Acórdão nº 2462/19.3YLPRT.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelTERESA SANDIÃES
Data da Resolução18 de Março de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa M.L.

e J.C.

requereram procedimento especial de despejo contra F., Lda., com fundamento na cessação por oposição à renovação pelo senhorio do contrato de arrendamento celebrado sobre o imóvel sito na Rua Y, nº x, 5º andar. A R. deduziu oposição alegando, em síntese, que o contrato de arrendamento foi celebrado em 12 de maio de 2000, tratando-se de um contrato de arrendamento de duração indeterminada, sendo inadmissível a oposição à renovação pelo senhorio neste tipo de contratos.

Conclui pela improcedência do pedido.

Os AA. responderam pugnando pela improcedência da oposição.

Por decisão de 14/12/2020 foi decretado o despejo do prédio sito na Rua Y, nº x, 5º andar. A R. interpôs recurso desta decisão, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: 1. O contrato de arrendamento dos autos é de duração indeterminada e, por isso, não há lugar à aplicação do instituto da “oposição à renovação do contrato” como modo de cessação do mesmo.

  1. Na realidade, e como consta do contrato de arrendamento dos autos o mesmo foi celebrado pelo prazo de um ano, renovável por iguais períodos, tendo tido o seu início no dia 01 de maio de 2000 (Cf. Cláusula primeira), sendo esta a única cláusula do contrato de arrendamento celebrado entre senhoria e inquilina, respeitante à duração do contrato.

  2. O contrato dos autos foi celebrado na vigência do RAU (e do subsequente Decreto-Lei nº 257/95), sendo-lhe aplicável o disposto nos artigos 117º a 120º do mesmo diploma legal.

  3. A Recorrente e a já falecida Maria C., mãe dos Recorridos, estabeleceram um prazo para a duração do contrato dos autos – de um ano -, inferior ao mínimo legal para os contratos de duração limitada – então de cinco anos -, quando este último prazo de duração era imperativo para arrendamentos para comércio, indústria, profissão liberal ou outros fins lícitos – por força da aplicação do número 2 do artigo 82º da RAU conjugado com o disposto nos números 1 e 2 do artigo 117º do mesmo diploma -, não podendo ser afastado, na altura, por vontade das partes.

  4. Nas circunstâncias dos autos não é inequívoco – como impõe o artigo 117º, nº 1 do RAU -, que as partes quiseram vincular-se por um contrato de duração limitada.

  5. Mesmo que fosse possível, que não era, a fixação de um prazo inicial de duração inferior a cinco anos, não consta do contrato qualquer expressão, ou sequer, palavra, donde se possa concluir, que as partes quiseram celebrar um contrato de arrendamento de duração efetiva, nos termos dos anteriormente citados artigos do RAU. 7. A mera fixação de um prazo não é suficiente para se concluir pela existência de uma cláusula inequívoca de duração efetiva do arrendamento uma vez que, nos termos do que então se dispunha no artigo 8º, nº 2, alínea g) do RAU, o contrato de arrendamento devia mencionar o prazo, sob pena de prevalecer o prazo supletivo previsto no artigo 10º do mesmo diploma.

  6. É que, o contrato de arrendamento dos autos, ao caso de duração indeterminada, aquando da sua celebração, teria sempre de ter um prazo de duração nele aposto, por força das disposições legais anteriormente referidas.

  7. Pelo que, não pode servir de argumento para se considerar um contrato de arrendamento como sendo de duração limitada, o simples facto de as partes lhe terem atribuído, sem mais qualquer outra referência, uma duração de um ano, a qual se mostra incompatível com o regime de duração efetiva e não permite afirmar a existência da inequivocidade exigida pelos artigos 98º, nº1 e 117º, nº 1 do RAU.

  8. Estipular um prazo de um ano resulta ambíguo relativamente ao caráter limitado ou ilimitado da duração, não servindo a expressão “renovável por iguais períodos”, também ela ambígua, para afastar a referida ambiguidade.

  9. Da conjugação do disposto nos números 1 e 2 do artigo 117º do RAU, resulta inequívoca a aplicação, no caso dos autos, com as necessárias adaptações, do regime dos artigos 98.º a 101.º do RAU.

  10. Mais concretamente, do disposto no referido artigo 98º, nº 2, que estipula que o prazo para a duração efetiva dos arrendamentos não pode ser inferior a cinco anos.

  11. O que significa que, o tribunal recorrido, ao não considerar o disposto nos artigos 117º, números 1 e 2 e 98º nos termos referidos, ou seja, ao não considerar aplicável ao arrendamento dos autos (comercial) a obrigatoriedade, mínima, do prazo de cinco anos para a celebração de contratos de duração limitada deste tipo – cujo prazo de duração efetiva, podia, na ótica do Tribunal Recorrido, ser até inferior a cinco anos -, fez uma incorreta interpretação e aplicação da lei aos factos, violando o disposto nos mesmos.

