Acórdão nº 766/19.4T8OLH.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 766/19.4T8OLH.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório 1.

(…), solteira, residente na Praceta (…), n.º 4, 3.º-Direito, em Tavira, por si, e na qualidade de representante comum da quota com o valor nominal de € 748,20, instaurou contra (…), Hotelaria e Turismo, Lda., com sede social na Rua da (…), n.º 4, em Tavira, ação de anulação das deliberações sociais.

Alegou, em resumo, que em conjunto com os seus irmãos e representados detém uma quota de € 748,20 correspondente a 1/3 do capital social da sociedade R., que o restante capital social é detido por (…), seu tio, atual gerente da R., que no passado dia 7/6/2019 ocorreu uma assembleia geral da R. e aí foram tomadas deliberações sem que à A. e aos seus representados houvesse sido facultada a informação mínima para compreensão e tomada de posição sobre os assuntos que constituíram a respetiva ordem de trabalhos, que as deliberações tomadas nesta assembleia violam normas imperativas e que o sócio gerente pretende, por efeito delas, retirar da sociedade o máximo de disponibilidades financeiras em claro prejuízo dos interesses sociais e dos sócios, o que configura uma situação de voto abusivo do sócio-gerente e de abuso de direito.

Concluiu pedindo que sejam anuladas as seguintes deliberações tomadas na assembleia geral da R do passado dia 7/6/2019: (i) sobre o balanço e contas da requerida relativo ao exercício de 2018 e aplicação de resultados, (ii) sobre a renovação das deliberações anteriores de 3/3/2009 (ata n.º 34), 31/3/2010 (ata n.º 35), 31/3/2011 (ata n.º 36), 31/3/2012 (ata n.º 37), 31/3/2013 (ata n.º 38), 31/3/2014 (ata n.º 39), 31/3/2015 (ata n.º 40), 31/3/2016 (ata n.º 41), 31/3/2017 (ata n.º 42), 31/3/2018 (ata n.º 43), (iii) sobre a restituição das prestações suplementares ao sócio (…) e à ex-sócia (…) cada um no montante de € 74 819,69, e (iv) sobre a distribuição de lucros.

A R. contestou argumentando, em resumo, que as deliberações tomadas na assembleia geral do passado dia 7/6/2019 não são contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato social, que da sua execução não decorre qualquer dano para a A. ou para a R., nem qualquer benefício ilegítimo para o sócio-gerente desta e que todos os documentos referentes às contas da R. estão, como sempre estiveram, disponíveis para consulta de todos os sócios no gabinete responsável pela execução da respetiva contabilidade, situação que é do perfeito conhecimento da A.

Concluiu pela improcedência da ação.

2. Foi proferido despacho que afirmou a validade e regularidade da instância, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova.

Teve lugar a audiência de discussão o julgamento e depois foi proferida sentença, em cujo dispositivo designadamente se consignou: “Julgo a presente ação procedente, por provada e, consequentemente, anulo todas as deliberações sociais tomadas na assembleia geral de 7 de junho de 2019.

Em particular: a) Anulamos a deliberação sobre o balanço e contas da sociedade relativo ao exercício findo em trinta e um de dezembro de 2018, por não ter sido precedida do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação-, nos termos do disposto no artigo 58.º/1, alínea c), do CSC, por referência aos artigos 263.º/1/65.º/1/3/66.º do CSC; b) Anulamos a deliberação sobre a renovação das deliberações anteriores de 31/3/2009 (ata n.º 34), 31/3/2010 (ata n.º 35), 31/3/2011 (ata n.º 36), 31/3/2012 (ata n.º 37), 31/3/2013 (ata n.º 38), 31/3/2014 (ata n.º 39), 31/3/2015 (ata n.º 40), 31/3/2016 (ata n.º 41), 31/3/2017 (ata n.º 42 e 31/3/2018 (ata n.º 43), por não ter sido precedida do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação, nos termos do disposto no artigo 58.º/1, alínea c), do CSC, por referência aos artigos 263.º/1/65.º/1/66.º do CSC; c) Anulamos a deliberação de distribuição de lucros, por não ter sido precedida do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação, nos termos do disposto no artigo 58.º/1, alínea c), do CSC, por referência aos artigos 263.º/1/65.º/1/3/66.º do CSC; d) Anulamos a deliberação da restituição das prestações suplementares, por a constituição das prestações suplementares assentarem em deliberação nula, por ausência de convocação para assembleia – cfr. artigo 56.º/1/a), do CSC; por preterição do dever de informação mínima previsto no artigo 58.º/1/c), por referência ao artigo 214.º/1, ambos do CSC; por não ser possível ponderar se a situação liquida da sociedade fica com um valor superior à soma do capital e da reserva legal –cfr. artigo 58.º/1/a), por referência ao artigo 213.º/1, do CSC.” 3.

Recurso.

