Acórdão nº 55/20.1T9RGR.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelGUILHERME CASTANHEIRA
Data da Resolução15 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO: No nuipc 55/20.1T9RGR (contra-ordenação), que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca dos Açores, Juízo Local Criminal da Ribeira Grande, AA impugnou judicialmente a “decisão administrativa da INSPECÇÃO REGIONAL DO AMBIENTE, datada de 13 de Novembro de 2019”, pela qual “foi aplicada ao recorrente, residente na Rua ………………………., Ribeira Grande, a coima de 25.000,00 €, e ainda a sanção acessória de no prazo de 6 (seis) meses obter as licenças, permissões ou autorizações exigíveis para as construções realizadas, ou, na impossibilidade de obter as legais (e regulamentares) licenças, permissões ou autorizações para a construção, naquele local, das obras executadas em datas não concretamente apuradas do ano de 2005 e Outubro de 2019, no prazo de 120 dias, a contar do (eventual) indeferimento remover toda a obra ilegalmente executada, repondo as alterações de relevo, e, em qualquer dos casos, e até ao fim do prazo de 120 dias, requerer aos Serviços de Ambiente de São Miguel uma inspecção ao local destinada a verificar e a informar a regularização desta situação”.

* Realizada audiência, foi proferida sentença, pela qual, “tendo em atenção as considerações produzidas e as normas legais citadas”, se julgou “procedente o presente recurso de impugnação judicial interposto” e se decidiu “julgar extinto o procedimento contra-ordenacional por prescrição”.

* Inconformado com tal decisão, dela recorreu o Ministério Público, formulando as seguintes conclusões: “1. Por decisão administrativa da INSPECÇÃO REGIONAL DO AMBIENTE, datada de 13 de Novembro de 2019, foi aplicada ao recorrente AA, residente na …………………, Ribeira Grande, a coima de 25.000,00 € e ainda a sanção acessória de no prazo de 6 (seis) meses obter as licenças, permissões ou autorizações exigíveis para as construções realizadas, ou, na impossibilidade de obter as legais (e regulamentares) licenças, permissões ou autorizações para a construção, naquele local, das obras executadas em datas não concretamente apuradas do ano de 2005 e Outubro de 2019, no prazo de 120 dias, a contar do (eventual) indeferimento remover toda a obra ilegalmente executada, repondo as alterações de relevo, e, em qualquer dos casos, e até ao fim do prazo de 120 dias, requerer aos Serviços de Ambiente de São Miguel uma inspecção ao local destinada a verificar e a informar a regularização desta situação.

  1. Interposto o recurso de impugnação de contra-ordenação, o tribunal declarou prescrita a coima.

  2. Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos: 1. O recorrente é proprietário de um prédio urbano onde explora um comércio de Snack Bar ……………..”, sito junto ao acesso à praia dos Moinhos (coordenadas ……………….. W), freguesia de Porto Formoso, concelho da Ribeira Grande. 2. Este prédio está inscrito na titularidade do recorrente desde 1987. 3. A edificação original era constituída por uma casa baixa telhada com quintal, moinho ou engenho de moer cereais, com a área coberta de 40m2 e a área descoberta de 300 m2. 4. Este prédio confina, a poente, com a Ribeira dos Limos. 5. Antes do ano 2001 existia neste prédio uma estrutura fixa de madeira do tipo esplanada de apoio ao Snack-Bar, ao lado do edifício do moinho, que confrontava a poente com a referida Ribeira dos Limos. 6. Em datas não concretamente apuradas, mas no ano de 2005, o arguido procedeu à construção de uma rampa em cimento em direcção ao real da margem do mar, com respectivo muro de suporte; fez o arranque do segundo piso sobre a cobertura do edifício em cimento e blocos executado em 2004, também ele em cimento e blocos, assente sobre placa de cobertura, a encostar ao edifício do velho moinho. 7.( ...). Todas as referidas obras encontram-se a menos de 50 metros da linha máxima de maré (praia mar) da Praia dos Moinhos (a Norte) e, na sua maior parte, dentro da margem da Ribeira dos Limos (a Poente). 10. Em 5 de Janeiro de 2018 tais obras ainda não tinham sido demolidas.

  3. Na fundamentação da decisão a Mma Juíza escreveu: A prescrição, como é sabido, consiste na extinção de um direito em virtude do decurso de certo período de tempo e a verificar-se essa excepção, no caso em apreço, a mesma tem por efeito a extinção do procedimento contra-ordenacional. No âmbito contra-ordenacional há prescrição quando o Estado, por não o haver exercido em tempo considerado útil, perde o direito de perseguir contra-ordenacionalmente o agente de uma contra-ordenação ou de executar a coima que já lhe tiverem sido imposta. Antes de mais, coloca-se a questão do momento relevante para o início de contagem do prazo de prescrição. O momento da prática do facto ilícito, em matéria de contra-ordenações é definido pelo artigo 6º da LQCOA como segue: o facto considera-se praticado no momento em que o agente actuou, ou no caso de omissão, deveria ter actuado, independentemente do momento em que resultado típico se tenha produzido. As contra-ordenações preenchidas pela conduta do arguido consistem em intervenções/construções não autorizadas em área considerada do domínio público hídrico sem a devida autorização/licença.

