Acórdão nº 6798/16.7T8LSB-A.L2-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados Em 15/03/2016, o Novo Banco, SA, em administração dos activos que foram do BES, SA, veio requerer uma execução para pagamento de 289.784,73€, contra M-SA (= executada 1), MF, AM, NM (executados 2, 3 e 4, respectivamente) e MSS-SA (executada 5), com base numa livrança que apresentou (doc.1).

Alegou para tanto que era portador dessa livrança, no valor de 289.586,70€, subscrita pela executada 1 e avalizada pelos executados 2 a 4; vencida em 26/02/2016 e apresentada a pagamento, não foi a mesma paga, então ou até agora; tal livrança foi entregue, em branco, ao BES, para garantir/caucionar o pagamento de um empréstimo, que o primeiro, no exercício da sua actividade bancária, concedeu, à executada 1, no valor de 250.000€ de capital, respectivos juros e demais encargos, o qual foi formalizado, por ambas as partes, através de contrato, datado e assinado, em 29/06/2010, que também junta (doc.2). O BES e os executados, convencionaram, também, entre outras coisas, que em caso de incumprimento das obrigações assumidas no referido contrato, pela executada 1, o BES poderia preencher a livrança, entregue em caução, pela executada 1, pelo valor que se mostrasse em dívida (capital, juros e demais encargos), e executar a mesma (vide doc. 2). De acordo com o artigo 32 da LULL, aplicável por força do art. 77 do mesmo diploma, os avalistas são responsáveis da mesma maneira que as pessoas por eles afiançadas. O contrato mostra-se incumprido, foi denunciado e a livrança foi preenchida pelo referido valor e, do preenchimento da mesma, deu o NB, conhecimento, aos executados, através de cartas, datadas de 03 e 04/02/2016, que se juntam e dão por inteiramente reproduzidas, para todos os efeitos legais (docs. 3 a 7). Para além do valor constante da livrança dada à execução, devem também, os executados, ao exequente, os juros de mora e respectivo imposto, vencidos e vincendos, importando os vencidos, contados à taxa de 4% ao ano, desde o vencimento da mencionada livrança, até 03/03/2016, em 198,03€. Acresce, ainda, que, o empréstimo supra referido foi também garantido, por hipoteca voluntária, celebrada no mesmo dia 29/06/2010, pela executada 5, a favor do BES, sobre uma fracção autónoma predial, propriedade da mesma, a qual, se destina a garantir todas as obrigações emergentes do empréstimo (doc. 8). Aquela hipoteca foi devidamente registada a favor do BES e depois a seu favor.

Os executados 2 a 5 deduziram oposição à execução: excepcionam a ilegitimidade do NB; dão a conhecer que a executada 1 , foi declarada insolvente, pelo que a execução devia ser sustada quanto a ela; alegam que o NB não tem direito de acção com base naquela livrança – enquadram isto na previsão dos artigos 703/1-c, a contrario, e 729/-a do CPC (isto porque, por força dos artigos 44 e 46, ex vi art. 77, todos da LULL, o portador da livrança para poder exercer o seu direito de acção, dispensado do protesto, tem que beneficiar da cláusula “sem despesas” aposta no título, o que não acontece na livrança oferecida à execução; pelo que o NB não estava dispensado de fazer o protesto da livrança – ou seja, comprovar formalmente a falta de pagamento - para poder accionar os executados pela alegada falta de pagamento; como não fez o protesto, carece de direito de acção); excepcionam a nulidade da relação subjacente (o BES celebrou com a insolvente um contrato de mútuo em 29/06/2010 – doc.2 junto à PI; a livrança dada à execução pretende garantir o cumprimento do referido contrato, conforme resulta da PI; o contrato de mútuo constitui, por conseguinte, a relação subjacente que determinou a alegada emissão da livrança; os termos e condições do referido contrato são complexos, foram pré-feitos pelo banco e em letra “miúda”, não estando a sua compreensão e leitura ao alcance de uma pessoa média, como é o caso dos executados 2 a 5; as cláusulas do contrato não foram colocadas pela exequente aos executados, com a antecipação necessária e razoável, para que estes fizessem uma ponderada reflexão sobre os seus termos, antes de os assinar. Os executados limitaram-se a subscrever os referidos contratos, diga-se, de adesão, sem que lhes tenha sido explicado detalhadamente pela exequente o conteúdo de cada cláusula que os compõe. Não foi dado pelo BES aos executados a possibilidade de negociar as cláusulas que compõem o contrato em crise. A executada 2 é doméstica, octogenária, míope e de poucas letras; assim, o BES violou o dever de comunicação e informação previsto nos artigos 5 e 6 da LCCG (DL 446/85, de 25/10); devem, em consequência, considerarem-se excluídas, porque nulas, todas as cláusulas do contrato junto pelo NB, que vão impugnadas, e, por força desse vício, declarada nula por contágio a livrança dada à execução, cfr. ac. TRP de 04/03/2014, proc. 1033/10.4TBLSD-A.P2); dizem que falta a interpelação prévia (o executado 4 não mora na morada indicada há 15 anos; os executados 2 a 4 não foram notificados, previamente à instauração da presente execução, pelo NB, dando-lhes conta do montante exacto e da data de vencimento da livrança; o título dado à execução havia sido entregue em branco ao BES; é jurisprudência dominante – ac. TRE de 27/02/2014, proc. 1470/11.7TBSTB-A.E1; ac. TRL de 11/08/2012, proc. 5930/10.9TCLRS-A.L1-6; ac. do STJ, de 10/05/2007, proc. 07B841 -, a exigência de interpelação prévia dos avalistas pelo credor com indicação da data de vencimento da garantia cambiária e montante a pagar pelos devedores quando a livrança seja entregue em branco; não tendo os avalistas sido interpelados é inexequível e, logo inexigível; assim, os executados 2-5 não estão em incumprimento com a exequente; aliás, esta violou expressamente o previsto nas cláusulas 36.2 e 36.3 do contrato celebrado entre as partes, cfr. doc.2 junto à PI e ac. do TRG, de 12/03/2009, proc. 900/2004.9TCGMR-A.G1); não aceitam, assim, o valor inscrito na livrança pela exequente, cuja importância vai expressamente impugnada – art. 446/1, in fine, do CPC; a livrança, no limite, garante os 250.000€ de capital, alegadamente, emprestados pelo BES à executada 1; ora, executando a livrança pelo valor de 289.586,70€, a exequente, mais uma vez, viola claramente o contratado; impugnam os factos constantes do petitório da acção executiva por serem falsos.