  12. Para se aquilatar da possibilidade de estarmos perante um eventual contrato de duração limitada, como pretendem os recorridos, seria necessário apurar-se, com vista à obtenção de tal desiderato, a vontade conjetural das partes nestas circunstâncias no momento da celebração do contrato, ao caso, em 12 de maio de 2000.

  13. Ora, a este propósito nada foi apurado em tribunal, não foi ouvida uma única testemunha. Não se apurou a vontade das partes, ou seja, se a senhoria na data da celebração do contrato de arrendamento queria efetivamente um contrato de duração limitada, se deu conhecimento desse facto ao representante da arrendatária e se esta aceitou, desconhecendo-se assim a vontade subjetiva comum das partes, sendo, para efeitos probatórios, as declarações de parte do Requerente M.C.

    insuficientes, só por si, desacompanhadas de outras provas, para as sustentar, como acontece no caso em apreço. 16. Ademais, revelador de que não se pretendeu a celebração de um contrato de duração limitada, restringida a apenas um ano, eventualmente prorrogável por idênticos períodos, é também o facto de se ter permitido que o escritório arrendado à inquilina, a ora Requerida, se destinasse também a escritório relacionado com atividade comercial e à instalação da sede de qualquer outra sociedade que se insira no mesmo grupo de empresas a que pertença a inquilina, como se alcança da Cláusula 2ª do contrato de arrendamento.

  14. Cláusula 2ª que permitiu a ocupação do locado por outras sociedades, aí se incluindo sociedades constituídas ou a constituir, o que é sintomático - até porque geralmente a duração das sociedades verifica-se por tempo indeterminado (artigo 15º do CSC) -, de que as partes projetaram e conceberam um contrato de arrendamento para vigorar por prazo incerto, sem extensão de prazo determinada, situação contratual que só por si também afasta qualquer entendimento no sentido de se poder considerar estar-se na presença de contrato de duração limitada.

  15. Nestas circunstâncias, qualquer cidadão médio, colocado nas circunstâncias do caso concreto, apenas interpretaria a cláusula primeira do contrato de arrendamento dos autos no sentido literal que ela evidencia, ou seja, de que as partes estabeleceram um prazo inicial de um ano e a possibilidade de prorrogação de tal prazo por períodos iguais e sucessivos.

  16. Mas daí não poderia concluir o intérprete, considerando até que qualquer contrato tem de ter forçosamente um prazo, que as partes ao fixarem o prazo do contrato dos autos, o quiseram restringir, limitar a um determinado período, dado até a possibilidade de prorrogação sucessiva do referido prazo e as circunstâncias invocadas na cláusula segunda do mesmo. 20. Pelo que, também nesta parte, o tribunal recorrido não fez uma interpretação correta do disposto no artigo 326º do Código Civil, violando assim o disposto no mesmo.

  17. Não sendo possível à luz da teoria da impressão do destinatário, consagrada no artigo 326º do Código Civil, inferir pela existência de uma inequívoca cláusula de duração efetiva do arrendamento, haverá que qualificar o contrato de arrendamento dos autos, como um contrato vinculístico, para fins não habitacionais por tempo indeterminado (antes considerado “sem duração limitada”).

  18. Contrato que transitou para o NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano), nos termos do disposto no artigo 26º da Lei nº 6/2006, de 27 de fevereiro, sendo regido pelas regras aplicáveis aos contratos de duração indeterminada, por força da aplicação do disposto no nº 4 daquele normativo - e não, como erradamente refere o tribunal recorrido ao considerar aplicável no caso em apreço o nº 3 do artigo 26º do referido diploma legal, no pressuposto errado de estarmos, que não estamos, perante um contrato de arrendamento não habitacional de duração limitada - no âmbito das quais e por força da aplicação conjugada do disposto nos artigos 1101º, 1110º, número 1 e 1110º - A, número 1, todos do Código Civil, o locador apenas poderá extinguir o contrato por ato de vontade unilateral mediante denuncia, nos casos previstos nas alíneas b) e c) do artigo 1101.º, não o podendo fazer por meio de dedução de oposição à renovação.

  19. Com efeito, a comunicação de oposição à renovação do contrato de arrendamento dos autos efetuada pelos Autores/Recorridos, é ilegal e não pode produzir qualquer efeito como modo de cessação do referido contrato, que deve por isso manter-se em vigor. 24. Fez pois o Tribunal Recorrido incorreta interpretação e aplicação da lei aos factos, violando, entre outros, o...

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