Acórdão nº 2160/18.5T9MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ CARRETO
Data da Resolução14 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Rec nº 2160/18.5T9MTS.P1 TRP 1ª Secção Criminal Acordam em conferência os juízes no Tribunal da Relação do Porto No Proc. C. S. nº 2160/18.5T9MTS do Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Local Criminal de Matosinhos - Juiz 3 em que é arguido B… C… deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 21.808,30€, a título de indemnização pelos danos sofridos, sendo 11.808,30€ a título de danos patrimoniais e 10.000,00€ a título de danos não patrimoniais, e o demais que se liquidasse em execução de sentença, conforme requerimento de fls. 386.

Por acórdão de 9/3/2020 foi decidido: Por todo o exposto, julgo: - Improcedente a acusação deduzida contra o arguido B… pela prática de um crime de ofensa à integridade física negligente, previsto e punido pelo art.º 148 n.º 1 (por não constituir a conduta crime), pelo que dela o absolvo.

- Procedente a acusação deduzida contra o arguido B… mas pela prática da contra-ordenação prevista e punida pelo art.º 38 n.º 1 r) e n.º 2 do Decreto-Lei 315/2009 (para a qual se convola a incriminação constante da pronúncia), condenando o mesmo na coima de 750€.

- Parcialmente provado o pedido de indemnização civil deduzido pelo lesado C… contra o arguido, condenando este no pagamento àquele da quantia de 608,12€, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a data da notificação do pedido cível, a título de indemnização por danos patrimoniais, e no pagamento da quantia de 3.500,00€, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a data desta sentença, a título de compensação por danos não patrimoniais.

- No mais julgo o pedido de indemnização civil improcedente, dele absolvendo o demandado.

- Condeno o arguido nas custas criminais do processo, fixando em 1 UC a taxa de justiça - As custas do pedido cível ficam a cargo do demandante e demandado, na proporção dos respectivos decaimentos.” Recorre o lesado o qual no final da respectiva motivação apresenta as seguintes conclusões: I.

O presente recurso destina-se à impugnação da Sentença, proferida pelo Tribunal a quo, que judiciou parcialmente provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo Recorrente, condenando o Recorrido no pagamento à aquele da quantia de 608,12€, acrescidos de juros de mora à taxa legal, desde a data da notificação do pedido cível, a título de indemnização por danos patrimoniais, e no pagamento da quantia de 3.500,00€, acrescidos de juros de mora à taxa legal, desde a data da Sentença, a título de compensação por danos não patrimoniais.

II.

O Tribunal a quo, no que se refere ao pedido de indemnização civil e ao quantum indemnizatório, judiciou da seguinte forma: “No caso presente, resultou provado que o arguido, em desrespeito pelos deveres de cuidado que sobre ele impendiam, permitiu que os cães que estavam à sua guarda saíssem da jaula, corressem em direcção ao ofendido e um deles o mordesse na perna, provocando-lhe os danos físicos descritos nos factos assentes.

Verificado está, pois, o condicionalismo do art.º 71 do Código de Processo Penal, do que resulta também a verificação dos 4 primeiros pressupostos da obrigação de indemnizar (existência de acção ilícita e culposa, com ocorrência de nexo de causalidade entre a conduta do agente e as lesões sofridas).

[…] Ponderando tudo quanto se expôs, entende-se como adequada a fixação da compensação devida ao ofendido, pelos danos não patrimoniais sofridos, em 3.500,00€.

Uma vez que a definição do montante supra é efectuada por referência à data desta sentença, os juros de mora serão devidos desde esta decisão actualizadora e não desde a data da notificação.

No que se reporta aos danos patrimoniais peticionados e decorrentes da mordedura do animal, constata-se que em transportes para tratamentos e em medicamentos o ofendido gastou 608,12€.

[…] O ofendido é livre de escolher onde quer ser tratado. Todavia, nem tudo o que o ofendido gaste nos tratamentos que entende fazer deve ser suportado por aquele que às lesões deu causa: o arguido. A este deverá ser imputado o ressarcimento das despesas que tiveram a sua causa directa e necessária na sua conduta. Ora não há dúvida de que o ofendido carecia de tratamento. Este começou a ser-lhe prestado no hospital D… e no hospital E…, onde supostamente deveria ter continuado a ser acompanhado. A dada altura, porém, o ofendido decidiu-se pelo sector privado, sem que tenha sido demonstrado que aqueles hospitais não lhe prestaram ou podiam continuar a prestar-lhe os cuidados de que carecia. Tratando-se de uma opção livre do ofendido, considera-se que os respectivos custos devem por si ser suportados e não imputados ao arguido, por não serem despesas necessariamente imputáveis à conduta.

Improcede, pois, o peticionado em todo o que não se reporta ao custo das deslocações (a terem que ser feitas para qualquer tipo de instituição) e medicamentos adquiridos em farmácia, para uso em casa, sendo que esta despesas ascendem a 608,12€.

