Acórdão nº 73602/19.0YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelCRISTINA D
Data da Resolução03 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 73602/19.0YIPRT.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1. (…), Europe, Limited, autora na ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias movida contra (…), interpôs recurso da sentença proferida pelo Juízo de Competência Genérica de Olhão, juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, o qual julgou que o capital e juros peticionados na ação prescreveram em 30 de maio de 2019 e, em conformidade, absolveu o réu do pedido. A decisão sob recurso tem o seguinte teor: «Exceciona a Ré a prescrição das prestações de amortização de capital e dos juros peticionados relativos ao período compreendido entre 30/09/2010 até 30/05/2014 tendo em conta que a Requerente interpôs o presente procedimento de injunção em 04.09.2019 e o prazo de prescrição das referidas obrigações se previsto no artigo 310.º do CPC. Em resposta veio a Autora, alegar que se trata de um contrato de crédito pessoal, onde foi concedido um crédito de € 5.510,44, e que o Requerido não pagou as rendas vencidas após 30/09/2010, sendo que a última se venceu a 30/05/2014. O contrato de mútuo em referência é um documento, cujo montante é determinado ou determinável por simples cálculo aritmético, razão pelo qual foi admitido na Injunção e a mesma só foi à distribuição por oposição do Requerido, caso contrário a Injunção seria um título Executivo, razão pela qual vale, no caso, o prazo de prescrição de 20 anos. Cumpre decidir. "O tempo é também na vida do direito um importante fator, um grande modificador das relações jurídicas" (Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4a edição, Almedina, 1995, pago 729), o que claramente se comprova com o instituto jurídico da prescrição. Esta será "o meio por que, havendo decorrido o tempo fixado na lei e verificando-se as demais condições por esta exigidas, se adquirem direitos pela posse, ou extinguem obrigações por não se exigir o seu cumprimento (Albano Ribeiro Coelho, Prescrições de Curto Prazo, Jornal do Foro, Ano 27, 142-143-144, Jan-Set., 1963, pág. 54): "pela prescrição o devedor adquire o direito de se libertar do cumprimento da obrigação, alegando-a e paralisando consequentemente a ação do credor" (Guilherme Moreira, Instituições de Direito Civil Português, II, pág. 239). O fundamento dominante deste instituto jurídico, assenta na "negligência do titular do direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei. Negligência que faz presumir ter ele querido renunciado ao direito, ou pelo menos o torna (o titular), indigno de proteção jurídica (dormientibus non sucurrit ius)" (Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, II, 7.ª reimpressão, Almedina, 1987, página 445; Paolo Vitucci, La Prescrizione, Tomo primo, Art. 2934-2940, Giuffré Editore, Milano, 1990, págs. 20 a 28). Repare-se, por outro lado, que nele são também relevados interesses de ordem pública (Rodrigues Bastos, Notas ao Código Civil, II, Lisboa, 1988, pág. 63), ligados à certeza e segurança jurídicas ("as situações de facto que se constituíram e prolongaram por muito tempo, sobre a base delas se criando expectativas e se organizando planos de vida" – Manuel de Andrade, ob. cit., pág. 446), à proteção dos devedores ("contra as dificuldades de prova a que estariam expostos no caso de o credor vir exigir o que já haja, porventura, recebido" – ob. loc. cit.; Karl Larenz, ob. cit., págs. 328¬329), de estímulo e pressão educativa sobre "os titulares dos direitos no sentido de não descurarem o seu exercício ou efetivação, quando não queiram abdicar deles" (Manuel de Andrade, ob. loc. cit.). A situação é particularmente clara no caso da prescrição negativa ou extintiva ("instituto por via do qual os direitos subjetivos se extinguem quando não exercitados durante certo tempo fixado na lei e que varia conforme os casos" – Manuel de Andrade, ob. cit., pago 445), caracterizada "pelo facto de, não havendo sido pedido o cumprimento duma obrigação durante o prazo fixado na lei, o credor PERDER o direito respetivo" (Albano Ribeiro Coelho, ob. cit., pág. 54). Assim e concretizando, podem sistematizar-se como requisitos deste conceito: "a existência dum direito; o seu não exercício por parte do titular; e o decurso do tempo" (Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4.ª edição, Almedina, 1995, pág. 729; Rubén Stiglitz, Contratos-Teoria General, I, Ediciones Depalma, 1994, págs. 769-770), sendo que, "verificados estes elementos, a prescrição procede" (Albano Ribeiro Coelho, ob. cit., pág. 54), perdendo o direito alegado, a sua eficácia. Em concreto, no Código Civil Português, a matéria vem regulada nos artigos 298.° e 300.° a 327.°, do Código Civil e ainda em normas especiais deste (artigos 430.°, 482.°, 498.°, 500.°, 521.°, 530.°, 636.°), sendo evidente a dicotomia criada entre prescrições extintivas (artigos 309.° a 311.°, 498.°, CC) e presuntivas (artigos 312.° a 317.°, CC; as quais não produzem, como nas anteriores, "a extinção do direito, dando lugar apenas a uma presunção de cumprimento, que pode ser ilidida, embora só pelo meio previsto no artigo 313.°", tendo como ratio "a presunção de cumprimento de obrigações, nascidas de relações da vida quotidiana, cujo pagamento costuma ocorrer sem demora" – Rodrigues Bastos, ob. cit., págs. 76 e 77). Como se viu, o crédito reclamado pela Autora nesta ação emerge de um contrato de crédito ao consumo celebrado com o Réu, contrato esse que à data da sua celebração – 30.05.2010 – era regido pelo DL n.º 133/2009, de 02/06, ainda em vigor, o qual procedeu à transposição para o direito interno da Diretiva n.º 2008/48/CE, do Parlamento e do...

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