Acórdão nº 187/10.4GTABF.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Setembro de 2020
Magistrado Responsável | ANA BACELAR |
Data da Resolução | 08 de Setembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.
RELATÓRIO No processo comum n.º 187/10.4GTABF do Juízo Local Criminal de Albufeira [Juiz 2] da Comarca de Faro, o Ministério Público acusou (…), pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.
Realizado o julgamento, perante Tribunal Singular, por sentença proferida e deposita em 9 de novembro de 2016, foi decidido: «i) Condenar o arguido (…) pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 60 (sessenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), perfazendo um montante global de € 300,00 (trezentos euros).
ii) Condenar ainda o arguido (…) na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias.
iii) Mais se condena o arguido (…) no pagamento das custas do processo, fixando a taxa de justiça em 2 (duas) unidade de conta.
» Na sequência de recurso desta decisão, interposto pelo Arguido, por acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 26 de junho de 2018, foi declarada a nulidade prevenida na alínea c) do artigo 119.º do Código de Processo Penal, que acarretou a invalidade da audiência de julgamento e de todos os atos subsequentes.
Devolvido o processo à 1.ª Instância e aí tendo sido dado cumprimento à decisão acabada de mencionar, foi proferida nova sentença, a 24 de fevereiro de 2020 e cujo depósito ocorreu na mesma data, onde se decidiu: «(…) condenar o arguido (…) , pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º do Código Penal
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Na pena principal de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de € 5 (cinco euros); B) Na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por 6 (seis) meses.
Condena-se ainda o arguido (…) no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (art. 8.º do Regulamento das Custas Processuais, com referência à Tabela III do mesmo diploma).
» Inconformado com tal decisão, o Arguido dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «a) – O despacho recorrido que negou ao arguido a produção dos meios de prova requeridos por extemporânea, violou o disposto nos arts. 283.º e 277.º e nos arts. 20.º e 32.º da CRP, na medida em que tinha que considerar que o arguido só foi validamente notificado quando prestou o TIR em 23 OUT 2019 e foi notificado de todas as demais obrigações legais.
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– Porém, tais notificações do RAI para contestar e apresentar rol de testemunhas ficaram sem efeito por força do despacho recorrido, em recurso que sobe com os presentes.
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– Pelo que entende o arguido que foi submetido a julgamento e condenado, sem que até à data tenha sido validamente notificado da acusação e para apresentar o RAI, na medida em que esta notificação não se confunde de todo com as notificações das datas para julgamento e para contestar.
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– O entendimento de que um arguido pode ser submetido a julgamento, relativamente a uma acusação de que nunca foi validamente notificado para apresentar RAI constitui inequivocamente uma interpretação inconstitucional e violadora dos arts. 20.º e 32.º da CRP, quanto ao disposto nos arts. 283.º e 272.º do CPP.
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– O arguido nunca foi sequer notificado editalmente da acusação.
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– Assim, entende o arguido que o seu requerimento dos meios de prova que apresentou não só é tempestivo, como os meios de prova em causa são pertinentes e necessários para o apuramento dos factos, a descoberta da verdade e a aplicação do direito; g) – O segundo exame pericial admitido pelos arts. 158.º e 159.º do CPP integra-se no regime da contraprova prevista e admissível nos termos do art. 153.º do CE uma vez que as amostras biológicas são guardadas para esse efeito nos termos do art. 16.º da Lei 18/2007 de 17/5.
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– Já que se o Tribunal não tem razões para duvidar do resultado do 1.º exame pericial, o arguido não tem razões para confiar no mesmo, e assiste-lhe o direito de requerer a contraprova, como contra-análise que a própria lei de fiscalização prevê.
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– O arguido foi objeto no início do ano de 2019 de um processo de internamento compulsivo como resultado provado e é do conhecimento oficial do Tribunal como resulta do proc. N.º (…) do Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim e por isso foi internado no Centro Psiquiátrico Magalhães Lemos no Porto.
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– Onde lhe foi diagnosticada “psicose paranoica evolutiva” a qual terá sido desenvolvida pelo choque da morte da sua mãe em abril de 2003 quando ainda tinha 22 anos de idade, segundo a médica psiquiátrica.
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– Pelo que tal doença terá afetado a sua consciência para efeitos da perceção da disfunção cognitiva relativamente a comportamentos legalmente censuráveis, impondo-se por isso a necessidade da realização de um exame psiquiátrico nos termos do artigo 159.º e 351.º do CPP, com fundamento na indicação daquele processo ao qual o Sr. Juiz a quo tem acesso.
