Acórdão nº 600/04.0TBSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelPAULO AMARAL
Data da Resolução14 de Julho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 600/04.0TBSTB.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora (…) intentou a presente acção de processo comum sob a forma ordinária, para efetivação de responsabilidade civil emergente de acidente contra 1. Lisnave Infraestruturas Navais, SA 2. Somague Engª, SA 3. Império Bonança-Companhia de Seguros, SA.

Alega ter sofrido um acidente que consistiu em ter sido atingido por um andaime e certo tipo de ferros porque um manobrador de grua embate com esta no dito andaime, fazendo cair a carga que transportava. O acidente ocorreu numa obra a cargo das duas primeiras RR..

*Nos articulados, foi suscitada a intervenção provocada da (…), Lda., como entidade patronal directa do A., e da (…) – Sociedade Fornecedora de Máquinas Industriais, Lda. enquanto sub-empreiteiro da R. Somague, SA.

Foi também pedida, pela R. Somague, a intervenção de (…).

*Finda a fase dos articulados, foi proferido despacho a convidar o A. a apresentar nova p.i. indicando que factos imputa a cada uma das RR..

*Foi apresentada nova p.i.

*Houve desistência do pedido de intervenção de (…).

*O A. peticiona a condenação das RR. no pagamento ao A. de € 600.000,00 a titulo de danos morais; de € 58.800,00 a titulo de danos patrimoniais vencidos; € 460.600,00 a fim de suprir a diferença para o futuro tendo em conta uma esperança de vida de 75 anos, ou em alternativa o valor mensal de € 700,00; do capital de € 222.000,00 a fim de suprir os danos emergentes vencidos e vincendos tendo em conta a esperança de vida de 75 anos , ou em alternativa o valor mensal de € 500,00; eventuais danos futuros materiais ou morais nos quais o A. venha a incorrer decorrentes do acidente objecto destes autos; Mais peticionou a condenação das RR. a suportar todos os danos patrimoniais futuros decorrentes do acidente indicando, entre outros, a perda mensal supra indicada; bem como a actualização deste valor tendo em conta a progressão na carreira do A. e a taxa de subida do custo de vida e da expectativa de maior ganho do A.; acrescidos dos correspondentes juros de mora vincendos calculados à taxa legal até efectivo e integral pagamento do devido, bem como procuradoria e custas de parte nas quais o A. venha a incorrer.

Além do que já se deixou exposto, alegou que a Somague tinha encarregado o gruista de garantir que de manobrar a carga com os cuidados devidos e que tal manobra seria feita em segurança e que a carga não colidiria com quaisquer objectos.

*As RR. contestaram.

*O processo seguiu os seus termos e, depois de realizada a audiência de julgamento foi proferida sentença cuja parte decisória é a seguinte: 1- Absolve-se do pedido a R. Lisnave Infraestruturas Navais, AS; 2-Absolve-se do pedido a R. (…) –Sociedade Fornecedora de Máquinas Industriais, Lda.; 3- Condena-se a R. Império Bonança-Companhia de Seguros AS (hoje Fidelidade-Companhia de Seguros, S.A.) no pagamento ao A., a título de indemnização por danos morais, a quantia de € 297.500,00 (85% de 350.000,00); 4- Condena-se a R. Império Bonança-Companhia de Seguros SA no pagamento ao A. da quantia que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença relativa aos montantes referentes a lucros cessantes e a danos emergentes com os limites das quantias peticionadas nos autos, descontando-se o valor da franquia do seguro cujo pagamento é a cargo da R. Somague; 5- Reconhece-se à R. Lisnave o direito a ser reembolsada do valor pago ao A. em sede de arbitramento de compensação provisória, valor esse a cargo da R. Somague e a descontar do montante indemnizatório a liquidar em execução de sentença; 6- Do cômputo indemnizatório global será descontado o montante pago a título de reparação provisória arbitrada no processo cautelar apenso; 7- Absolve-se a R. Somague do restante peticionado.

*Desta sentença recorrem o A. e a R. Fidelidade, impugnando a matéria de facto bem como a solução de direito.

*A R. conclui o seu recurso nestes termos: 3ª – Analisados os depoimentos testemunhais prestados em julgamento e, em especial, o da testemunha (…), impunha-se outro julgamento.

  1. – Impunha-se julgar demonstrado que a obra em questão dispunha de um plano de segurança que foi escrupulosamente aplicado e cumprido por todos os intervenientes na obra.

  2. – E, consequentemente, que as Rés empregaram todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos.

  3. – não foi feita qualquer prova da existência de uma qualquer relação de comissário/comitente entre o operador da grua e a Somague.

  4. – com base na matéria de facto a considerar provada, impunha-se a absolvição da Império Bonança, S.A., hoje Fidelidade-Companhia de Seguros, S.A..

  5. – Ainda que assim se não entenda, atenta a natureza do contrato de seguro, impunha-se a condenação solidária entre a Fidelidade (até ao limite do capital seguro) e o responsável pelo acidente.

