Acórdão nº 4585/11.8TBSTS.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelEUGÉNIA CUNHA
Data da Resolução09 de Dezembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº 4585/11.8TBSTS.P2 Processo do Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 3 Relatora: Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha 1º Adjunto: Maria Fernanda Fernandes de Almeida 2º Adjunto: António Eleutério Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto Sumário (elaborado pela relatora - cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC): ……………………………… ……………………………… ………………………………*I. RELATÓRIO Recorrente: B…, Lda Recorrida: C…, Lda., I-Relatório B…, Lda.

e C…, Lda., respetivamente A./Reconvinda e Ré/Reconvinte, deduziram, reciprocamente, incidentes de liquidação, pedindo a primeira a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 59.523,70 € e a segunda a condenação daquela a pagar-lhe a quantia de 162.596,29 €, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos.

Fizeram-no na sequência da sentença dos autos que, decretando a anulação, por venda de coisa defeituosa, do contrato de compra e venda celebrado entre a A. e a R. de fornecimento de 16.052,700 Kgs. de fio 16/1 100% algodão cardado pronto a tingir, determinou que a R./Reconvinte C… devolvesse à A./Reconvinda B… o valor correspondente a tal fio que lhe foi entregue, calculado por referência ao valor suportado com a sua aquisição por esta, que, por sua vez, condenou a pagar àquela o valor das despesas com a fabricação da tela onde foi incorporado o fio.

Para o efeito alegaram: A Autora, B…, os diferentes custos por si suportados com a aquisição do fio que forneceu à Ré.

A Reconvinte, C…, que o valor peticionado corresponde ao valor total das despesas que suportou com o fabrico do tecido em que utilizou o fio fornecido pela B…, como seja despesas com outros tipos de fio e despesas com o processo de produção do tecido.

Cada uma das partes impugnou a matéria alegada pela parte contrária.

Proferido despacho saneador, foi identificado o objeto do processo e enunciados os temas de prova.

Procedeu-se à audiência final, com a observância das formalidades legais.

*Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto: 1. Julgo o incidente de liquidação da A. improcedente, e, em consequência, absolvo a R. do respectivo pedido, e 2. Julgo parcialmente procedente o incidente de liquidação da R., e, em consequência, condeno a A. a pagar à R. a quantia de 161.459,93 € (cento e sessenta e um mil quatrocentos e cinquenta e nove euros e noventa e três cêntimos), acrescida de juros moratórios à taxa legal de 4% ao ano desde a presente data até integral pagamento.

  1. As custas do incidente promovido pela A. correm pela A. e as do incidente promovido pela R. correm por A. e R. na proporção do respectivo decaimento”.

    *A Autora, B…, LDA., apresentou recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a decisão e substituída por outra que condene a Ré, em sede de liquidação, a pagar à Autora € 59.532,70, nos termos e com os fundamentos alegados no incidente de liquidação e seja absolvida da liquidação operada pela Ré, formulando as seguintes CONCLUSÕES: ……………………………… ……………………………… ………………………………*Apresentou a Apelada contra-alegações sustentando inexistir o invocado vício, dever ser rejeitada a impugnação da matéria de facto por inobservância dos ónus previstos no art. 640º, do CPC, pugnando pela improcedência do recurso e, caso assim não se entenda, a matéria de facto dada como provada seja alterada e mantida a decisão recorrida ou se opere a compensação.

    *Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.

    *II. FUNDAMENTOS - OBJETO DO RECURSO Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

    Assim, as questões a decidir são as seguintes: 1ª – Enquadramento do incidente de liquidação de condenação genérica pós-sentença e análise das particularidades da respetiva instrução – obrigatoriedade de intervenção do juiz a suprir a insuficiência da prova, complementando-a, designadamente com produção de prova pericial; 2º - Se a sentença padece de patologias, se cabe proceder à sua anulação por violação, pelo juiz, do dever de, oficiosamente, completar as provas, insuficientes para fixar a quantia devida (artigo 360.º, n.º 4, do CPC), designadamente com produção de prova pericial, indispensável à decisão da matéria de facto, sempre sendo de anular mesmo oficiosamente; 3ª – Em caso negativo, do erro da decisão da matéria de facto: 3.1. Do incumprimento do ónus de impugnação da matéria de facto; 3.2. Se se impõe a requerida alteração da decisão da matéria de facto; 4ª - Do erro da decisão de mérito relativamente à liquidação do valor do fio entregue pela Autora à Ré.

    *II.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 1. FACTOS PROVADOS São os seguintes os factos considerados provados, com relevância, para a decisão (transcrição): 1.

