Acórdão nº 150/14.6GBILH.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMOREIRA RAMOS
Data da Resolução21 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 150/14.6GBILH.P2 Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:I – RELATÓRIO:Inconformado com o despacho proferido em 16/04/2020 no qual se decidiu indeferir, por manifesta falta de fundamento legal, a sua pretensão de que fosse declarada extinta, por perdão, a pena em que o mesmo foi condenando no âmbito dos presentes autos, nos termos do artigo 3º, nº 1, da Lei nº 9/2020, de 10 de abril, dele veio o arguido/condenado arguido B… maio interpor recurso nos termos que constam destes autos (ref.ª 10069226), que se consideram aqui reproduzidos, tendo formulado, a final, as seguintes conclusões (transcrição): A/ Tendo o espírito que presidiu à Lei 9/2020 de 10 de abril sido evitar a propagaçãodovírus“Covid-19”nomeioprisional,operdãonelaconsagrado aplica-se a condenados por sentença transitada em julgado à data da sua entrada em vigor, quer estejam ou não recluídos, sendo, como se sabe, de menos risco um recluso estar infetado do que um condenado que entre após a sua entrada em vigor (dada a dimensão da propagação mundial da doença a essa data) para a prisão; B/ Caso fosse intenção do legislador restringir a sua aplicação, apenas, a reclusos (o que, como se disse, dada o objetivo que se pretende – erradicar a entrada e propagação da doença no meio prisional, jamais se alcançaria com a sua aplicação, apenas, a esses) a Lei tê-lo-ia previsto. Não o tendo feito, não se vê porque razão se possa o aplicador da lei afastar do regime legal consagrado para os indultos e perdões de penas estabelecido na Lei geral; C/ De modo a evitar a entrada e propagação da doença no meio prisional, esta interpretação é a única possível, padecendo, pois, de inconstitucionalidade a sua aplicação, apenas, a condenados reclusos; D/ Beneficia, pois, o recorrente condenado, mas não recluído, do regime excecional do perdão consagrado na Lei 9/2020 de 10 de abril, por a sua condenação não ultrapassar a pena de 2 anos e, igualmente, por à data da entrada em vigor daquela a decisão de condenação já estar transitada em julgado.

O recurso foi regularmente admitido (ref.ª 111176242).

O Ministério Público veio responder nos termos vertidos nos autos e aqui tidos como renovados (ref.ª 10127417), concluindo no sentido de que deveria julgar-se improcedente o recurso apresentado, mantendo a decisão recorrida.

O Ex.mo PGA elaborou o parecer que consta dos autos, aqui tido como reproduzido (refª 13731088), através do qual preconizou que, caso não seja sumariamente rejeitado por ser manifesta a sua improcedência, deverá o recurso ser julgado não provido, confirmando-se o despacho impugnado.

No cumprimento do artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, o recorrente veio responder nos moldes insertos nos autos e aqui considerados como renovados (refª. 297660), para anotar que reiterava as conclusões de recurso e que o recurso deveria merecer total provimento.

Após exame preliminar, colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir, nada obstando a tal.

II – FUNDAMENTAÇÃO: a) a decisão recorrida:O despacho recorrido é do teor seguinte (transcrição): I – O arguido B… maio veio requerer que este Tribunal declare extinta, por perdão, a pena em que o mesmo foi condenando no âmbito dos presentes autos, nos termos do artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril.

O Ministério Público promoveu o indeferimento do requerido por inexistência de fundamento legal para o efeito.

* II – Cumpre apreciar e decidir.

A Lei n.º 9/2020, de 10 de abril veio prever um regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID -19, prevendo o seu artigo 1.º, n.º 1, al. a) um perdão parcial de penas de prisão, que concretamente se mostra positivado no artigo 2.º da predita Lei.

Na verdade, se analisarmos o regime de exceção assinalado, sem necessidade de grande esforço hermenêutico, concluiremos que o regime de perdão das penas de prisão só tem cabimento relativamente aos condenados que se encontrem em situação de reclusão, o que, objetivamente, não é a situação do arguido nestes autos.

Cremos que só esta interpretação converge com o escopo da previsão legislativa que se centra em impedir a propagação – apressada, insidiosa e imprevisível – do vírus denominado de Coronavírus – COVID19, que originou já o decretamento pela OMS de pandemia por COVID19, nos estabelecimentos prisionais, estando-lhe subjacente evidentes razões de ordem sanitária e de saúde públicas.

Pelo que, não tendo o arguido dado início à pena de prisão em que foi condenando nestes autos não se encontra a coberto da previsão legislativa supra enunciada, deverá, nessa medida, ser indeferida a sua pretensão por falta de fundamento legal.

O que decidirei.

*III – Pelo exposto, por manifesta falta de fundamento legal, indefiro a pretensão do arguido.

* b) apreciação do mérito:Antes de mais, convirá recordar que, conforme jurisprudência pacífica[1], de resto, na melhor interpretação do artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, o objeto do recurso deve ater-se às conclusões apresentadas pelo recorrente, devendo sublinhar-se também que importa apreciar apenas as questões concretas que resultem das conclusões trazidas à discussão, o que não significa que cada destacada conclusão encerre uma individualizada questão a tratar, tal como sucede no caso vertente.

*Neste contexto, e em face daquilo que se apreende das efetivas conclusões trazidas à discussão pelo recorrente importa saber apenas se, apesar de não estar recluído, deverá ser-lhe aplicado o regime excecional do perdão consagrado na Lei 9/2020 de 10 de abril, verificados que estão os demais pressupostos.

Vejamos, pois.

O recorrente discorda do decidido, pois que entende, em suma, que, sendo o espírito que presidiu à publicação da Lei nº 9/2020, de 10/04, o de evitar a propagação do vírus “Covid-19” no meio prisional, o perdão nela consagrado deverá aplicar-se a condenados por sentença transitada em julgado à data da sua entrada em vigor, quer estejam ou não recluídos, sendo, como se sabe, de menos risco um recluso estar infetado, do que um condenado que entre após a sua entrada em vigor (dada a dimensão da propagação mundial da doença a essa data) para a prisão, sublinhando ainda que, caso fosse intenção do legislador restringir a sua aplicação apenas a reclusos, o que comprometeria o objetivo acima referido e aqui pretendido, a lei tê-lo-ia...

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