Acórdão nº 162/12.4GAACN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2014
Magistrado Responsável | ELISA SALES |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO A...
veio interpor recurso da sentença que o condenou pela prática de um crime de ameaça agravado p. e p. pelos artigos 153º e 155º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena de 80 dias de multa, à taxa diária 5,00 €, no montante global de 400,00 €.
Na procedência parcial do pedido de indemnização civil formulado pelo demandante B...
, foi o demandado/arguido condenado no pagamento (ao demandante) de 300,00 € a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos.
* A sua discordância encontra‑se expressa na motivação de recurso de onde retirou as seguintes conclusões: A. O Arguido não se conforma com douta sentença que o condenou pela prática de um crime de ameaça agravado previsto e punido pelos artigos 153º e 155°, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à razão diária de 5€ (cinco euros) no montante global de 400€.
B. Entende o Arguido que face aos factos considerados provados que se reconduzem às expressões "mato-te .
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mordo-te as orelhas todas", não poderia o Tribunal ter por consumada a prática do crime de ameaça agravada, C. O n.º 1 do artigo 153.° do Código Penal estabelece «quem ameaçar outra pessoa com a prática de um crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido (...) ».
D. A doutrina e a jurisprudência têm entendido que são elementos constitutivos deste tipo legal, o anúncio, por qualquer meio, de que o agente pretende infligir a outrem um mal futuro, dependente da vontade do autor, que constitua crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, que o anúncio seja feito de forma adequada a provocar receio, medo ou inquietação ou a prejudicar a liberdade do destinatário, e que o agente actue com dolo (tenha consciência da adequação da ameaça a provocar medo ou intranquilidade no ameaçado).
E. São três as características essenciais do conceito de ameaça: o anúncio de um mal, o carácter futuro do mesmo e a sua ocorrência dependente da vontade do agente.
F.
Quanto à primeira característica prevê-se o anúncio de um mal, G. No que à segunda característica importa «que o mal, objecto da ameaça, não pode ser iminente, pois que neste caso, estar-se-á perante uma tentativa de execução do respectivo acto violento, isto é, do respectivo mal, H. Como se refere no Ac. Relação do Porto de 17-11-2004, sendo o crime de ameaça «um crime contra a liberdade pessoal (liberdade de decisão e de acção) a conduta típica deve gerar insegurança, intranquilidade ou medo no visado, de modo a condicionar as suas decisões e movimentos dali em diante.
I. Perante as expressões que o Tribunal considerou como provadas, não estamos perante um mal futuro que gere insegurança, intranquilidade ou medo no Assistente, de modo a condicionar as suas decisões e movimentos dali em diante.
J. Estamos perante uma ameaça de um mal a consumar no momento, porque ou a ameaça entra no campo da tentativa do crime integrado pelo mal objecto da ameaça, sendo nesse caso a conduta punível como tentativa desse crime, se a tentativa for punível, ou não entra e, então, a ameaça logo se esgota na não consumação do mal anunciado, K. Face à matéria provada não ficou o Assistente condicionado nas suas decisões e movimentos dali para a frente.
L. Para a consumação do crime de ameaça a expressão proferida tem de anunciar a prática de um mal no futuro, que constitua crime, e da análise das expressões dadas como provadas na sentença o Arguido não está a anunciar um mal futuro, mas um mal presente.
M. O entendimento da Mma Juiz de que “tudo o que não seja execução em curso é anúncio de mal futuro, sendo indiferente que a expressão usada seja "agora", "hoje", "amanhã" ou "para o ano e que Futuro é todo o tempo compreendido naquele em que é proferida a expressão que anuncia o mal não acompanhada de actos correspondentes à sua concretização", não tem cabimento no presente caso.
N. A expressão imputada ao Arguido não se repercutiu na liberdade de decisão e de acção futura da vítima, incidindo antes sobre o presente.
O. A expressão "mato-te" não configura ameaça de mal futuro, não aparece em termos de vir a ocorrer no futuro, antes constitui um acto de execução do crime de que, afinal, o recorrente "desistiu", não prosseguindo na sua execução; P. Em conformidade, não se verifica um dos elementos constitutivos, de natureza objectiva, do crime de ameaça imputado ao arguido - mal futuro -, pelo que se impõe a sua absolvição.
Q. A douta sentença recorrida violou, assim, entre outros normativos, o disposto nos artigos 30°, n.º 1, 153°, n.º 1, 155°, n.º1, alínea a), todos do Código Penal e 127°, do Código de Processo Penal.
Nos termos expostos e nos demais aplicáveis, (…) deve conceder-se provimento ao recurso, e absolver-se o arguido.
* O Magistrado do MºPº junto do tribunal recorrido não apresentou resposta.
Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral...
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