Acórdão nº 936/19.5Y4FNC.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelCELINA NÓBREGA
Data da Resolução25 de Novembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório AAA com sede na Rua (…), inconformada com a decisão da Direcção Regional do Trabalho e da Acção Inspectiva, da Secretaria Regional de Inclusão Social e Cidadania do Governo da Região Autónoma da Madeira que lhe aplicou a coima de €2.000.00 pela prática, a título de negligência, de uma contra-ordenação prevista e punida pelo artigo 245.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Código do Trabalho (efeitos da cessação do contrato de trabalho no direito a férias), a coima de €2.000.00 pela prática, a título de negligência, de uma contra-ordenação prevista e punida pelo artigo 278.º, n.ºs 1, 2 e 4 do Código do Trabalho (tempo de cumprimento) e da coima de €9.300.00 pela prática, a título de negligência, de uma contra-ordenação prevista e punida pelo artigo 263.º, n.ºs 1 e 2, alínea b) do Código do Trabalho (subsídio de Natal) e, em cúmulo jurídico, a coima única de €10.000.00 e ainda ordenou, ao abrigo do artigo 564.º do Código do Trabalho, o pagamento de €2.060.33 para o trabalhador e de €801,85 para a Segurança Social, veio impugná-la judicialmente invocando, para tanto: - A incompetência da Direcção Regional do Trabalho e da Acção Inspectiva, em razão do território; - A nulidade da decisão impugnada: a) Por não ter conhecido da alegada incompetência em razão do território; b) Por não conter a descrição sumária dos factos e a indicação das normas violadas e punitivas, nem a apreciação crítica da prova; c) Por ser omissa quanto à moldura penal aplicável; e d) Por não justificar nem fundamentar o cúmulo jurídico obtido.

Mais invocou que não existe nem alegação nem prova de que a declaração do ex-trabalhador da arguida pela qual assume quaisquer responsabilidades pelo inventário não correspondesse à sua livre e expressa vontade, que a certeza da compensação débitos/créditos que a sociedade retira da declaração não está posta em causa na decisão impugnada, que não é verdade que a arguida não efectuou ao seu ex-trabahador o pagamento das quantias referidas na decisão impugnada, que a arguida respondeu à notificação de 4.7.2019 e justificou o cumprimento da obrigação decorrente da cessação do contrato de trabalho, que, na sequência da rescisão do contrato de trabalho, a arguida notificou o ex-trabalhador para comparecer nos dias 13 e 14 de Junho no estabelecimento de que era responsável a fim de se proceder ao inventário, mas aquele não compareceu, que na sequência do inventário apurou-se a falta de acessórios e peças de automóveis no valor de €3.063.82, por carta registada com aviso de recepção a arguida comunicou ao ex-trabalhador o resultado do inventário e que tinham sido apurados os créditos laborais devidos à data da cessação do contrato de trabalho e procedido à compensação entre o crédito/débito, sendo que a arguida ainda é credora do montante de € 1.783.81, que a compensação obteve autorização prévia do ex-trabalhador quando iniciou as suas funções de encarregado do estabelecimento comercial e que não existiam obstáculos à compensação operada, não tendo a arguida praticado as infracções que lhe são imputadas.

Pugnou, a final, pela procedência da impugnação e revogação da decisão impugnada.

O Ministério Público tornou presentes os autos ao Mmº. Juiz do Juízo do Trabalho do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, de acordo com o artigo 37.º da Lei n.º 107/2009 de 14.09.

Foi proferido despacho que declarou o tribunal competente e admitiu a impugnação judicial.

Procedeu-se ao julgamento.

Posteriormente foi proferida a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto, julgo parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada pela arguida AAA e, em consequência: a) Absolvo a arguida da prática da contraordenação prevista e punida pelo art. 278.º, n.º 1, 2, 4 e 5 do Código do Trabalho; b) Condeno a arguida pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo art. 245.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 5 do Código do Trabalho, na coima de € 2.000,00 (dois mil euros); c) Condeno a arguida pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo art. 263.º, n.º 1, n.º 2, alínea b) e 3 do Código do Trabalho, na coima de € 9.300,00 (nove mil e trezentos euros); d) Procedo ao cúmulo jurídico das coimas indicadas, condenando a arguida na coima única de € 9.300,00 (nove mil e trezentos euros); e) Condeno a arguida no pagamento ao trabalhador (...) da quantia de € 1.783,51 (mil setecentos e oitenta e três euros e cinquenta e um cêntimos).

* Custas pela arguida, nos termos do art. 59.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC, nos termos do art. 8.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III.

* Notifique.

Comunique à autoridade administrativa, nos termos do art. 45.º, n.º 3 da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro.

