Acórdão nº 667/19.6T8STS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso de Apelação ECLI:PT:TRP:2021:667.19.6T8STS.P1* Sumário:..................................

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Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório:B…, contribuinte fiscal n.º ………, residente em …, Trofa, instaurou acção judicial contra C…, contribuinte fiscal n.º ………, com domicílio profissional no Porto, pedindo a condenação do réu a pagar à autora a metade que ela pagou a mais de dívidas que eram da responsabilidade de ambos e ainda a pagar-lhe a metade das quantias mensais pagas para amortização dos empréstimos hipotecários e inerentes seguros e impostos correspondentes que se vencerem posteriormente e que a autora venha a pagar e ainda nos juros sobre as quantias em divida a partir da citação.

Alegou para o efeito que foi casada com o réu, tendo o respectivo casamento sido dissolvido por divórcio, que na pendência do casamento contraíram empréstimos bancários para construção da casa de morada de família e para aquisição de um veículo automóvel, tornando-se devedores do reembolso desses empréstimos, que para reembolso dos empréstimos, seguros associados e IMI da cada de morada de família a autora efectuou pagamentos no montante global de 46.739,82€ os quais eram da responsabilidade de ambos, que no inventário instaurado para partilha dos bens comuns os interessados foram remetidos para os meios comuns.

O réu contestou, por impugnação e por excepção, defendendo a improcedência da acção.

Em reconvenção pediu a condenação da autora a pagar-lhe o montante de 23.100€ referente a metade do valor da ocupação do imóvel pertencente a ambos, pelo período de 66 meses, bem como metade da quantia de 700€, até à adjudicação do imóvel no processo de inventário.

Alegou para o efeito que na sequência da separação do casal a autora ficou a ocupar o imóvel comum, enquanto ele teve de arranjar uma nova habitação e suportar o respectivo custo, e que no mercado de arrendamento esse imóvel proporcionaria uma renda mensal na ordem dos 700€.

Findos os articulados foi realizada audiência prévia e após foi proferida sentença, julgando a acção provada e procedente e a reconvenção não provada e improcedente.

Do assim decidido, o reconvinte interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença que julgou improcedente, por não provado, o pedido reconvencional, e em consequência, absolveu a autora do mesmo.

  1. Como se tentará demonstrar fez aquela sentença má interpretação dos factos e provas constantes dos autos, fazendo consequentemente má aplicação do direito, pelo que deve ser revogada.

  2. Considerou o tribunal a quo que não assiste à ré o direito a peticionar uma compensação como contrapartida pela utilização exclusiva da casa morada de família por parte da autora uma vez que “resulta dos autos, por acordo homologado por sentença judicial já transitada em julgado, autora e réu definiram que o direito à habitação daquela que foi a casa morada de família fica atribuído ao cônjuge mulher até à partilha. Ora, em tal acordo não foi contemplado qualquer compensação ao réu/reconvinte pelo direito de habitação daquela que foi a casa morada de família à autora até à partilha, pelo que, entendemos que agora não pode vir, tão singelamente, reclamar tal compensação pela referida ocupação em contrário do acordo que deu.” 4. No caso concreto, tendo as partes em processo de inventário sido remetidas para os meios comuns, é este, salvo devido respeito por melhor opinião, o momento concreto para que a parte que ficou privada do uso do bem comum, possa reclamar o pagamento de uma compensação pela ocupação, da outra parte, de tal bem.

  3. Porém, presumir-se que tal ocupação/cedência foi efectuada a título gratuito, sem que se ouça as partes, sobre qual a sua interpretação do acordo outorgado, não faz qualquer sentido.

  4. Tal presunção assumida pelo douto tribunal “a quo” carece assim de fundamentação jurídica, que a sustente.

  5. Entende assim como não correto, o réu, a fundamentação da inexistência de um direito no simples facto de tal direito não ter sido comtemplado num acordo homologado num processo de jurisdição voluntária 8. Até e porque: a compropriedade e a comunhão de bens têm regime diverso.

  6. Não é assim correto, e diga-se, nem justo, proporcional, nem equitativo sequer, que um herdeiro (neste caso um cônjuge meeiro) possa fazer uso exclusivo do prédio comum, impedindo o outro (herdeiro) de entrar, usar, gozar e fruir do mesmo, durante sete anos consecutivos.

  7. Assim, como não é válido: considerar que um herdeiro meeiro tenha de suportar metade dos custos e encargos de um prédio (empréstimos bancários, impostos, etc.), que está impedido de usar, gozar e fruir, por oposição concreta do outro herdeiro meeiro; não considerando que esse herdeiro meeiro tenha direito de ser compensado, por essa limitação do seu direito de propriedade, em favor de outrem.

