Acórdão nº 550/09.3GBPMS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Maio de 2011
Magistrado Responsável | ORLANDO GON |
Data da Resolução | 18 de Maio de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Relatório Pelo 2º Juízo do Tribunal Judicial de WWW..., sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento, em processo comum colectivo, com Tribunal de Júri, o arguido AB...
, , em cumprimento da medida de coacção, à ordem destes autos, de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica, imputando-se-lhe a prática, em autoria material e concurso real, sob a forma consumada, - de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo artigo 132.º, n.º 2, alíneas c) e e), por referência ao n.º 1 do artigo 131.º e n.º 1 do artigo 132.º, todos do Código Penal e artigo 86.º, n.º 3, do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições, Lei n.º 5/2006, de 23/2, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio; - de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c) e artigo 99º-A, nº 2, do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições aprovado pela Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio; e - de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 145.º, nº 1, alínea a), ex vi dos artigos 143º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea l), todos do Código Penal.
Os assistentes FS... e LS..., deduziram pedido de indemnização civil contra AB..., peticionando a quantia global de € 203.000,00, sendo € 43.000,00 a título de danos patrimoniais, e € 160.000,00 a título de danos morais, dos quais € 75.000 são relativos à perda do direito à vida, € 60.000,00 pelos danos não patrimoniais próprios e € 25.000 pelos danos decorrentes das dores e angústia sofridas pelo filho antes da morte.
Realizada a audiência de julgamento - no decurso da qual foi comunicada uma alteração não substancial, para efeitos do artigo 358º, nºs 1 e 3 do Código de Processo Penal, quer no atinente a factos, quer quanto à alteração da qualificação jurídica, nos termos vertidos em acta -, o Tribunal de Júri, por acórdão de 30 de Novembro de 2010, decidiu: - Absolver o arguido AB... da acusação da prática de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo artigo 132.º, n.º2, alíneas c) e e), por referência ao artigo 131.º e n.º 1 do art. 132.º, todos do Código Penal; - Absolver o arguido AB... da prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 145.º, nº 1, alínea a), ex vi do artigo 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea l), todos do Código Penal; - Considerar verificados os factos integradores de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo artigo 148.º, n.º 1, do Código Penal e declarar extinto o procedimento criminal relativamente a este crime, nos termos do n.º 4 do artigo 148.º e n.º 1 do artigo 115.º, ambos do Código Penal; - Condenar o arguido AB... pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio, p. e p. pelo art. 131.º do Código Penal, agravado pelo cometimento com arma, p. e p. pelo nº 3 do artigo 86.º da lei nº 5/2006, de 23/2, na redacção que lhe foi introduzida pela Lei nº 17/2009, de 6/5, na pena de 12 (doze) anos e 6 (seis) meses de prisão; - Condenar o mesmo arguido pela prática, em autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, alínea c), da Lei nº 5/2006, de 23/2, na redacção que lhe foi introduzida pela Lei nº 17/2009, de 6/5, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão; - Em cúmulo, condenar o arguido AB..., na pena única de 13 (treze) anos de prisão; - Declarar perdida a favor do Estado a arma apreendida nos autos, da marca “Famars”; declarar perdidos os restantes objectos e ordenar a sua destruição; - Manter a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica aplicada ao arguido AB...; - Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pelos demandantes FS... e LS... contra o demandado AB..., e, em consequência, condenar este a pagar àqueles a quantia de € 111.000,00 (cento e onze mil euros), acrescida de juros, à taxa legal, desde a notificação do pedido sobre a quantia de € 1.000,00 e desde a presente data sobre a quantia de 110.000,00€, absolvendo-o do mais peticionado.
Inconformado com o douto acórdão dele interpôs recurso o arguido AB..., concluindo a sua motivação do modo seguinte: B1: É intolerável que os órgãos de polícia criminal presentes no “teatro” dos acontecimentos tenham meramente “alertado” o arguido para observar cuidados no manuseamento da caçadeira de que era portador, quando era dever deles desapossá-lo dessa arma B2: o que só não fizeram por, atendendo às condições de tempo (noite escura) e lugar (ermo) terem eles próprio sentido medo da situação tal como ela objectivamente se apresentava e de eventuais consequências deletérias para a sua saúde. Nesta sequência B3: o arguido, ao inquirir, em conversa a dois, o militar da G.N.R. sobe a identidade do ladrão, mais tarde vítima, por certo já o havia avistado, tanto mais que o assinalado militar, que auxiliava a vítima no percurso até junto das viaturas, paradas no terreno que medeia entre as instalações da XX... e a Estrada Nacional n.º 1, ia munido de uma lanterna. Por outro lado, B4: O tribunal do júri guardou o mais obstinado silêncio sobre as seguintes questões absolutamente cruciais; Desde quando o arguido empunhava a arma à altura da cintura? Qual a posição em que empunhava essa arma quando travou o assinalado diálogo com o militar? Já viria a mesma apontada à região axilo/temporal de um pessoa de estatura normal? B5: uma coisa é certa: qualquer pessoa normal não deixará de questionar-se como foi possível, face ao narrado no acórdão que um disparo provindo da lado direito do referido militar, após um trajecto curto e superficial pelo corpo da vítima, tenha atingido aquele no lado oposto, mais concretamente na zona da axila e do braço esquerdo. Por outro lado, B6: é ininteligível a afirmação segundo a qual o “arguido não contou com a presença próxima do militar DB..., ..., poderia atingir o corpo do mesmo” uma vez que havia falado com ele era portador de uma lanterna B7: sendo porventura ainda mais misterioso que o tribunal tenha dado como não provado que o dito militar transportasse a lanterna com o braço esquerdo estendido.
