Acórdão nº 1907/19.7T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 1907/19.7T8EVR.E1 Tribunal Judicial Comarca de Évora – Juízo Central Cível e Criminal de Évora – J4 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Na presente acção de condenação proposta pela sociedade “(…), SA” contra a sociedade “(…) e (…), Lda.”, a Autora e (…) vieram interpor recurso da sentença proferida, na parte em que o legal representante da Autora (…) foi condenado como litigante de má-fé, no pagamento da multa correspondente de 10 (dez) UC´s.

* A Autora “(…), SA” pediu a condenação da Ré “(…) e (…), Lda.” no pagamento da quantia de e 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil euros), acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contabilizados desde a data da citação da Ré.

* Como fundamento do pedido, a Autora alegou, em síntese, que: Por escritura pública de compra e venda celebrada no dia 11/05/2018, e pelo preço de € 1.650.000,00 (um milhão e seiscentos e cinquenta mil euros), adquiriu à Ré as fracções A e B que compõem o “Hotel (…)”.

Nas inspecções técnicas realizadas às referidas fracções verificou-se que as mesmas apresentavam graves falhas estruturais, que não eram conhecidas da Autora e lhe diminuíam o valor em e 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil euros).

A Autora pretende assim que o preço da compra e venda seja reduzido, tanto por via dos custos da reparação e de execução da obra de remodelação/reconversão, como pela perda de receita da exploração do hotel, reduzindo-se, por conseguinte, o preço da compra e venda para o valor de € 1.000.000,00 (um milhão de euros).

* A sociedade “(…) e (…), Lda.” foi citada para a acção, mas não apresentou contestação.

* No dia 13/12/2019, as partes remeteram aos autos uma transacção, com os seguintes termos:  A Ré reconhece que as fracções que compõem o “Hotel (…)”, seguidamente descritas: (i) Fracção autónoma designada com a letra “A”, destinada a serviços, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua (…), n.º 49 e 51, freguesia de Sé e São Pedro, concelho de Évora, descrito na Conservatória do Registo Predial de Évora sob o número (…), da referida freguesia, inscrito na matriz da união das freguesias de Évora (São Mamede, Sé, São Pedro e Santo Antão), sob o artigo (…).

(ii) Fracção autónoma designada com a letra “B”, destinada a serviços, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua (…), n.º 41, 43, 45, 47, freguesia de Sé e São Pedro, concelho de Évora, descrito na Conservatória do Registo Predial de Évora sob o número (…), da referida freguesia, inscrito na matriz da união das freguesias de Évora (São Mamede, Sé, São Pedro e Santo Antão), sob o artigo (…).

Apresentam diversas falhas estruturais, nomeadamente e sem excluir outras, corrosão da respectiva estrutura na área dos anexos e pátios, situações graves de infiltrações decorrentes de fissurações, defeitos na rede eléctrica e de distribuição de gás resultante das infiltrações, corrosão e deterioração das canalizações de água com infiltrações, desaprumo de paredes, e falta ou deficiente aplicação de isolamento térmico e acústico em paredes, coberturas e pavimentos.

 A Ré reconhece que a reparação das falhas estruturais referidas fará a Autora incorrer em custos avultados de reparação, e que esta reparação terá repercussão na execução das obras de remodelação/reconversão já anteriormente previstas para as fracções em causa, do hotel, implicando o encerramento total ou pelo menos parcial do hotel para execução das obras estruturais, com a consequente perda de receita.

 As partes fixam o valor necessário para a realização das reparações das falhas estruturais referidas na quantia certa, líquida, exigível e irrevogável de € 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil euros).

 Consequentemente, as partes obrigam-se a corrigir o valor de aquisição das fracções acima referidas para o valor de € 1.000.000,00 (um milhão de euros), mediante a celebração da respectiva escritura pública de rectificação, no Cartório Notarial do Dr. (…), sito na Av. (…), n.º 72, 7.º-B, em Lisboa, no prazo de 15 (quinze dias) contados da data de homologação da presente transacção.

 A escritura pública de rectificação será agendada pela Autora, que fica obrigada a notificar a Ré por correio electrónico com antecedência não inferior a 5 (cinco) dias sobre a data para qual seja agendada a sua realização.

 Na data de celebração da escritura pública de rectificação do preço de aquisição, a Ré obriga-se a restituir à Autora o montante de € 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil euros), através de cheque bancário à ordem da Autora ou por transferência bancária a realizar para o IBAN a indicar pela Autora.

 Considerando que os presentes autos não passaram da fase dos articulados, que a Ré não apresentou contestação e não foi exigida do tribunal uma actividade judicial relevante, e ainda em face da simplicidade da causa, as partes requerem muito respeitosamente a V. Exa. se digne dispensá-las do pagamento da taxa de justiça remanescente, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais.

 Sem prejuízo do disposto no número anterior, as custas eventualmente em dívida a juízo serão suportadas pela Ré, prescindido ambas de custas de parte».

* Por despacho de 16/12/2019, determinou-se a notificação das partes para juntarem os autos, respectivamente, cópia certificada do título constitutivo da sociedade em questão e, bem assim, certidão permanente do registo comercial, o que foi cumprido.

Mais foi determinado à Autora a junção aos autos do relatório técnico a que aludiu no artigo 4.º da petição inicial.

* Por requerimento de 31/01/2020 a Autora remeteu ao processo o aludido relatório de peritagem.

* Por despacho de 04/03/2020, determinou-se a notificação das partes para se pronunciarem, querendo, sobre a eventual inexistência de interesse em agir por parte da Autora e, bem assim, a possibilidade de os autos revelarem o preenchimento, pelas partes, da previsão do artigo 542.º, nºs 1 e 2, alíneas a) e d), do Código de Processo Civil.

* As partes deram entrada aos requerimentos datados de 16/03/2020 e 19/03/2020.

* Por sentença datada de 03/06/2020, o Tribunal «a quo» concluiu: a) «pela inexistência de necessidade justificada e razoável do recurso à via judicial e, assim, pela falta de interesse em agir da Autora, o que constitui uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso (cfr. artigos 577.º e 578.º do Código de Processo Civil), conducente à absolvição da instância, como previsto no artigo 278.º, n.º 1, alínea e), do Código Processo Civil.

Por conseguinte, o Tribunal julga verificada a excepção dilatória da falta de interesse em agir da Autora, e, em consequência, absolve a Ré da presente instância.

Custas pela Autora, que se fixam em 3 UC.

Registe e notifique».

* b) «ao abrigo do disposto nos artigos 542.º, n.º 1 e 2, alínea a) e 543.º, ambos do Código de Processo Civil, em conjugação com o artigo 27.º, n.º 1 e 2, do Regulamento das Custas Processuais, condeno o legal representante da Autora, (…), como litigante de má-fé, no pagamento da multa correspondente de 10 UC´s». * Os recorrentes não se conformaram com a referida decisão e as alegações de recurso continham as seguintes conclusões[1] [2] [3] [4].

  1. O presente recurso tem por objecto a condenação, a título pessoal, do Recorrente como litigante de má-fé e ao pagamento de uma multa de 10 UC, e assenta na discordância quanto à interpretação e aplicação das normas que sancionam a conduta processual que faça um uso indevido do processo, com a qual aquele não se pode conformar.

  2. A sentença em apreço assenta em convicções erradas e pressupostos enviesados, fruto de um erro grosseiro verificado desde logo no plano da fundamentação da resposta dada à matéria de facto provada, nomeadamente, na que foi dada ao Ponto 6 dos factos provados.

  3. A resposta dada ao facto provado 6 é fundamentada no documento de fls. 6 a 9 dos autos, que corresponde à escritura pública na qual o Recorrente interveio em representação da Autora e da Ré, datada de 11 de Maio de 2018.

  4. Estava vedado ao Mm.º Juiz “a quo” fundamentar a resposta a matéria de facto em decisão proferida em Junho de 2020 num documento datado de 11 de Maio de 2018, pois aquela escritura pública não lhe permite aferir se poderes do Recorrente de representação da sociedade “(…) e (…), Lda.”, ainda se mantinham à data da prolacção da decisão.

  5. Tão acentuado desfasamento temporal não constituiu, erradamente, obstáculo para que o Mmº. Juiz “a quo” desse por provado um facto de particular relevância para a decisão ora recorrida, e que ele próprio faz sobressair da restante matéria de facto.

  6. Uma escritura pública outorgada mais de ano e meio antes da data em que é proferida decisão sobre matéria de facto que com ela se pretende sustentar, não constitui meio de prova idóneo de poderes de representação, pois as situações não se mantêm necessariamente imutável para todo o sempre, e pode deixar – como no caso concreto deixou – de ter actualidade.

  7. O erro assume ainda maior gravidade quando foi o Mmº. Juiz “a quo” a determinar a junção aos autos da certidão comercial permanente da sociedade “(…) e (…), Lda.”, e somente pela sua consulta poderia verificar, querendo, os poderes de representação do Recorrente relativamente àquela sociedade.

  8. Ao fundar a sua convicção na resposta dada ao facto 6 da matéria de facto com base no documento correspondente a fls. 6 a 9 dos autos, o Mm.º Juiz “a quo” deu como provado um facto com base num documento inidóneo para o efeito, em clara violação do disposto no artigo 607.º, n.º 5, do CPC.

  9. Resulta da sentença em apreço que essa resposta errada tem uma influência decisiva na condenação do Recorrente como litigante de má-fé, pois se a certidão comercial fosse devidamente analisada, como se impunha, ter-se-ia necessariamente formado convicção diferente.

  10. Nomeadamente, o Mmº. Juiz “a quo” poderia ter apreendido que o Recorrente foi nomeado gerente da sociedade “(…)...

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