Acórdão nº 342/17.6IDSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelLAURA GOULART MAUR
Data da Resolução23 de Junho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No âmbito dos autos com o NUIPC nº342/17.6IDSTB foi, em 28.10.2019, proferido o seguinte despacho (transcrição): “Lida a acusação deduzida nos presentes autos constato que aos arguidos é imputada a prática de um crime de fraude fiscal qualificada do artigo 104.°, nº 2, alínea b), do Regime Geral das Infracções Tributárias. Dispõe o artigo 311.°, nº 2, alínea a), do Código de Processo Penal, que o juiz rejeita a acusação na eventualidade de a considerar manifestamente infundada, sendo que os casos em que tal ocorre resultam especificados nas alíneas a) a d) do n.º 3 do artigo ora em menção, as quais dispõem, respectivamente, que a acusação é manifestamente infundada "quando não contenha a identificação do arguido"; "quando não contenha a narração dos factos", "se não indicar as disposições legais aplicáveis ou as provas que a fundamentam"; ou "se os factos não constituírem crime". No caso vertente, afigura-se e ressalvado diverso entendimento, que não é identificado o quadro legal aplicável aos factos descritos na acusação, pois somente é feita alusão à agravação a que respeita a alínea b) do nº 2 do artigo 104.° do Regime Geral das Infracções Tributárias, o qual dispõe «a mesma pena é aplicável quando A vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 50 000», mas sem que se aluda concretamente a qualquer alínea do nº 1, e, em especial, não se aludindo ao artigo 103.° do mesmo diploma legal e a qualquer uma das suas alíneas, faltando, pois, a menção concreta à disposição legal atinente ao tipo de crime imputado, somente resultando efectivada, reitera-se, a menção isolada à agravação. Ademais e mais uma vez ressalvada diferente análise, afigura-se-me que os factos que constam da acusação, por si só, não configuram a prática de um crime, mormente um crime de fraude fiscal. Dispõe o artigo 103.°, nº 1, alíneas a) a d), do Regime Geral das Infracções Tributárias, que «constituem fraude fiscal, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias», concretizando-se que a fraude fiscal pode ter lugar através da «ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável; ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária»; e «celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas». No caso vertente menciona-se na acusação que os arguidos - sociedade arguida e legal representante - procederam ao preenchimento e entrega, na parte relevante, das declarações de IVA respeitantes ao primeiro e segundo trimestres, identificando enquanto IVA dedutível, respectivamente, os montantes de € 68.766,04 e de € 31.765,63, referindo-se adicionalmente que foi realizada uma inspecção no âmbito da qual aqueles não apresentaram documentos contabilísticos, nem documentos de suporte à aquisição de bens e serviços, não tendo sido encontrados na respectiva contabilidade suporte de aquisições de bens e serviços declarados, concluindo-se assim que o montante de € 100.531,67 não lhes era devido e, bem assim, que subsistiu diminuição das receitas tributárias. Importa, pois, considerar que não se alega na acusação o elemento objectivo do crime de fraude fiscal, mais concretamente não se consignando factualidade em tal peça processual da qual se possa extrair "ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável", "Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária" e "celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas", aferindo-se que não é bastante alegar que não foram entregues e/ou encontrados documentos contabilísticos, antes se reputando como necessário, entre o mais, mencionar que o IV A dedutível declarado não se referia a operações de aquisição de bens e/ou serviços efectivamente realizadas por banda do sujeito passivo. Prosseguindo, é ainda de considerar que se alude a IVA dedutível, o qual, salvo o devido respeito, nunca seria de per se a vantagem patrimonial, pois que o mesmo simplesmente se repercute no IVA a entregar ao Estado por banda do contribuinte, isto é, o IVA dedutível, como o próprio nome indica, respeita a uma operação de subtracção. Afigura-se, pois, que seria necessária, por um lado, a indicação do IVA declarado pelo sujeito passivo e, por outro, a menção do IVA dedutível, só assim se logrando aferir da efectiva vantagem fiscal que o actor criminis visava. O que se acaba de referir é, aliás, evidenciado pelo artigo 19.°, n.º1, alínea a), do Código da IV A, quando aí se menciona que «para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram, o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos», tal como é no artigo 22.°, n.º 1, do mesmo diploma legal, aí se referindo «o direito à dedução nasce no momento em que o imposto dedutível se torna exigível (. . .) efectuando-se mediante subtracção ao montante global do imposto devido pelas operações tributáveis do sujeito passivo, durante um período de declaração, do montante do...

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