Acórdão nº 366/11.7TAPTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução12 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães.

(Secção Penal) I. RELATÓRIO No processo comum singular n.º 366/11.7TAPTL, do Juízo de Competência Genérica de Ponte de Lima, Juiz 1, da comarca de Viana do Castelo, foram submetidos a julgamento os arguidos J. S. e M. C.

, com os demais sinais dos autos.

A sentença, proferida a 23 de outubro de 2020 e depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo: «a)- Absolver os arguidos J. S. e M. C. da prática do crime de insolvência dolosa previsto e punido pelas condutas típicas descritas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 227.º do CP.

b)- Condenar o arguido J. S. como autor material, na forma consumada, de um crime de insolvência dolosa, previsto e punido pela alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão, cuja execução se suspende, pelo período de 2 (dois) anos (artigo 50.º, n.ºs 1 e 5 do Código Penal), subordinada à condição de o arguido, no prazo da suspensão, pagar a indemnização devida à demandante X, Lda., que se fixa no mesmo montante da condenação no pedido de indemnização civil por ela deduzido, e que nele se imputa, consumindo-o, sem prejuízo de aquele poder executar a sentença, logo que a mesma seja exequível por ter transitado em julgado.

c)- Condenar a arguida M. C. como autora material, na forma consumada, de um crime de insolvência dolosa, previsto e punido pela alínea a) do n.º1 do artigo 227.º do CP, na pena de 290 dias (duzentos e noventa) de multa à taxa diária de 6,50 € (seis euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a quantia de 1.885 € (mil oitocentos e oitenta e cinco euros).

d)- Julgar improcedente o pedido de indemnização civil formulado pela demandante X, Lda. contra os demandados M. C. e M. D., absolvendo-os do pedido.

e)- Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pela mesma demandante contra o demandado J. S. e, consequentemente, condená-lo no pagamento àquela da quantia total de 17.500 € (dezassete mil e quinhentos euros), correspondente aos valores inscritos nos cheques referidos em 57 dos factos provados, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados sobre cada uma das quantias tituladas nos referidos cheques e desde a data de vencimento respetiva, até efetivo e integral pagamento; absolvendo-o do demais peticionado.

  1. - Condenar os arguidos nas custas criminais, fixando-se a taxa de justiça individual em 3 (três) unidades de conta (UC) – artigos 513.º, n.º 1 do Código de Processo Penal e artigo 8.º, n.º 9 e tabela III anexa do Regulamento das Custas Processuais.

  2. - Condenar a demandante cível e o demandado J. S. nas custas do pedido cível, na proporção do decaimento respetivo.

    Notifique.

    Após trânsito, remeta boletins ao registo criminal.

    Vai proceder-se ao depósito da presente sentença na secretaria do Tribunal, conforme disposto no artigo 372.º n.º 5 do Código de Processo Penal.»*Inconformados, interpuseram recursos os arguidos J. S. e M. C.

    , apresentando cada um deles as respetivas motivações que rematam com as conclusões que de seguida se transcrevem.

    *A.

    Conclusões do recurso do arguido J. S.

    : «1. O arguido não pode conformar-se a decisão proferida nos presentes autos, pois entende que perante a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, outra deveria ter sido a decisão, nomeadamente a sua absolvição.

    1. Apesar da segunda repetição do julgamento, o arguido Recorrente continua a não aceitar os factos dados como provados na sentença recorrida e devidamente elencados sob os pontos 22, 24, 25, 26, 27 e 28 por entender que não foi produzida e examinada em sede de audiência de julgamento, prova suficiente para dar como provada esta factualidade e porque os mesmos se encontram em contradição com os pontos iii), iv) e xi) a xiv) dos factos não provados.

    2. Consideramos, sem olvidar o princípio da livre apreciação da prova e da livre convicção do juiz para julgar e decidir, que os supra referidos factos se encontram considerados provados e não provados, de forma contraditória entre si, devendo todos ser considerados não provados, para efeitos da alínea a) do n.º 3 do art. 412.º do CPP.

    3. Desde logo, os pontos 23, 24 e 25, dos factos provados, encontram-se em contradição com os pontos xi, xii, e xiv dos factos não provados: 5. O Tribunal a quo considerou provado que pelo facto da Tecto ... não ter pago aos arguidos, o preço, nos termos declarados na escritura (ponto 23 e 24), contribuiu para a descapitalização dos arguidos e subsequentemente para a declaração de insolvência dos arguidos (ponto 25).

    4. Não obstante, deu como não provado que como consequência directa e necessária da transmissão da propriedade dos bens imoveis para a Tecto ..., os arguidos entraram em situação de insolvência (ponto xi)), bem como que, durante o ano de 2008, a transferência do sobredito património terá resultado no falimento dos arguidos, culminando na sua respectiva insolvência (ponto xii), e ainda que as acções descritas levadas a cabo pelos arguidos, concretizadas na dissipação dos respectivos patrimónios foram causa directa e necessária da posterior decisão judicial de declaração de insolvência de cada um dos arguidos (ponto xiv).

