Acórdão nº 740/18.8T9EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução08 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora: 1. RELATÓRIO 1.1. Neste processo comum, com intervenção do Tribunal Coletivo, n.º 740/18.8T9EVR, do Tribunal Judicial da Comarca de Évora – Juízo Central Criminal de Évora – Juiz 1, foi a arguida (...), melhor identificada nos autos, acusada da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa ao mesmo diploma legal.

1.2. Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual, o Tribunal Coletivo procedeu à comunicação à arguida, ao abrigo do disposto no artigo 358º, n.º 1, do CPP, da alteração não substancial dos factos descritos na acusação, nada tendo sido requerido pela arguida.

1.3. Foi proferido acórdão em 11/02/2021, depositado nessa mesma data, com o seguinte dispositivo: «(…) acordam os Juízes que constituem este Tribunal Colectivo em julgar a acusação parcialmente procedente, por provada e em consequência:

  1. Condenar a arguida (...) pela prática, em autoria material, na forma consumada de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à Tabela I-C do mesmo diploma, na pena de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão; B) Manter a arguida (...) sujeita às medidas de coação de termo de identidade e residência até à extinção da pena e ainda de prisão preventiva (artºs 191.º, 192.º, 193.º, 195.º, 196.º, 202.º, nº1, al. a), 204º, als. b) a c), 213.º e 215.º n.ºs 1 e 2, todos do CPP); C) Determinar a recolha de amostra de ADN à arguida (...), por modo a que o seu perfil seja introduzido na base de dados de perfis de ADN – art. 8.º n.º 2, da Lei 5/2008 de 12 de Fevereiro; D) Condenar a arguida (...) nas custas criminais do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC´s.

    E) DECLARAR PERDIDOS A FAVOR DO ESTADO: - a canabis resina com o peso de 288,89 gramas, em formato de 3 (três) placas; - o telemóvel, marca Huawei, com o IMEI 867955040802552; - a canabis resina, com o peso de 1, 612 gramas; - a faca de cozinha, com cabo de madeira, com 11 cm de lâmina e 21,5 cm de comprimento total; - a caixa de metal; - o veículo automóvel de matrícula (...).

    (…)».

    1.4. Inconformada com o decidido, recorreu a arguida para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso, as seguintes conclusões: «1ª - A defesa não concorda com a aplicação ao caso do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, sendo que é do seu entendimento que seria de aplicar o artigo 25.º do mesmo diploma.

    1. - Mesmo perante condenação pelo referido artigo 21.º, a pena de 4 anos e 9 meses é excessiva, dadas as circunstâncias do caso concreto, sendo antes de aplicar o mínimo previsto nesse preceito, ou seja, os 4 anos.

    2. - Condenar-se a arguida a uma pena superior a 4 anos, parece-nos desproporcional atenta a factualidade geral.

    3. - O veículo automóvel de matrícula (...) deve ser restituído à arguida.

    Nestes termos, e nos melhores de Direito, que V. Exa. doutamente suprirão, deve ao presente recurso ser dado provimento e, em consequência: se não se alterar a qualificação jurídica dos factos, aplicando-se ao caso o crime de tráfico de menor gravidade, nos termos do artigo 25.º do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, ser a pena alterada para os 4 anos, o mínimo previsto no artigo 21.º do mesmo diploma; e, em segundo lugar, ser o veículo automóvel de matrícula (...) restituído à arguida.» 1.5. O recurso foi regularmente admitido.

    1.6. O Ministério Público, junto da 1ª Instância, apresentou resposta ao recurso, concluindo no sentido de o recurso não dever merecer provimento e de dever manter-se integralmente o acórdão recorrido, formulando, a final, as seguintes conclusões: «1. A matéria de facto apurada integra, indubitavelmente a previsão legal do artº 21º, do Dec. Lei nº 15/93, de 22/1, pois a arguida (...), ao longo de cerca de dois anos, comprou haxixe a terceiros, que revendeu em Évora a consumidores finais desse produto e vendeu ainda a (…), para que este o revendesse a outros consumidores desse estupefaciente.

    1. No caso verifica-se que a culpa da arguida atinge um grau médio uma vez que agiu com dolo directo e procedeu à venda de haxixe, com vista à obtenção de vantagens económicas 3. Por outro lado, são prementes as exigências de prevenção geral e especial. Com efeito, 4. Para além de outras condenações registadas, a arguida já foi condenada, anteriormente, em penas de prisão suspensas na sua execução, pela prática de outros crimes e também numa pena única de prisão que cumpriu.

    2. Atentos tais elementos, a pena concreta de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão aplicada à arguida no Acórdão recorrido, bem abaixo do quadro médio da moldura penal aplicável, mostra-se ajustada à actividade por esta desenvolvida, à sua culpa e às exigências de prevenção especial e, consequentemente, está conforme aos critérios legalmente fixados no artº 71º, nºs. 1 e 2, do Cód. Penal, para a determinação da medida concreta da pena.

