Acórdão nº 292/06.1IDBRG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução07 de Abril de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO 1. O MP veio interpor recurso do despacho, proferido em 27-11-2020, que declarou extinto, por efeito de prescrição, o procedimento criminal contra os arguidos B, Lda, A., E. e V. e ordenou o arquivamento dos autos.

* 2. Da respectiva motivação extraiu as seguintes conclusões: 1º Nos presentes autos, o crime imputado é fraude fiscal, na forma continuada, p.p. pelo artigo 103º n.º 1, al. a) e b) e c) do RGIT, na versão aplicável à data dos factos, introduzida pela lei 15/2001 de 05-06, e, art. 30º n.º 2 e 79º do CP.

  1. O prazo normal de prescrição é 5 Anos, sendo o prazo máximo de prescrição de 7Anos e 6Meses, ressalvando os períodos de suspensão.

  2. A data do último facto relevante para inicio da contagem do prazo normal de prescrição de procedimento criminal é de 23-12-2003 (data do último negócio simulado).

  3. Por oficio de 03-01-2007 a DGI (atual Autoridade Tributária) comunicou ao Ministério Publico a instauração de processo de inquérito em 05-01-2007 por despacho manuscrito foi determinado “RDA como inquérito”.

  4. Por oficio da DGI de 07-05-2008 foi comunicado ao MP a suspensão do processo criminal, nos termos do artigo 47º do RGIT, fazendo refrª. expressa ao processo de impugnação n.º490/07.0BEBRG.

  5. Foram juntas aos autos, cópias da PI e posteriormente das sentenças com nota de trânsito em julgado, proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal, respeitantes às impugnações judiciais tributárias, alusivas a IRC dos anos de 2002 e 2003.

  6. Não foi proferido qualquer despacho no processo no inquérito, pela autoridade judiciária a determinar a suspensão do processo penal tributário na sequência das impugnações judiciais tributárias intentadas perante Tribunal Administrativo e Fiscal.

  7. Os autos de inquérito prosseguiram os seus termos com a dedução de despacho de acusação em 15-03-2016 e despacho de remessa à distribuição para julgamento em 12-03-2020.

  8. Por despacho proferido em ata, no dia 27-11-2020, a Mmº Juiz a quo, como questão prévia ou incidental, ao abrigo do disposto no artigo 338 n.º 1 do CPP, analisou e apreciou a questão prévia de prescrição de procedimento criminal 10º Fazendo apelo a legislação e jurisprudência pertinente, conclui verificar-se nos autos a prescrição do procedimento criminal, quanto a todos os arguidos.

  9. Considerou para esse efeito, e, em suma que, inexistindo despacho de autoridade judiciária em sede de inquérito a determinar a suspensão do processo penal tributário por via da instauração de impugnações judiciais tributárias, não se verifica a causa de suspensão do prazo de prescrição de procedimento criminal, 12º E, que tal causa de suspensão, prevista no artigo 47º do RIGT não é automática, carecendo sempre de despacho da autoridade judiciária a determiná-la.

  10. Porém, analisando as petições iniciais de impugnações judiciais tributárias, e, bem assim, as sentenças proferidas nesses autos, constatamos que, de facto, se discutia e discutiu-se, a situação tributária de cuja definição dependia a qualificação criminal dos factos imputados nestes autos.

    Pelo que, 14º Materialmente verificam-se as condições para que possa e pudesse operar a causa de suspensão do processo penal tributário, e, consequentemente, a suspensão do prazo de procedimento criminal tributário.

  11. Considerou já o STJ no Acórdão 3/2007 de fixação de jurisprudência, que a suspensão do processo penal tributário operava ope legis, não carecendo de despacho de autoridade judiciária a determiná-la, embora não se desconheça que ter sido proferido na vigência de anterior legislação, 16º Nos presentes autos, formalmente não existe despacho em sede própria a apreciar a questão e a determinar a suspensão, mas, substancialmente a causa de suspensão existe, razão pela qual entendemos que deverá ser considerada para efeitos de contagem do prazo prescricional nestes autos.

  12. Em conclusão, a questão que pretendemos por em crise no despacho proferido com a instauração do presente recurso, é saber se, neste caso em concreto, a forma, ou melhor, a omissão da forma/ a omissão do despacho- prevalece sobre a substância, pois que a qualificação criminal dos factos tributários em causa nestes autos dependia efetivamente da situação tributária discutida nessas ações, sendo uma verdadeira causa prejudicial.

  13. Afigura-se-nos, assim, no caso concreto, ser defensável a prevalência da substância em detrimento da forma, o que se peticiona.

  14. Acrescenta-se e reitera-se por fim que, sendo uma questão de direito, também por dever de ofício, e com vista a que a questão seja também apreciada nestes autos, em instância superior se interpõe o presente recurso.

