Acórdão nº 152/14.2PTOER.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelFLORBELA SEBASTIÃO E SILVA
Data da Resolução05 de Maio de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I.

No âmbito do processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, que corre termos pelo Juiz 1 do Juízo Local Criminal de Oeiras, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, sob o nº 152/14.2PTOER, em que é arguido CS. , foi proferida sentença em 20-12-2019, com a refª 122972415, constante de fls. 798 e ss, através da qual foi proferida a seguinte decisão: “DISPOSITIVO Nestes termos o tribunal decide julgar procedente por provada a acusação e, em consequência: 1.

Condenar o arguido CS. como autor material de um crime de ofensa à integridade por negligência, p. e p. pelo art.º 148.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), o que perfaz o montante de € 720,00 (setecentos e vinte euros).

2.

Na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 4 meses.

3. Mais se condena o arguido no pagamento das custas do processo, sendo no valor de 2 UC`s a taxa de justiça, reduzida a metade atenta a confissão - artigos 344º, n.º 2, al. c), 513.º e 514.º do C. P. Penal e art.º 8.º, n.º 9, do RCP e tabela III anexa a esse mesmo diploma. Quanto ao pedido Cível: a).

Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado por e condenar a demandada Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A a pagar ao demandante as seguintes quantias: a) € 1.063,48, a título de danos patrimoniais, acrescidos de juros de mora, à taxa legal em vigor, vencidos e vincendos desde a notificação do pedido cível e até efetivo e integral pagamento; b) € 80.000,00, a título de indemnização pelo dano biológico, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde vencidos e vincendos desde a notificação do pedido cível e até efetivo e integral pagamento; d) €40.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a presente decisão e até integral e efetivo pagamento; e) Absolver a demandada do demais peticionado.

  1. Condenar o demandante e a demandada nas custas dos pedidos cíveis, na proporção do decaimento (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 e 607.º, n.º 6 do CPC, ex vi artigo 523.º do CPP).

    Após trânsito, declarar extinta a medida de coação aplicada ao arguido (artigo 214.º, n.º 1, al. e) CPP); Adverte-se o arguido para entregar a sua carta de condução na Secretaria deste Tribunal ou em qualquer posto policial, no prazo de dez dias, após o trânsito em julgado desta sentença, sob pena de, não o fazendo, incorrer num crime de desobediência (cfr. art. 69.º n.º3 do CP e 500.º n.º 2 do CPP.

    Após trânsito, remeta-se o boletim ao registo criminal (D.S.I.C.).

    Comunique à A.N.S.R., ao I.M.T. e à D.G.R.S.P.

    Remeta boletim aos serviços de identificação criminal.

    Lida a sentença, cumpre-se o disposto no art. 372.º, n.º 5, do Cód. de Proc. Penal.” II. Inconformado com a referida decisão no tocante ao pedido cível, veio o Demandante Cível, JPC , interpor recurso, com entrada em 03-02-2020 (refª 16288960), constante de fls. 824 e ss, através do qual oferece as seguintes conclusões: “

  2. Salvo o devido respeito, a sentença proferida pelo Tribunal a quo padece do vício de nulidade por a sua fundamentação se revelar ambígua, deixando dúvidas quanto ao direito aplicável ou raciocínio argumentado, nos termos do art.º 615.º nº1 al. c) do CPC.

  3. Caso assim não se entenda, sempre haverá um erro de julgamento, nomeadamente no que respeita ao quantum indemnizatório atribuído.

  4. O Tribunal a quo condenou a Recorrida no pagamento de €80.000,00(oitenta mil euros), a título de danos biológicos, recorrendo a juízos de equidade para o seu apuramento.

  5. Ora, se o Recorrente de facto efetuava de facto um esforço complementar no exercício das suas funções, sendo a atividade física um elemento fundamental no exercício das suas funções, então sempre caberia executar o seguinte raciocínio.

  6. O Recorrente auferia 1.094,74€ (mil e noventa e quatro euros e setenta e quatro cêntimos) mensais líquidos, o que se traduz em 15.326,36€ (quinze mil trezentos e vinte e seis euros e trinta e seis cêntimos) anuais líquidos (1.094,74€x14).

  7. Ora, 22% (correspondente ao IPP apurado e provado) do rendimento anual do Recorrente corresponde a 3.371,80€ (três mil trezentos e setenta e um euros e oitenta cêntimos).

  8. Atendendo que à data dos factos o Recorrente teria 25 anos, e por referência a expectante media de vida laboral de 70 (setenta) anos, então o Recorrente trabalharia por mais 45(quarenta e cinco) anos.

  9. Assim, teremos 3.371,80x45=151730,96€ (cento e cinquenta e um mil setecentos e trinta euros e noventa seis cêntimos). Se procedermos à dedução de ¼, então chegaríamos ao valor de 113798,22€ (cento e treze mil setecentos e noventa e oito euros e vinte e dois cêntimos).

  10. Tal valor corresponderia assim ao dano biológico decorrente da IPP, o qual visa indemnizar o Recorrente relativamente ao esforço complementar que este terá de executar em todas as atividades da sua vida.