    3. Essas circunstâncias revelam que são fortíssimas as exigências de prevenção especial.

    4. A necessidade de repor a confiança da comunidade nas normas violadas e a impossibilidade de formular um juízo de prognose social favorável ao arguido impedem, assim, que se decida pela suspensão da execução da pena de prisão, pois não é, em concreto, possível formular o juízo exigido no artº 50º, do Cód. Penal.

    5. A arguida (...) utilizava o seu veículo de matrícula (...) para se deslocar à zona de Lisboa onde ia comprar o haxixe que depois vendia em Évora e, no trajecto para Évora, escondia as placas de haxixe que comprara debaixo do forro do banco do condutor, como efectuou no dia 09.10.2019.

    6. O veículo constituiu um verdadeiro instrumento do crime e relativamente a esse automóvel estão preenchidos todos os pressupostos exigidos no nº 1, do artº 35º, do Dec. Lei nº 15/93, de 22.01, pelo que deve ser mantida a declaração de perda desse veículo a favor do Estado.

    Nesta conformidade, negando provimento ao recurso e mantendo a decisão recorrida V. Exªs. afirmarão a JUSTIÇA!» 1.7. Neste Tribunal, o Exmº. Procurador da República emitiu parecer no sentido de o recurso dever ser julgado improcedente.

    1.8. Cumprido o disposto no nº. 2 do artigo 417º do Código de Processo Penal, não foi exercido o direito de resposta.

    1.9. Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

    Cumpre agora apreciar e decidir: 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1.

    Delimitação do objeto do recurso Em matéria de recursos, que ora nos ocupa, importa ter presente as seguintes linhas gerais: O Tribunal da Relação tem poderes de cognição de facto e de direito – cfr. artigo 428º do CPP.

    As conclusões da motivação do recurso balizam ou delimitam o respetivo objeto – cfr. artigos 402º, 403º e 412º, todos do CPP.

    Tal não preclude o conhecimento, também oficioso, dos vícios enumerados nas als. a), b) e c), do nº. 2 do artigo 410º do C.P.P., mas tão somente quando os mesmos resultem do texto da decisão recorrida por si só ou em sua conjugação com as regras da experiência comum (cfr. Ac. do STJ nº. 7/95 – in DR I-Série, de 28/12/1995, ainda hoje atual), bem como das nulidades principais, como tal tipificadas por lei.

    No caso vertente, considerando os fundamentos do recurso interposto pela arguida são as seguintes as questões suscitadas: - Erro de subsunção; - Excessividade da medida da pena.

    - Restituição do veículo automóvel apreendido nos autos.

    2.2.

    Acórdão recorrido Para que possamos apreciar as questões suscitadas no recurso, importa ter presente o teor do acórdão recorrido, nos segmentos relevantes para a decisão e que se transcrevem: «(…) II. FUNDAMENTAÇÃO

  2. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A.1) FACTOS PROVADOS Com interesse para a boa decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos: 1. Desde data concretamente não apurada, mas pelo menos desde Outubro de 2017, que a arguida (...) se dedica de forma permanente à actividade de aquisição e posterior venda e distribuição para venda de canabis resina na localidade de Évora, vivendo dos rendimentos que obtém com essa actividade.

    1. Para tanto, a arguida (...) deslocava-se habitualmente a Lisboa, designadamente a local concretamente não apurado no Bairro Casalinho da Ajuda, onde adquiria ao seu fornecedor, indivíduo que não foi possível identificar, a canabis resina.

    2. A arguida (...) efetuava contacto prévio com o fornecedor, acertando as quantidades e local onde se encontravam para proceder à compra e venda de canabis resina, o que ocorreu, designadamente no dia 30 do Julho de 2019.

    3. No dia 18 de Setembro de 2019, a arguida (...) acordou com o seu fornecedor encontrarem-se em Belém, Lisboa para que aquela procedesse à compra e venda de canabis resina.

    4. No dia 9 de Outubro de 2019, entre as 15 horas e 4 minutos e as 15 horas e 16 minutos, no Casalinho da Ajuda, em Lisboa, a arguida (...) procedeu à compra de canabis resina ao seu fornecedor.

    5. Aquando do referido em 5. a arguida adquiriu ao seu fornecedor três placas de canabis resina pelo preço total global de €480,00.

    6. Cada placa de canabis resina adquirida pela arguida aquando do referido em 5. e 6. tinha o preço inicial de €240,00, tendo o fornecedor feito um desconto de €80,00 por placa.

    7. As três placas de canabis resina adquiridas pela arguida em 09 de Outubro de 2019 tinham o peso total de 280,850 gramas, com um grau de pureza de 14,8 THC correspondentes a pelo menos 831 doses.

    8. Noutras vezes referidas em 2., que não a referida de 5. a 8., pela compra de 50 gr., correspondente a ½ placa, a arguida pagava €100,00 e pela compra de 25gr., correspondente a ¼ de placa, a arguida pagava €25,00.

    9. Após, adquirir a canabis resina, a arguida (...) procedia à divisão, e acondicionamento da canabis resina e posterior venda aos consumidores, estabelecendo o respetivo preço, gerindo os proventos pecuniários...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT