Acórdão nº 237/18.6T8SSB.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelRUI MACHADO E MOURA
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

P. 237/18.6T8SSB.E2 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: (…) instaurou a presente acção declarativa, sob a forma comum, contra MEO – Serviços de Comunicações e Multimédia S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 21.900,00, acrescida de juros à taxa legal em vigor, desde a citação até integral pagamento, e ainda pagar-lhe a indemnização diária de € 20,00 por cada dia que decorra até à efectiva eliminação dos ruídos que causam prejuízo à A. desde a data de propositura da presente acção.

Alegou para tanto que, conforme provado em sede de acção de tutela da personalidade, que correu termos neste tribunal, a R. tem vindo a afectar o seu direito ao descanso e sossego, com equipamentos instalados em prédio contíguo à sua residência que propagam ruídos geradores de danos para a A.

Devidamente citada para o efeito veio a R. contestar, defendendo-se por excepção, invocando a incompetência absoluta do tribunal e a prescrição do direito indemnizatório da A. Defendeu-se ainda por impugnação, alegando que já procedeu à efectiva eliminação do ruído e, caso possa existir alguma incomodidade para a A., derivada da actividade da R., a mesma age sem culpa, inexistindo nexo de causalidade entre a conduta da R. e os danos peticionados pela A., os quais, a provarem-se, não devem, além do mais, merecer a tutela do direito.

Notificada para o efeito, a A. respondeu às invocadas excepções, pugnando pela improcedência das mesmas.

Procedeu-se ao saneamento do processo com dispensa de audiência prévia, tendo sido proferida decisão que julgou improcedentes as excepções alegadas pela R. Foi ainda fixado o valor da acção, o objecto do litígio e os temas de prova, não tendo existido quaisquer reclamações das partes.

Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, tendo sido proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência, condenou a R. a pagar à A. a quantia de € 21.900,00, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal em vigor, desde a data da presente sentença até pagamento integral e efectivo, absolvendo-se a R. do demais peticionado.

Inconformada com tal decisão dela apelou a R. para este Tribunal Superior que, por acórdão proferido em 30/1/2020, anulou a sentença recorrida e determinou a repetição do julgamento a fim de ser apurado o concreto período de tempo que o ruído produzido na habitação da A., pelos equipamentos da R., perturbou o descanso e a tranquilidade daquela, com vista à posterior fixação de uma indemnização à A., a título de danos não patrimoniais.

Assim, veio a ser realizada uma nova audiência de julgamento na 1ª instância, com observância das formalidades legais, tendo sido proferida uma nova sentença qual julgou a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência, condenou a R. a pagar à A. a quantia de € 15.000,00, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal em vigor, desde a data da presente sentença até pagamento integral e efectivo, absolvendo-se a R. do demais peticionado.

Inconformada novamente com tal decisão dela veio apelar a R., tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões: 1. A inconformidade da Recorrente face à douta sentença ora recorrida resulta essencialmente dos seguintes motivos: i) falta de fundamentação da decisão quanto aos factos provados; ii) existência de manifesto erro de julgamento, por serem dados como provados factos que obtiveram prova em sentido diverso; iii) porque os meios probatórios existentes nos Autos, bem como a prova testemunhal produzida em sede de Audiência de julgamento, impunham decisão diversa; iv) por ter havido uma incorrecta interpretação e aplicação das disposições e princípios legais do Código Civil.

  1. A Meritíssima juíza a quo considerou provados os factos dos pontos 12, 13, 14, 15, 16, 22, 23, 25 e 26 no que respeita à localização dos quartos da residência da Recorrida e à necessidade de os deslocalizar para a sala devido ao ruído da central da MEO, sem que, no entanto, os mesmos se encontrem provados atendendo à prova produzida nos autos e em audiência de julgamento.

  2. Com efeito, para dar tais factos como provados – que são determinantes para a solução de Direito a dar no presente pleito – a Meritíssima Juíza a quo bastou-se com as declarações de parte da A. e depoimento da testemunha (…), mas esses factos apenas teriam que ser devidamente provados por documento (fotografias, plantas ou outros), o que não aconteceu.

  3. Deste modo, não se compreende por que motivo considerou a Meritíssima Juíza a quo tais factos como provados, tanto mais atendendo a que estes factos consistem nos danos alegados pela Recorrida e que consubstanciam a alegada responsabilidade de indemnizar que imputa à Recorrente.

  4. Deveria a Meritíssima Juíza a quo, ao invés, ter dado como não provado, seja que os quartos da habitação da Recorrida eram contíguos ao edifício da MEO, seja que a mesma efectuou, em momento algum, qualquer alteração da disposição e utilização dessa habitação em resultado exclusivo da existência de ruído no quarto, e em consequência, proferir decisão diversa daquela que foi preconizada na sentença ora recorrida.

