Acórdão nº 43364/19.7YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelCRISTINA D
Data da Resolução05 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 43364/19.7YIPRT.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1. Águas da Região de Aveiro, SA, autora na ação especial de cumprimento de obrigação pecuniária que moveu contra (…) interpôs recurso da sentença do Juízo de Competência Genérica de Lagos, Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, o qual, julgando verificada a exceção dilatória de incompetência absoluta do tribunal, declarou-se incompetente em razão da matéria para apreciar o mérito da ação e competente o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé. Na ação, a autora pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia global de € 290,95, sendo € 166,32 por serviços de fornecimento de água que não foram pagos, € 3,908 por juros de mora, € 51,80 relativo a outras quantias que não discrimina e € 66,85 a título de taxa de justiça que pagou. Para fundamentar o pedido, a autora alegou, em síntese, que no âmbito da sua atividade de fornecimento de serviços de fornecimento de águas emitiu várias faturas no valor supra referido em nome da ré e relativas ao período de 6 de novembro de 2018 a 30 de abril de 2019 e melhor identificadas na petição inicial. A ré deduziu oposição, admitindo ter celebrado o contrato em causa, em 11 de julho de 2018, relativo a um estabelecimento comercial onde exercia a atividade de restauração e que na sequência da cessação da sua atividade, em 23 de novembro de 2018, cessou o contrato que mantinha com a autora, tendo nessa data subscrito um documento de confissão de dívida e celebrado um acordo de pagamento com a autora ao abrigo do qual pagou três das prestações acordadas. A autora apresentou resposta à exceção de pagamento parcial (cfr. fls. 27-29 dos autos). Após ter concedido às partes prazo para o exercício do contraditório relativamente à exceção de falta de competência material do tribunal para conhecer do mérito da causa, o tribunal recorrido proferiu a decisão objeto do presente recurso. I.2. A recorrente formula alegações que culminam com as seguintes conclusões: «1. Conforme resulta do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), o âmbito da jurisdição administrativa em matéria contratual não depende do carácter jurídico-administrativo do contrato.

2. Não se aplica o artigo 4.º, n.º 1, alínea d), do ETAF, dado não estarem perante a fiscalização da legalidade das normas e demais atos jurídicos praticados por sujeitos privados, designadamente concessionários, no exercício de poderes públicos; 3. A alínea f), do n.º 1 do artigo 4.º, apenas atribui competência à jurisdição administrativa para apreciar litígios de responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito público, incluindo por danos resultantes do exercício das funções política, legislativa e jurisdicional, sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 4; 4. A relação material em litígio é de natureza manifestamente privada e contratual, pois é pedido a condenação do cliente/consumidor final no pagamento de determinado montante referente aos serviços prestados de água e saneamento, sendo a causa de pedir a violação da relação sinalagmática pelo não pagamento do preço acordado e não do foro administrativo, não se alicerçando no disposto no art.º 4, n.º 1, alíneas d) e f), do ETAF, estando excluída a sua aplicação; 5. O contrato dos autos (contrato de fornecimento de água), para efeitos de critério de justiciabilidade administrativa, é um contrato de consumo, regulado no âmbito do direito privado, de uma relação de consumo, que não se celebra em substituição de qualquer ato administrativo; 6. Apesar de ser objeto de uma regulação específica, está longe de se poder considerar uma regulação baseada em normas de direito público, antes tal regulação é, pelo menos nos anos mais recentes, claramente, a proteção do consumidor no contexto de uma relação de consumo de um serviço público essencial.

7. Sempre se dirá que o contrato de fornecimento de água seria qualificado como contrato de direito privado ainda que o fornecimento de água fosse efetuado por uma entidade pública.

8. O contrato dos autos não foi expressamente submetido pelas partes a um regime substantivo de direito público; 9. A competência dos tribunais administrativos em matéria de contratos da Administração (em sentido lato) não depende (apenas) da administratividade, mas antes de outros critérios que inspiram as alíneas do artigo 4.º do ETAF, sobre o âmbito da jurisdição administrativa relativa a contratos; 10. Os contratos de fornecimento de água por empresas como a da Recorrente não entram em nenhum dos preceitos constantes do ETAF, antes ordenam-se no âmbito do direito privado: são contratos de direito privado; 11. Da interpretação do ETAF resulta que, só a ordenação dos mesmos como contratos administrativos seria suscetível de os reconduzir à jurisdição dos tribunais administrativos.

12. Os contratos de fornecimento de água não são administrativos pela simples razão de que não são objeto de uma regulação baseada em normas de direito administrativo; trata-se de contratos de consumo, em parte regulados por normas que protegem precisamente os direitos dos consumidores/utentes - Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, Lei dos Serviços Públicos Essenciais; 13. Estamos perante uma simples cobrança de dívida civil, por uma empresa privada, regulada pelas regras do direito privado.

14. A Recorrente é uma empresa privada, que não atua munida de poder soberano na sua relação com o consumidor, antes atua, perante este, em situação de paridade.

15. Não está aqui em discussão nem consubstancia o pedido ou a causa de pedir tal qual foi apresentada pela ora recorrente, a relação entre a Recorrente e os entes públicos indicados no Contrato de Parceria, 16. Muito menos a correta ou incorreta determinação do preço ou das taxas devidas pela prestação do serviços e/ou pela utilização do domínio público, está em apreço nos autos, 17. Ou sequer a validade das clausulas contratuais subjacentes à prestação do serviço não pago.

18. Estamos...

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