Admitida a oposição, o NB contestou-a: impugna a base que sustenta a conclusão da ilegitimidade da exequente tirada pelos executados; aceita que a execução seja suspensa quanto à executada 1 por ter sido declarada insolvente; impugna a necessidade de protesto para ter direito de acção contra os executados/avalistas (porque eles respondem da mesma maneira que o subscritor da livrança e o protesto não é necessário em relação a este: artigos 30, 32, 44, 53, 77 e 78 da LULL); diz que as cláusulas contratuais não são de excluir do contrato, porque o BES não violou os deveres de comunicação e informação previstos nos artigos 5 e 6 do RCCG (a concessão do empréstimo subjacente à emissão da livrança, foi precedida de reuniões, onde tudo foi negociado, valor do empréstimo, prazo de reembolso, taxas de juros, comissões, garantias, etc., entre exequente e executados; os executados 2 a 4 tinham à data da assinatura do empréstimo, poderes de representação das executadas 1 e 5, das quais eram os únicos membros do conselho de administração, conforme se pode constatar do contrato e da escritura de hipoteca (docs. 2, 3 e 8); esses executados são pessoas com uma vasta experiência no mundo dos negócios, bastando, para tanto atentar no doc.2, onde logo na primeira página, parte inferior, se pode ler: "Considerando que: (a) o BES concedeu ao cliente um financiamento, em 24/08/2000, pelo valor inicial de 100.000.000$ (contravalor 498.798€); (b) O financiamento foi já objecto de alterações, em matéria de taxas de juro aplicáveis, de montante máximo de crédito concedido e de garantias; (c) as partes entendem ser oportuno actualizar o texto do contrato, aprovando de uma só vez todos os seus termos actualmente em vigor, e reformulando o respectivo clausulado, nos termos que se seguem; (d) a presente alteração, não é pois uma novação, mas apenas uma reformalização do acordo entre as partes”; quer dizer, pelo menos, desde 2000, que os executados 2 a 4 têm negociado com o BES, alterações, relativas a taxas de juro aplicáveis, montante máximo de crédito concedido e garantias, tendo em conta as dificuldades que a executada 1 apresentava); os executados assinaram o contrato, de forma consciente, livre, voluntária e devidamente esclarecidos, o que, aliás foi declarado no contrato e na escritura: no contrato junto sob o doc.2, na última página, logo acima das assinaturas, que os executados ali apuseram, pode ler-se, o seguinte: "o(s) cliente(s) declaram ter conhecimento que este contrato é composto pelas presentes condições gerais e pelas respectivas condições particulares. Mais declara(m) ter tomado conhecimento da totalidade das cláusulas que constituem as presentes condições gerais de que guarda(m) uma via, e cujo conteúdo declara(m) aceitar." Na escritura junta sob o doc.3, pode ler-se o seguinte: disseram os outorgantes nas suas invocadas qualidades […] que esta hipoteca destina-se a garantir as obrigações emergentes do contrato de financiamento FEC 9151/09, celebrado hoje entre o BES e a executada 1, representada dos executados 2 a 4, o qual se junta como documento anexo a este escritura, que dela fica a fazer parte integrante, e do qual os outorgantes declaram não prescindir da sua leitura. […] que a celebração e execução da presente escritura foi devidamente deliberada pela sociedade representada pelos executados 2 a 4, nos termos e condições dos respectivos estatutos."); o NB interpelou, pessoalmente, telefonicamente e por escrito, quer a mutuária executada 1, quer os seus garantes, designadamente, através das cartas datadas de 09/07/2015 (docs. 4, 5, 6 e 7), para que estes pagassem...

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