  4. Assim, referindo-se que o recorrente executou as obras entre 2005 e Outubro de 2009, é esta a data a considerar para o início do prazo prescricional. Nos termos do disposto no artigo 40.°, n.º 1, da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, "o procedimento pelas contra-ordenações graves e muito graves prescreve logo que sobre a prática da contra-ordenação haja decorrido o prazo de cinco anos, sem prejuízo das causas de interrupção e suspensão previstas no regime geral". Por outro lado, dispõe o artigo 27.º-A do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, que: 1 No caso presente, temos de relevar os factos pertinentes para efeitos de determinação do eventual decurso desse prazo extintivo: - a contra-ordenação imputada ao recorrente foi praticada entre 2005 e Outubro de 2009; - a decisão administrativa é datada de 13 de Novembro de 2019.

  5. Não se verificando nenhuma causa de suspensão da alínea a) do artigo 27.º do RGCO, a suspensão não pode ser superior a 6 meses (n.º 3 do referido artigo).

    Assim sendo, terá de concluir-se que em 13 de Novembro de 2019 há muito que havia decorrido o prazo prescricional - 8 anos - Outubro de 2017.

  6. Da não Prescrição da coima Os factos dos presentes autos consubstanciam infracções de natureza continuada, pois o arguido construiu em DPH (Domínio Público Marítimo) sem estar na posse de prévio título (licença ou concessão), pelo que a contagem (dos prazos) da prescrição do procedimento só se iniciará com a cessação da infracção.

    Nesse sentido Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa, Processo 5202/01, 3ª Secção, de 07/11/2001, que para o que aqui importa fixa o seguinte entendimento: “I - A contra-ordenação p. e p. nos termos dos artigos 1.º, n.º 1-a) e 54.º, n.ºs 1-a) e 2 do DL n.º 445/91, de 20 de Novembro, com a redacção da Lei n.º 29/92, de 5 de Setembro e DL n.º 250/94, de 15 de Outubro (edificação de obra de construção civil sem licença municipal), tem natureza de infração de execução permanente (que não instantânea), prolongando-se por isso a sua execução no tempo enquanto a obra estiver levantada e não licenciada; II - Por isso, nos termos do disposto no art. 119.º, n.º 2, al. a) do CP, aplicável "ex vi" do art. 32.º do DL n.º 433/82, de 27 de Outubro, o prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional só começa a correr no dia em que cessar a consumação. III - É de considerar como "obra de construção civil" sujeita ao regime de licenciamento de obras particulares, e portanto de integrar na previsão normativa das aludidas disposições do DL n.º 445/91, o levantamento e montagem de uma estrutura metálica amovível, com cobertura de plástico e pavimento em betão, com área aproximada de 6.400 m2, obra feita pela arguida, sem licenciamento, num terreno de que é proprietária”.

  7. Ou Acórdão nº TRL_690/09.9TBSSB.L1-9 de 03-12-2009: O prazo de contagem da prescrição não se conta a partir da prática da contra-ordenação, mas a partir do momento em que o facto se tiver consumado ou cessado, de acordo com o disposto no art.º 119.º n.ºs 1 e 4 do CP], aplicável ex vi do art.º 32.º do RGCOC.

    Neste sentido: Mendes, António de Oliveira e Cabral, José dos Santos, Notas ao Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, 3.ª edição, Coimbra.

  8. No caso dos autos, trata-se de uma contra-ordenação duradoura ou permanente, em que o prazo de prescrição só começa a contar a partir do momento da cessação da situação antijurídica, uma vez que a persistência da antijuridicidade depende da vontade do arguido.

    A lesão dos bens jurídicos em causa, prolongou-se no tempo, pelo menos desde 2009, até à data da audiência de julgamento. A consumação da contra-ordenação ocorre com o início da obra, a qual marca o momento a partir do qual começa a lesão do bem jurídico tutelado pela lei, contudo, só termina quando cessa a lesão.

  9. Daí decorre que a prescrição do procedimento contra-ordenacional ainda não começou a correr. Tal só ocorrerá quando cessar a consumação, ou seja, quando a escavação for tapada ou obtida licença camarária para a manter (Acórdão nº TRL_690/09.9TBSSB.L1-9 de 03-12-2009).

    11. No Ac. TRG, no processo de contraordenação n.º 4723/12.3TBBRG, decidiu-se: Entendemos, tal como o tribunal, que não ocorre no caso vertente, a existência de caso julgado ou qualquer violação do princípio do ne bis in idem; o que sucedeu foi que a arguida ora recorrente persistiu em continuar a exercer a sua atividade, sem para tal estar devidamente licenciada e fê-lo mesmo após ter sido alertada para o facto, e nos mesmos moldes em que o havia feito anteriormente. A sua conduta é praticada de forma continuada, mas por referência a factos pelos quais já foi anteriormente condenada.

  10. Ou mais recentemente, Ac.TRP, processo 5955/18.6T8MTS.P1 de 21-10-2019: I - Havendo o cometimento da contra-ordenação, por falta de licença, com a abertura do...

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