* Proceda ao depósito da sentença, nos termos do art. 372.º, n.º 5 do Código de Processo Penal ex vi do art. 41.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro ex vi do art. 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro.” Inconformada, a arguida recorreu, sintetizando as suas alegações nas seguintes conclusões: “1 - Vem o presente recurso interposto da sentença que julga parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada pela arguida e em consequência; - Condena a arguida pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artº 245º, nº 1 alíneas a) e b) e 5 do Código do trabalho, na coima de € 2.000,00 (dois mil euros); - Condena a arguida pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artº 263º, nº 1, alínea b) e 3 do Código do Trabalho, na coima de €9.300,00 (nove mil e trezentos euros); - Procede ao cúmulo jurídico das coimas indicadas, condenando a arguida na coima única de €9.300,00 (nove mil e trezentos euros); - Condena a arguida no pagamento ao trabalhador (…) da quantia de €1.783,51 (mil setecentos e oitenta e três euros e cinquenta cêntimos).

2 – A Direção Regional do Trabalho e da Ação Inspetiva da Região Autónoma da Madeira é incompetente territorialmnete para o procedimento contra-ordenacional sob apreciação nestes autos, nos termos do disposto no art. 6.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro ex vi do art. 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro; 3 – As contraordenações imputadas à sociedade recorrente prendem-se com o não pagamento de remuneração e subsídios ao ex trabalhador que sempre foram processadas na sua sede e pagas neste local através de transferência bancária; 4 – Ao invés do que consta da sentença recorrida a cessação do contrato de trabalho não determinou alteração alguma quanto ao procedimento de processamento dos créditos laborais e local de pagamento.

5 – Na fase administrativa do processo de contraordenação objeto destes autos, a instrutora dirigiu todas as solicitações de informações à sede da sociedade e não ao estabelecimento sito no Funchal, como se comprova pelo processo administrativo junto a estes autos.

6 – Discordando-se assim do entendimento acolhido na sentença recorrida relativamente à suscitada incompetência da recorrida para a instrução e decisão do processo de contraordenação, por violar o disposto nas disposições legais referidas na conclusão 2 supra.

7 – A decisão administrativa é nula nos termos do disposto no artº 25º da Lei nº 107/2009 de 14 de Setembro, nulidade esta insuprível nos termos do disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 63º do RGCO, por não se ter pronunciado sobre a suscitada, (na defesa), incompetência territorial nem se encontrar fundamentada; 8 – Na decisão administrativa confunde-se a factualidade considerada provada com a fundamentação e esta com aquela, como se pode verificar pela análise das alíneas i), j), e l) da ali intitulada factualidade provada.

9 – Padece ainda a decisão administrativa de nulidade por omissão de apreciação crítica da prova. Sendo contraditória a decisão com a fundamentação da qual consta que “ as testemunhas arroladas pela arguida corroboram na sua totalidade os argumentos aduzidos na resposta escrita apresentada pela sua defesa (cfr. fls. 79 a 83).” 10 – A decisão administrativa também é omissa quanto à moldura penal aplicável, uma nulidade prevista na disposição legal atrás referida na conclusão 7.

11 – Da factualidade provada na sentença recorrida não se pode considerar os pontos 12, 13 e 14 (por referência á identificação que consta da sentença recorrida), por expressarem um raciocínio conclusivo e que também não encontra qualquer sustentação em alguma prova.

12 – A omissão de fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto gera a sua nulidade.

13 – A fundamentação da matéria de facto provada e não provada, com a indicação dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da convicção do julgador, devem ser feitas com clareza, objetividade e discriminadamente, de modo a que as partes, destinatárias imediatas da decisão, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e qual a fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida pelo Tribunal.

14 – A necessidade imposta pela decisão, no que respeita ao apuramento cristalino do completo elenco dos factos não provados, para lá de ser totalmente omissa a fundamentação quanto a eles, como se verifica na sentença recorrida, consubstancia nulidade nos termos do disposto nos artºs 607º nº 4 e 615º nº 1 al. c) e d) do C. Civil.

15 – Uma deficiente ou obscura alusão aos factos provados ou não provados, como ocorre na sentença recorrida, compromete o recurso e, nessa perspetiva, contende com o acesso à Justiça e à tutela efetiva, consagrada como direito fundamental no artº 20º da Constituição da República.

16 – Com o devido respeito, não pode este Tribunal reconhecer à decisão recorrida os requisitos de clareza e precisão na indicação da matéria de facto provada e não provada, para lá da omissão da fundamentação dessa decisão, pelo que enferma de nulidade, nos termos do artº 615º nº...

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