Acórdão nº 913/19.6T8CVL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelISA
Data da Resolução14 de Setembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco – Juízo Local Cível da Covilhã – correm termos (sob o nº.

913/19.6T8CVLA) os autos de execução para pagamento de quantia certa (€20.960,01), sob a forma de processo ordinário, instaurados (no ano de 2019) pelo exequente, Banco P..., S.A.

contra as executadas, M...

e A..., tendo como título executivo uma livrança subscrita e entregue – em branco, contendo apenas as suas assinaturas - pelas últimas (em favor daquele/sacador) na sequência de celebração de um contrato de concessão de crédito para aquisição de veículo automóvel.

2. As executadas opuseram-se a tal execução, mediante a dedução (em 08/01/2020) de embargos.

Embargos esses que, em síntese, fundamentaram na seguinte matéria alegada: Na sequência do estipulado no aludido contrato (no qual as executadas/embargantes se comprometeram reembolsar o mutuário em prestações mensais) o exequente só poderia resolver o mesmo, e preencher a livrança dada à execução, em caso de incumprimento definitivo das mutuárias, o que só deveria suceder, além do mais, quando o montante das prestações em dívida excedesse 10% do valor total do capital mutuado.

O que não aconteceu no caso presente, pois que quando o exequente a tal procedeu o montante das prestações então em dívida não excedia tal percentagem de valor.

Pelo que invocaram, com base em tal fundamento, ter havido, por parte do exequente, violação do pacto que fora acordado para o preenchimento da livrança dada à execução, que leva à sua nulidade e, consequentemente, à inexistência de título executivo (cambiário).

Terminaram por pedir a procedência dos embargos.

  1. Contestou o exequente, defendendo-se por impugnação motivada, alegando em síntese: Que quando o exequente comunicou às executadas (depois de prévia e atempadamente as ter interpelado para cumprir as obrigações em falta, advertindo-as para as suas consequências e para o preenchimento da livrança) a resolução do contrato, com o vencimento imediato/antecipado das prestações em dívida, as mesmas apenas haviam pago 10 das 108 prestações a que se haviam contratualmente obrigado (no montante de € 278,11 cada), encontrando-se então por pagar parte da 11ª., e a totalidade das 12ª., 13ª., 14ª., 15ª. e 16ª. (sendo que quando aquela interpelação teve lugar a referida mora ocorria já em relação àquelas primeiras cinco prestações, num total de € 1.199,28).

    E sendo assim, havia fundamento legal e contratual para a resolução do aludido contrato e para o preenchimento da livrança dada à execução, nos termos em que o fez.

    Pelo que pediu a improcedência dos embargos.

  2. No despacho saneador, a sra. juíza a quo - entendendo disporem já os autos dos elementos necessários para conhecer da causa, sem necessidade de produção de mais prova – proferiu despacho saneador/sentença, no final da qual decidiu julgar procedentes os embargos, determinando, em consequência, a extinção da execução.

  3. Inconformado com tal sentença, o exequente dela apelou, tendo concluído as suas alegações de recurso nos seguintes termos: «

    1. O presente recurso tem como objecto a matéria de facto e, consequentemente, o respetivo tratamento ao nível da matéria de direito, já que o tribunal recorrido incorreu em manifesto erro de julgamento e de apreciação que, consequentemente, conduziu auma má aplicação do direito.

    2. O tribunal a quo considerou não verificada uma das condições de que dependia o vencimento antecipado das prestações: que o montante das prestações em dívida excedesse os 10% do montante total do crédito.

    3. Ao fazê-lo, salvo diverso entendimento, o tribunal a quo cometeu um erro na apreciação da norma de Direito aplicável ao presente caso, designadamente, o n.º 1 do artigo 20 do DL 133/2009.

    4. Mal andou o tribunal a quo nesta matéria, sendo algo com o que não se pode concordar.

    5. Segue-se nesta matéria o entendimento do douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.05.2015 do Relator Ilídio Sacarrão Martins disponível em in www.dgsi.pt onde se dispõe “que seja dada protecção ao consumidor que deixe de pagar duas prestações sucessivas que exceda 10% do montante total do crédito, mas já não se justifica que subsista a mesma protecção relativamente àquele consumidor que deixe de pagar mais do que duas prestações sucessivas, qualquer que seja o montante dessas prestações não pagas. Este consumidor relapso, reincidente, não merece aquela protecção quanto à perda do benefício do prazo e à resolução do contrato.” F) O facto das 5 (cinco) prestações vencidas, não pagas e sucessivas não representarem mais do que 10% do montante total do crédito concedido, não significa no caso em concreto que, não tivesse havido perda do benefício do prazo ou a possibilidade da resolução do contrato, face às comunicações quer de interpelação quer de resolução que o Recorrente fez (elencadas pelo tribunal a quo na factualidade relevante para a decisão da causa), concedendo, respetivamente o prazo suplementar de 20 (vinte) dias em cada uma das comunicações.

    6. Ora da redacção da alínea a) depreende-se que a mesma não contém duas condições cumulativas mas apenas uma: “falta de pagamento de duas prestações sucessivas que excedam 10% do montante do crédito”, entendendo-se que a falta de pagamento de 3 prestações seguidas - independentemente do seu quantum proporcional face ao montante do crédito concedido - permitirão a resolução do contrato desde que cumprido o formalismo constante da alínea b).

    7. O referido contrato foi incumprido.

    8. Perante o incumprimento foi o contrato legalmente resolvido pelo Recorrente.

    9. Deverá então ser revogada a decisão proferida pelo Tribunal a quo, sendo em consequência substituída por outra que condene ambos as Recorridas ao pagamento da quantia de € 20.960,01 (vinte mil, novecentos e sessenta euros e um cêntimo) acrescidos dos respectivos juros calculados à taxa contratual, desde a resolução contratual, operada em 25.05.2019 até efectivo e integral pagamento.

      » 6.

      Contra-alegaram as executadas/embargantes, pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção do julgado, e após concluírem nos seguintes termos: « 1- O presente recurso foi interposto do despacho saneador sentença que julgou procedentes os embargos de executados para pagamento da quantia exequenda de 20.960,01€, titulada por um livrança preenchida e emitida pela embargada e subscrita pelas embargantes, por considerar a inexistência de título executivo, por nulidade da livrança em virtude do seu preenchimento abusivo em violação do respetivo pacto de preenchimento; 2- A recorrente entende porém que as embargantes incumpriram definitivamente o contrato o que permitiu a sua resolução, não ocorrendo a alegada violação do pacto de preenchimento da livrança, inexistindo portanto a alegada nulidade da mesma, que, por isso, constitui título executivo válido; 3- A embargante e a sentença recorrida têm o mesmo entendimento que, quanto a tal matéria de incumprimento e resolução do contrato de crédito, não foram cumpridas as cláusulas contratuais gerais outorgadas pelas partes, bem como a legislação aplicável (Decreto-Lei 133/09, de 2 de Junho - contratos de credito aos consumidores), pelo que o mesmo não podia ser resolvido, como considera a recorrente.

      4- Considerando o teor da cláusula 15º das condições gerais do contrato, não pode haver dúvidas que o incumprimento contratual só poderá ocorrer pela falta de pagamento de duas ou mais prestações, quando o valor em conjunto das prestações incumpridas exceda 10% do valor total do crédito.

      5- Sendo o montante do crédito no valor de 21.954,31, torna-se claro que o contrato só poderia ser resolvido pela embargada por incumprimento dos mutuários quando tal incumprimento ultrapassa-se o valor de 2.194,43€, correspondente a 10% daquele valor, mesmo tratando-se de mais de duas prestações em atraso.

      6- Por sua vez, segundo o pacto de preenchimento da livrança, o banco ora exequente só poderia proceder ao preenchimento da livrança na sequência da resolução do contrato, resolução que por sua vez só era possível com o incumprimento do mesmo, nas condições acordadas naquele contrato, o que não ocorreu.

      7- Deste modo a ora exequente violou o respetivo pacto de preenchimento da livrança, o que, necessariamente, acarreta a nulidade da livrança dada à execução (art. 10º da LULL) e a inexistência do título executivo.

      8- Deve por isso o presente recurso considerar-se improcedente mantendo-se integralmente a sentença do tribunal da 1ª instância..

      » 7. Cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.

      II- Fundamentação

    10. De facto.

      Pelo tribunal da 1ª. instância foram dados como provados os seguintes factos: ...

    11. De direito.

  4. Do objeto do recurso.

    Com sabido, é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se fixa e delimita o objeto dos recursos, pelo que o tribunal de recurso não poderá conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs. 635º, nº. 4, 639º, nº. 1, 608º, nº. 2, e 852º do CPC).

    Ora, calcorreando as conclusões das alegações do recurso da exequente/apelante a única questão nelas colocadas traduz-se em saber se a exequente ao preencher a livrança dada à execução violou o pacto/acordo que para o efeito havia sido estabelecido com as executadas e, em caso afirmativo...

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