Acórdão nº 10221/18.4T8LRS.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelLUÍS FILIPE SOUSA
Data da Resolução27 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO AA e mulher BB interpuseram ação declarativa de condenação contra CC, SA, formulando os seguintes pedidos: condenação do Réu a pagar-lhes capital e juros vencidos e garantidos, perfazendo € 57.000,00 à data de interposição da acção, e juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento, e ainda € 3.000,00 a título de danos não patrimoniais.

Para tal, alegam que eram clientes do então denominado DD - em cujos direitos e obrigações o R. sucedeu - sendo titulares de uma conta bancária na agência da (...) onde faziam os seus movimentos e poupanças, e que o Gerente daquela agência, que conhecia o perfil conservador dos AA. e que sabia que estes sempre aplicavam o seu dinheiro em depósitos a prazo, disse-lhes que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo DD, com juros semestrais, e que poderiam levantar o capital e juros quando entendessem, mediante aviso da agência com três dias de antecedência.

E com a convicção de que assim era os AA., em Abril de 2006, investiram € 50.000,00 convencidos de que estavam a aplicar esse montante num produto com as características de um depósito a prazo, e só posteriormente, quando o Banco deixou de lhes pagar juros, souberam ter investido em obrigações subordinadas (...) 2006, sobre as quais nenhuma documentação lhes foi entregue nem prestada qualquer informação.

Até Novembro de 2015, sempre o Banco lhes pagou os juros do capital, circunstância que lhes transmitiu segurança e nunca os alertou para que o investimento não era aquele que estavam convencidos que tinham efectuado. Quando nessa data o banco deixou de lhes pagar juros passou a atribuir a retiponsabilidade pelo pagamento à (...), sociedade cuja existência os AA. desconheciam, pensando até então que (...) era a denominação bancária do depósito em que haviam aplicado o seu dinheiro, e desde então os funcionários do R. da agência da (...) aconselharam os AA. a esperar pela maturidade das obrigações.

No entanto, na data de maturidade das obrigações, em Maio de 2016, o R. não restituiu o montante investido aos AA. apesar de o Gerente do balcão lhes ter apresentado o Banco R. como garante da aplicação, estando assim os AA. Privados de usar o seu dinheiro, o que lhes causa dificuldades financeiras na gestão das suas vidas, e passaram a estar em permanente preocupação e ansiedade, tristes, sem alegria de viver, sem perspectivas de futuro, receando não recuperar o capital investido que eram as suas economias de uma vida.

O Réu contestou, começando por invocar a excepção de prescrição da retiponsabilidade de intermediário financeiro, mais impugnando a matéria alegada pelos AA..

Referiu que o Autor sendo embora um investidor conservador era pessoa informada, consciente e cuidadosa com os seus investimentos, e que sabia perfeitamente que a obrigação (...) não era do Banco, tendo recebido informação adequada, assim como sabia que este actuava apenas na qualidade de simples intermediário financeiro e que não estava garantido o pagamento do produto no seu prazo de maturidade.

Concluiu pela procedência da excepção de prescrição ou, assim não se entendendo, pela improcedência da acção.

Os AA. Responderam, sustentando a aplicação do prazo de prescrição ordinária previsto no artigo 309º do Código Civil e não o prazo previsto no artigo 324º, nº 2, do Código dos Valores Mobiliários. E para o caso de assim não se entender, invocaram a nulidade do contrato de intermediação financeira.

Tudo para concluir pela improcedência da matéria de excepção invocada perlo Banco R..

Após julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dipositivo: «Nestes termos e pelos fundamentos supra expostos, o Tribunal julga: - Improcedente a excepção de prescrição invocada pelo R., - Procedente parcialmente a acção, e, em consequência - Condena o R. a pagar aos AA. a quantia de € 50.000,00 acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento; - Absolve o R. do pedido relativo a danos não patrimoniais, no montante de € 3.000,00.» * Não se conformando com a decisão, dela apelou o requerente, formulando, no final das suas alegações, as seguintes: «CONCLUSÕES I. O Banco Recorrente não pode concordar com a matéria de facto dada como provada descrita nos pontos 3, 6, 8, 17, 18 e ainda com a matéria dada como não provada vertida na alínea D. II. A modificação da matéria de facto impõe-se pela análise do depoimento da testemunha LB, registado no sistema Citius no ficheiro com o número 20191202095645_5862125_2871206 nos trechos acima identificados bem como pela análise dos seguintes documentos: nota informativa da Obrigações (...) 2006, nota interna do marketing sobre produto, argumentário de venda e boletim de subscrição assinado pelo cliente.

III. Tendo em conta estes elementos de prova entende o Recorrente que os factos provados 3, 6, 8 e 17 deverão assim passar a ter a seguinte redação: 3 - Em 10 de Abril de 2006 o gerente do Banco Réu da agência da (...) contactou os AA. dizendo-lhes que tinha uma aplicação semelhante nas suas características a um depósito a prazo, com capital garantido e com rentabilidade assegurada com taxa de juros melhor que depósito a prazo.

6 - O gerente da agência assegurou-lhes que a aplicação em causa tinha capital garantido, vendendo-lhes o produto como se fosse semelhante no seu funcionamento a um depósito a prazo, com taxa de juros melhor do que a de um depósito a prazo, com mobilização de capital quando os AA. entendessem, bastando avisar o Banco que este logo arranjaria interessados na recompra do produto.

8 - Os AA. não foram informados da característica da subordinação.

17 - O que motivou o investimento por parte dos AA. foi a circunstância de o gerente da agência lhes ter dito que o capital era garantido, com juros semestrais, e que poderiam levantar o capital desde que fosse encontrado um comprador para o produto.

IV. Entende ainda que os factos 9, 15 e 18 deverão ser dados como não provados.

V. Com base os elementos de prova acima assinalados deverá ainda ser dado como provado o seguinte facto: D - No momento da subscrição o R., através de algum dos seus funcionários, informou o A. marido de que a única forma de o investidor liquidar o produto de forma unilateral seria transmitindo as suas obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso.

VI. Entende o Banco Recorrente não ter sido prestada qualquer garantia do banco relativamente ao reembolso do produto em causa.

VII. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado teria que ver com a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao subscritor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era um produto sem risco e com capital garantido, não transmitindo a característica da subordinação ou a possibilidade de insolvência da emitente, configura a prestação de uma informação falsa.

VIII. Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

IX.O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exatamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

X. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado RISCO GERAL DE INCUMPRIMENTO! XI.A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! XII. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica -, em 2006, dez anos antes! XIII. A (...) era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

XIV. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da (...).

XV. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! XVI.A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela (...) seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no DD.

XVII. O risco DD ou risco (...), da perspetiva da insolvência era também equivalente! XVIII. A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

XIX. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objetivamente razoáveis e previsíveis.

XX. A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação… XXI. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do |tulo e correspondente ao respetivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! XXII.A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos financeiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exatamente nos termos que vimos de expor.

XXIII. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de...

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