A R. recorre da sentença e conclui assim a motivação do recurso: “I.- A decisão sobre a matéria de facto deve ser revogada, atenta a prova produzida, passando a dar-se com provados os factos seguintes: 1. A Ré é uma sociedade por quotas estando o seu capital – de € 2.244,60 – dividido em duas participações, uma no valor de € 1.496,40 pertencente ao sócio-gerente (…) e outra no valor de € 748,20 pertencente à ora Autora e aos representados (…), (…) e (…); 2. De salientar que a configuração atual da participação de (…) resultou da recente “cessão de quota” efetuada por “doação” pela sua mãe (…), 3. Sem prejuízo do supra referido, a Autora é contitular da quota com o valor nominal de € 748,20 (setecentos e quarenta e oito euros e vinte cêntimos), representativa de aproximadamente 33,3% (trinta e três, três por cento) do capital social da Ré; 4. Representando assim os restantes contitulares da referida quota, a saber: (…), (…) e (…); 5. Estamos perante uma sociedade familiar porquanto todos os seus sócios são da mesma família, sendo o sócio gerente tio da Autora; 6. Inicialmente a sociedade Ré era do pai (gerente), do tio e da avó da Autora e dedicava-se à exploração dos imóveis do primeiro como pensão.

7. Após o falecimento do pai da Autora, esta, os irmãos e a mãe herdaram a sua quota e a sociedade Ré continuou a exploração da pensão, sendo a sua gerência agora assumida pelo tio; 8. No passado dia 22 de março de 2019, a autora e os seus representados requereram a realização de inquérito judicial à sociedade Ré; 9. Foi intentada ação de exclusão judicial dos sócios pelo tio aos sobrinhos, aqui AA, na sequência de deliberação tomada no passado dia 12 de abril; 10. Foi requerida a anulação da referida deliberação, tendo assumido o n.º 565/19.3T8OLH; 11. Na mesma ação foi requerida a anulação de todas as deliberações de aprovação de contas dos exercícios de 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2015, 2016 e 2017 por falta de convocatória; 12. Por seu turno, a Ré já deu entrada de um processo de exclusão (com fundamentos diferentes dos apresentados na Assembleia Geral e que suportaram a deliberação) da ora Autora e dos seus irmãos, o qual está a correr termos também neste douto Tribunal sob o processo n.º 558/19.0T8OLH, correndo prazo para apresentação de Contestação; 13. A Autora e os seus irmãos foram convocados no passado dia 23 de maio para uma nova Assembleia Geral, a realizar no passado dia 7 de Junho, com a seguinte ordem de trabalhos: “Ponto Um: Deliberar sobre o balanço e contas da Sociedade relativo ao exercício findo em trinta e um de dezembro de dois mil e dezoito e aplicação de resultados; Ponto Dois: Deliberar sobre a renovação das deliberações anteriores de 3/03/2009 (ata n.º 34), 31/03/2010 (ata n.º 35), 31/03/2011 (ata n.º 36), 31/03/2012 (ata n.º 37), 31/03/2013 (ata n.º 38), 31/03/2014 (ata n.º 39), 31/03/2015 (ata n.º 40), 31/03/2016 (ata n.º 41), 31/03/2017 (ata n.º 42), 31/03/2018 (ata n.º 43), por padecerem de nulidade, de acordo com o artigo 56.º, n.º 1, alínea a), SCS, atribuindo eficácia retroativa às mesmas, ressalvando os direitos de terceiros, nos termos do artigo 62.º, n.º 1, CSC; - Ponto Três: Deliberar sobre a restituição das prestações suplementares prestadas por (…), no valor de € 74.819,68 (setenta e quatro mil, oitocentos e dezanove euros e sessenta e oito cêntimos) e (…), no valor de € 74.819,68 (setenta e quatro mil, oitocentos e dezanove euros e sessenta e oito cêntimos); Ponto Quatro: Discutir e deliberar sobre a distribuição de lucros”.

14. Foram disponibilizados para consulta os balanços, balancetes referentes e relatórios de gestão relativos aos exercícios dos anos 2008, 2009, 2010, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016 e 2017; 15. Não foi disponibilizado/facultado o relatório de gestão referente ao exercício de 2018; 16. Os elementos apresentados e consultados (balanço e balancetes, demonstração de resultados) referentes ao exercício de 2018 não estavam assinados; 17. Não foi disponibilizado o livro de atas; 18. Com efeito, no passado dia 30 de maio, a Autora deslocou-se, acompanhada do Revisor Oficial de Contas (…), ao local indicado para consultar a documentação referente à Assembleia e constatou que não estavam disponíveis os seguintes elementos: livro de atas e relatório de gestão de 2018; 19. A Autora enviou à Ré duas cartas, uma datada de 3 de junho de 2019 registada com aviso de receção e outra datada de 5 de junho de 2019 apenas registada, dando nota que os documentos relativos aos assuntos da ordem do dia não estavam disponíveis para consulta no local indicado; 20. No passado dia 30 de maio de 2019 (7 dias antes da realização da assembleia geral), esses elementos estavam disponíveis para consulta; 21. A carta enviada não mereceu qualquer resposta, pelo que a Autora compareceu no dia, hora e local marcados para a Assembleia; 21. Na referida Assembleia, a Autora entregou uma declaração prévia na qual, mais uma vez, dava conta das vicissitudes associadas à convocatória bem como da ausência de elementos que lhe permitissem votar a ordem de trabalhos – cfr. doc. 12 junto ao procedimento cautelar, cujo teor se dá aqui por reproduzido; 22. Requerendo que a mesma fosse adiada por forma a permitir a consulta da documentação em falta, o que não foi atendido tendo o sócio maioritário decidido realizar na mesma a assembleia, deliberando e aprovando todos os...

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