Acórdão nº 131/09.1TBTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução19 de Dezembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Nos presentes autos de acção declarativa de condenação na forma de processo comum sumário a autora A....

, viúva, residente na Rua ... Mosteiro de Fráguas, veio pedir que os réus: 1º - B…. ,viúva, residente na Avenida ... Tondela; 2º - C…. e mulher D...., casados sob o regime da comunhão de adquiridos, residentes na Avenida ... Tondela: 3º - E....e mulher F...., casados sob o regime da comunhão de adquiridos, residentes na Rua ... , Tondela; Sejam condenados no seguinte: - ser a Autora reconhecida como legítima proprietária do artigo rústico x... º da freguesia de Mosteiro de Fráguas; - ser reconhecido à Autora o direito de haver para si o prédio rústico vendido, inscrito na matriz sob o artigo z... º, da freguesia de Mosteiro de Fráguas; - ser reconhecido o direito à Autora de substituir os terceiros Réus adquirentes, na citada escritura de 14 de Fevereiro de 2006, na titularidade e posse do aludido prédio rústico z... º, posição que esta ocupará, mediante o pagamento do preço e despesas da escritura, IMT e registo, pagamento já efectuado por Depósito Autónomo; Para tanto alega que é proprietária de um prédio confinante com o que foi vendido pelos 1.os e 2ºs Réus aos terceiros réus sem que lhe tenham sido comunicados os elementos essenciais do negócio e dada a oportunidade de preferir na aquisição do mesmo, uma vez que ambos os prédios são rústicos tendo ambos área inferior à unidade de cultura.

Regularmente citados os réus E… e mulher F...., apresentaram contestação na qual pugnam pela improcedência da acção alegando que o prédio em causa apesar de formalmente adquirido aos 1.o e 2.os réus foi, de facto, adquirido a uma outra pessoa, e que tal negócio foi efectuado conjuntamente com a venda da casa de habitação de que o prédio rústico está afecto como quintal e fonte de água para a habitação, uma vez que no prédio em causa foi, há mais do que 40 anos instalado um motor e tubagem para extracção e condução de água para a habitação para uso doméstico, bem como o prédio foi usado como quintal, atendendo á proximidade do mesmo, da casa de habitação despejando nele lenhas, estrumes e demais utilidades para a habitação, pretendendo, ainda, nele construir anexos com vista ao apoio a sua casa.

Mais alegam que a autora sabe da transmissão do imóvel, com todos os elementos essenciais, há mais do que dois anos sobre a entrada da acção.

Para a hipótese de procedência da acção, formulam os réus contestantes, pedido reconvencional, no sentido de a autora ser condenada a reconhecer o seu direito de propriedade sobre a água do poço existente no prédio objecto da presente acção e bem assim condenada a reconhecer que por sobre o mesmo prédio e no modo e forma alegados nos artigos 46.º e 47.º da contestação, se encontra constituída uma servidão de aqueduto com vista à derivação de tal água para a sua casa.

Respondendo, a autora, alega que a compra e venda dos prédios referidos pelos réus na sua contestação, foram efectuadas em momentos diferentes e que o rústico é separado da casa de habitação aí referida, onde não existe nem está licenciada qualquer construção.

Mais impugna os factos em que os réus assentam a reconvenção que deduziram e mais refere, que, ainda, que esta proceda, em nada contende com a preferência a que se arroga, podendo, quanto muito, manter-se tal servidão.

Com dispensa de audiência preliminar, foi, de seguida, proferido despacho saneador, no qual se admitiu a reconvenção deduzida e foram fixados os factos assentes e a base instrutória.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova testemunhal nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 178 a 181, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.

No seguimento do que foi proferida a sentença de fl.s 183 a 190, na qual se decidiu o seguinte: “Por tudo o exposto o tribunal julga improcedente a presente acção e consequentemente declara: I. Não ser reconhecido à Autora o direito de haver para si o prédio rústico vendido, inscrito na matriz sob o artigo z... º, da freguesia de Mosteiro de Fráguas; II. Não ser reconhecido o direito à Autora de substituir os terceiros Réus adquirentes, na citada escritura de 14 de Fevereiro de 2006, na titularidade e posse do aludido prédio rústico z... º, posição que esta ocupará, mediante o pagamento do preço e despesas da escritura, IMT e registo, pagamento já efectuado por Depósito Autónomo.

  1. Absolve os réus do pedido.

  2. Condena a autora nas custas do processo.”.

Inconformada com a mesma, interpôs recurso a autora A…, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 235), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1.

Quando se impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, são elementos fundamentais os depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento.

  1. No caso sub judice, as testemunhas indicadas pelos 3ºs Réus, ora Recorridos, não contrariaram a tese desenvolvida pela Autora, na sua Petição Inicial.