[…] Sobre o montante de 608,12€ são devidos juros de mora à taxa legal, desde a data da notificação do pedido cível à demandada, nos termos do disposto no art.º 805 n.º 1 e 3 do Código Civil.

III.

O Tribunal a quo não logrou de se libertar da ideia preconcebida de que, por um lado, os danos não patrimoniais sofridos pelo Recorrente, por conta de ter sido numa perna em que este já tinha sofrido um problema médico, invalidavam a dor e perturbações sofridas, por conta da conduta do Recorrido, e, por outro, que só pelo facto de o Recorrente ter-se socorrido do serviço privado de cuidados médicos, o valor por si gasto não era consequência direta da conduta do Recorrido, apesar de ter sido para tratamento de lesões que ocorreram como resultado da conduta do Recorrido.

IV.

O Recorrente detém de legitimidade e capacidade judiciária para deduzir o pedido de indemnização civil, (cfr. n.º 1, do art.º 74.º, do Código de Processo Penal, e art.º 11.º, e alínea d), do art.º 12.º, do Código de Processo Civil, ex vi art.º 4.º, do Código de Processo Penal), porquanto, é a pessoa que sofreu os danos originados pela praticada da contraordenação pela qual o Recorrido foi condenando na Sentença, da qual ora se recorre.

V.

O mencionado pedido de indemnização civil deduzido foi fundado em responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, ao abrigo do art.º 483.º, do Código Civil, ex vi art.º 129.º, do Código Penal.

VI.

O Recorrente, com o pedido de indemnização civil, pretende ser ressarcido pelos danos patrimoniais e não patrimoniais originados pela mordida do canídeo.

VII.

O Recorrente, por conta da conduta do Recorrido, sofreu as lesões sequentes, no seu membro inferior esquerdo: i.

Área cicatricial nacarada com áreas acastanhadas, com 16 por 11 cm de maiores dimensões, com formato retangular, desde a transição do terço superior com o terço médio da face anterior da coxa, estendendo-se até à transição do terço médio com o terço inferior da coxa, - correspondente a zona dadora de enxerto -, visível à distância de contacto social e de proximidade; ii.

Área cicatricial circular com 21 por 6 cm de maiores dimensões na face anterior do joelho, com relevo, - com zona central de pele sem alterações e bordos hiperpigmentados -, provocando dismorfia, - área rede enxerto; iii.

Área cicatricial rosa, com relevo e bordos hiperpigmentados, com 16 por 9 cm de maiores dimensões, estendendo-se desde o terço superior da face interna da perna até à transição do terço médio com o terço inferior da face interna da perna, implicando queixas de dor à palpação profunda da mesma, - área dadora e recetora de enxerto; iv.

Duas cicatrizes hiperpigmentadas, horizontais, com 1,5 cm de comprimento e outra com 2 cm de comprimento, paralelas entre si, localizada externamente às duas cicatrizes atrás mencionadas; v.

Entre as duas cicatrizes horizontais e a cicatriz arciforme, apresenta tumefação mole, com dores à palpação da mesma, por se tratar do local onde foi mordido pelo canídeo; vi.

Edema ligeiro, ao nível da perna esquerda, de predomínio no seu terço inferior, que resultou num período de doença fixável em 249 dias, com afetação da capacidade de trabalho geral, sendo que desse tempo, 10 dos dias foram em regime de internamento hospitalar, e com afetação da capacidade de trabalho profissional, igualmente por 249 dias, da qual 10 deles foram em regime de internamento hospitalar.

VIII.

As cicatrizes e sequelas sofridas foram múltiplas e perfeitamente visíveis a uma distância de contacto social e proximidade, sendo permanentes.

IX.

Com as lesões e sequelas supra referenciadas, o Recorrente teve intensas dores, nomeadamente ao se deslocar, que, ainda no presente dia, permanecem, interferindo sobre a sua capacidade de laboração, causando uma diminuição no seu rendimento.

X.

Todos estes danos foram consequência direta da conduta do Recorrido, sendo, portanto, indemnizáveis, mediante uma compensação, por danos não patrimoniais, e uma indemnização, pelos danos patrimoniais sofridos.

XI.

Assim sendo, e seguindo, nesta parte, a posição propalada pelo Tribunal a quo, entendemos que se encontram preenchidos os pressupostos do art.º 483.º, do Código Civil.

XII.

Porém, o ora Recorrente não pode é concordar com o quantum indemnizatório fixado pelo Tribunal a quo, atendendo aos danos supra mencionados, nomeadamente quando conjugados com os factos dados como provados.

XIII.

No que diz respeito aos danos não patrimoniais, o Tribunal a quo fixou a compensação em 3.500,00€, acrescido de juros, calculados a partir da data da Sentença.

XIV.

Ora, o montante desta compensação peca por defeito, atendendo aos danos supra expostos e ao próprio critério de equidade, (cfr. art.º 494.º, do Código Civil), não podendo o Tribunal a quo ignorar as dores e transtornos emocionais causados ao Recorrente, por conta...

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