Acórdão nº 1200/19.5T8OLH.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelRUI MACHADO E MOURA
Data da Resolução05 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora
  1. 1200/19.5T8OLH.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: (…) na qualidade de sócio veio, ao abrigo do art. 1055º do C.P.C., interpor acção de destituição de membro de órgão social com prévia suspensão do mesmo, contra (…), e a sociedade “(…) – Clínica Dentária, Lda.”, pedindo que seja suspensa de imediato a primeira requerida das funções de gerente da segunda requerida, sendo provisoriamente confiada a gerência ao requerente, bem como seja a primeira requerida destituída das funções de gerente da segunda requerida com fundamento em justa causa.

    Para tanto, alegou, em sínteses que a primeira requerida tem consecutivamente desviado para fins particulares dinheiros da sociedade, usa o cartão de crédito/multibanco da sociedade para pagar despesas particulares e, com as disponibilidades da sociedade efetua pagamentos de viagens mensais para o Brasil, para fins e interesses particulares da própria.

    Foi determinada a suspensão provisória da primeira requerida do cargo de gerente da segunda requerida, sem audiência prévia daquela, e, posteriormente, foram ambas citadas para, querendo, contestarem os pedidos – cfr. nº 3 do mencionado art. 1055º do C.P.C.

    Apenas a primeira requerida apresentou contestação alegando, em síntese, que a presente ação tem apenas intuito de vingança pessoal do outro sócio, motivado pelo divórcio ocorrido entre os dois sócios aqui intervenientes neste litígio. É falso que tenham existido convocatórias para as assembleias de sócios por parte do requerente, pois a única convocatória foi feita pela requerida em 27/9/2010. Não houve qualquer assembleia de sócios depois da saída do requerente da casa de morada da família, em agosto de 2018, pois até essa data não havia qualquer necessidade de convocatória para esse efeito. A última acta assinada pela requerida foi a de final de 2016, não tendo assinado qualquer acta em 2017, sendo que a assinatura nela constante não é dela. Até julho de 2019, data em que o requerente deliberou de motu próprio o aumento dos vencimentos dos gerentes da sociedade, a requerida apenas recebia o valor mensal de € 798,67, passando a auferir € 2.041,00. Não houve distribuição dos lucros de 2018 e de 2019. É absolutamente falso que a requerida se tenha apossado de valores pertencentes à sociedade e deles tenha feito uso em proveito próprio, como alega o requerente, sem que este tivesse conhecimento. O valor de 2019 dos lucros é superior ao valor detido pela requerida, pelo que o mesmo só pode estar retido pelo requerente. Quer o requerente, quer a requerida faziam uso dos valores existentes nas contas da sociedade para fins particulares, em particular para as despesas do agregado familiar, que nenhum prejuízo causava à sociedade, pois que apenas haveria menos valores de lucros a distribuir a final. Era uma prática de ambos os sócios, com o conhecimento e consentimento mútuos. Dos parcos documentos carreados para os autos não resulta que a requerida se tenha apossado do valor de € 50.269,73. É verdade que a requerida tem na sua posse os valores correspondentes ao seu trabalho e o requerente o dele e dos outros médicos. As viagens que fez ao Brasil foram para efeitos da sua formação. Inexiste lesão grave e irreparável ou de difícil reparação de um grave direito, quer pelos danos que possam advir dessa conduta, quer pela demora na tutela definitiva e, de igual modo, inexiste periculum in mora. Conclui, assim, pela improcedência da acção, devendo a requerida ser absolvida dos pedidos.

    Oportunamente foi realizada a audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, tendo sido proferida sentença que, com o acordo das partes, veio a decidir, não só a confirmação ou infirmação da medida de suspensão provisória, como também a decidir sobre a destituição definitiva da gerência em relação à primeira requerida.