    9º - Caso contrário e atenta a condenação em quantia que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença relativa aos montantes referentes a lucros cessantes e a danos emergentes com os limites das quantias peticionadas nos autos, descontando-se o valor da franquia do seguro cujo pagamento é a cargo da Ré Somague, a Fidelidade corre o risco de ver esgotado o capital da apólice ou, em última análise, de ter de pagar montante superior àquele que a sua obrigação contratual determina.

  6. – Não obstante, o Autor não logrou provar os danos patrimoniais alegados pelo que se impunha a absolvição do pedido.

  7. – Das condições especiais resulta que «002-Responsabilidade Civil Cruzada (…) a Seguradora não indemnizará o segurado ou terceiros ao abrigo desta clausula relativamente a (…) 3. Danos decorrentes de lesões corporais ou morte de empregados efetivos ou contratados temporariamente ao serviço do segurado que estejam ou devam estar seguros de acordo com o estabelecido na lei de Acidentes de Trabalho.» 12ª – Assim, nos termos do contrato de seguro celebrado, não pode a seguradora ser condenada a pagar qualquer verba a título de danos patrimoniais.

  8. – Danos patrimoniais esses que se encontram a ser ressarcidos pela seguradora de Acidentes de Trabalho.

  9. – O montante fixado na sentença a título de danos morais é manifestamente exagerado e não justificado.

  10. – Não tendo sido respeitados os critérios legais e jurisprudenciais para fixar o montante indemnizatório a título de danos morais, pelo que deve o mesmo ser reduzido ao montante de € 100.000,00.

  11. – Foram violadas as disposições dos artigos 341º, 342º do Código Civil, 494º e 496º do Código Civil e o Regime Jurídico do Contrato de Seguro.

    *O A. conclui desta forma: II. Atento o teor do contrato de empreitada, no qual é à Lisnave como dono da obra, a definir e a encarregar o empreiteiro da execução da mesma.

    1. Não se pode assim alhear a Lisnave da produção deste acidente e absolver a mesma.

    2. Assim, deve ser dado como provado que a Lisnave encarregou a Somague de realizar a obra, não se podendo face a terceiros alhear desta decisão.

    3. De facto, o contrato de empreitada e as exclusões de responsabilidade da Lisnave tem efeitos internos entre as partes, mas não pode impor-se face a terceiros como a vítima, ora A.

    4. Assim, a Lisnave deve ser solidariamente condenada com a Somague.

    5. No presente sinistro, constata-se a existência de um seguro facultativo e, por isso, nunca poderia ser absolvido o próprio segurado, devendo segurado e segurador ser solidariamente demandados e condenados.

    6. Dito de outra maneira, o legislador nacional não obriga o dono de uma obra a celebrar ou exigir aos empreiteiros um seguro de "all risks". O presente contrato de seguro foi celebrado no âmbito da autonomia da vontade entra as seguradoras, os empreiteiros e o dono da obra para cobrir de forma voluntária riscos empreitada perigosa e de uma obra complicada a realizar.

    7. O Tribunal, provavelmente atento o hábito de julgar acidentes de viação, fez um raciocínio e uma aplicação analógica do regime do seguro obrigatório de responsabilidade civil decorrente de acidentes de viação, logo de seguro de responsabilidade civil obrigatório, ao presente sinistro.

    8. Como dissemos acima, a legitimidade passiva exclusiva da seguradora é uma situação somente prevista na lei para certos tipos de seguro, e tem por fim evitar que em todo e qualquer acidente de viação, ou acidente de trabalho, o autor tivesse que demandar simultaneamente o segurado, o causador e a seguradora.

    9. Trata-se de uma situação excepcional com um regime de legitimidade processual expressamente previsto na lei, que não se aplica ao presente caso.

    10. De facto, louvamos a lei do contrato de seguro que reproduz o regime em vigor à data do sinistro, e que deve ser aplicado.

    11. Remetemos para o preâmbulo da LCS e remetemos para o artigo 146º: XIV. No seguro de responsabilidade civil voluntário, em determinadas situações, o lesado pode demandar directamente o segurador, sendo esse direito reconhecido ao lesado nos seguros obrigatórios de responsabilidade civil. Por isso, a possibilidade de o lesado demandar directamente o segurador depende de se tratar de seguro de responsabilidade civil obrigatório ou facultativo. No primeiro caso, a regra é a de se atribuir esse direito ao lesado, pois a obrigatoriedade do seguro é estabelecida nas leis com a finalidade de proteger o lesado. No seguro facultativo, preserva-se o princípio da relatividade dos contratos, dispondo que o terceiro lesado não pode, por via de regra, exigir a indemnização ao segurador.

    12. Não pode, o A e lesado, ver prejudicada a sua indemnização, recebendo apenas 85%, quando foram demandados os responsáveis e estamos face a um seguro facultativo.

    13. Assim e por ser um seguro facultativo, no qual a Lisnave e empreiteiros são segurados, devem responder seguro e segurados solidariamente pela totalidade dos danos causados.

    Assim, a presente decisão deve ser alterada devendo a Lisnave e a (…) ser condenadas solidariamente com a Somague e Império.

    Deste modo, todos os Réus devem ser condenados solidariamente nas Indemnizações, respondendo a Império apenas na...

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