  8. A verdade é que o réu foi impedido de entrar num prédio seu pela autora desde a data em que foi decretado o divórcio até aos dias de hoje.

  9. Aliás a considerar-se como válida, correta e justa a afirmação que “em tal acordo não foi contemplado qualquer compensação ao réu/reconvinte pelo direito de habitação daquela que foi a casa morada de família à autora até à partilha, pelo que, entendemos que agora não pode vir, tão singelamente, reclamar tal compensação pela referida ocupação em contrário do acordo que deu“ dever-se-á também considerar como válida, correta e justa a afirmação que em tal acordo não foi contemplado quaisquer pagamentos referentes ao crédito hipotecário existente sobre o imóvel propriedade de autora e réu, pelo que tais montantes devem ser suportados por quem beneficia exclusivamente do imóvel e a quem foi atribuído o direito à habitação até à partilha.

  10. Ora ambas as afirmações, na humilde opinião do recorrente, não fazem sentido, até e porque a atribuição da casa morada de família à aqui autora esteve e está condicionada à realização da partilha, ou por outras palavras, ao fim da comunhão do bem.

  11. O processo “de partilhas” – inventário em consequência de separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação de casamento – compreende em si uma panóplia de situações jurídicas a ser analisadas e decididas.

  12. Sendo uma delas: d) a relação dos créditos e das dívidas da herança, acompanhada das provas que possam ser juntas.

  13. Tentou o recorrente demonstrar neste autos, que foi obrigado a sair de casa após a separação do casal, que em face de tal teve de arrendar casa e custear todos os gastos inerentes a tal, ao longo de sete anos (que na realidade serão mais uma vez que a partilha ainda não está realizada); afirmando ainda que foi impedido de entrar, usar, gozar e fruir, de um prédio seu, por oposição directa da aqui autora.

  14. E que, por outro lado, a autora não teve esses custos, tendo ficado a habitar a casa pertença de ambos, sem qualquer custo acrescido.

  15. Condenou o tribunal “a quo” o recorrente no reembolso à “autora em metade das dividas da responsabilidade de ambos e por esta paga, que à data da instauração da presente acção computavam o valor de €23.369,92 (vinte e três mil, trezentos e sessenta e nove euros e noventa e dois cêntimos), acrescido dos respectivos juros, à até efectivo pagamento e ainda no pagamento do valor correspondente a metade das quantias mensais que a autora tenha pago desde tal data ou que venha a pagar até à partilha referente às amortizações do créditos hipotecários, inerentes seguros e impostos que incidam sobre bens comuns.” 19. Ora, não é equitativo, nem sequer proporcional, condenar o réu ao pagamento desses supra mencionados créditos relativos ao bem comum, quando ao mesmo foi negado os seus direitos enquanto proprietário desse mesmo bem comum.

  16. Assim como também não é legítimo desconsiderar que o réu passou a ter de suportar um novo encargo, após a separação, traduzido no pagamento de uma prestação mensal para pagamento de uma renda, que resultou num empobrecimento do seu património próprio 21. É notório que a aqui autora, ao manter-se na habitação pertença do património comum do ex-casal, enriqueceu o seu património próprio à custa desse património comum.

  17. O tribunal a quo ao fundamentar a sua decisão nos termos em que o fez e consequentemente absolver a autora do peticionado na reconvenção pelo réu violou de forma concreta os artigos 1689.º, 1730.º e 1790.º do Cód. Civil, e 615 n.º 1 al. b) e c) do Código Processo Civil, pelo que 23. A douta sentença, incorre num erro de análise do direito e consequentemente dos factos.

  18. Assim, violou a douta sentença todos os normativos legais supra mencionados, quando considerou inexistir direito de compensação do réu sobre a autora como forma de obviar a um inadmissível enriquecimento do cônjuge a quem o imóvel foi provisoriamente atribuído à custa do outro interessado.

  19. A douta sentença recorrida deveria, pois, sempre salvo o devido respeito por melhor opinião, ter reconhecido a existência desse direito de compensação, julgando procedente a reconvenção do réu.

    A recorrida respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.

    Após os vistos legais, cumpre decidir.

    1. Questões a decidir:As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida as seguintes questões: a) Se a sentença recorrida é nula; b) Se o cônjuge que após a separação do casal deixou de habitar a casa de morada de família, bem comum do casal, pode reclamar do cônjuge que passou a utilizar em exclusivo esse bem comum uma compensação por essa utilização exclusiva e, na afirmativa, se essa compensação deve equivaler a metade do valor locativo do imóvel.

    2. Os factos:Na decisão recorrida foram julgados provados os seguintes factos: 1. Autora e réu contraíram casamento sem convenção antenupcial em 3 de Dezembro de 1999.

  20. Em 11.07.2013 a autora...

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