Acórdão nº 141/18.8PATNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução27 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Central Criminal, J4 - correu termos o processo comum colectivo supra numerado no qual são arguidos: (…), melhor identificado nos autos, a quem foi imputada a prática de um crime de tráfico de produto estupefacientes agravado, p. e p. pelos artigos 21.º/1, 24.º, al. h) do DL n.º 15/93, de 22-01, com referência à Tabela I-C, à Portaria n.º 94/96, de 26-03 e ao artigo 2.º/2 do DL n.º 30/2000, de 29-11, punível como reincidente, nos termos do disposto no artigo 75.º do Código Penal; (…), melhor identificado nos autos, a quem foi imputada a prática de um crime de tráfico de produto estupefacientes agravado, p. e p. pelos artigos 21.º/1, 24.º, al. h) do DL n.º 15/93, de 22-01, com referência à Tabela I-C, à Portaria n.º 94/96, de 26-03 e ao artigo 2.º/2 do DL n.º 30/2000, de 29-11.

* O tribunal recorrido veio, por sentença de 15 de Julho de 2020, a: 1.

Absolver os arguidos (…), melhor identificados nos autos, da prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos artigos 21.º/1, 24.º, al. h) do DL n.º 15/93, de 22-01, com referência à Tabela I-C, à Portaria n.º 94/96, de 26-03 e ao artigo 2.º/2 do DL n.º 30/2000, de 29-11; 2.

Convolar o referido crime num crime de consumo de produto estupefaciente, p. e p. pelo artigo 40.º/2 do DL n.º 15/93, de 22-01, com referência à Tabela I-C anexa e ao mapa a que se refere o artigo 9.º da Portaria n.º 94/96, de 26-03.

  1. Condenar o arguido (…)pela prática de um crime de consumo de produto estupefacientes, p. e p. pelo artigo 40.º/2 do DL n.º 15/93, de 22-01, por referência à Tabela I-C anexa e ao mapa a que se refere o artigo 9.º da Portaria n.º 94/96, de 26-03, punível como reincidente, nos termos do artigo 75.º do Código Penal, na pena de prisão de 6 (seis) meses.

  2. Condenar o arguido (…)pela prática de um crime de consumo de produto estupefacientes, p. e p. pelo artigo 40.º/2 do DL n.º 15/93, de 22-01, por referência à Tabela I-C anexa e ao mapa a que se refere o artigo 9.º da Portaria n.º 94/96, de 26-03, na pena de prisão de 7 (sete) meses.

  3. Declarar perdido a favor do Estado o produto estupefaciente apreendido - artigo 109.º/1 do CP e artigos 35.º/1 e 2 e 39.º/2, do DL n.º 15/93, de 22-01.

  4. Determinar que os arguidos aguardem os ulteriores termos do processo sujeitos ao TIR prestado até extinção da pena respectivamente aplicada – artigo 214.º/1, e) do CPP.

  5. Condenar os arguidos nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça devida por cada um deles em 3 (três) UCs – artigo 513.º/1 do CPP.

    * Inconformado interpôs recurso o arguido (...), concluindo: .(...), melhor identificado nos autos e neles Arguido, não concordando com o teor do Acórdão proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca de Santarém no âmbito dos presentes autos no passado dia 15 de julho de 2020, com a ref. 834645562, vem dele interpor recurso, em a MATÉRIA DE FACTO e de DIREITO.2.PONTOS DE FACTO QUE A RECORRENTE CONSIDERA INCORRECTAMENTE JULGADOS (art. 412º., nº. 3, al. a), do CPP): Ponto 7 e 9 dos factos provados. 3.PROVAS QUE IMPÕEM DECISÃO DIVERSA DA RECORRIDA (art. 412º., nº. 3, al. b), do CPP): A) As declarações do recorrente em sede de julgamento quanto aos seus consumos, à sua problemática de toxicodependência e quanto ao período para o qual as 14 doses de haxixe que lhe foram apreendidas dariam para seu consumo próprio diário. Declarações que não foram infirmadas por nenhum outro elemento de prova, tendo sido corroboradas pelo conjunto dos depoimentos das testemunhas (...), (...) e (...) e, ainda, pela informação prestada pelo CRI de Bragança e pelo relatório social do arguido B) Prova testemunhal: as declarações das testemunhas de defesa: (...), (...) e (...), conjugada com a prova documental: informação prestada pelo CRI de Bragança, relatório social do arguido e que foram atendidas pelo Tribunal recorrido para dar como provado a matéria provada nos pontos 14, 30 e 32, considerando o Tribunal recorrido que o depoimento destas testemunhas “foram isentas e com conhecimento directo, atestaram os problemas aditivos do arguido, os tratamentos por ele realizados com vista a debelar essa dependência, designadamente, do consumo de heroína.” 4.DECISÃO DIVERSA DA RECORRIDA: O recorrente insurge-se contra a sua condenação pela prática do crime p. e p. pelo artigo 40º, nº 2, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01, defendendo que a sua conduta integra conduta não criminalizada, apenas susceptível de se configurar como contra-ordenação.