    Assim sendo, da mencionada sentença consta, como dispositivo, o seguinte: “Pelo exposto: a) Mantenho a decisão de suspensão imediata da requerida da qualidade de gerente; b) Julgo procedente por provada a destituição de (…) da gerência da (…) – Clínica Dentária, Lda.; c) Não se vislumbra a verificação de litigância de má fé”.

    Inconformada com tal decisão dela apelou a requerida (…), tendo apresentado para o efeito as suas alegações e conclusões de recurso.

    Pelo relator foi proferido despacho a determinar que a requerida sintetizasse as suas conclusões de recurso (uma vez que aquelas que tinha apresentado o tinham sido em 22 páginas), o que foi feito ao abrigo do disposto no art. 639º, nº 3, do C.P.C., tendo a requerida apresentado novas conclusões devidamente sintetizadas (em 7 páginas), as quais, de imediato, passamos a transcrever: Da falta de representação da sociedade nos autos: A. O processo em causa, encontra-se ferido de nulidade, por violação do disposto no artigo 25.º, nº 2, do Código de Processo Civil, uma vez que a Sociedade Demandada nos autos, não poderia ser representada em juízo pelo Recorrido (…) B. Do mesmo modo, cumpre destacar, que o terceiro sócio da Sociedade, é o menor (…), além da ausência de capacidade judiciária, inviável tornou sua representação, dado ser filho da Recorrente e do Recorrido. Sem prescindir e por mera cautela de patrocínio, acresce que, Da incorreta valoração da prova produzida: C. Da prova produzida não resultou provado que a Recorrente se locuptou com dinheiros da sociedade e se utilizou os valores da sociedade em proveito próprio, e se tal facto, pela sua natureza e relevância justificam a sua destituição da gerência da sociedade.

  2. Importa, desde logo sublinhar que não se pode aceitar o argumento de que os factos 12, 13, 14, 15, 16, 17, 23, 24, 25, 34, 35, 37 e 38 já estariam confessados, tanto em sede de contestação apresentada (cfr. arts. 78 da contestação) como igualmente nas declarações prestadas em julgamento. Denota-se das linhas gerais da contestação apresentada (oposição), a inexistência de qualquer confissão acerca de matéria de factos e de direito.

  3. Do mesmo modo, se anota que das declarações prestadas pela Recorrente em Juízo, não possuem o condão de certificar a ocorrência de qualquer confissão da matéria trazida a relevo.

  4. Em nenhum momento do depoimento a Recorrente confessa ter feito seu o dinheiro de caixa da sociedade, sem intenção de o entregar.

  5. Releva-se particularmente relevante assinalar que a Sociedade detinha características de empresa familiar H. A decisão proferida ignorou que sempre foi prática da sociedade, a Recorrente recolher o dinheiro de caixa e que não era prática o depósito no dia seguinte, contrariamente ao que consta da sentença proferida.

    I. Sendo portando errado concluir como o Tribunal concluiu no ponto 13 que não havia consentimento e autorização dos sócios para que assim fosse.

  6. Não existindo qualquer elemento de prova que revele que em algum momento o Recorrido tenha manifestado, perante a Recorrente, o seu desacordo com a conduta daquela. Aliás, bem pelo contrário dado ter sido claro pelos depoimentos prestados, ser exatamente esse o modus operandi estabelecido.

  7. Acresce referir que nunca foi pratica o dinheiro de caixa ser depositado diariamente (contrariamente ao referido no ponto 15 da matéria considerada por provada).

    L. Importa aqui assinalar que os valores depositados pelo Recorrido não correspondem às folhas diárias de caixa, nem com o valor total de caixa.

  8. O que se verifica pelo confronto das folhas de caixa e os extratos bancários, e também pelo facto do Recorrido já no curso da ação ter depositado mais de € 49.000,00 (vide artigo 35 dos factos provados).

  9. Ora, facto de ser assumido pelo próprio Recorrido de ter mais de € 40.000,00 de caixa consigo, o qual depositou já no decurso do processo, através de um único depósito fere de morte a credibilidade do depoimento das...

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