    Da sentença proferida nos presentes autos, consta a seguinte decisão: “…julga-se a reconvenção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência: a) Decreta-se a anulação, por venda de coisa defeituosa, do contrato de compra e venda celebrada entre a Autora e a Ré de fornecimento de 16.052,700 Kgs. de fio 16/1 100% algodão cardado pronto a tingir e, por inerência, determina-se que a Ré/reconvinte “C…, Lda.” devolva à Autora/reconvinda “B…, Lda. o valor correspondente a tal fio que lhe foi entregue, calculado por referência ao valor suportado pela Autora com a sua aquisição, a liquidar em momento ulterior…(negrito e sublinhado nosso) b) Condena-se a Autora/reconvinda a pagar à Ré/reconvinte, a título de danos patrimoniais, a quantia de 4.438,46 (quatro mil quatrocentos e trinta e oito Euros e quarenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à respectivas taxas supletivas fixadas para as empresas comerciais, vencidos desde a data de notificação da reconvenção e até integral pagamento.

    1. Condena-se igualmente a Autora/reconvinda a pagar à Ré/reconvinte o valor das despesas com a fabricação da tela onde foi incorporado o fio dos autos, a liquidar em momento ulterior…” 2.

    Com interesse da referida sentença consta que: “7) A Ré não liquidou junto da Autora qualquer valor, relativamente aos aludidos fornecimentos, ascendendo a quantia em dívida a 61.270,28 €.

    13) Em meados de Agosto de 2011, a Ré enviou à Autora uma carta com o teor de fls. 23 e ss.

    15) Na carta de fls. 23 e ss., a Ré disse que o seu cliente lhe havia devolvido 156.500 metros de tecido quando, na realidade, a quantidade de fio fornecida pela Autora, 12.938,50 Kg., apenas davam para fabricar 67.500 metros.

    16) No exercício das respectivas actividades, a Autora e a Ré acordaram que a Autora forneceria à Ré fio 16/1 100% algodão cardado pronto a tingir, pelo preço de 3,850/kg.

    17) Na sequência desse acordo, a Autora, no dia 02 de Maio de 2011 e na sua viatura de matrícula n.º ..-..-UZ transportou 7.260,700 Kgs. de fio, 3.114,200 Kgs. em 05 paletes e 4.146,500 Kgs. em 06 paletes, para deles fazer entrega à Ré e que titulou pela factura n.º 261, desse dia 02 de Maio de 2011.

    18) Perante a recusa da Ré em receber 3.114,200 Kg. das referidas 05 paletes, a Autora, na mesma viatura e nesse mesmo dia, levou-os para as suas instalações e emitiu a nota de crédito referida em 4).

    19) Até hoje, a Autora não repôs à Ré os 3.114,200 Kgs. do fio.

    20) As quantidades de 7.082,000 Kgs. e de 1.710,00 Kgs. de fio, entregues pela Autora à Ré, respectivamente, em 13 e 20 de Maio de 2011 e, ainda, os 4.146,500 Kgs. da factura n.º 261, tinham à vista semelhança ao fio 16/10 100% algodão cardado pronto a tingir.

    39) Com aquele fio, entregue pela Autora, a Ré fabricou 67.500 metros de tela.

    40) Que entregou a cliente seu.

    41) Que lhe tinha encomendado 550.000 metros de tela, a um preço concreto não determinado.

    42) E que tinha de ser fabricado pela Ré com fio 16/1 100% algodão cardado pronto a tingir, para ser tingida e com ela fabricar calças.

    43) Efectuado pelo seu cliente o tingimento prévio em várias amostras daqueles 67.500 metros de tela, as respectivas amostras não ficaram tingidas uniformemente com a mesma tonalidade das respectivas cores em que foram tingidas.

    44) Ficaram com a anomalia acima referida por não terem sido fabricadas com fio 16/1 100% algodão.

    45) E aqueles 67.500 metros de tela ficaram inaproveitáveis para a respectiva confecção de calças, a que se destinavam.

    46) Que por isso foram devolvidos à Ré pelo seu cliente. … 51) A Ré, ante aquela reclamação do seu cliente, mandou tingir uma amostra, em cone, do fio entregue pela A.

    52) Cuja amostra, após tingida, evidenciou a existência de fibras no fio e que entregou a D…, colaborador da Autora e para por ele lhe ser entregue essa amostra.

    59) E os resultados dessa análise foram que o fio tinha os valores médios seguintes: “Algodão 76,5%”; “Viscose” + Liocel 18,9%” e “Poliéster 4,6%”.

    60) Foi a mistura no algodão e nas respectivas percentagens daquelas fibras viscose, liocel e poliéster, referidas acima que constituíram a composição do fio entregue pela Autora à R. e que causou a anomalia referida em 43) e ss.

    62) O tingimento referido em 55) custou à Ré a quantia de 4.438,46 €.

    63) Da encomenda de 550.000 metros de tela, o cliente da Ré, por causa daquela anomalia, devolveu os respetivos 67.500 metros de tela.

    64) E, quanto a esta metragem, cancelou a respetiva encomenda.” 3.

    O fio que a A./Reconvinda vendeu à R./Reconvinte foi adquirido, por importação, em momentos distintos, na Turquia, ao fornecedor da requerente E…, AS e remetido à A. em 2 contentores.

  2. Conforme fatura de 03.03.2011, a A. adquiriu ao referido fornecedor um total de 14.481,20 KG de fio NE 16/01, 100% algodão, ao preço de € 3,35/kg, correspondendo a um total...

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