Acórdão nº 3057/11.5TBGDM-E.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelMÁRCIA PORTELA
Data da Resolução25 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação 3057/11.5TBGDM Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B… veio requereu declaração de insolvência, ao abrigo do disposto nos artigos 18.º, 23.º e 24.º do CIRE, bem como a exoneração do passivo restante, tendo, no que ao caso concerne, sido proferido despacho liminar deferindo a exoneração do passivo restante e fixando como montante necessário ao sustento digno da insolvente e do agregado familiar em € 1.500,00.

Inconformado, apelou o C…, apresentado as seguintes conclusões: «1. Salvo o devido respeito, a douta decisão em apreço não fez correcta interpretação dos factos e adequada aplicação do Direito, devendo ser revogada e substituída por outra que fixe um montante nunca superior a um salário mínimo e meio (Eur.727,50) como suficiente para assegurar o sustento condigno da Insolvente e agregado familiar.

  1. Em 26 de Julho de 2011, a Insolvente B… apresentou-se à insolvência e requereu a exoneração do passivo restante. E, em 10 de Agosto de 2011, foi a mesma declarada por sentença de fls. do processo.

  2. Em 16 de Maio de 2012, e não obstante a oposição dos credores, foi proferido despacho a deferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, que determinou como rendimento disponível da Insolvente todos os rendimentos que lhe adviessem a qualquer título, com exclusão dos créditos referidos no nº 3 do artigo 239º do CIRE, fixando o valor de Eur.1.500,00 como o necessário para o seu sustento.

  3. A decisão recorrida não poderá manter-se por manifesta violação do disposto no nº 3 do artigo 239º do CIRE.

  4. A exclusão ao rendimento disponível tem como limite mínimo o “que seja razoavelmente necessário para o sustento minimamente digno do devedor e do seu agregado familiar” e como limite máximo o montante correspondente a três vezes o salário mínimo nacional.

  5. Qualquer exclusão do rendimento disponível superior ao limite máximo de três salários mínimos nacionais tem que ser devidamente fundamentada e deve basear-se numa situação absolutamente excepcional.

  6. Fundamentação essa, exigida em todas as decisões judiciais (artigo 158º do CPC) mas, aqui, enfatizada.

  7. In casu, o valor excluído do rendimento disponível (Eur.1.500,00) é superior a 3 salários mínimos nacionais (Eur.1.455,00).

  8. Portanto, esse montante só seria juridicamente admissível se a Insolvente tivesse alegado e provado a existência de uma conjuntura absolutamente excepcional que o justificasse (doença no agregado familiar, necessidade de cuidados especiais, etc.).

  9. Pois, a exclusão de certas quantias do rendimento a ser cedido aos credores alicerça-se no princípio da dignidade humana, expressamente previsto no artigo 1º e 59º, nº1, a), da Constituição da República Portuguesa, 11. E não na manutenção de uma vida luxuosa e desafogada pelos Insolventes, em detrimento dos legítimos interesses dos credores.

  10. Neste sentido, dispõe o Acórdão da Relação do Porto de 02/02/2010 que o legislador afirma que “o montante equivalente a três salários mínimos nacionais é o máximo do que entende ser o razoavelmente necessário para o sustento minimamente condigno do indivíduo – para lá desse valor não estará já em causa a dignidade humana.” (negrito nosso) 13. Ora, a decisão “a quo” fundamentou a necessidade de fixar um montante superior ao previsto como limite máximo pelo legislador, devido às despesas alegadas pela Insolvente na Petição Inicial. Desde logo, despesas correntes diversas de Eur.337,58, às quais acrescem Eur.400,00 de empregada de limpeza e ama da filha, Eur.450,00 de mensalidade do colégio particular da filha da insolvente e Eur.450,00 de propinas de frequência de um Programa de Doutoramento pela Insolvente.

  11. Ora, as despesas alegadas pela Insolvente no artigo 36º e 37º da Petição Inicial não podem ser consideradas para efeitos de exclusão do rendimento disponível, sob pena de uma grave distorção jurídica.

  12. Nenhuma destas despesas cabe na letra ou espírito da alínea b), i) do nº 3 do artigo 239º do CIRE, não podendo ser atendidas neste particular.

  13. A frequência de um colégio particular pela filha da Insolvente é uma despesa claramente desajustada e infundada.

  14. Note-se que, em Portugal, o ensino é tendencialmente gratuito, tem qualidade e é frequentado pela grande maioria da população.

  15. Não foi alegada nem provada a necessidade de um ensino especial, inexistente no sistema público, pela filha da Insolvente, pelo que a frequência discricionária de colégios particulares, inacessíveis à grande maioria da população portuguesa, não se enquadra no conceito de “sustento digno”.

  16. A desconsideração da despesa de Eur.450,00 de mensalidade do colégio da filha não põe em causa a dignidade da pessoa humana. Já a sua consideração acarretaria uma situação injusta e desigual.

  17. Sem prescindir, sempre se dirá que, de acordo com o acordo de regulação do poder paternal, o pai da menor suporta metade das despesas escolares da mesma. Por essa razão, nunca se poderia considerar a quantia de Eur.450,00, mas quando muito, apenas metade.

  18. Por outro lado, a consideração, para efeitos de exclusão do rendimento disponível, da despesa mensal de Eur.400,00 com uma empregada de limpeza e uma ama é, também ela...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT