Acórdão nº 2981/19.1T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelANTÓNIO SANTOS
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL do Tribunal da Relação de LISBOA 1.

- Relatório A [ ….& FILHOS,S.A] . instaurou – em 8/2/2019 - a presente acção especial de consignação de depósito contra B [ ANA …..] , peticionando que sendo a mesma julgada provada e procedente, seja admitida a consignação que efectuada junto da Caixa Geral de Depósitos no valor de €8.325,00, referente às rendas de Janeiro de 2013 a Fevereiro de 2019 acrescido de 50% de indemnização da quantia devida.

1.1 - Para tanto aduziu a requente, em síntese, que : - Em 27 de Setembro de 1939 foi celebrado um contrato de arrendamento referente à loja sita nos números 115 e 117 ( Loja 1) da Rua da Prata a números .. e … da Rua de São Nicolau, com entrada pelo número … da Rua da Prata e a 26 de Novembro de 1954 um contrato de arrendamento referente à loja sita no número …. ( Loja 2 ), do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de São Nicolau sob o artigo XX; - Já em 4 de Julho de 1983 foi celebrado entre a Autora e Mário …. e mulher, Maria …., um contrato de trespasse, que teve como objecto as Lojas 1 e 2, transmitindo-se então para a autora a posição contratual do arrendamento , passando consequentemente a ser a arrendatária das Lojas identificadas supra; - Por sua vez, desde 5 de Junho de 2018 que a Ré é dona e legitima proprietária da fracção autónoma onde se mostram instaladas as Lojas 1 e 2, , situação que apenas chegou ao conhecimento da autora a 10 de Janeiro de 2019 ; - Sendo o montante da renda mensal das Lojas 1 e 2 do valor de € 75,00, ocorre que apenas liquidou a Autora as rendas até Dezembro de 2012, e isto porque perante as sucessivas aquisições do imóvel das lojas locadas nunca logrou apurar quem era o respectivo proprietário e, consequentemente, a quem deveria pagar as rendas; - O aludido desconhecimento apenas cessou quando a 10 de Janeiro de 2019, veio a Autora a tomar conhecimento de Notificação Judicial Avulsa apresentada pela ora Ré e que lhe comunicava a resolução dos contratos de arrendamento referentes à Loja 1 e 2 , por falta de pagamento da renda, e que a dívida resultante da falta de pagamento das rendas vencidas, acrescidas de juros de mora à taxa legal em vigor, correspondia ao montante total de € 6.638,58 , sendo € 4.500,00 referente às rendas vencidas e não pagas e € 2.138,58 aos juros de mora vencidos; - Ocorre que, pretendendo a Autora fazer cessar a mora e obstar aos efeitos da resolução [ mediante o pagamento das rendas vencidas acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida ], solicitou à Ré que informasse o IBAN para o qual deveria ser transferida a quantia de € 6.975,00, respeitantes às rendas em dívida relativas a Janeiro de 2013 a Janeiro de 2019, acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida, mas, não obstante as diversas tentativas efectuadas para que a Ré informasse o IBAN para onde deveria ser transferida a quantia em causa, não veio a Ré, até à data, a fornecer tal informação.

- Perante o exposto, e na qualidade de arrendatária, não tem assim a autora outra opção senão avançar com a consignação em depósito, em conformidade com os preceitos previstos no n.º 2 do art. 1042.º e n.º 1 do art. 1048.º do C.C., libertando-se, deste modo, das consequências prejudiciais que possam advir da circunstância de ainda não ter cumprido a prestação e , porque se encontram verificados os pressupostos para a consignação em depósito, deve a mesma ser aceite.

1.2 – Citada a Ré [ nos termos do artº 917º, do CPC ], veio a mesma apresentar contestação, deduzindo oposição no essencial por impugnação [ alem de deduzir concomitantemente um pedido reconvencional ] , alegando estar-se perante uma consignação em depósito que (i) não foi efectuada nos termos do artigo 916.º do C.P.C., (ii) assenta em motivos inexactos e (iii) a não foi comunicada pela Autora à Ré em clara violação do disposto nos artigos 1084.º, n.º 3, do C.C. e artigo 19.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano (“NRAU”) , logo, pugna para que a final seja ; (i) a acção julgada improcedente por preterição dos pressupostos estabelecidos no artigo 916.º do C.P.C. ; caso assim não se entenda, (ii) a acção julgada improcedente, por não provada, declarando-se que a consignação efectuada pelo Autora não tem o efeito liberatório previsto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C.

in fine ; Caso assim não se entenda e se admita a consignação realizada pela Autora como regularmente efectuada ao abrigo do artigo 916.º do C.P.C. e eficaz nos termos e para os efeitos do artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e artigo 19.º do NRAU , subsidiariamente, (iii) Seja declarada a caducidade dos contratos de arrendamento que servem de fundamento à presente acção, julgando-se improcedente a presente acção por falta de objecto.

