Acórdão nº 10/10.0PECT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução30 de Março de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO 1.

No processo comum colectivo n.º 10/10.0PECTB do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco, foram julgados os arguidos · TC..., melhor identificado a fls 937 e · MP..., melhor identificada a fls 937, tendo ambos sido condenados, por acórdão datado de 24 de Novembro de 2010, e pela prática, como autores materiais, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1 do DL 15/93 de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-A anexa ao referido diploma, na pena individual de seis anos de prisão.

2. Anteriormente, na sessão de julgamento de 11/11/2010 (cfr. fls 871), foi proferido pelo Colectivo de Castelo Branco um DESPACHO de improcedência da arguição da nulidade do meio de prova constante de fls 112, arguição essa feita pelo arguido TC...a fls 805 a 807.

3. Recorreram os dois arguidos[1] TC...e MP...do despacho referenciado em 2. e do acórdão mencionado em 1.

4. RECURSOS DO DESPACHO DE 11.11.2010 4.1. RECURSO A Recorre o arguido TC...de tal despacho, CONCLUINDO da seguinte forma: «1. O douto despacho recorrido, ao qualificar como revista o meio de obtenção de prova utilizado para extrair do corpo da Arguida as 24,482 g de heroína, violou o artigo 174º do CPP, bem como o artigo 53º do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22/1; 2. Violou ainda, ao não considerar nula a prova obtida mediante intromissão na vagina da Arguida, sem consentimento desta, nem despacho do Juiz de Instrução que o ordenasse, o artigo 53,° do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22/1, conjugado com os artigos 269.°/1 a), 154.°/2 e 126.°/3 do CPP; 3. A interpretação dos artigos 126º/3 e 154º/2 do CPP e artigo 53.° do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22/1, que vá no sentido de permitir utilizar a prova obtida mediante intromissão na vagina da Arguida, sem que esta o consentisse ou o Meritíssimo Juiz de Instrução o ordenasse, é contrária ao disposto no artigo 32.°/8 da Constituição da República Portuguesa; 4. Deve, atento o exposto, declarar-se nula a perícia efectuada à Arguida e que resultou numa alegada apreensão de 24,482 g de heroína».

4.2. RECURSO B Recorre a arguida MP...de tal despacho, CONCLUINDO da seguinte forma: «1. A arguida/recorrente não autorizou a extracção da droga oculta de forma endo-vaginal e que o corpo estranho foi extraído à arguida em cumprimento de ordem dada verbalmente pelo sr. Procurador-Adjunto, que não assistiu à diligência.

2. Se alguém pretender eximir-se ou obstar a qualquer exame (...) pode ser compelido por decisão da autoridade judiciária competente”.

Daí que o arguido possa ter de submeter-se a exame e a perícia — arts. 151º a 171° do C.P.P., desde que ordenada pela autoridade judiciária competente que preside à respectiva fase processual, neste caso, o M°P°.

No caso sub judicio, verifica-se que a decisão da autoridade judiciária foi verbal, sem justificação e explanação dos motivos e não foi efectuada na sua presença. Pelo que, não se pode considerar válida tal decisão do M°P° para compelir a recorrente a efectuar a extracção da droga.

3. O tribunal “a quo” ao considerar válida a prova resultante da extracção da droga do corpo da recorrente, considerando válida a decisão do M°P° de compelir a arguida a exame, na interpretação que faz do art. 172° do C.P.P. viola o disposto nos artigos 26°, n°s 1 e 3, 18°, nºs 1, 2 e 3, 25°, n° 1, 27°, n°s 2 e 3, 32°, n° 8 CRP.

Nestes termos, requer a V.Exas se dignem considerar procedente e provado o presente recurso, e em consequência: declarar nula a prova resultante da extracção da droga oculta no corpo da recorrente de forma endovaginal».

4.3. Respondeu A ESTES DOIS RECURSOS o Ministério Público na 1ª instância, defendendo a justeza do despacho recorrido, CONCLUINDO que: «(…) Na verdade, o que fundamentalmente está em causa nos autos é o recorte da diligência que foi levada a cabo na pessoa da arguida e que é alvo do presente recurso.

Não temos dúvidas em considerá-la uma revista, nos termos das disposições conjugadas dos art.s 53° e 52° do DL 15/93 e ainda dos art.s 174°, n.° 1, 3 e 5 al. a), 1° al. m) e 151° todos do CPP, atentos os doutos fundamentos do despacho recorrido que aqui nos dispensamos de reproduzir.

No caso, a autoridade judiciária competente para autorizar a revista era o Ministério Público, estando os autos em sede de inquérito, pelo que não houve qualquer violação do disposto nos art.°s 126°, 171° e 172° do CPP, nem por qualquer dos fundamentos apresentados dos artigos da Constituição da República mencionados pela recorrente.

Mostra-se devidamente fundamentado o despacho judicial posto sob censura pelo recorrente, não tendo havido violação de qualquer das normas legais referidas pela recorrente.

Pelo que não merece, a nosso ver, o douto despacho recorrido qualquer reparo».