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– Ao não ordenar os exames o Sr. Juiz a quo violou o disposto nos arts. 151.º, 158.º, 159.º, 340.º e 351.º do CPP e ainda nos arts. 20.º e 32.º da CRP.
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– Os factos constantes dos n.ºs 3 e 4 da matéria de facto dada como provada têm de ser eliminados por não integrarem qualquer facto, mas tão só conclusões de direito e meros juízos e por isso violarem o disposto na al. A) do n.º 1 do art. 389.º-A do CPP.
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– No que respeita ao facto n.º 5 devem do mesmo ser eliminadas as referências feitas aos processos relativos aos factos de março de 2008 e OUT 2008, por sobre os mesmos já terem decorrido mais de 10 anos e sobre as respetivas decisões mais de oito anos, pelo que já deveriam até ter sido eliminados do CRC.
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– Até o n.º 2 do art. 71.º do CP refere que “não releva para a reincidência” se entre a prática tiverem decorrido mais de 5 anos o que é manifesto em relação ao processo da R. P. da China, região de Macau.
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– O Sr. Juiz a quo desconsiderou que os registos do arguido não contêm quaisquer condenações sejam de que natureza forem quanto a alcoolemia e por isso a desnecessidade de qualquer prevenção especial para efeitos de censura da conduta do arguido ocorrida há cerca de 11 anos.
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– Na escolha da pena aplicável entre pena de prisão e pena de multa, na sua aplicação concreta quanto à medida da sua fixação não pode deixar de se ponderar sobre a gravidade, a reincidência e as necessidades de prevenção geral e especial e o grau de culpa.
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– Não pode sob pena de contradição e consequente nulidade referir-se que a infração tem gravidade média e aplicar-se a pena máxima como é o caso da decisão recorrida, punindo-se o arguido não pelo facto criminoso que lhe é imputado mas pelos factos das condenações pelas quais já foi julgado e devidamente censurado.
Termos em que deve o presente recurso ser dado como provado e procedente e em consequência ser a audiência de julgamento declarada nula e sem efeito e ordenando-se a sua repetição, após repetição de todos os atos omitidos desde a prolação da acusação.
Se assim não se entender deve a decisão ser revogada e substituída por outra em que a pena aplicada ao arguido corresponde a 1/3 da moldura penal da multa.
Termos em que assim decidindo farão V. Exas., aliás como sempre, a costumada JUSTIÇA!» Os recursos foram admitidos.
Respondeu o Ministério Público, junto do Tribunal recorrido, formulando as seguintes conclusões [transcrição]: «1. Por despacho proferido a 11.02.2020, foi indeferida a realização de exame de uma amostra de sangue recolhida em 2010 e o incidente de alienação mental, ambos requeridos pelo arguido , a 16.01.2020, tendo o Tribunal a quo entendido que o requerimento apresentado era tardio, pois podia ter sido oferecido na contestação, e, além disso, não era indispensável à descoberta da verdade e boa decisão da causa (art. 340.º, n.º 4, al. a), do CPP), porque inexistia qualquer motivo para duvidar do rigor do exame de fls. 12 e não existia nos autos qualquer indício de que, em 2010, o arguido padecia de qualquer doença mental.
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Por sentença proferida a 24.02.2020, foi condenado, em autoria material e sob a forma consumada, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de €5,00 (cinco euros), bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículo motorizados pelo período de 6 (seis) meses.
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Inconformado com estas decisões, delas veio o arguido interpor recurso.
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Quando ao despacho recorrido, o recorrente apresenta os seguintes fundamentos: A) Não se encontrava ainda precludido o prazo para apresentar o requerimento de prova; B) Quanto ao exame de sangue requerido, referiu que tem direito a requerer a contraprova, ao abrigo do disposto no artigo 153.º, do Código da Estrada, não sendo necessário sequer alegar quais os motivos pelos quais duvida do resultado da primeira análise, e, ao negar-lhe tal possibilidade, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 158.º, 159.º, do Código de Processo Penal, e 32.º, n.ºs 1 e 6, da CRP. Quanto ao incidente de alienação mental, explicou que nos autos não consta qualquer indício de que o arguido padecia de doença mental, nem o arguido sequer o alegou, uma vez que apenas foi internado compulsivamente no início do ano de 2019, tendo-lhe sido diagnosticada “psicose paranoica evolutiva”, facto que o próprio desconhecia, sendo que, por não ter confirmado se no ano de 2009 já padecia de tal doença e se a mesma era capaz de afetar a sua consciência e conduta relativamente a atos de natureza criminal, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 351.º, 151.º, 159.º e 340.º todos do Código de Processo Penal, e ainda do artigo 32.º, n.ºs 1 e 6, da CRP.
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Quanto à sentença recorrida, o...
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