Acórdão nº 13995/18.9T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução24 de Setembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório A (…), nos autos m.id., instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, contra o Estado Português, B (…), C (…) e D (…), todos nos autos também m. id., peticionando a final: a) a declaração da nulidade da hipoteca sobre a fracção autónoma designada pela letra “… “, correspondente ao terceiro andar … para habitação, com arrecadação na cave do prédio sito na Av. (…), em Lisboa, descrito sob o nº (…), da freguesia de (…) e do respectivo registo constitutivo efectuado sob a Ap. (…), de (…), com o inerente cancelamento de tal registo e, a título subsidiário e para o caso de se entender que a hipoteca não padece da nulidade apontada, b) o pedido de cancelamento da mesma hipoteca e do seu registo constitutivo, por se mostrar excessiva atenta a constituição de outra hipoteca sobre outro imóvel, ambas para assegurar o mesmo crédito, estando esta segunda registada sob a Ap. (…) de (…), relativamente à fracção “(…)“ do prédio descrito na (…) C. R. Predial de (…), com o nº (…) e a consequente nulidade da penhora registada sobre a fracção dos pais do Autor sob a Ap. (…) de (…) quanto à fracção aludida em a) e, em qualquer dos casos, que seja ordenado o cancelamento da mesma penhora e do respectivo registo.

Em síntese alegou que seus pais, simuladamente, adquiriram em nome do R. D (…), a fracção “…”, que posteriormente foi doada por este Réu ao pai do A. Sucede porém que a mãe do filho do R. D (…), apesar de ter conhecimento de tais factos, requereu o registo de hipoteca sobre a mesma fracção para garantia de um direito a alimentos de seu filho (Réu C…) relativamente ao R. D (…).

A hipoteca é nula por omissão de menção da respectiva causa, do valor máximo do crédito por ela garantido e de identificação do próprio crédito garantido, além de que a mesma Ré, mãe do R. C (…), requereu a constituição de outra hipoteca sobre outro imóvel do Réu D (…), para garantia do mesmo crédito, tendo ambas as fracções aludidas sido, por isso, penhoradas, sendo pois que a hipoteca sobre a fracção (…) é excessiva.

Apenas o Réu Estado contestou, arguindo a respectiva ilegitimidade passiva na causa, impugnando parte dos factos alegados pelo Autor e pugnando, para o caso de se não concluir pela respectiva ilegitimidade passiva, pela improcedência da acção.

Notificado o Autor para, querendo, se pronunciar sobre a matéria de excepção pelo Réu Estado arguida, veio o mesmo pronunciar-se nos termos de fls. 70 a 71 dos autos.

Notificadas as partes para se pronunciarem sobre a eventual possibilidade de prolação de decisão de mérito em sede do despacho saneador, apenas o Réu Estado se pronunciou, nos termos de fls. 126 a 127 dos autos. Foi então conhecida a excepção de ilegitimidade do Estado, tendo sido julgada procedente e absolvido o Estado da instância, e seguidamente foi proferido saneador sentença de cuja parte dispositiva consta: “A) Julgar improcedente, por não provada a acção, no que ao pedido principal formulado pelo Autor contra os segundo a quarto Réus concerne e, por via disso, absolver os mesmos de tal pedido.

B) Julgar improcedente, por não provada, a acção, no que ao pedido subsidiário formulado pelo Autor contra os segundo a quarto Réus se refere e, consequentemente, absolver os mesmos de tal pedido.

C) Custas pelo Autor.

Do valor da causa – Nos termos das disposições legais conjugadas dos artºs 296, 297, 299, 305 e 306 do C. P. Civil, fixo à causa o valor de 30.000,01 Euros”.

Inconformado, o A. interpôs o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões: “1. A decisão da matéria de facto dada por assente relativamente às duas fracções hipotecadas pela mãe do (então) menor deve ser modificada no sentido de dela passarem a constar os factos sujeitos aos registo predial devidamente actualizados, ou seja, resultando do registo predial que determinadas penhoras, dadas como registadas pela decisão recorrida, foram canceladas, esses cancelamentos devem constar da matéria de facto dada como assente, até porque a nova situação dos prédios implica ponderação diferente quanto a cancelamento e redução da hipoteca para garantia de pagamento de dívida de alimentos que onera o prédio do ora recorrente.

  1. A sentença homologatória de divórcio por mútuo consentimento com o acordo de fixação de alimentos a favor do filho menor não é título bastante para registo de hipoteca legal, dado que é omissa quanto à determinação do valor a assegurar, quanto à determinação do valor da hipoteca ou hipotecas, e determinação do imóvel ou imóveis a hipotecar.

  2. As declarações complementares do progenitor que exerce as responsabilidades parentais quanto ao montante máximo a assegurar e determinação dos imóveis a hipotecar não constituem título bastante para registo e constituição de hipoteca legal.

  3. O artigo 706º nº 1 do Código Civil estipula que a determinação do valor da hipoteca estabelecida a favor de menor, interdito ou inabilitado, para efeitos de registo, e a designação dos bens sobre que há-de recair, cabem ao Conselho de família, e não distingue entre menor representado por progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais e menor representado por tutor.

  4. Daqui se retira que o progenitor que representa o menor só tem legitimidade para requerer o registo de hipoteca legal, depois da referida determinação pelo Conselho de Família, em vista do nº 2 do citado artigo 706º do CC.

  5. Inexiste razão ética ou legal para diferenciar entre credor de alimentos menor representado por progenitor e credor de alimentos menor representado por tutor, pelo que tem que entender-se que o legislador no nº 2 do artº 706º do CC, quanto a legitimidade para requerer o registo, também quis referir-se ao progenitor que representa o menor.

  6. Estando o menor representado por progenitor, não se entendendo como acima, por não haver lugar à constituição do Conselho de Família, tal implica uma desigualdade de tratamento entre o progenitor e o tutoro que não se justifica em face dos princípios de interesse e ordem pública que regem o Registo Predial, implicando deixar ao livre critério do progenitor não só a determinação do montante máximo assegurado pela hipoteca como a escolha do imóvel ou imóveis a hipotecar.

  7. Com a estipulação do artigo 706º nº 1 e n 2 do CC o legislador pretendeu assegurar não só os interesses do credor de alimentos mas também os do devedor de alimentos, não permitindo oneração desproporcionada do património deste, em vista dos interesses daquele, equilíbrio que visa igualmente quando o menor está representado por progenitor.

  8. Dai que, se se entende que não há lugar a deliberação prévia do Conselho de Família, que legitime o progenitor para requerer o registo de hipoteca legal, este progenitor, que representa o menor, tem de pedir a intervenção do tribunal para determinação do valor da hipoteca e dos bens a onerar.

  9. E nem se diga que a sentença homologatória e as declarações complementares do representante legal do menor, a ser constituída hipoteca com fundamentos nos mesmos, afastam constituição de hipotecas legais desproporcionadas, por excesso, por o devedor ter o beneficio da redução previsto no artigo 708º do CC, porquanto esta redução opera depois de ter sido observado o mecanismo legal para uma válida e justa e não excessiva constituição de hipoteca legal, que as disposições do artigo 706º nº 1 e nº2 do CC visam garantir.

  10. A falta ou insuficiência de título determina a nulidade do registo por força do artigo 16º alínea b) do Código do Registo Predial, bem como a falta das menções referidas no artº 96º nº 1 alínea a) do mesmo Código no que respeita às hipotecas (de qualquer natureza) determina essa nulidade artº 16º c) do Código do Registo Predial.

  11. O registo de constituição de hipoteca a que se refere a AP (…), que onera o prédio do recorrente, por a hipoteca ter sido constituída com fundamento em sentença homologatória da pensão de alimentos devidos ao menor, sem menção dos bens a hipotecar e sem menção dos montantes máximos assegurados, e sem que do registo predial conste qual o montante máximo que assegura (ainda que por recurso a declarações complementares) é nulo por violação das atrás citadas estipulações do Código do Registo Predial.

  12. É desnecessária e deve ser declarada nula, a hipoteca constituída sobre o prédio do ora recorrente pela mãe do alimentando, atento que o empréstimo garantido pela hipoteca de que beneficia o credor Banco E (…) (AP (…)), constituída sobre o outro prédio do pai do menor, não se encontra vencido, inexistindo penhora a favor deste credor bancário, e tendo em conta que o valor patrimonial deste imóvel, que é de (…) euros, por o produto da venda ser suficiente para assegurar o pagamento do montante máximo declarado pela mãe do C (…), que foi de (…) euros, sendo excessiva a hipoteca constituída pela mãe do menor sobre o prédio ora propriedade do recorrente.

  13. A sentença recorrida violou o disposto no artigo 706º nº 1 e 2 do CC e as disposições do Código do Registo Predial citadas na conclusão anterior.

Termos que deve o presente recurso ser considerado provado e procedente, declarando-se a nulidade da hipoteca constituída e registada sob a Apresentação (…) ordenando-se o respectivo cancelamento”.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir: II. Direito Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC - as questões a decidir são a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e saber se os pedidos devem proceder.

  1. Matéria de facto A decisão do tribunal de 1ª Instância sobre a matéria de facto é a seguinte: “Da instrução e discussão da causa resultam provados os seguintes factos com interesse para a decisão a proferir: 1 – A (…) nasceu no dia (…) de (…) de 19 (…), na freguesia de (…)...

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