  11. Na sentença proferida pelo Tribunal a quo refere-se: «Tudo ponderado, nomeadamente, que o demandante tinha 25 anos à data dos factos, a atividade que exercia e atualmente exerce, o seu vencimento, montante que recebeu do exercício…» k) Nos factos provados 73 da sentença proferida pelo Tribunal a quo refere-se que: «De 5 de Setembro de 2014 até 3 de Maio de 2016 o demandante recebeu do Exercito a quantia de €30.995,60, a titulo de remunerações.» l) Ora, salvo melhor opinião, parece-nos que o Tribunal a quo deduziu ao quantum atribuído a titulo de indemnização por danos biológicos o montante recebido pelo Recorrente a titulo de remunerações.

  12. Não podemos concordar ou colher tal entendimento.

  13. A indemnização atribuída a título de danos biológicos tal como já referido, tem como pressuposto a compensação da perda de capacidades funcionais, mesmo que estas não tenham reflexo nos rendimentos salariais.

  14. Esta não se prende em compensar salários perdidos, reduzidos ou existentes, mas sim o esforço acrescido que o Recorrente terá de suportar para exercer as suas funções laborais, por força da incapacidade permanente de que adquiriu.

  15. Assim, não se compreende como poderá o Tribunal a quo deduzir remunerações recebidas por força das funções laborais.

  16. Ainda que por mera hipótese tal fosse possível, sempre caberia deduzir o 22% dos valores recebidos, e nunca a sua totalidade.

  17. Assim e face ao explanado, deve a presente sentença proferida pelo Tribunal a quo ser reformulado, condenando a Recorrida no pagamento de uma indemnização por dano biológico no valor de 120 mil euros.

  18. Mais, vem o Tribunal a quo indemnizar o dano sexual, incluindo no montante indemnizável por dano biológico.

  19. Porém, uma vez que que engloba todo o dano biológico num único quantum indemnizatório, recorrendo a um juízo de equidade, não é possível ao Recorrente aferir qual o quantum atribuído nesta sede.

  20. Do relatório realizado pelo IML, datado de 30/11/2018, na sua página 10 é possível verificar que o Recorrente, com 25 anos, tem dificuldades em manter a ereção, bem como apresenta uma diminuição do volume do testículo direito, bem como apresenta duas cicatrizes lineares.

  21. Tal apresenta um impacto tremendo na vida de um individuo que não pode ser descurado.

  22. Mais, apesar de no relatório do IML se referir que o dano de procriação não foi quantificado para efeitos de quantificação do dano sexual, verdade é que pela analise do relatório do serviço de patologia elaborado pelo Hospital Militar, junto pelo requerente em 19/11/2018 no requerimento com ref.ª 13548157, é possível verificar que o Requerente apresenta uma diminuição da contagem de espermatozoides, que poderá ter implicações na sua capacidade de procriação e vida familiar.

  23. Tais danos terão não só repercussão física, como psicológica, uma vez que trarão elevado sofrimento e angustia ao Recorrente ao longo da sua vida.

  24. Será de concluir que tais danos deverão ser indemnizáveis autonomamente por quantum não inferior a 25 000,00€ (vinte cinco mil euros).

  25. Veja-se ainda o decidido no Acórdão do STJ, datado de 19/06/2019: «Olhando para os valores atribuídos em casos análogos ou próximos que foram decididos, retira-se uma orientação no sentido de elevar o valor atribuído pelo Tribunal recorrido. Olhando, por exemplo, para o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.05.2014 e mantendo presente que é preciso atualizar constantemente os valores indicativos da jurisprudência, é de concordar com /secundar o Tribunal de 1.ª instância, que fixou o valor desta indemnização em 15.000,00.

    a

  26. Em conclusão, ponderados todos os factos provados (o facto do qual resulta que o grau do dano estético permanente do autor é de 4 bem como os demais factos provados relacionados) e considerado o dano estético no contexto dos danos não patrimoniais, julga-se adequado fixar o valor desta indemnização em 15.000,00.» bb) Atenta à extensão e às inúmeras cicatrizes do Recorrente, bem como a amputação do dedo esquerdo do pé, então caberia atribuir, a título de indemnização por dano estético, ao Recorrente uma indemnização nunca inferior a 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros).

    cc) Assim, face ao princípio da igualdade nos termos do art.º 13 do CRP, e a presente jurisprudência, o valor justo a atribuir nos presentes autos atendendo aos casos supra referidos seria justo nos presente autos seria de 60.000,00 (sessenta mil euros), uma vez que o Recorrente tem um quantum doloris de grau 7/7 e uma repercussão permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer fixável em 3/7.

    Termos em que deverá o presente recurso proceder, e em consequência ser a Sentença proferida pelo Tribunal a quo recorrida revogada e sendo atribuída uma indemnização ao Recorrente nunca inferior a 250.000,00€ (duzentos e cinquenta mil euros).” III. O recurso foi admitido por despacho de 10-02-2020, com a refª 123745127, junto a fls. 836, que lhe fixou efeito suspensivo.

    1. ...

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