    Nestes termos, e nos que Vossas Excelências melhor suprirão, apreciando e decidindo que, no caso concreto, a substância deverá prevalecer em detrimento da forma, ou omissão desta, e considerando como verificada a causa de suspensão do procedimento criminal, prevista no artigo 47º do RGIT, Vossas Excelências, farão, como sempre, a costumada Justiça.” * 3. Na Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto proferiu o seguinte parecer: “(…) 2. – O recurso em análise foi interposto do douto despacho que, para além do mais, declarou extinto, por efeito de prescrição, o procedimento criminal contra os arguidos B. Lda, A., E. e V. e ordenou o, consequente, arquivamento dos autos.

    1. – O Ministério Público não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso, alegando, em síntese, que, instaurada que seja impugnação judicial perante Tribunal Administrativo e Fiscal, a suspensão do procedimento criminal, nos termos do artigo 47º do Regime Geral das Infrações Tributárias, opera, em sede de inquérito, independentemente de despacho proferido pela autoridade judiciária a declará-la.

      4 - Nos termos do artigo 47.º, n.º 1 do Regime Geral das Infracções Tributárias: “Se estiver a correr processo de impugnação judicial ou tiver lugar oposição à execução, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o processo penal tributário suspende-se até que transitem em julgado as respectivas sentenças”.

      Assim, a declaração de suspensão do processo penal, nas circunstâncias previstas no artigo 47.º, n.º 1, do referido RGIT, não é uma faculdade e não depende de critérios de oportunidade, sendo antes o reconhecimento da verificação de uma situação objectiva à qual a lei atribui efeitos no processado.

      Todavia, tal suspensão, fundada na pendência de impugnação judicial ou de oposição à execução fiscal, só se justifica nos casos em que a existência de infracção criminal depende da resolução de uma questão de natureza fiscal.

      Daí que não possa prescindir de despacho a declará-la.” * 4. Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417º do CPP, não foi obtida resposta.

      * Os autos tiveram os vistos legais.

      * II. Fundamentação 1. Delimitação do objecto do recurso O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a decidir pelo tribunal ad quem, como são as referidas no nº 2 do art. 410º do Código de Processo Penal - cf. acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19.10.1995, DR. I. Série – A, de 28.12.1995.

      Impõe-se então decidir se o despacho recorrido, declarando a prescrição do procedimento criminal, ignorou a causa de suspensão do procedimento criminal, prevista no artigo 47º do RGIT.

    2. Consta do despacho recorrido (transcrição): “Dispõe o artigo 338º, nº1, do CPP, que: «O tribunal conhece e decide das nulidades e de quaisquer outras questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar».

      Nos termos do nº2 do citado preceito legal: «A discussão das questões referidas no número anterior deve conter-se nos limites de tempo estritamente necessários, não ultrapassando, em regra, uma hora. A decisão pode ser proferida oralmente, com transcrição na acta».

      No caso vertente os arguidos V., E., A. vieram invocar, nas respectivas contestações que apresentaram, e que foram admitidas, a prescrição do procedimento criminal.

      Por sua vez, a sociedade arguida B., Lda veio também invocar, na sua contestação, a prescrição do procedimento criminal, não tendo, no entanto, tal contestação sido admitida, por intempestiva.

      Ora, independentemente da contestação da referida sociedade arguida não ter sido admitida, importa aqui referir que a verificação da prescrição do procedimento criminal é de conhecimento oficioso, sendo que a sua verificação dá lugar à extinção do procedimento criminal, e obsta ao conhecimento do mérito da causa. Com efeito, a prescrição do procedimento criminal caracteriza-se, em primeira linha, como um pressuposto processual negativo - «obstáculo processual» - que obsta ao procedimento criminal e tem como consequência o arquivamento dos autos [cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, Editorial Notícias, 1993, pág. 698 e ss.; Manuel Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, III, pág.14; M. Leal-Henriques e M. Simas Santos, C. Penal Anotado, Rei dos Livros, 1995, 1º.volume, pág. 826 e seg.].

      Nesta decorrência, importa apreciar a questão da prescrição do procedimento criminal relativamente a todos os arguidos.

      No caso dos autos constatamos que, em 15/03/2016, a Digna Magistrada do MP deduziu acusação, em processo comum, e para julgamento em tribunal singular, contra B., Lda, A., E. e V., imputando, aos arguidos pessoas singulares, prática, em co-autoria, de um crime de fraude fiscal, na forma continuada, p. e p., pelas disposições conjugadas dos arts. 103º, n.º 1, als. a) e b) e c) do RGIT (Regime Geral das Infrações Tributárias), na versão aplicável à data dos factos, introduzida pela Lei 15/2001, de 5 de Junho e arts. 30º, nº2 e 79º do Código Penal, mais se responsabilizando criminalmente a referida sociedade arguida, B., Lda, pela prática do...

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