, eu acho que na Assembleia (imperceptível), há muitos jornalistas. "(sic) o) A ser insofismável a ideia que o arguido pretendia tão só que o Vereador assumisse, publicamente, a legalidade do negócio, justificando essa conclusão na consulta de documentação existente ao seu dispor no município ou na Câmara, não se concebe, também, que, para tanto, apesar do negócio cumprir todas as exigências legais, mesmo assim, tivesse que pagar a quantia monetária de €200.000,00, objecto da proposta. Seria intolerável para o comum dos homens.

    p) É inegável que o arguido, mercê da reconhecida capacidade financeira das empresas por si representadas, com obras realizadas por todo o território nacional, não pretendeu, somente, que o assistente, na qualidade de Vereador, tivesse a clarividência da legalidade dos negócios das empresas por si representadas. Quis mais, muito mais.

    q) Pretendeu condicionar a vontade política do visado, criando um clima de permeabilidade favorável às suas pretensões, em futuros projectos, mormente na capital do país assumindo a contrapartida monetária pedra de toque, na sua acção.

    r) Recordem-se, neste capítulo, as palavras do arguido quanto ao esquema para recolher a quantia monetária objecto do pagamento a fazer ao assistente "...Conforme faço uma escriturazinha, rapo 2 mil euros aqui, eh, 10 mil euros aqui, 10 mil euros acolá, pronto, a curto prazo. Por lá em casa num cofre, para, para a gente ir fazendo umas ratices, mas nisto não sou virgem, esteja à vontade....

    Não sou virgem nestas coisas, não é? Não sou.

    "(sic) s) O arguido, sem qualquer rodeio, no seu diálogo com a testemunha B…, faz vincar a sua experiência na prática de esquemas denominados de"...ratices..." ... ratices... "envolvendo o desvio de dinheiro de negócios jurídicos, esquemas ilícitos e contrários à lei, vangloriando-se até de não ser"...virgem..." nesses esquemas.

    t) Esta postura do arguido genuína, sem qualquer pejo e acanhamento, direccionada à pessoa do assistente, outra leitura não pode ter de que com a sua proposta pretendeu a violação, por parte do assistente C…, dos deveres de imparcialidade, de lealdade e de obediência à lei inerentes ao seu cargo de Vereador e correspondente à prática de um acto contrário a esses deveres.

    U) O arguido como agente de corrupção activa visou, única e exclusivamente, a prática de um acto ilícito pelo assistente.

    v) O depoimento da testemunha B…, prestado em 23/01/2008, constante do CD 2-00:00:30 a 02:32:40 - não pode, também, deixar de ser valorado, positivamente, no sentido de que o arguido pretendia na sua acção de corrupção activa a prática de um acto ilícito, por parte do seu irmão.

    w) O tribunal "a quo" julgou, incorrectamente, ao dar como não provado os factos, constantes do ponto IV. do acórdão elencados a fls. 2080 e2080 verso, a saber que: “… .o mesmo arguido A… pretendesse que o Vereador C… viesse a afirmar a sua mudança de opinião em sede de reuniões dos órgãos do Município de Lisboa; .o mesmo arguido fizesse depender o pagamento do montante pecuniário, tal como referido em a.19., do proferimento, por parte do Dr. C…, de declarações públicas na qualidade expressa de vereador da Câmara Municipal de Lisboa; (…) .o arguido pretendesse com a declaração pública do Dr. C… aludida em a.36. e a.37, comprometer o vereador C… com uma versão de apoio aos interesses do mesmo grupo de empresas, de forma a vinculá-lo em votações futuras de temas e de projectos em que as sociedades por si participadas estivessem envolvidas; .o arguido, para além do exposto em a.52., pretendesse uma alteração das tomadas de posição do Dr. C… em sede de artigos de imprensa e enquanto vereador na Câmara Municipal de Lisboa, como fim de este passar a reconhecer idoneidade e viabilizar projectos e negócios mantidos pelas empresas de que o arguido era accionista, em particular as empresas"D…" e "E… – Investimentos Imobiliários"; .o arguido actuou com vista a levar o referido vereador a violar as obrigações que havia assumido com a aceitação do seu mandato;." (sic) y) A argumentação gizada em sede de impugnação da matéria de facto impõe inevitáveis reflexos no enquadramento jurídico-penal da conduta do arguido.

    z) O ilícito criminal referido em a) é punido, em abstracto, com uma pena de prisão de 6 (seis) meses a 5 (cinco) anos.

    a

  2. ...

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