5. RECURSOS DO ACÓRDÃO 5.1. RECURSO C Recorre o arguido TC...de tal acórdão, CONCLUINDO da seguinte forma: «1.

O Recorrente não se conforma com a factualidade dada como provada, como não se conforma com a qualificação jurídica conferida à mesma e com a consequente medida da pena fixada pelo Tribunal a quo; 2. O Recorrente não se conforma que tenha sido considerado provado que: “Pelo menos entre Julho de 2009 e Abril de 2010, ambos inclusive, o arguido FF... adquiriu heroína aos Arguidos TC... e MP…, no valor mensal entre 300,00 e 400,00”.

3. Não se deveria ter considerado provado o ponto 33 da matéria de facto assente, lapso na apreciação da matéria de facto que se requer que seja corrigido nesse Alto Tribunal; 4. Com o devido respeito, que, já se disse, é muito, não se descortina corno é possível subsumir a referida factualidade num tipo legal de crime que o Tribunal a quo denomina de grande tráfico; 5. O Recorrente, como se provou e ora se conclui, levava urna vida de miséria e de exclusão social, pela qual, naturalmente, tem a sua responsabilidade e culpa. Não é, todavia, a que lhe foi imputada pelo Tribunal a quo; 6. Não se concebe como o Tribunal a quo qualifica o Recorrente de grande traficante; 7. Salvo melhor e mais sábia opinião, só violando o artigo 21.°/l do DL n.° 15/93, de 22/1, se logra subsumir a referida factualidade neste crime, violação essa que expressamente se deixa referida; 8. A interpretação do artigo 21.° do DL n.° 15/93, de 22/1, que neste artigo inclua a factualidade provada no presente processo, no que se refere ao Arguido TC..., ora Recorrente, é inconstitucional por violação do artigo 18.°/2 da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que se deixa expressamente arguida, para os devidos e legais efeitos; 9. No presente processo provaram-se 55 transacções, 6,765 gramas transaccionadas, 8 compradores, ano e meio de actividade ilícita, um agente em situação de miséria e de toxicodependência, inexistência de proveitos económicos da actividade ilícita; 10. Deve subsumir-se a factualidade em apreço num crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. no artigo 25.° do DL n.° 15/93, de 22/1, operando-se a diminuição da pena em conformidade; 11. Ainda que, por hipótese, não se convolasse a referida factualidade num crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25.° do DL n.° 15/93, de 22/1, crê-se que deveria ser aplicada ao Recorrente, dentro da moldura penal prevista para o crime de tráfico, p. e p. pelo artigo 21 , uma pena de menor severidade; 12. Com efeito, atendendo à moldura da pena em questão, 4 a 12 anos, bem como as circunstâncias em que decorria o referido tráfico, uma condenação pelo referido artigo teria de se aproximar do limite mínimo da moldura legal, o que não sucedeu; 13. Salvo melhor opinião, apenas assim se aproximaria a culpa da pena, que ora excede aquela, motivos pelos quais violou o Tribunal a quo o artigo 71º/1 do CP».

5.2. RECURSO D Recorre a arguida MP...de tal acórdão, CONCLUINDO da seguinte forma: «1ª - Caso venham V.Exas a considerar o dito despacho recorrido - que validou a prova resultante da extracção da heroína oculta de forma endo-vaginal pela recorrente - nulo e nula a prova resultante da extracção da droga oculta no corpo da recorrente de forma endovaginal, terá a recorrente de ser absolvida por não existir qualquer tipo de droga para traficar.

  1. - A recorrente impugna a matéria de facto dada como provada constantes dos n° 5, 33, 35, 36, 39 e 41 da douta sentença recorrida, os quais deveriam ter sido considerados não provados; e ainda impugna os factos não provados da contestação da recorrente, os quais devem ser considerados parcialmente provados.

    Os factos constantes do n° 5 da matéria provada devem ser considerados não provados, pois nenhuma prova foi produzida acerca dos mesmos em audiência de julgamento, pois ninguém disse onde seria dividida a droga e acondicionada e se as doses tinham todas a mesma quantidade.

    Os factos constantes do n°33 devem ser considerados não provados, já que a fundamentação de tais factos baseia-se no depoimento do co-arguido, FF... cuja passagem infra se transcreve, e que está gravado em CD desde o minuto 14:25 a 15:40, conforme acta de julgamento.

    “Juiz, doravante designado de J.- O Sr. tem ideia de quanto é que estoirou em droga nesse período? Arguido, doravante designado de A.- Tenho.

    J.- Quanto é que estoirou em droga? Fez as contas? A.- Fiz mais ou menos. Deixei de pagar a prestação do meu carro, era praticamente o meu ordenado todo.

    J.- Por mês? A.- Por mês.

    J.- Que iam para o TC...e para a MP…? Era só a eles que adquiria ou adquiria a mais pessoas? A.- Era só a eles.

    J.- Quanto é que é o seu ordenado mensal? A.- Líquido 520€.

    J.- Quando diz que é o meu ordenado todo era mesmo o ordenado todo? A.- Pagava a água, luz...

    J.- Quanto é que estima que por mês ia para o Sr. TC...e para a D. MP…? A- Não faço ideia. Não consigo calcular. Era conforme as despesas. 300, 400... não sei, mais ou menos.

    J.- Então entre 300, 400€ por mês iam para a droga adquirida ao Sr. TC...e MP...? A: Sim”.

    Os arguidos TC...e MP...remeteram-se ao silêncio, pelo que este não os pode prejudicar.

    Sendo razoável e do conhecimento comum que o FF... e os demais...

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