  2. Não havendo qualquer outra prova em sentido contrário.

  3. Assim sendo, a factualidade provada e articulada não permite que esta Acção seja julgada improcedente.

  4. Os factos articulados pelos 3ºs Réus (quesitos 5º a 13º da Base Instrutória) que constituem a causa de pedir, foram indevidamente dados como provados, uma vez que o depoimento das Testemunhas destes, não poderia levar a esse entendimento.

  5. Ficou assente que os Recorridos não cumpriram o dever de comunicação a que alude o art. 416º, nº. 1, do Código Civil, e foi julgada improcedente a excepção peremptória de caducidade invocada por estes.

  6. A Recorrente depositou o preço nos termos exigidos legalmente.

  7. Assim, verificam-se nos Autos os pressupostos do exercício do direito de preferência e as condições para a sua procedência.

  8. Resultou provado nos autos que o prédio dos 3ºs Réus, aqui em causa, não foi adquirido com vista à sua afectação a fim que não fosse a cultura.

  9. Não estando o direito de preferência afastado pela verificação de qualquer uma das circunstâncias descritas no art. 1381.º do Código Civil, deveria o direito da Recorrente ter sido considerado procedente.

  10. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre o pedido reconvencional formulado pelos 3ºs Réus, ora recorridos.

  11. Mesmo que se considere o facto complementar (a utilização para uso doméstico da água do poço) vertido na Contestação, os 3ºs Réus, ora recorridos, não manifestaram interesse directo em deles se aproveitar, apenas o fizeram no pedido reconvencional, pedido sobre o qual o Tribunal a quo nem sequer se pronunciou na douta Sentença.

  12. Pelo que a douta Sentença recorrida violou as normas dos artigos 664º e 264º do C.P.C., ao basear a decisão em factos não articulados pelos Réus.

  13. A existência de uma hipotética servidão de águas, para abastecimento de uma habitação, não é por si só suficiente para afastar o direito de preferência., até porque hoje em dia perante a Lei, só pode ser captada água de poços para uso doméstico, se estiverem licenciados para o efeito e não houver água da rede pública que possa abastecer a casa de habitação. O que não é o caso dos Autos, já que se encontra junta aos Autos, uma certidão emitida pela Câmara Municipal de Tondela, que comprova que os 3ºs Réus têm água da rede pública no seu domicílio.

  14. Ao afirmar-se na douta Sentença do Tribunal a quo que, a existência de uma servidão predial faz cessar o direito de preferência da Autora, praticou-se um erro na determinação das normas aplicáveis.

  15. Tal como já supra se referiu a douta Sentença recorrida não se pronuncia quanto ao pedido reconvencional dos 3ºs Réus.

  16. Formulado e admitido pedido reconvencional, terá o juiz que sobre ele também se pronunciar, o que não foi feito nos Autos, apesar da sua causa de pedir ter servido de base á decisão.

  17. No entanto utiliza a causa de pedir deste pedido reconvencional para fundamentar a decisão de direito.

  18. Assim, a fonte do direito de preferência invocado pela autora, isto é, a confinância e a necessidade de aproximação da sua parcela á área mínima de cultura, não pode cessar pelo facto de haver uma hipotética servidão predial a favor de um prédio urbano do adquirente.

  19. Nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, é nula a sentença “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar” (1ª parte) “ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento” (2ª parte).

  20. O art. 1380º, nº1, do Código Civil confere um direito de preferência com eficácia “erga omnes”, aos donos de prédios rústicos confinantes, desde que um deles tenha área inferior à unidade de cultura – art. 18º do DL. 348/88, de 25.10.

  21. Trata-se de um direito legal de aquisição que depende da verificação dos requisitos enunciados no citado artigo, cujo ónus da prova incumbe aos que se arrogam titulares do direito de preferência, por se tratar de factos constitutivos desse direito – art. 342º, nº1, do Código Civil.

  22. "Quem pretenda ver judicialmente reconhecido um direito real de preferência, na qualidade de proprietário confinante, deverá (terá) alegar e provar, de acordo com a repartição do ónus da prova, os factos constitutivos do seu direito e que são os indicados no artigo 1380" do Código Civil, o que a ora Apelante conseguiu nos Autos.

  23. Por seu turno, quem possa defender-se terá de provar algumas das excepções indicadas no artigo 1381°do mesmo Código", onde não está incluída a servidão de aqueduto.

  24. Os Apelados, nos seus articulados não alegaram qualquer das excepções enunciadas no art. 1381° Cod. Civil.

  25. Assim, a douta sentença sob recurso não terá feito a melhor aplicação das normas constantes dos arts. 1380°, 1381° do Cod. Civil.

  26. Atentas as conclusões acima apresentadas, a douta Sentença...

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