    5. Ora, não se considerando provado que a situação de insolvência se ficou a dever à transmissão destes bens, 8. Cremos que o Tribunal a quo não poderia, nunca, ter dado como provado que, o facto do pagamento da aquisição não ter sido efectuado nos termos declarados na escritura, tivesse contribuído para a descapitalização dos arguidos e a subsequente declaração de insolvência, muito menos que tal pagamento foi efectuado de forma fictícia.

    6. Relativamente ao ponto 24 dos factos provados (pagamento fictício), cremos que não foi produzida prova bastante e cabal quanto ao ficcionado pagamento, verificando-se inclusive salvo devido respeito por melhor opinião a violação do princípio in dubio pro reo.

    7. Pois o Tribunal a quo fundamentou a sua decisão no depoimento da Senhora Inspetora da Polícia Judiciária, que relativamente a este assunto, não analisou qualquer documentação, sabendo apenas o que ouviu da Contabilista A. R., ainda na fase da investigação e daí terá extraído a conclusão de que o pagamento não existiu, conforme decorre das suas próprias declarações - Dia 18-09-2020 - 10:11:42, Inquirida pela Mandatária do Arguido aos 17m03s a 17m:44s.

    8. Porém, a testemunha A. R. ouvida, de novo, acerca deste particular, no Dia 18-09-2020 - 11:05:05 a instâncias da mandatária do Arguido 09m:02s até 10m:44s, refere que os pagamentos efectivamente existiram - fosse através de rendas pelo arrendamento de imóveis, fosse por vendas de móveis e até um empréstimo do sócio M. D.. Apenas não ocorreram da forma declarada na escritura… 12. Pelo que, face ao que foi carreado para os autos, quanto a este ponto, ainda que se julgue não provada a forma como foi efectuado o pagamento, parece-nos que isso não pode resultar na prova do não pagamento, outrossim na aplicação do princípio in dúbio pro reu e o facto ser julgado como não provado, seria essa a decisão lógica e razoável.

    9. Por outro lado, os pontos 22, 26, 27 e 28, dos factos provados, encontram-se em contradição com os pontos iii) e iv) dos factos não provados, 14. O Tribunal a quo considerou provado que: - os arguidos registaram os bens imóveis em nome de entidade terceira, com vista a salvaguarda-los de eventuais penhoras (ponto 22), - com o intuito alcançado de fazer desaparecer os imoveis, obstando que os credores conseguissem a cobrança coerciva dos seus créditos à custa daqueles bens (ponto 27), - com o propósito conseguido de privar a sociedade X – Automóveis unipessoal, lda, de créditos que sobre o arguido detinha e com isso conseguir o que efectivamente sucedeu, ocultar os referidos imóveis à credora, prejudicando-a, como pretendiam e conseguiram (ponto 26), -e tudo isto, de forma livre, voluntária e consciente, apesar de saberem tratar-se de uma conduta ilícita (ponto 28); 15. Mas considerou não provado, que os cheques referidos em 11 consubstanciavam quantias em dinheiro que os arguidos devem à sociedade “X, Automóveis unipessoal, lda”, bem como que as referidas transacções foram efectuadas no exercício do comércio e no interesse comum dos arguidos (pontos iii) e iv) dos factos não provados), 16. Cremos que, uma vez que os cheques emitidos pelo arguido à X não representavam dívida pessoal, nunca se poderá concluir que, subjacente aos negócios por si celebrados estivesse a intenção de prejudicar os credores e, concretamente, a X – Automóveis unipessoal, da., 17. Tal como não se poderá considerar que, o arguido tenha agido com a intenção de prejudicar qualquer credor, uma vez que, como resultou provado o prédio urbano, objecto da escritura de compra e venda celebrada entre os arguidos e a Tecto ..., foi transmitido com os ónus a que correspondiam duas hipotecas pelo montante máximo de € 263.126,44, 18. Isto é, com a transmissão de propriedade daquele bem, os arguidos deixaram de estar obrigados ao pagamento de uma prestação mensal, que passou a ser encargo da sociedade Tecto ....

    10. Por outro lado, o próprio bem respondia perante a entidade bancária até ao montante máximo de € 263.126,44, pelo que, em bom rigor, ainda que os bens se mantivessem na esfera jurídica dos arguidos, caso os mesmos deixassem de conseguir pagar as respectivas prestações, aquele bem imóvel garantiria quase em exclusivo, o pagamento daquelas hipotecas – Como veio a acontecer em sede de rateio no processo de Insolvência.

    11. Ora, na realidade, esta foi a única intenção e a verdadeira vantagem subjacente à realização deste negócio – ficarem desonerados da obrigação de pagamento de uma prestação mensal.

    12. Considerando que a venda foi efectuada pelo preço de €146.000,00 (que receberam embora de forma distinta da declarada na escritura) e que se encontrava em dívida ao Banco (cerca de € 196.000,00), tal representa um valor consideravelmente superior ao valor real dos bens (ainda que se considerem...

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