B8: A referida assunção probatória só é explicável em função da circunstância de, após a alteração não substancial dos fatos constantes da acusação, a que se procedeu, o tribunal colectivo não ter permitido ao arguido produzir a prova que este se propusera B9: Também não se compreende o fato de haver diversos veículos pesados com os respectivos depósitos de combustíveis violados e de os bidons apreendidos todos se apresentarem vazios.
810: A circunstância de ter ficado não provado que o sangue da vítima, para além de vestígios de morfina apresentava os de codeína, como pericialmente demonstrado, coenvolve a violação do art. 163.º-2 do CPP e, por conseguinte, um vício na assunção da prova que deve conduzir à anulação do julgamento B11: Alguns dos “meios de prova” de que o tribunal fez uso - aqueles referidos supra, no ponto A3.1.1. da motivação -, pelo menos porque não tomados em conta na audiência, violaram o disposto no art.355º-1 do CPP e 32º-5, segunda parte, da CRP, o que deve, também, conduzir à anulação do julgamento. Acresce que B11: mesmo as questões conexamente referentes ao futuro julgamento e determinação da sanção, nos incidentes processuais relevantes a este propósito, foram apenas decididas pelo colectivo que votou, a tal propósito, contra a lei, os jurados ao total ostracismo, quando seria mister que os mesmos tivessem co-intervindo na decisão dos mesmos. Com efeito B12: é essa a prática genericamente assumida, entre nós, pelo comum dos tribunais do júri, por ser aquela que encontra respaldo e imposição legal, como demonstrou FARIA COSTA no parecer junto aos autos e cujo inteiro teor foi dado por reproduzido, acima, no momento próprio. Na verdade, B13: o assinalado ilustre professor catedrático da faculdade de direito da universidade de Coimbra, conclui o seu estudo, da seguinte forma: “2 A competência do tribunal de júri encontra-se estabelecida no artº 13.º do Código de Processo Penal, sendo o seu regime estabelecido no Decreto-Lei no 387-A/87, de 29 de Dezembro, que regula a constituição do tribunal, a capacidade para ser jurado, e a selecção dos jurados e o estatuto do jurado.
2.1…. 2.2. Particular interesse revela a norma ínsita no n.º 3 do art. 2.º do DL n.º 387-A/87, segundo o qual o júri intervém na decisão das questões da culpabilidade e da determinação da sanção.
2.3. Daqui resulta que, actualmente, do regime vigente resulta que o júri detém um poder de decisão em matéria de direito, ou seja, a realidade do júri tem uma competência, mais ampla, afirmando-se cada vez mais enquanto realidade una do que enquanto conceito espartilhado. O júri substitui, assim, a (mera) adição de juízes e jurados.
3. Dos artigos 368.º e 369.º do CPP resulta, assim, que o júri, detém um poder decisório em matéria de direito muito amplo, fundamentado na sua intervenção na decisão das questões sobre a culpabilidade e sobre a determinação da sanção.
3.1....
3.2....
4. A decisão sobre a culpa e sobre a sanção determina de facto et de iure, a intervenção em questões materiais que com estas sejam conexas.
4.1. Não podendo fazer-se uma aplicação analógica da norma contida no n.º 2 do artigo 369.º do CPP (determinação da sanção) ao artigo 368.º (questão da culpabilidade), do mesmo código deverá sempre fazer-se uma aplicação analógica do princípio ínsito naquela norma relativo à sanção para as questões da culpabilidade.
4.2. O que implica que as decisões sobre os requerimentos feitos em sede de Audiência de Julgamento relativos à admissibilidade de meios de prova suplementares ou diversos daqueles previamente indicados, constituem uma questão material conexa com a decisão sobre a culpabilidade, justamente porque podem ser fundamentais à formação de uma convicção por parte dos membros do júri indispensáveis, portanto, para a boa decisão da causa.
(…) 7.2. Qualquer uma das três questões - junção de...
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