  5. Deu também a Meritíssima Juíza a quo por provados os factos 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21, 23, 24 e 25 no sentido que a Recorrida sofreu maleitas derivadas da privação de sono e forte irritabilidade proveniente do ruído que alegava sentir, mas uma vez mais, não foi produzida qualquer prova documental, de nenhuma natureza de tais factos, e a prova testemunhal produzida foi vaga e inconsistente, sendo que essa prova lhe competia na totalidade, de acordo com as regras da repartição da prova.

  6. Deste modo, não se compreende por que motivo considerou a Meritíssima Juíza a quo tais factos como provados, sendo que atendendo a que estes factos consistem nos danos alegados pela Recorrida e que consubstanciam a alegada responsabilidade de indemnizar que imputa à Recorrente, não poderiam ter sido dados como provados, com a correspondente consequência a nível de responsabilidade civil que a Meritíssima Juiz a quo lhes vem atribuir, sem que tivesse sido carreada para aos Autos prova cabal da sua veracidade.

  7. A Meritíssima Juíza a quo veio a dar como provados os factos 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21, 22, 23, 24, 25 respeitantes às legadas doenças do foro neurológico que a Recorrida alega ter sofrido em consequência do ruído que alega ouvir na sua residência.

  8. Uma vez mais, não foi produzida qualquer prova documental, de qualquer natureza, de tais factos, e até a prova testemunhal produzida foi vaga e inconsistente, sendo que a prova desses factos – que se impunha fazer e que competia legalmente à Recorrida fazer e sem a qual não se compreende como se podem considerar provados tais factos – era facilmente obtenível e passível de ser efectuada documentalmente pela Recorrida.

  9. Na verdade, a mesma refere um quadro clínico cuja gravidade e consequências apenas poderiam ter sido atestadas por profissional clínico, mas não foram carreadas para os autos nenhumas provas da intervenção de um médico no auxílio e acompanhamento terapêutico das patologias alegadas pela Recorrida.

  10. De igual modo, a Recorrida refere tomar abundante medicação psicotrópica que depende de receita médica, mas não é provada nem a necessidade de quaisquer medicamentos, nem a respectiva designação de mercado, nem forma juntas receitas e/ou recibos da farmácia relativos à respectiva aquisição.

  11. A Recorrida que fazer prova da prescrição desses medicamentos para ser crível e poder provar que tais patologias se verificam e que possuíam efectivamente impacto na vida da Recorrida, conforme esta vem alegar, o que não fez em absoluto, quando lhe competia legalmente provar tais factos e era facilmente obtenível e passível de ser efectuada documentalmente pela Recorrida … 13. Acresce que, embora o limite de referência da Lei do Ruído se tenha apurado não ser elevado para o normal das pessoas e de tenha in casu constatado que o ruído na casa da Recorrida não era sequer claramente perceptível (cfr. testemunhas … e …), a pessoa em causa pode ter especial e anómala sensibilidade em relação às demais, pelo que teria a Recorrida que provar que efectivamente sofria dessas patologias clínicas derivadas do ruído que alegava sentir, pois essas patologias derivariam necessariamente de especial sensibilidade da mesma.

  12. Ao invés de fazer tal prova para os autos a Recorrida não carreou para os autos elemento probatório, sendo, assim, patente que nenhuma prova foi feita de tais factos, donde não poderia ter dado a Meritíssima Juiz a quo dar tais factos como provados, como erradamente e em violação das regras da prova veio a fazer.

  13. E mais: dos pontos 14., 16., 17. e 19. refere-se que se deu como provado que os ruídos derivados na Central da Recorrente eram audíveis, incomodativos, provocava que a Recorrida acordasse e não conseguisse voltar a dormir, que tivesse de tomar soporíferos para o efeito, e que incomodavam não só a Recorrida mas também os demais membros da família.

  14. Ora, para a prova de tais factos, que implicavam que se verificasse concretamente um nível elevado de ruído na residência da Recorrida que provocava desmedida perturbação na vida e saúde de todos, bastou-se uma vez mais a Meritíssima Juiz a quo com a mera alegação desse facto pela Autora, quando nos autos foi produzida prova em sentido divergente deste, i. e., que o ruído sentido na residência da Recorrida era de pequena monta, de tal forma que o mesmo nem era percepcionado por outros que não a própria Recorrida, e como, tal, insusceptível de causar as gravosas consequências que a recorrida lhe atribui – cfr depoimentos das testemunhas (…) aos 18m30s e aos 18m45s e de (…), 7m25s e aos 15m30 dos seus depoimentos.

  15. Assim, claramente a Meritíssima Juiz a quo deu resposta à matéria de facto em clara...

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