Acórdão nº 210/20.4TXCBR-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução28 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório 1. No âmbito do processo n.º 210/20.4TXCBR-C do Tribunal de Execução das Penas de Coimbra – Juiz 3, por despacho judicial de 22.05.2020 foi decidido julgar perdoada a pena aplicada, no processo n.º 77/15.4GBTCS, a L.

    , perdão, esse, concedido sob condição resolutiva do beneficiário não praticar infração dolosa no ano subsequente.

    1. Inconformado com a decisão recorreu o Ministério Público, formulando as seguintes conclusões: 1.ª – O perdão previsto no artigo 2.º da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, só pode ser aplicado a reclusos, condenados por sentença transitada em julgado em data anterior à da sua entrada em vigor, excluindo os condenados que não tenham ainda ingressado fisicamente no estabelecimento prisional; 2.ª – O artigo 7.º, n.º 1, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, de 6 de abril, suspendeu todos os prazos para a prática de atos processuais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19; 3.ª – Pelo que, enquanto durar a situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, está suspensa toda a tramitação processual tendente à emissão e execução de mandados de captura na sequência de condenação transitada em julgado; 4.ª – Desta forma se evitará que, durante esse mesmo período, ingressem no estabelecimento prisional novos reclusos, e assim se logrará garantir que não seja ocupado o espaço prisional deixado livre pela libertação dos reclusos abrangidos pelo perdão; 5.ª – Restringir a aplicação do perdão previsto na Lei n.º 9/2020 aos condenados que se encontram já recluídos à data da entrada em vigor daquela mesma lei, excluindo os condenados ainda não recluídos, não viola o princípio da igualdade plasmado no art. 13.º da Constituição da República Portuguesa; 4.ª – Ao perdoar a pena aplicada ao arguido L.

      no âmbito do processo n.º 77/15.4GBTCS, não estando este preso à data da entrada em vigor da Lei n.º 9/2020, o tribunal proferiu decisão ilegal, por violação do disposto no art. 2º, n.º 1, desse mesmo diploma legal.

      Nestes termos, e pelos mais que V. Exas, por certo e com sabedoria, não deixarão de suprir, concedendo-se provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogando-se a decisão recorrida, far-se-á JUSTIÇA.

    2. Foi proferido despacho de admissão do recurso.

    3. O arguido/condenado não respondeu ao recurso.

    4. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no qual, acompanhando os fundamentos do recurso, se pronunciou no sentido de o mesmo merecer provimento.

    5. Cumprido o n.º 2, do artigo 417.º do CPP, o recorrido defendeu a correção da decisão em crise e, logo, a improcedência do recurso.

    6. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cabendo, pois, decidir.

  2. Fundamentação 1. Delimitação do objeto do recurso Tendo presente as conclusões, pelas quais se delimita o objeto do recurso, no caso em apreço importa decidir se o despacho recorrido, ao aplicar o perdão à pena de prisão subsidiária, resultante da conversão da pena de multa em que o arguido foi condenado por sentença transitada em julgado em data anterior à da entrada em vigor da Lei n.º 9/2020, de 10.04.2020, violou o artigo 2.º do mesmo diploma.

    1. A decisão recorrida Ficou a constar do despacho em crise [transcrição]: L.

      foi condenado, por decisão proferida no âmbito do processo nº 77/15.4GBTCS, transitada em julgado em 21.05.2018, na pena de 120 dias de multa, por crime de condução de veículo sem habilitação legal.

      Por decisão transitada em julgado em 29/01/2019, foi a dita pena convertida em 80 dias de prisão subsidiária.

      O condenado ainda não iniciou o cumprimento da aludida pena.

      Do exame do respetivo CRC resulta que o condenado não tem qualquer outra pena de prisão para cumprir.

      Em 11 de Abril de 2020, entrou em vigor a L 9/2020, de 10 de Abril, que no art. 2º estatui que “1 - São perdoadas as penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração igual ou inferior a dois anos./ 2 – São também perdoados os períodos remanescentes das penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração superior à referida no número anterior, se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral for igual ou inferior a dois anos, e o recluso tiver cumprido, pelo menos, metade da pena./3 – O perdão referido nos números anteriores abrange a prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa e a execução da pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição e, em caso de cúmulo jurídico, incide sobre a pena única./4 - Em caso de condenação do mesmo recluso em penas sucessivas sem que haja cúmulo jurídico, o perdão incide apenas sobre o remanescente do somatório dessas penas, se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral for igual ou inferior a dois anos./5 - Relativamente a condenações em penas de substituição, o perdão a que se refere este artigo só deve ser aplicado se houver lugar à revogação ou suspensão./6 - Ainda que também tenham sido condenados pela prática de outros crimes, não podem ser beneficiários do perdão referido nos n.ºs 1 e 2 os condenados pela prática: a) Do crime de homicídio previsto nos artigos 131.º, 132.º e 133.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, na sua redação atual; b) Do crime de violência doméstica e de maus tratos previstos, respetivamente, nos artigos 152.º e 152.º-A do Código Penal; c) De crimes contra a liberdade pessoal, previstos no capítulo IV do título I do livro II do Código Penal; d) De crimes contra a liberdade sexual e autodeterminação sexual, previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal; e) Dos crimes previstos na alínea a) do n.º 2 e no n.º 3 do artigo 210.º do Código Penal, ou previstos nessa alínea e nesse número em conjugação com o artigo 211.º do mesmo Código; f) De crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal, previstos no título III do livro II do Código Penal; g) Dos crimes previstos nos artigos 272.º, 273.º e 274.º do Código Penal, quando tenham sido cometidos com dolo; h) Do crime previsto no artigo 299.º do Código Penal; i) Pelo crime previsto no artigo 368.º-A do Código Penal; j) Dos crimes previstos nos artigos 372.º, 373.º e 374.º do Código...

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