  6. Dos factos objetivamente dados como provados pelo Tribunal recorrido não podia o tribunal concluir que o arguido soubesse que a quantidade de haxixe que lhe foi apreendida excedia a quantidade necessária para o consumo médio individual durante 10 dias.

  7. Dos factos objetivamente dados como provados pelo Tribunal recorrido não podia o tribunal concluir e que o arguido sabia que tal detenção era proibida e punida por lei.

  8. Isto porque o limite quantitativo máximo diário para a substância em análise – canabis-resina - é de 0,5 gramas para consumo durante 10 dias, o que dá um total de 5 gramas e o recorrente apenas detinha a quantidade de 4,705 gramas e não tinha como saber a percentagem de princípio ativo (tetrahidrocanabinol ou A9THC) na droga que detinha.

  9. os valores mencionados no mapa da portaria 94/96 são valores de princípio ativo contido nas plantas, substâncias ou preparações, que o recorrente – como mero consumidor -não tinha como saber, sem a tal análise pericial.

  10. Assim, o tribunal ignorou e não podia ignorar - agora tendo em conta as tais regras da experiência e do normal acontecer - a situação de convicção legitima em que sempre fica aquele que, para seu consumo, adquire ou detém as substâncias proibidas em quantidades inferiores em gramas às permitidas pela tabela (no caso inferior a 5 gramas), pois não podendo conhecer o teor de princípio ativo, o mesmo estará sempre convicto de que estará a incorrer em contraordenação e nunca em um crime de consumo – como é o caso concreto do recorrente.

  11. Não podia o recorrente no momento em que deteve o haxixe, na quantidade inferior às 5 gramas (4,705 gramas) e que lhe foi imediatamente apreendido saber que a detenção daquela quantidade era proibida e punida pela lei penal, por ultrapassar as 10 doses diárias previstas na tabela após exame pericial, porque desconhecia e não tinha como saber, a percentagem de princípio ativo e, portanto, o número de doses que efetivamente estava a deter tendo em conta tal percentagem de THC.

  12. Sabia é que detinha 4,705 gramas de haxixe resina e que tal detenção era inferior ao estabelecido na tabela (5 gramas) desconhecendo, por completo, a concentração de THC existente no produto que detinha e, portanto, o recorrente não sabia nem tinha como saber que a quantidade que detinha excedia a quantidade necessária para o consumo medio individual durante o período de 10 dias, nem tão pouco sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  13. E, portanto, o Tribunal teria que dar, forçosamente, como não provado os factos dados como provados no ponto 7 e 9 dos factos provados, 13. Por outro lado, o Tribunal não dá como provado um dos elementos essenciais para que o Recorrente pudesse ser condenado pelo crime de consumo p. e p. pelo art. 40º, nº 2 do DL 15/93 de 22 de janeiro, na medida em que não dá como provado que a quantidade que o recorrente detinha excedia a quantidade necessária para o seu consumo individual durante o período de 10 dias.

  14. as doses médias diárias para consumo individual de cada consumidor não são iguais para todos os consumidores, tanto assim é que o entendimento generalizado da doutrina e da jurisprudência é de que se devem conjugar os valores da portaria "com os hábitos de consumo do concreto agente” 15. Como resulta dos factos objectivos dados como provados, o recorrente é consumidor de produtos estupefacientes desde dos 16 anos, hoje com 40 anos, tendo sido sujeito a vários tratamentos à sua problemática aditiva (como lhe chama o próprio tribunal recorrido), contudo sem sucesso, voltando a recair - O que é corroborado com as declarações do arguido em sede de julgamento que referiu expressamente que o haxixe que lhe foi apreendido daria para dois dias apenas tendo em conta os seus hábitos de consumo de há longos anos.

  15. Não tendo sido produzida qualquer prova de que contrariasse as declarações do arguido, sendo estas corroboradas por toda a prova documental existente aos autos quanto à sua problemática aditivada, tendo sido dado como provado no ponto 14 que o arguido iniciou os seus consumos de droga aos 16 anos evoluindo no sentido de uma cada vez maior dependência química e tendo-lhe sido apreendido apenas dois pedaços de haxixe com o peso total inferior a 5 gramas (4,705 gramas) que dariam, segundo a tabela, e só após exame pericial apenas para mais 4 doses do que as permitidas, tinha o Tribunal de concluir, forçosamente, que essas 14 doses destinavam-se a ser consumidas pelo arguido durante um período inferior a 10 dias.

  16. Estamos a falar de um consumidor de drogas com 24 anos de consumos até de drogas duras como heroína, estamos a falar em concreto de haxixe e de apenas de 4,705 gramas que após exame pericial apenas dariam para 4 doses a mais das previstas na tabela como limite para o consumo médio diário para 10 dias após exame.

  17. Porém, o Tribunal para além de ter matéria que lhe permitisse dar como provado que a quantidade de haxixe apreendida ao recorrente se destinava ao seu consumo exclusivo para um período inferior a 10 dias tendo em conta os seus hábitos de consumo e a sua problemática aditiva de longos anos, a verdade é que não se pronunciou quanto a tal matéria; não se tendo pronunciado, também, quanto ao consumo médio individual do recorrente.

  18. Em conclusão: O Tribunal não deu como provado o consumo médio individual do arguido nem deu como provado que os dois pedaços de...

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