1.3. – Após resposta da Autora à matéria de excepção pela ré invocada e indeferido liminarmente o pedido reconvencional, porque não admissível, foram de seguida as partes informadas que tencionava o tribunal conhecer de imediato do mérito da causa, razão porque se lhes facultou o prazo de 20 dias para a discussão de facto e de direito, nos termos do disposto no artigo 597.º do Código do Processo Civil em conjugação com o disposto no artigo 595.º, n.º 1, alínea b) do mesmo diploma, aplicável por força do disposto no artigo 920.º, n.º 1, do mesmo diploma.

1.4. – Conclusos de seguida os autos para eventual decisão , foi então proferido Saneador-Sentença, sendo o respectivo segmento decisório do seguinte Teor: Decisão: Pelo exposto, julga-se totalmente procedente esta acção e julgam-se validamente depositadas as rendas e indemnização devidas.

Custas da acção pela ré.

Notifique-se e Registe-se.

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2020.

1.5. - Notificada da decisão referida em 1.4. , atravessou de seguida nos autos de consignação em Depósito a requerida B instrumento de interposição da competente Apelação, acompanhado das devidas alegações, e aduzindo então as seguintes conclusões : A. A Sentença recorrida padece do vício de nulidade, por omissão de pronúncia e falta de fundamentação nos termos dos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e d) e n.º 4, e 617.º, todos do CPC e artigo 205.º, n.º 1 da CRP.

  1. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre a (i) o uso dado pela Autora à acção especial de consignação judicial de depósito/erro na forma de processo, (ii) a verificação dos pressupostos para a consignação, amplamente discutida pelas Partes ao longo de todo o processo, para além de não ter concretizado a verificação dos mesmos no que respeita ao caso concreto, (iii) quanto à verificação dos pressupostos da consignação em depósito (mora do credor), (iv) o modo e lugar de cumprimento do pagamento das rendas, (v) sobre o dever de comunicação da consignação plasmado no artigo 19.º do NRAU e especificadamente não se pronunciou de o mesmo não ter sido assegurado no prazo de 1 (um) mês – prazo previsto para se pôr termo à mora, cfr. disposto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e artigo 19.º do NRAU, (vi) sobre o efeito liberatório da consignação efectuada pela Autora, ora Recorrida, assim como (vii) não se pronunciou sobre única questão que identificou como questão a resolver: “A questão a resolver pelo Tribunal consiste na verificação dos pressupostos para a atribuição da indemnização peticionada”, sendo que estes factos constituem questões essenciais controversas face ao objecto dos presentes autos.

  2. Com efeito, o Tribunal a quo limitou-se por iniciar a sua bastante escassa e praticamente inexistente fundamentação de direito quanto aos pressupostos da consignação em depósito referindo simplesmente que “A circunstância de o pagamento dever ser feito na residência do locador não é de molde a tornar irregular o depósito da renda, salvo o devido respeito por opinião diversa”.

  3. De uma forma muito genérica e vaga, pouco centrada no caso concreto e nos factos que resultam do processo, o Tribunal a quo limitou-se por iniciar a sua bastante escassa e praticamente inexistente fundamentação de direito quanto ao dever de comunicação do depósito efectuado referindo simplesmente que “Quando a ré pretendeu efectivar a resolução do contrato de arrendamento, no procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, na contestação, a ora Autora alega no artigo18.º e 19.º que instaurou esta acção e que tem estado a depositar as rendas, tendo junto cópia de guias de depósito, cumprindo desta forma o disposto no n.º 2, do artigo 19.º do RNAU. Por outro lado, anteriormente, a autora informou a ré da intenção de fazer cessar a mora, solicitando IBAN. Assim, inexiste qualquer falta de informação da ré”.

  4. O Tribunal desconsiderou por completo o facto de a presente acção especial de consignação judicial em depósito ter sido proposta apenas no dia 8 de Fevereiro, de a Autora não ter requerido a citação prévia da Ré, desta ter sido citada da presente acção apenas no dia 3 de maio de 2019, de a Autora não ter alegado ou feito prova que comunicou no prazo de 1 (um) mês o depósito efectuado, bem como o facto de a acção especial de despejo proposta pela Ré ter sido requerida no dia 29 de Abril de 2019 ( i.e. antes de a Ré ter conhecimento do depósito efectuado pela Autora junto da CGD ), os referidos factos não foram apreciados ou valorados na decisão tomada.

  5. Em conformidade, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 617.º do CPC, não tendo tido estes factos sido apreciados, nem tomados em conta na decisão proferida, sendo que os mesmos constituem questões essenciais controversas face ao objecto dos presentes autos, a sentença padece do vício de nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos197.º, 615.º, n.º 1, alínea d) e n.º 4, e 617.º do CPC, que expressamente se argui, devendo, com este fundamento, ser julgada verificada a invocada nulidade e, em consequência, deve a Sentença recorrida ser revogada G. O Tribunal a quo limitou-se a fazer uma síntese sobre (i) a qualificação dos contratos de locação, qualificando os contratos...

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